Em "
Por que continuamos a ignorar os rinocerontes cinzentos?" voltei a recolher elementos sobre o movimento em curso, que está a ganhar força e coragem, para começar a defender abertamente o desligar do aumento do salário mínimo do aumento da produtividade.
Entretanto, via Helena Garrido, fui encaminhado para esta conversa entre o Bicicletas e Fernando Alexandre no programa "
Tudo é Economia" de 21 Out 2019:
- ver minuto 41:40
- ver minuto 42:50 (sobretudo este trecho)
Tenho de confessar que a argumentação do Bicicletas faz sentido, se aumentarmos o salário mínimo as empresas que não o puderem suportar fecham e teremos cada vez mais emprego baseado em negócios que suportam salários superiores. O problema é o aviso de Nassim Taleb:
“Don’t take advice from those who are not at risk” for the consequences of a possible inflection point."
Até que as empresas novas apareçam para dar emprego aos desempregados das empresas que fecharam, muita gente com skin in the game vai sofrer.
Qual a alternativa ao modelo do Bicicletas? Esta semana encontrei no Jornal de Negócios um artigo que ilustra o que vai acontecer, "
Goucam entra nos EUA e na Alemanha":
"A Goucam é um dos maiores exportadores do concelho de Viseu, onde concentra o grosso do seu quadro de pessoal. Quase tudo o que produz é vendido fora de Portugal.
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Seja como for, estima que a indústria têxtil venha a ter grandes problemas a médio prazo por dificuldades em atrair mão de obra. Na indústria têxtil ganha-se por regra o salário mínimo mas "num centro comercial também e trabalha-se à noite e ao fim de semana". "O nosso maior concorrente nem é o salário. É a imagem". Ainda assim, quando questionado sobre a razão de ser de não pagarem mais para compensar a falta de mão de obra disponível, o CEO da Goucam diz que não é possível. "Não digo que não pudéssemos até pagar um pouco mais durante alguns anos. Mas estamos ao sabor das oscilações do mercado e de quem são os nossos concorrentes", diz, o que significa que "sabemos perfeitamente que há anos bons e há anos menos bons" e que a política atual permite que, mesmo apesar das crises, não falhe o pagamento de salários e a manutenção de postos de trabalho.
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O empresário explica os fatores que influenciam a competitividade de uma empresa nesta indústria e porque é tão grande a amplitude de preços finais praticados.
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Num setor como o têxtil que foi tão afetado pela globalização, é da Ásia que vem a maior concorrência?
Os nossos concorrentes são locais de produção com salários muito mais baixos. No nosso setor e, em particular, no nosso nível de atividade e na maior parte das empresas que ainda existem em Portugal, concorre-se com o Leste da Europa e com a Turquia. A Turquia e a Roménia são neste momento os nossos principais concorrentes, nomeadamente pela via da desvalorização da moeda.
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Tendo em conta que a competição é tão aguerrida nos custos de produção, não é por essa via que a Goucam tem vingado...
É. É muito importante neste negócio..
A ideia, porventura errada, que existe é que empresas de países pequenos como o nosso não conseguem competir por essa via, por faltar escala. E que é pela qualidade que se afirma.
Claro. Mas também no custo. Pode ter toda a qualidade do mundo. Se não tiver o custo correto, não vende a ninguém. Não tenhamos ilusões. Agora o que tentamos fazer é ter uma boa relação qualidade, custo e serviço. Os três são fundamentais."
Uma empresa que trabalha para marcas e que assenta a sua competitividade no preço. Havendo falta de mão de obra, já o escrevi aqui, o tema do salário mínimo desaparece, as empresas têm de pagar o valor de mercado, sendo a mão de obra escassa, quem não puder suportar o preço de mercado tem de fechar. Comparem com a concorrência de mão de obra destes casos "
Um exemplo de subida na escala de valor".
Portanto, as Goucan's deste país têm os dias contados. Não é má vontade, é destruição criativa. Imaginem que os funcionários da Goucan passam para uma empresa como as duas novas que vão para Santo Tirso:
- empresas dão alguma formação básica aos trabalhadores transferidos;
- trabalhadores de um momento para o outro tornam-se muito mais produtivos.
Porquê? Trabalham mais depressa? Não, por que passaram a produzir coisas diferentes. Mexeu-se no numerador da equação da produtividade.
BTW, há tempos aqui no blogue ou no Twitter, referi que quando a maré muda ... Ah!
Encontrei:
"Juro que andava há cerca de dois meses a reflectir sobre que empresas fecham primeiro quando há uma mudança da maré. E pensei nas várias empresas que nos últimos meses têm fechado apesar de não ficarem a dever nada a ninguém. Gente organizada percebe antes de todos os outros que não vale a pena enterrar dinheiro e age em conformidade. Gente que não tem noção, vai ser empurrada pela realidade."
Esta quarta-feira no Jornal de Notícias encontrei, "Declarada insolvência de têxtil em Guimarães":
"Na sequência de decisão judicial de decretar a insolvência da Famouscotton, os créditos têm de ser reclamados nos 30 dias seguintes à decisão. Está ainda agendada, para o dia 13 de dezembro, uma assembleia para apresentação do relatório da insolvência. Pelo que foi possível apurar, todos os trabalhadores têm os salários em dia. A Famouscotton é mais uma entre dezenas de empresas de pequena dimensão que estão a fechar, nos vales do Ave e Cávado, no setor têxtil. O Brexit, a guerra comercial entre os EUA e a China, bem como a deslocalização da produção são as razões apontadas pelos empresários para a estagnação."