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sábado, julho 19, 2025

Maturidade, inteligência e birras


Julgo que foi na quarta-feira, ao final do dia, que num jornal televisivo vi imagens de produtores de vinho do Douro a cortarem a estrada nacional 2 próximo da cidade da Régua.

Foi uma cena triste. 

Triste porque tinham um discurso emotivo e pouco racional. Um dizia que o Douro vinhateiro era um tesouro, outro recusava o conselho dos que dizem que vinhas têm de ser arrancadas e novas culturas encontradas, outro exigia aumento do benefício, outro ...

Triste porque o seu presente não tem futuro, mas ao mesmo tempo recusam mudar, recusam assumir a liderança da sua vida e optam por agenciar terceiros com a responsabilidade de lhes resolver os problemas, mas sem implicar sacrifícios.

Tão diferente do que encontrei num artigo do NYT do passado dia 17 de Julho que mão amiga me enviou, "Move Over, Curds. Whey, and Its Protein Punch, Is the New Big Cheese."

O artigo descreve a transformação da indústria de laticínios no Wisconsin, nos EUA, com foco na crescente valorização do soro de leite (whey) — outrora considerado um resíduo — como um produto de elevado valor proteico. Relata-se a história da quinta Norm-E-Lane e da queijaria Nasonville Dairy, mostrando como ambas se adaptaram a esta mudança. O boom recente do whey, alimentado por tendências de saúde e novos medicamentos contra a obesidade, gerou oportunidades económicas significativas, mas também trouxe riscos de saturação do mercado. O artigo sublinha a importância da adaptação rápida, da diversificação de produtos e do realismo económico por parte dos produtores. Sim, do realismo económico por parte dos produtores... o que aumenta a tristeza da cena passada na Régua.
"Ken Heiman is a certified Master Cheesemaker, one of four who ensure that the Cheddar, Gouda and other cheeses made at Nasonville Dairy in Marshfield, Wis., taste great.
But as proud as he is of his cheese, Mr. Heiman knows that his company's profitability these days is thanks less to Colby than it is to whey, the liquid byproduct of making cheese that helps to satisfy America's seemingly insatiable appetite for added protein.
Nasonville Dairy produces around 150,000 pounds of cheese a day, but just breaks even on most of it, especially the 40-pound blocks of Cheddar that are a cheesemaker's stock in trade. What increasingly keeps the lights on is whey.
"We ought to be thanking people who are buying whey protein at Aldi's," said Mr. Heiman, who, in addition to being a Master Cheesemaker, is Nasonville's chief executive. "It definitely enhances the bottom line."
Whey is so valuable because it can deliver a lot of protein in a small caloric package, especially as exhortations to consume more protein have popped up everywhere over the last two decades.
...
[Moi ici: A evolução do soro de leite: de resíduo a produto valioso. O preço desde 2020 triplicou. When Mr. Heiman, 72, began his career in the 1960s, it was pumped down a river, spread on a field, or fed to pigs. In other words, it was waste, and the only goal was to get rid of it as cheaply as possible.
Times have changed. "In the last decade or so, there are times when cheese is the byproduct of cheese production, and the cheese plants make more money off the whey production," said Mike McCully, a dairy industry consultant.
...
[Moi ici: Os produtores não controlam o preço do leite — são price takers] Still, the Meissners have little control over what they are paid for their milk. They are what economists call price takers, not price makers.
Milk is not priced like other commodities. Most milk in the United States is sold to dairy coops. The minimum price that farmers receive is set by the federal government - a system set up in the 1930s to bolster milk producers - and changes monthly depending on the various market forces hitting all milk products (cheeses, butter, yogurt, whey, etc.). Even farmers, like the Meissners, who sell their milk directly to cheese producers, get essentially the co-op price for their milk.
«There is not a lot of wiggle room of shopping around these days," Josh Meissner said."
...
[Moi ici: Agora entra a parte do realismo] The boom will eventually end. A glut of new cheese and whey plants are being built, and like fluid milk and Cheddar cheese before it, high-protein whey will become a commodity.
Norm-E-Lane and Nasonville Dairy are already looking over the horizon.
Emmett Meissner has begun raising Angus steers, taking advantage of historically high beef prices and customers' interest in knowing more about where their beef comes from. Mr. Heiman is pushing his specialty cheeses, like the ghost pepper Jack, that the bigger, more streamlined factories cannot make.
"The curse of any commodity business," Mr. Bozic said, "is that you cannot have extraordinary profits forever."
...
[Moi ici: Já antes Mr Heiman tinha dito no artigo] Although Nasonville is the largest cheesemaker in Wood County, in the heart of America's dairyland, he says it can't compete with West Coast dairies, where multinational conglomerates have built massive cheese plants.
"If you are making the same kind of cheese they make, you're roadkill," he said. "Those guys have efficiency that just spooks you."" [Moi ici: Daí o foco na produção de "specialty cheeses ... that the bigger, more streamlined factories cannot make"] 

É impossível não reconhecer a maturidade e a inteligência de quem não faz birra com as regras do jogo, mas observa o mercado com atenção, reconhece oportunidades (mesmo que passageiras), e age depressa para tirar partido delas.

Esta postura é o oposto da resignação ou da queixa. É uma atitude que junta realismo económico com iniciativa prática. Eles sabem que a rentabilidade extraordinária não dura — e por isso não se acomodam: já estão a preparar o passo seguinte enquanto o mercado ainda parece promissor.

No fundo, é disto que se faz a boa gestão: capacidade de observar, agir sem demora, aproveitar o ciclo em alta e preparar a próxima jogada. É a combinação de prudência com audácia, de pé no chão com olhos no horizonte. Um exemplo que muitos gestores — de qualquer sector — deviam seguir.

sábado, julho 05, 2025

E se começássemos a experimentar responsavelmente?



No JN do passado dia 3 de Julho encontrei mais uma página usada como megafone a pedir que perdas privadas sejam socializadas, "Viticultores fartos de "empobrecer alegremente"".

Está quase a fazer um ano que publiquei aqui "O foco certo", como o tempo voa.

Recordando um empreendedor que, depois de vender a sua empresa, viajou por Israel à procura de inspiração para investimentos na área agrícola, pergunto, não há culturas de nicho utilizadas em perfumaria e na indústria farmacêutica, com forte presença em Israel devido ao seu clima semiárido e à capacidade de inovação agrícola, que poderiam ser adaptadas ao terroir do Douro, especialmente nas zonas de encosta e com solos pobres?

A resposta que o ChatGPT deu surpreendeu-me, logo a abrir:
  • Labdanum (Cistus ladanifer) - Cisto ladanífero - Utilização: Perfumaria de luxo (nota de base resinosa, quente, semelhante ao âmbar). É a minha querida estêva (chara no Alentejo). Quem diria!!!
  • Helichrysum italicum - Sempre-viva (também chamada "curry plant") - Utilização: Perfumaria (aroma quente e apimentado), cosmética e medicina tradicional (propriedades anti-inflamatórias). Altíssimo valor por quilo de óleo essencial.
  • Salvia officinalis - Sálvia - Utilização: Cosmética, perfumaria, fitoterapia (anti-inflamatória, digestiva). Mercado em crescimento com exigência por origem controlada (tradição + qualidade).
  • Calendula officinalis - Calêndula - Utilização: Cosmética e farmacêutica (regenerador da pele, anti-inflamatório). Valor comercial médio-alto com boa procura.
Em vez de continuar a pedir que "alguém lá em cima resolva", talvez esteja na hora de parar, observar o que temos, e perguntar: o que é que ainda depende de nós?

Há conhecimento, há solos, há clima, há tradição agrícola — o que parece faltar é vontade de sair da cartilha única da vinha para o benefício.

A estêva já lá está, só precisa que a olhemos com outros olhos. 

E se deixássemos de empobrecer alegremente — e começássemos a experimentar responsavelmente?

sábado, maio 24, 2025

As vítimas... não são agentes livres?

Li no The Times do passado 5 de Maio "Appeal for farmers to earn more from food".

A baronesa Minette Batters, ex-presidente da National Farmers' Union no Reino Unido e actual líder de uma revisão sobre a rentabilidade agrícola, alerta que os agricultores devem ganhar mais com a produção de alimentos do que com subsídios ambientais como painéis solares ou projectos de reflorestação (rewilding). Actualmente, produzir comida muitas vezes é menos rentável do que outras formas de uso da terra.

"Batters stressed that the review would prioritise treating farms as businesses that needed to be economically viable in order to survive. Central to the review is the issue of how little farmers receive from the sale of their produce compared with what they invest in producing it."

Batters defende que as explorações devem ser tratadas como negócios viáveis, e denuncia práticas injustas dos supermercados, que pagam tarde e mal, aumentando a pressão económica sobre os produtores.

Inglaterra igual a Portugal. A incapacidade de olhar para as coisas como elas são. Então os agricultores não são livres? Não têm o poder de tomar decisões?

Recordo:

"Treating farms as businesses" - Esta frase sugere uma vontade de encarar a agricultura com racionalidade económica, o que é, à partida, uma boa notícia. Ou seja, abandonar a visão romântica ou meramente subsidiada da agricultura e centrar o debate na viabilidade económica da actividade agrícola.

"How little farmers receive compared with what they invest" - Aqui Batters aponta para um desequilíbrio entre custos de produção e rendimentos obtidos - uma crítica recorrente de agricultores em muitos países. O subtexto é que os preços pagos aos agricultores são tão baixos que colocam em causa a sobrevivência do sector.

Na prática, Batters parece colocar o ónus apenas no Estado e nas cadeias de distribuição, dizendo que:

  • o governo deve rever o equilíbrio entre subsídios ambientais e apoio à produção alimentar,
  • os supermercados pagam mal e pagam tarde, e que 
  • a agricultura deve ser tratada como negócio — mas sem implicar que os agricultores tenham de ajustar o seu modelo de negócio.

Ou seja: reclama-se viabilidade, mas não se discute a responsabilidade empresarial do agricultor.

O que está ausente nesta declaração?

Não há referência à melhoria de produtividade. Nem à diferenciação de produto. Nem à organização dos produtores para ganhar poder de negociação. Nem à inovação nos modelos de negócio ou canais de distribuição.

É como se a viabilidade económica dependesse apenas do contexto externo (subsídios e preços, ou seja, o locus de controlo externo), e não da capacidade de gestão e adaptação dos próprios agricultores. Isso pode gerar uma leitura passiva do papel do agricultor — como se fosse apenas uma vítima e não também um agente económico com margem de acção.

O que falta dizer é que: A viabilidade também depende da capacidade de cada agricultor em gerir bem, inovar e adaptar-se. A agricultura é uma actividade económica, e como qualquer negócio, implica risco, decisão e responsabilidade.

A caricatura diz "Os alemães que trabalhem" e é tipicamente tuga. Em Inglaterra será antes: "Os saxões que trabalhem".

quarta-feira, abril 23, 2025

Curiosidade do dia

O FT do passado dia 21 de Abril trazia um artigo, "Hospitality turns to baby boomers to ease staff shortage", que podia ser enviado ao sector do turismo português logo no dia em que o presidente da Confederação do Turismo aparece no JdN.

"Now, hospitality, once a long-hour, hard-graft, high-turnover culture, has evolved to be a more flexible working environment and as a result, is drawing more older workers back. Employers say they are attracted by the wide range of roles the industry offers as well as the social element. They have found hiring more in this age group boosts staff retention rates compared with, for example, more transient younger people and students.

...

Some of the UK's biggest hospitality companies are now directly targeting older workers. Pub and hotel chain, Fuller's, for example, has partnered with Rest Less, an over-50s digital community and job site and has adapted its recruitment strategy to attract this cohort."

O sector da hotelaria no Reino Unido está a tornar-se um dos principais empregadores para pessoas com mais de 50 anos, oferecendo flexibilidade, sentido de propósito e conexão social, especialmente após a reforma ou mudanças de carreira. 

O número de trabalhadores com mais de 50 anos aumentou significativamente no sector da hospitalidade O sector apresenta a segunda maior taxa de crescimento de emprego para este grupo etário, atrás apenas do "care sector".

As empresas reconhecem o valor da experiência, responsabilidade e capacidade de adaptação dos profissionais seniores. E estes continuam activos, encontram um novo propósito ou complementam rendimentos após a reforma. 

Recordo Depois não se venham queixar das empresas zombies (parte II)

sexta-feira, fevereiro 28, 2025

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?


Mão amiga fez-me chegar às mãos recorte do jornal "Barcelos Popular" com o artigo "Rombo no sector têxtil faz exportações reduzirem 12% em Barcelos" onde basicamente se repete o comunicado da Associação Comercial e Industrial de Barcelos (ACIB).

Recordo os temas:
Com base no conteúdo das páginas 2 e 3 do Barcelos Popular, fica evidente que a ACIB enfatiza a necessidade de intervenção pública para sustentar um sector têxtil em declínio. Enquanto a narrativa enaltece a região como um motor de empreendedorismo e capacidade industrial, paradoxalmente, reivindica subsídios para manter empresas cuja produtividade e competitividade são questionáveis.

A questão central reside na incoerência entre o discurso e a acção: defende-se o aumento da produtividade e da inovação, mas, simultaneamente, solicita-se financiamento público para sustentar empresas que, por razões estruturais ou de modelo de negócio ultrapassado, não conseguem manter a sua viabilidade. No contexto de uma União Europeia que privilegia a sustentabilidade económica e boas condições de vida, insistir na manutenção de um sector pouco competitivo à custa dos contribuintes parece ser uma estratégia míope.

Resta saber se a associação tem uma visão de futuro que vá além da dependência do Estado ou se continuará a perpetuar um ciclo de subsidiação sem uma estratégia real de adaptação e modernização. O locus de controlo está, claramente, no exterior, mas é crucial que se invista em soluções de longo prazo em vez de insistir numa lógica de curto prazo que já demonstrou falhas.

A forte dependência de subsídios e apoios públicos pode ter implicações sérias na produtividade e competitividade de longo prazo da economia de Barcelos. Se as empresas locais se habituarem a recorrer a ajudas externas sempre que enfrentam dificuldades, corre-se o risco de enfraquecer os incentivos à eficiência e à inovação. Uma economia que sobrevive à base de subsídios pode cair na armadilha de adiar ajustes necessários, criando empresas menos produtivas ou "zombies" mantidas artificialmente. 

No caso em análise, a ACIB insiste que as "empresas precisam de apoios, infraestruturas e acções colectivas bem executadas" para enfrentar a crise. Sem dúvida, infraestruturas melhores e colaboração podem aumentar a competitividade (por exemplo, melhor logística e cooperação sectorial). No entanto, se os apoios financeiros servirem apenas para cobrir prejuízos ou prolongar a vida de modelos de negócio ultrapassados, a competitividade e produtividade estrutural da região tende a estagnar ou deteriorar-se. É duro, mas aquele título de há dias, "It's no longer about how you do it; it's about what you do," mostra como é difícil ou quase impossível que os apoios pedidos ajudem a resolver a situação.

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?

Ontem de manhã vi este tweet na mouche:

A Teoria do Cavalo Morto é uma metáfora que se refere ao acto de continuar a investir tempo, esforço ou recursos em algo que claramente já falhou ou não tem mais hipóteses de sucesso. A expressão vem do ditado:

"When you discover that you are riding a dead horse, the best strategy is to dismount."

Ou seja, se um cavalo está morto, não adianta continuar a montá-lo – o mais lógico é aceitar a realidade e seguir em frente. No contexto empresarial, a metáfora é usada para descrever situações onde empresas, governos ou pessoas insistem em estratégias, projectos ou modelos de negócios falidos em vez de mudarem de abordagem.

quarta-feira, janeiro 08, 2025

Uma das piores coisas na cultura portuguesa

Escrevo muitas vezes aqui no blogue que defender o passado impede-nos de abraçar o futuro, mesmo um futuro cheio de incertezas. O passado é já certeza de um buraco.

Acerca do vinho, alguns postais recentes sobre a infantilidade de produtores e políticos:

Vamos a outra mentalidade.  

No FT do passado dia 4 de Janeiro no artigo, "French red wine in 'existential' decline as young tastes change":

"Consumption of red wine in France has fallen about 90 per cent since the 1970s, according to Conseil Interprofessionnel du vin de Bordeaux (CIVB), an industry association.

Total wine consumption, spanning reds, whites and roses, is down more than 80 per cent in France since 1945, according to data from Nielsen, and the decline is accelerating, with Generation Z purchasing half the volume bought by older millennials.

"The issues with wine - particularly red wine - are becoming existential now and have been problems for more than a decade," said Spiros Malandrakis, analyst at Euromonitor International.

...

The change in French consumption exacerbates global trends hurting the sector, such as people drinking less and changes in tastes. Red wines in particular are falling out of fashion among young people in favour of rosé, beer, spirits and alcohol-free options.

"With every generation in France we see the change. If the grandfather drank 300 litres of red wine per year, the father drinks 180 litres and the son, 30," CIVB board member Jean-Pierre Durand said. The industry is also grappling with a sharp fall in demand from China, one of its main export markets, and the impact of climate change. The challenges have not hit all categories of wine equally.

"High volume, heavily tannic reds are in strong decline and it's accelerating with generational change," said wine buyer Thomas Castet.

...

The pressures have led the Bordeaux region to begin uprooting up to 9,500 hectares of vines to curb overproduction and prevent the spread of disease through under-maintained vineyards. The plan, initiated in 2023, offers €6,000 per hectare to be uprooted, from a €57mn budget funded largely by the government and the CIVB.

"We can't continue to produce wines that don't get drunk," said Durand. "When the model is broken, we adapt."" [Moi ici: Este tipo de pragmatismo não é francês. Conseguem imaginar alguém com responsabilidades no sector falar claramente, falar com esta assertividade? Recordar aquele primeiro postal da lista: E dizer a verdade?]

Entretanto, no WSJ do mesmo dia 4 de Janeiro apareceu o artigo "Surgeon General Seeks Alcohol Cancer Label":

"The U.S. surgeon general said alcoholic beverages should carry cancer warnings to increase awareness that the drinks are a leading cause of preventable cancers.

An act of Congress would be required to change the existing warning labels on bottles of beer, wine and liquor.

...

Alcohol consumption is the third leading preventable cause of cancer in the U.S., after tobacco and obesity. The link between alcohol consumption and cancer risk has been established for at least seven types of cancer, including breast, colorectum, esophagus, liver, mouth, throat and voice box, Murthy said."

Claro que a gente olha para isto e estranha, basta pensar na longevidade dos povos do Mediterrâneo. No final acrescento um tweet de Nassim Taleb sobre este tema. A verdade é que o FT de 07 de Janeiro na sua última página incluiu um texto sobre o impacte deste assunto nos investidores "Alcohol health warnings are an alert for investors too":

"Few purveyors of alcohol will be toasting the new year.

Just three days in to 2025, the US surgeon-general was advocating labels to warn drinkers of the link to cancer. This time next year, Ireland will be health labelling its drinks.

The sector has little to be merry about in any case. Abstinence is in vogue, at least in swaths of the developed world.

The ranks of US adults aged 18-34 who have "ever" drunk an alcoholic beverage has fallen from 72 per cent to 62 per cent over the past two decades, according to Gallup polling. As if lower sales are not headache enough, tariffs mooted by US president-elect Donald Trump stand to erode earnings.

This starts to smack of structural decline."

Por fim, no FT do passado dia 3 de Janeiro, o artigo "Social pressure hits low-alcohol drinks market":

"Most consumers say it is acceptable to have no- or low-alcohol drinks when they go out but some opt for alcohol anyway because of social pressure, according to research by Heineken and the University of Oxford.

The study, based on an Ipsos survey of 11,842 adults of a range of ages in the UK, US, Spain, Japan and Brazil, found that 68 percent had tried no- or low-alcohol alternatives and 80 per cent believed that drinking them was more acceptable than it was five years ago." 

É curioso como, no sector vinícola, o ministro da Agricultura parece aplicar um modelo antigo: evitar mexer no barril, mesmo quando o vinho está claramente a azedar. Enquanto outros países — França, Irlanda e até os EUA — já estão a engarrafar a dura realidade sobre o futuro da indústria, nós ficamos a assistir a discursos que mais parecem rótulos publicitários do que uma análise crua das vinhas.

Se um responsável francês pode dizer, com a franqueza de quem já sentiu a pressão de 9.500 hectares a serem arrancados, que "não podemos continuar a produzir vinhos que não são consumidos", por cá o debate parece envelhecer sem esclarecimento. Será que o ministro receia que, ao abordar o tema, o vinho nacional seja confundido com vinagre? 

E que dizer das mudanças nos hábitos de consumo globais? O vinho não é apenas uma vítima da nova geração "Z" que bebe menos; é também um sector afogado em produções que já não encontram mercado, enquanto as gerações mais jovens optam por rosé, bebidas sem álcool ou até nada.

Ironia das ironias, é que até um simples acto de "poda" no discurso do ministro poderia fazer mais bem do que mal. Reconhecer que o modelo actual é insustentável seria como arrancar videiras velhas para abrir espaço para uma nova geração de ideias. Mas parece que por cá preferimos brindar à espera, enquanto o mundo já está a fazer planos para vinhas mais sustentáveis — económica e ambientalmente.

E o que dizer do senhor das selfies? Se há algo que não falta ao presidente da república é capacidade para nos brindar com gestos simbólicos. Entre selfies, abraços e discursos, o presidente é um verdadeiro especialista em palavras agradáveis e gestos populares. Mas quando o tema é o vinho — símbolo da identidade portuguesa e agora símbolo de uma crise estrutural —, o silêncio torna-se ensurdecedor, como um brinde que nunca chega.

O Presidente, sempre atento às tradições, poderia perfeitamente discursar numa adega e citar Camões, mas talvez fosse mais útil citar o Conselho Interprofissional do Vinho de Bordéus, que já arrancou as vinhas da negação e plantou a semente da adaptação. Em vez disso, parece que a postura é a de quem prefere contemplar as colinas de vinhedos enquanto o sector tropeça em sobreprodução e mudança de hábitos de consumo.

Será que o Presidente tem receio de se aproximar do tema? Talvez, por achar que questionar o modelo de negócio do vinho é tocar num pilar da cultura portuguesa. Mas será que não é precisamente o contrário? Defender o sector, como um verdadeiro chefe de estado, não significa apenas beber um copo ao lado dos produtores; significa alertar para a insustentabilidade, apoiar a modernização e promover mentalidades que enfrentem a realidade global.

Uma das piores coisas na cultura portuguesa. Não enfrentar o touro, desviar para canto.



quinta-feira, setembro 19, 2024

Como dar este salto? (parte II)

Parte I.

Ainda a propósito de:

Esperar que tudo corra pelo melhor, se "tivermos cuidado", vem na onda do tema frequentemente referido aqui no blogue acerca do locus de controlo.

A maioria das pessoas tem o locus de controlo no exterior, age como uma folha na corrente. Espera que um papá qualquer lhe resolva o problema. Basta recordar o caso recente dos viticultores do Douro referidos na hiperligação acima, ou da indústria de madeira e mobiliário que tem falta de matéria-prima nacional e age como se isso fosse problema do governo de turno.

Vamos agora ás empresas com gente com locus de controlo no interior. 

Vamos concretizar e chamar ao indicador da parte I de "Eficiência operacional". Uma empresa quer passar a sua eficiência operacional de 51% para 60%. O que faz?

Em vez de começar a dar tiros no escuro na esperança de que algo resulte, pode começar por interrogar-se: o que faz baixar a eficiência operacional?

Algumas empresas, não muitas, vão construir uma espécie de diagrama de Pareto para perceber quais os principais motivos na origem da perda de eficiência operacional. Algo deste género:
39% das ocorrências que baixam a eficiênca operacional têm como motivo principal o tempo de paragem por avaria.

Então, quem quer aumentar a eficiência operacional pode decidir, vamos:
  • Aumentar a manutenção preventiva
  • Comprar máquinas novas para substituir as mais antigas

Lembra um coro de vozes internas horrorizado com a perspectiva!!!

- Então, querem aumentar a eficiência operacional ou querem reduzir custos?
Querem optimizar não um, mas um conjunto de indicadores. 

E podem optimizar tudo ao mesmo tempo? 

Não, tem de haver trade-offs. Para ser muito bom a umas coisas não se pode ser bom a outras. Se calhar só se pode ser bom a umas, muito bom a outras e, a outras ainda, manter ou esperar o menos mau.

Como saber quais os indicadores que devem ser maximizados e quais os indicadores que devem se subordinar a esses?

Continua.

segunda-feira, setembro 02, 2024

O foco certo (parte II)

Já vivo neste país há muitos anos, mas é impressionante como ainda me consigo surpreender com a mentalidade portuguesa. É sempre possível cavar mais um bocado.

Numa empresa liderada por gente com o locus de controlo no interior olha-se para o contexto interno e externo, consideram-se as necessidades e expectativas das principais partes interessadas e tomam-se decisões:
  • continuar como se tem continuado;
  • mudar de mercado;
  • mudar de clientes;
  • mudar de modelo de negócio;
  • fechar e aplicar os recursos noutra coisa.
Gente com um locus de controlo interno acredita que os resultados das suas acções dependem principalmente das suas próprias decisões, esforços e comportamentos, em vez de serem determinados por factores externos como sorte, destino ou a influência de outras pessoas. 

Gente com um locus de controlo interno tende a assumir a responsabilidade pelos seus sucessos e fracassos. Acreditam que as suas acções têm um impacte directo nos resultados. Isso motiva-as a trabalhar mais arduamente e a tomar decisões proactivas para alcançar os seus objectivos.

Gente com um locus de controlo interno sente-se confiante na sua capacidade de influenciar os acontecimentos que são a sua vida. Assumem-se como motoristas, não como passageiros. Há muitos anos, aqui no blogue, usei o termo "folhas levadas pela corrente". Não, não se comportam como folhas levadas pela corrente. Essa autoconfiança faz com que sejam mais resilientes perante os desafios, pois acreditam que podem superar obstáculos com esforço e determinação.

Gente com um locus de controlo interno define metas, planeia e toma iniciativas para alcançar o que deseja, em vez de esperar que as coisas aconteçam por si só ou por intermédio de um "papá".

Gente com um locus de controlo interno são menos propensas a se sentirem vítimas das circunstâncias e mais propensas a buscar soluções para os problemas.

Agora leio "CNA pede audiência urgente ao ministro da Agricultura sobre crise no vinho" e encontro o contrário, um hino ao locus de controlo no exterior:

A CNA pede uma audiência urgente ao ministro da Agricultura, argumentando que a situação "exige uma resposta eficaz do Ministério da Agricultura"​. Este pedido reflecte a expectativa de que uma entidade externa (o governo) tome medidas para resolver os problemas enfrentados pelos produtores, o que é um indicativo de locus de controlo externo.

Os pequenos e médios produtores estão em "situação de desespero" devido às ameaças dos grandes agentes da transformação e do comércio de não comprarem uvas. A confederação menciona que os viticultores são "forçados" a vender as uvas a preços de há 25 anos e a suportar "enormes custos de produção", sugerindo que os produtores sentem que não têm controlo sobre essas condições adversas​. O que querem que o governo faça? Obrigar os "agentes da transformação e do comércio a comprarem uvas"? Obrigar os preços a subirem? Doar dinheiro impostado aos saxões para salvar os viticultores e impedi-los de mudar de vida? O que impede os viticultores de mudarem de vida?

O artigo destaca o "crescente desequilíbrio de poder de mercado entre a produção, a transformação e o comércio", sempre em prejuízo dos pequenos e médios produtores. Este comentário aponta para a crença de que forças externas (o mercado e os seus agentes) são responsáveis pelas dificuldades enfrentadas, em vez de um foco nas possíveis acções internas que os produtores poderiam tomar para mitigar esses efeitos​.

A frase “os agricultores serão obrigados a entregar as uvas ao senhor ministro da Agricultura e ao Governo” é um exemplo de como a CNA coloca a solução do problema inteiramente nas mãos do governo, sugerindo que os agricultores não têm outras opções viáveis além de depender da intervenção governamental​.

Isto é simplesmente doentio. Dificilmente sairemos desta espiral de infantilização de produtores, jornalistas e leitores dos orgãos de comunicação social. Nem a Iniciativa Liberal se atreve a contrariar as CNA's desta vida. 

Quanto ao governo de turno, recordo o ditado: Quem se deita com crianças acorda mijado.

A falta que nos fazem mais suíços e canadianos.

BTW, o artigo começa com:
"Para os agricultores, a "dramática situação do setor" exige uma resposta eficaz do Ministério da Agricultura, não se compadecendo com "paliativos, adiamentos ou silêncios ensurdecedores"."
E paliativos e adiamentos é precisamente o que a CNA está a pedir.

sexta-feira, maio 31, 2024

"Why is this so rare at work?"

No livro "The Problem with Change" de Ashley Goodall o autor conta a estória sobre Alexander the Great que citei em "When I show up in your life..." e depois interroga-se:

"I was, at the time, an executive of a multinational corporation with nearly eighty thousand employees who, when his car wasn’t broken down, spent his time shuttling from one meeting to the next and one airport to the next; Alex was spending his days hauling malfunctioning lumps of metal onto his truck. And yet he embodied all the things that large companies say they want their people to feel—motivation, energy, delight—to a vastly greater extent than anyone I had ever met in the corporate world. I was more than a little envious. My planet was embroiled in busyness and stress and swirl; his planet was happy. To talk to him was to talk to a person borne aloft by the simple joy of a thing done well.

Why is this so rare at work?"

Nas páginas seguintes do livro o autor procura responder recordando que:

  • O trabalho em muitas empresas, sobretudo as grandes, é complexo e intangível. Ao contrário das tarefas directas com resultados tangíveis (montar um sapato, construir uma máquina, rebocar um carro, realizar uma auditoria), o trabalho corporativo muitas vezes carece de relações claras de causa e efeito, dificultando a percepção do impacte dos esforços individuais. Quantas pessoas preparam relatórios, preparam apresentações para as suas chefias apresentarem aos tubarões e depois nada acontece? Não acontece porquê? Foi algo que eu fiz/não fiz?
  • As organizações tentam quantificar o desempenho com pontuações, metas e avaliações, mas essas métricas quase sempre não capturam a verdadeira complexidade e nuances do trabalho, levando à frustração e a um sentimento de desconexão das realizações reais. Por exemplo, uma empresa pode avaliar o desempenho dos funcionários com uma pontuação de 1 a 5. Um empregado pode receber um "4" sem entender exactamente o que diferencia um "4" de um "5". Esta falta de clareza pode gerar frustração e um sentimento de injustiça, especialmente se promoções e aumentos salariais são baseados nessas pontuações. Ou os funcionários devem preencher relatórios periódicos detalhando o seu progresso em vários projectos. No entanto, esses relatórios, muitas vezes, tornam-se tarefas burocráticas que não reflectem o verdadeiro valor ou impacte do trabalho realizado. 
  • Os trabalhadores muitas vezes têm dificuldade em ter consciência das suas habilidades e contribuições devido à natureza opaca das tarefas corporativas e à dependência de validação externa através de métricas e avaliações. Por exemplo, feedback insuficiente, desconhecimento dos resultados, avaliação por métricas contaminadas (professor avaliado pelos alunos que avaliam não a qualidade do professor, mas a dificuldade do curso)
  • Os gestores ainda fazem julgamentos subjectivos que tornam nebulosa a ligação entre esforço e resultado (promoções baseadas em relações pessoais, avaliação de desempenho subjectiva, projectos cancelados sem justificação dada após muito esforço).

"This drives people nuts.

And it happens not because we lack rigor in executing these things, but because the task we have set ourselves is impossible. We are trying to replace local judgment with global objectivity, and while that might be an understandable aspiration, the reality on the ground is far too complex to be squashed into a few simple scales and scores. As soon as we try, everyone's eyes go to the exceptions, the unfairness, the errors, the inadequacy of the model, and the world seems less fair, and less tangible, and more mysterious as a result.

So the question remains. How, given all the complexities of modern work, and the scale at which it exists, and its ever-shifting nature, can we more nearly approach the joy of the tow truck driver, who can see a problem and fix it, who needs no one to tell him he has done so, or to evaluate him on his level of achievement or ability, and who feels, literally, like a king?"

domingo, fevereiro 11, 2024

Coisas que me fazem espécie

Encontrei um artigo com este título, "Indústria de madeira e mobiliário tem falta de mão de obra qualificada". Vejamos algumas citações:

"Vida Económica - Qual a atual situação geral do mercado da madeira e do mobiliário?

Vitor Poças - A evolução do mercado da madeira e mobiliário tem sido muito positiva, sobretudo no que diz respeito ao volume de exportações do setor que, nos últimos 12 anos, apresentou um crescimento verdadeiramente notável, passando de 1,5 mil milhões em 2010 para mais de três mil milhões em 2022. Num panorama mais recente, ainda só temos dados oficiais até novembro de 2023, o setor apresenta um crescimento global das suas exportações de 4,6% em comparação com o mesmo período do ano anterior, sendo que esperamos alcançar um record histórico de 3170 milhões de euros no final do ano. ...

VE - Quais os principais problemas que se colocam às empresas do setor?

VP - O setor tem desafios, alguns deles específicos do setor da madeira e mobiliário e/ou dos seus sub-setores, muito concretamente no que diz respeito à escassez de matéria-prima de origem nacional e de mão de obra qualificada, bem como dos custos de contexto para um setor industrial que, do nosso ponto de vista, o país teima em não acarinhar transversalmente, como a carga fiscal desproporcional sobre os rendimentos de quem trabalha, problemas de licenciamento industrial, burocracias, ineficiência de funcionamento do Estado em razão de celeridade de processos, desmotivação das pessoas, escassez de meios e ausência de proximidade para resolução de problemas concretos das pessoas e das empresas que poderiam catapultar o crescimento económico. 

...

VE - As empresas estão a fazer um esforço no sentido da internacionalização?

VP - Sim, sem dúvida. Portugal é um mercado de pequena dimensão pelo que o crescimento das empresas passa pelo aumento das exportações, ... Por outro lado, normalmente a exportação e a internacionalização permitem às empresas uma maior rentabilidade associada a uma maior valorização do produto, pelo que esta estratégia é seguida e constitui uma aposta das empresas nacionais e do setor.

...

VE - Tem havido problemas no fornecimento das matérias-primas?

VP - Sim, a questão da matéria-prima é crítica e penaliza a competitividade das nossas empresas. Portugal teima em não promover a exploração profissional da nossa floresta, fazendo uma gestão quase ruinosa da mesma e isso, obviamente, obriga à importação de enormes quantidades de matérias-primas, com todos os custos de transporte e de logística implícitos, e isso sem dúvida que afeta toda a fileira."

Portanto, primeiro:

  • crescimento significativo das exportações
  • a internacionalização é vista como uma forma de aumentar a rentabilidade e a valorização dos produtos
Seria interessante saber qual o aumento médio do preço de venda, e qual o aumento da rentabilidade média.

Segundo:
  • há uma crítica à gestão da floresta em Portugal, que é considerada quase ruinosa, levando à necessidade de importar grandes quantidades de matérias-primas. Isso implica custos adicionais de transporte e logística, afectando a competitividade das empresas portuguesas no setor.
Este trecho faz-me espécie, "Portugal teima em não promover a exploração profissional da nossa floresta,".

Portugal? Quem é Portugal? Típico de quem tem o locus de controlo no exterior. Quem tem mais a lucrar com uma boa gestão da floresta portuguesa? As empresas que fazem parte da Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal (AIMMP). Assim, a AIMMP é que devia tudo fazer para que os proprietários vissem como uma boa opção evoluir para uma exploração profissional das suas propriedades florestais.

Terceiro:
  • escassez de mão-de-obra qualificada
Então, tanto sucesso a exportar e a aumentar a rentabilidade e os preços e não se consegue seduzir mão-de-obra qualificada, por que será?

A minha resposta é; não há falta de mão-de-obra qualificada, há sim incapacidade de pagar salários suficientemente atractivos. Por causa da carga fiscal e por causa do valor acrescentado que o sector consegue gerar. Não digo que seja o caso aqui, mas recordo que é possível ser competitivo, aumentar as exportações e ir empobrecendo. Recordar também Explicar o mais importante.


quarta-feira, novembro 29, 2023

Desenhar futuros alternativos

Estava no meio de uma reunião via Teams quando um e-mail chegou com o video abaixo:

Vi-o ainda nessa manhã.

Achei esta análise muito interessante. Subir na escala de abstracção e olhar para os fluxos de factores que podem criar futuros alternativos. Como não recordar as três setas de Subsídios para um primeiro-ministro.

O que Zeihan faz é olhar para as três setas e numa primeira rodada lançar um cenário possível, para depois pensar nas alternativas de resposta, ou de antecipação de alguém com locus de controlo no interior.


sexta-feira, novembro 17, 2023

Depois não se venham queixar das empresas zombies (parte II)

Ontem publicamos aqui no blogue: "Depois não se venham queixar das empresas zombies". 

Volta e meia escrevo aqui sobre o país do absurdo. Querem mais um exemplo? O novo aeroporto de Lisboa. Às segundas, terças e quartas, empertigam-se porque já deveria estar construído e em operação, para às quintas, sextas e sábados protestarem contra o excesso de turismo e contra as alterações climáticas.

Às segundas, terças e quartas, empertigam-se porque temos demasiadas empresas zombies...

para às quintas, sextas e sábados, quando lhes começam a tremer as pernas, protestarem por causa da falta de apoios para elas.

Voltemos ao tema da parte I, a falta de mão-de-obra. Vai ser o novo normal.

Entretanto no NYT de quarta-feira passada encontro "Signs of a Lasting Labor Crunch"

"At Lake Champlain Chocolates, the owners take shifts stacking boxes in the warehouse. At Burlington Bagel Bakery, a sign in the window advertises wages starting at $25 an hour. Central Vermont Medical Center is training administrative employees to become nurses. Cabot Creamery is bringing workers from out of state to package its signature blocks of Cheddar cheese.

The root of the staffing challenge is simple: Vermont's population is rapidly aging. More than a fifth of Vermonters are 65 or older, and more than 35 percent are over 54, the age at which Americans typically begin to exit the work force. No state has a smaller share of its residents in their prime working years.

Vermont offers an early look at where the rest of the country could be headed

...

"All of these things point in the direction of prolonged labor scarcity," 

...

Employers are fighting over scarce workers, offering wage increases, signing bonuses and child care subsidies, alongside enticements such as free ski passes. [Moi ici:a diferença para a parte I é notória] When those tactics fail, many are limiting operating hours and scaling back product offerings.

...

Long-run labor scarcity will look different from the acute shortages of the pandemic era. Businesses will find ways to adapt, either by paying workers more or by adapting their operations to require fewer of them. Those that can't adapt will lose ground to those that can.

"It's just going to be a new equilibrium," said Jacob Vigdor, an economist at the University of Washington, adding that businesses that built their operations on the availability of relatively cheap labor may struggle. [Moi ici: A quem caberá a carapuça?]

...

"You may discover that that business model doesn't work for you anymore," he said. "There are going to be disruptions. There are going to be winners and losers." [Moi ici: Sinto tanta falta deste pragmatismo adulto carregado de bom senso... faz-me voltar ao piquenine e às formigas de 2006

...

The winners are the workers. When workers are scarce, employers have an incentive to broaden their searches - considering people with less formal education, or those with disabilities and to give existing employees opportunities for advancement.

...

Other businesses are finding their own ways to accommodate workers. Lake Champlain Chocolates, a high-end chocolate maker outside Burlington, has revamped its production schedule to reduce its reliance on seasonal help. It has also begun bringing former employees out of retirement, hiring them part-time during the holiday season.

...

"We've adapted," said Allyson Myers, the company's marketing director. "Prepandemic we never would have said, oh, come and work in the fulfillment department one day a week or two days a week. We wouldn't have offered that as an option."

Then there is the most straightforward way to attract workers: paying them more. Lake Champlain has raised starting wages for its factory and retail workers 20 to 35 percent over the past two years.

...

"We need to start looking at immigrants as a strategic resource, incredibly valuable parts of the economy,;" said Ron Hetrick, senior labor economist at Lightcast, a labor market data firm."

Na parte I temos o típico comportamento tuga em que o locus de controlo está no exterior (nós somos uns desgraçados, uns Calimeros, não temos agência, tem de ser alguém no exterior a resolver o nosso problema). Na parte II temos um discurso em que o locus de controlo está no interior.

domingo, setembro 17, 2023

Locus de controlo no interior ao vivo e a cores

"TALK TO GERMAN bosses these davs and sooner or later one will bring up "Buddenbrooks. Thomas Mann's epic tale of the eponymous clan of grain merchants and their demise is required reading in Germany's business circles, as well as its schools. Today it serves as a convenient metaphor for the country's perceived economic decline.
...
Viewed through a tragic Buddenbrookian lens, German decline can seem inevitable. Not to Nicola Leibinger-Kammüller, chief executive of Trumpf, a 100-year-old family company based in Ditzingen, near Stuttgart, which makes industrial tools such as laser cutters and punching machines. In Mrs Leibinger-Kammüller's reading, the Buddenbrooks' downfall was not caused by others. They brought it on themselves, by turning their backs on the virtues of thrift and hard work. [Moi ici: Isto é tudo o que falta na nossa sociedade, este locus de controlo no interior] That leaves a path to redemption. And this, she believes, runs through the Mittelstand, the German economy's enterprising backbone.
The Mittelstand is home to some 3.5m small and medium-sized businesses. They are as diverse as their wares, which range from chainsaws to industrial software. ... Despite this diversity, they share two important things in common. They are relentlessly innovative. And, not unrelatedly, their leaders are, like Mrs Leibinger-Kammüller, less gloomy about Germany's prospects than many of their blue-chip counterparts.
...
If there is a Buddenbrook in the latest chapter of the Mittelstand story, it is the German government. Policy makers and bureaucrats have become too set in their ways, sighs Mr Steil. They seem wedded to red tape and high taxes, and uninterested in supporting innovation. This is leading some Mittelstand firms to sell up or try their luck elsewhere."

Trechos retirados de "Deutschland AG's bright light bulb

quinta-feira, agosto 24, 2023

"The "autotelic self""

E aplicar o que segue a empresas? Atentas ao contexto, prontas a abraçar a mudança, e sentindo-se ao volante,  estabelecem indicadores e objectivos, monitorizam o desempenho e tomam decisões com base no feedback. Não porque seguem uma receita, mas porque vivem.

"A person who is healthy, rich, strong, and powerful has no greater odds of being in control of his consciousness than one who is sickly, poor, weak, and oppressed. The difference between someone who enjoys life and someone who is overwhelmed by it is a product of a combination of such external factors and the way a person has come to interpret them - that is, whether he sees challenges as threats or as opportunities for action. [Moi ici: Recordar as reflexões sobre os que resistem à mudança versus os que a abraçam - Abraçar ou resistir à mudança? ou Resistir versus abraçar]

The "autotelic self" is one that easily translates potential threats into enjoyable challenges, and therefore maintains its inner harmony. A person who is never bored, seldom anxious, involved with what goes on, and in flow most of the time may be said to have an autotelic self. The term literally means "a self that has self-contained goals," and it reflects the idea that such an individual has relatively few goals that do not originate from within the self [Moi ici: Recordar as reflexões sobre o locus de controlo interno e externo - Isto é mesmo um desafio digno de Hercules e Calimeros - não obrigado!].  For most people, goals are shaped directly by biological needs and social conventions, and therefore their origin is outside the self. For an autotelic person, the primary goals emerge from experience evaluated in consciousness, and therefore from the self proper.

The autotelic self transforms potentially entropic experience into flow. Therefore the rules for developing such a self are simple, and they derive directly from the flow model. Briefly, they can be summarized as follows:

1. Setting goals. To be able to experience flow, one must have clear goals to strive for. A person with an autotelic self learns to make choices-ranging from lifelong commitments, such as getting married and settling on a vocation, to trivial decisions like what to do on the weekend or how to spend the time waiting in the dentist's office--without much fuss and the minimum of panic.

...

As soon as the goals and challenges define a system of action, they in turn suggest the skills necessary to operate within it. If I decide to quit my job and become a resort operator, it follows that I should learn about hotel management, financing, commercial locations, and so on. Of course, the sequence may also start in reverse order: what I perceive my skills to be could lead to the development of a particular goal that builds on those strengths - I may decide to become a resort operator because I see myself as having the right qualifications for it.

And to develop skills, one needs to pay attention to the results of one's actions-to monitor the feedback. To become a good resort operator, I have to interpret correctly what the bankers who might lend me money think about my business proposal. I need to know what features of the operation are attractive to customers and what features they dislike. Without constant attention to feedback I would soon become detached from the system of action, cease to develop skills, and become less effective.

One of the basic differences between a person with an autotelic self and one without it is that the former knows that it is she who has chosen whatever goal she is pursuing. What she does is not random, nor is it the result of outside determining forces. This fact results in two seemingly opposite outcomes. On the one hand, having a feeling of ownership of her decisions, the person is more strongly dedicated to her goals. Her actions are reliable and internally controlled. On the other hand, knowing them to be her own, she can more easily modify her goals whenever the reasons for preserving them no longer make sense. In that respect, an autotelic person's behavior is both more consistent and more flexible."

sexta-feira, julho 21, 2023

Há que fuçar e reinventar-se ponto

Lê-se o FT e percebe-se a decadência do Reino Unido pós-Brexit.

Lê-se "Rust belt on the Rhine - the deindustrialization of Germany" e percebe-se o momento crucial por que passa a economia alemã. E fico a pensar no potencial de repercussão em toda a UE que depende da "caridade" alemã.

E recordo um vídeo recente de Peter Zeihan sobre a Califórnia onde ele refere:

"But now, all of the factors that have propped up California are flipping. Immigration is stalling. The capital situation is upside down. The cost of living is through the roof, so the labor force is moving to places like Texas. Rising tensions with Asia are causing reshoring and nearshoring. The only thing California can do now is reinvent itself."

Gosto do locus de controlo no interior. O mundo muda... não adianta chorar pelo queijo desaparecido, há que fuçar e reinventar-se ponto. 

Esta postura implica enfrentar o mundo de frente e ir ao fundo das questões, não passa por tapar o sol com uma peneira. Nunca mais vou esquecer a cena do regicídio.

BTW, o que passou com o Expresso e a médica Diana Pereira no Algarve é outra ilustração da cultura que leva ao evitar ir ao fundo das questões.

domingo, junho 18, 2023

Não acreditem no Pai Natal!

Sexta-feira passada ao final do dia, acabei de ver o filme "The Martian" em folhetins de cerca de 20 minutos ao longo de 3 ou 4 dias.

Gostei muito. MUITO MESMO!

Comecei a gostar do filme logo ao final dos primeiros 20 minutos. Experimentei uma sensação positiva indefinida que se manteve e até se reforçou ao longo do filme.

No final do filme percebi o porquê. É uma ode ao locus de controlo interno. Engraçado, no almoço dessa mesma sexta-feira com o meu parceiro das conversas oxigenadoras tinha falado do locus de controlo interno, um tema que acompanha este blogue há anos (2007 - ver também o marcador). Na altura escrevi aqui:

"É arrepiante a situação... quem tem o seu Locus de Controlo no exterior, ao atribuir poder a forças exteriores, para ditar o destino, para mudar as coisas... quase não tem motivação para agir, para melhorar, para actuar... afinal de contas, sente-se, acredita que é uma espécie de Calimero jogado de um lado para o outro pelos deuses! Esta postura degenera em "the discovery that loss of control leads to learned helplessness, a state similar to depression."" 

O click no final do filme ocorreu-me quando Mark Watney (o marciano) diz:

"When I was up there, stranded by myself did think was going to die? [Moi ici: Estava sozinho e sem contacto com a Terra] Yes, absolutely. 

And that's what you need to know going in because it's going to happen to you. This is space. It does not cooperate. At some point everything is going to go south on you. Everything is going to go south and you’re going to say 'This is it. This is how I end.' Now you can either accept that or you can get to work. [Moi ici: "You", não o papá, não o governo, não o outro, mas eu] That’s all it is. You just begin. You do the math, you solve one problem. Then you solve the next one, and then the next and if you solve enough problems you get to come home."

E o que é a vida? Aqui recordo o Livro do Génesis no capítulo 3:

"17 E ao homem disse: «Já que deste ouvidos à tua mulher e comeste do fruto da árvore, do qual eu te tinha proibido de comer, a terra fica amaldiçoada por tua causa, e será com grande sofrimento que dela hás de tirar alimento, durante toda a tua vida.

18 Só produzirá espinhos e cardos e tu terás de comer a erva que cresce no campo.

19 Só à custa de muito suor conseguirás arranjar o necessário para comer, até que um dia te venhas a transformar de novo em terra, pois dela foste formado.

Na verdade, tu és pó e em pó te hás de transformar de novo."

A vida envolve inerentemente lutas que os indivíduos têm de enfrentar e superar obstáculos para encontrar significado e realização. E a responsabilidade de agir é de cada um, não podemos esperar que outros decidam por nós.

E esta mensagem sobre o locus de controlo interno não é só sobre uma pessoa abandonada e isolada num planeta deserto. É quando a tripulação da Hermes a caminho da Terra resolve "amotinar-se" para regressar a Marte e salvar Mark. É quando a tripulação da Hermes tem de tomar uma decisão sobre como agarrar Mark no espaço, começam por desligar o som, retirar Houston da tomada de decisão. A decisão é deles.

 

Vivo num país em que o locus de controlo mais comum está no exterior. Toda a gente quer ser ajudada, toda a gente sente-se coitadinha. Mais, toda a gente pensa que tem direito a essa ajuda.

Os partidos políticos, da direita socialista à esquerda socialista, até a Iniciativa Liberal vai aderindo ao catecismo (têm de conquistar mais e mais votos), passam a mensagem: Todos têm direito a um queijo diário!!!

Acreditem no Pai Natal.

BTW, a banda sonora final ... 


... é a continuação da mensagem.

terça-feira, abril 11, 2023

Os culpados são os outros

"A falta de competitividade, de tecnologia, de trabalhadores qualificados e o excesso de legislação são os principais obstáculos para o crescimento da agricultura portuguesa. O problema não é a falta de dinheiro, mas sim a escassez de visão e de capacidade para utilizar os recursos disponíveis, alerta a Confederação dos Agricultores de Portugal."

Tantos culpados, todos externos. 

Estranho, os agricultores portugueses não têm nenhuma responsabilidade no estado da agricultura portuguesa. A culpa é dos outros, aka locus de controlo externo.

Trecho retirado de "Não há um rumo para a agricultura, é um barco à deriva, alerta CAP"

No Sábado passado, a propósito deste tweet:

Escrevi:

"agora fiquei no meio da ponte. trabalhar e ter de receber ajuda é também um subsídio a uma empresa que não consegue gerar riqueza suficiente para pagar aos seus trabalhadores. talvez seja um sinal de que a empresa precisa de mudar de vida ou fechar"

Uma pessoa que trabalha e é apoiada é uma pessoa que não procura um emprego melhor, é um empregador que não se esforça para aumentar a rentabilidade do negócio, é um outro empregador capaz e disposto a pagar mais que não encontra trabalhadores. Mas afinal o país que se queixa da baixa produtividade está cheio de exemplos do que dificulta a subida na escala de valor, e o aumento da produtividade. Empresas e sectores pouco produtivos são apoiados para manterem o perfil de produção actual e os modelos de negócios obsoletos. Como não recordar Spender e o seu trabalho dos anos 80:

quinta-feira, setembro 08, 2022

"There is no going back to the way everything was before."

Recordo a vergonha pessoal que senti quando numa conversa com o meu parceiro das conversas oxigenadoras percebi que quanto ao covid, em Fevereiro de 2020, tinha-me colocado mentalmente na posição fácil, preguiçosa e socialista de esperar que o estado, o governo, me dissesse o que fazer. Agora, ao escrever estas linhas, dá para ficar com ainda mais vergonha pessoal. Como confiar numa estrutura de boys and girls nomeados e promovidos pelos Medinas desta vida.

A verdade é que esta é a postura cultivada na sociedade portuguesa. Esperar que o estado nos guie, nos oriente, no nosso dia a dia. Só se pode fazer o que está na lei, se não está na lei não se pode fazer.

A minha irmã vive em Inglaterra. Por lá, em Janeiro deste ano, ainda antes da invasão da Ucrânia pelos orcs russos, já o tema da energia e do brutal aumento do seu custo era tema. Na Califórnia, na semana passada muitos californianos não conseguiram carregar os seus carros eléctricos porque o sistema de carregamento permite que centralmente se bloqueie o seu uso, porque a conjugação de calor e consumo pôs em risco a rede eléctrica. Assim, há meses que as pessoas em Inglaterra andam a trabalhar o tema da redução de consumo de energia, aumento da eficiência energética, alteração de comportamentos. 

Por cá esperamos o subsídio, o apoio, a mãozinha orientadora do papá Estado que nos diga o que fazer. Por isso, não nos sentimos pressionados a mudar comportamentos porque existe um papá que nos põe a mão por baixo. Depois queixam-se da relação pedo-mafiosa ...

Entretanto, na Alemanha, segundo o New York Times:
"But companies across Germany have been finding ways to continue operating. They are firing up coal plants or shifting production of some products abroad. They are even considering making deals with rival firms to share energy. Chief executives say that by adjusting to the new reality, they are in a better position to live with less natural gas.
We are in crisis mode, but we are not panicking,"
...
Not every manufacturer can operate with less gas. And no one knows how Germany, Europe's largest economy and the one most reliant on Russian gas, will fare this winter when chilly weather causes gas demand to soar.
But BASF, for one, said it had begun using oil instead of gas to generate power and steam, and reducing production at its European plants that use a lot of gas, especially its facility in Ludwigshafen, described as the world's largest chemical complex.
Detailing BASF's efforts in the earnings call, Mr. Brudermüller said the company was scaling back ammonia production, which requires natural gas, and seeking to buy it from outside suppliers. Ammonia plays a key role in the manufacturing of fertilizer, plastics and other products.
...
Private households, which combined use the most energy in Germany, have already shaved about 6 percent off their gas use this year. A government program is encouraging them to do more, dropping their thermostats by one degree in the coming winter and limiting showers to just five minutes.
...
When gas prices started rising, Evonik's engineers searched or where they could make cuts. An obvious solution was to keep a coal-fired power plant going past October, when it was scheduled to be swapped out for two new gasfired plants.
We built two fantastic new gas power plants, the best German engineering, but realized that we didn't have any gas for them," Christian Kullmann, the chief executive of Evonik, said on German television.
...
With winter approaching, traditional gas-hungry industries may be let with no choice but to scale back or halt production entirely. But for those that have already found solutions, analysts said, the changes may prove lasting, regardless of what Russia does.
"The signal that energy security can't be taken for granted is so clear that companies will continue to think of different scenarios even if there were a fast change, even if Russia were to deliver more gas and prices were to fall again," said Eric Heymann, an economist with Deutsche Bank Research. "There is no going back to the way everything was before."

Sabem o que é que este "There is no going back to the way everything was before." me faz lembrar? Aqueles que estavam perdidos e acabam por se encontrar.

"é que os que decidem aventurar-se e procurar a salvação, enfrentando o desconhecido, ao fazerem essa viagem, acabam por se transformarem a eles próprios e o mais interessante é que quando chegam à "civilização", ou quando são encontrados, já não estão perdidos, já se encontraram, já se adaptaram a uma nova realidade." 

O bom velho Gonzales

 

sábado, agosto 27, 2022

Tanta estupefacção, tantas questões ...


Não há maneira desta aberração sair da minha cabeça este Verão, "Norte da Europa vive à custa da agricultura intensiva portuguesa". Um produto típico do ecossistema coordenado pelos Desventuras e Zés Reis da academiade Coimbra.

Este texto gera-me tanta estupefacção, tantas questões. Vamos à primeira:

  • O sentimento de locus de controlo no exterior
Há anos que milito contra a floresta intensiva, por isso, fui fundador da Quercus (outra Quercus mais ingénua e ligada à Natureza e não o actual lobby político), contra a agricultura intensiva (basta pesquisar aqui no blogue o que escrevi acerca do azeite, das amêndoas, da agricultura de joalharia... até o que escrevi acerca de Jaime Silva, ministro da Agricultura de Sócrates e detestado por todos, a começar pelos socialistas, mas defendido aqui: Ter razão antes do mainstream é tramado. Recordo o que escrevi aqui acerca da destruição da marca Portugal no que à agricultura diz respeito, com a construção do Mar de Plástico do lado de cá da fronteira. Ver A marca Portugal.

O meu ponto aqui é: as asneiras são nossas.

A académica posiciona o problema como se fôssemos escravos sem vontade própria, obrigados pelos orcs do Norte da Europa a produzir estes produtos. 

Não! Nós é que somos os responsáveis por destruir a nossa terra, por abastardar a marca Portugal -Todos vão perder - A má moeda expulsa a boa moeda

Ter o locus de controlo no exterior é típico das so-called elites tugas. Nunca é nada com elas, é sempre culpa dos outros. Assim, nunca precisam de fazer um acto de contricção. No entanto, assim, nunca aprendem com os erros que cometemos como sociedade. Há sempre um Passos a quem atribuir as culpas.

domingo, junho 12, 2022

Jongleurs, precisam-se

Julgo absurdo que um governo, qualquer que ele seja, estabeleça metas de aumentos salariais. Ignoremos esse tópico de discussão e concentremos a atenção nos empresários. Duas respostas:

"Precisamos de políticas públicas que ..."

"Num momento em que as empresas veem aumentar de forma brutal os seus custos energéticos e de matérias-primas, como subir os salários acima dos aumentos de produtividade sem repercutir esses aumentos nos preços, contribuindo para uma escalada da inflação mais estrutural, mais duradoura, menos controlável? E, fazendo-o, como evitar a perda de clientes e de mercados? Como evitar a perda de competitividade daí decorrente, 

...

[Moi ici: Respirar fundo antes de ler o trecho que se segue] Só colmatando a grande divergência que nos separa da média europeia - a produtividade - é que os salários poderão aumentar de forma sustentável, sem pôr em causa a competitividade das empresas e o seu futuro.

Para isso, mais do que reptos, precisamos de políticas públicas consequentes, que promovam condições para que as empresas aumentem a produtividade."

Volta e meia aqui no blogue escrevo sobre o locus de controlo no exterior:

"É arrepiante a situação... quem tem o seu Locus de Controlo no exterior, ao atribuir poder a forças exteriores, para ditar o destino, para mudar as coisas... quase não tem motivação para agir, para melhorar, para actuar... afinal de contas, sente-se, acredita que é uma espécie de Calimero jogado de um lado para o outro pelos deuses!"

Aqueles sublinhados a vermelho ali em cima são significativos. Sobretudo o segundo... só através de políticas públicas é que as empresas privadas conseguirão aumentar a produtividade. Não, isto não é conversa de tasca de um qualquer anónimo empresário da província, é o discurso do presidente da CIP. Faz-me lembrar o ministro da Economia metido pelo irrevogável Portas no governo de Passos Coelho:

  • "Pires de Lima: "Com meia hora a mais aumentava 7% a produtividade"[Moi ici: Em 2011]
Faz-me lembrar um ex-presidente da GALP também em 2011:

  • “Preferia que me criassem condições para aumentar a produtividade do trabalho” [Moi ici: Replico aqui o que escrevi então - "Eu, anónimo engenheiro de província sou mesmo tótó... reparem ""Preferia que me criassem condições para aumentar a produtividade do trabalho""  no meu modelo mental, um administrador, um gerente, um gestor de topo nunca diria isto. Aumentar a produtividade do trabalho na sua empresa é a sua função e não está à espera que outrem lhe faça o biscate"]

Já em 2007 escrevi sobre a necessidade dos empresários jongleurs - Jongleurs:

"A vida de um gestor consiste pois em gerir duas empresas em simultâneo: a presente e a futura. Se ele se limitar a gerir a presente (e não a futura), a sua empresa em breve se tornará obsoleta por via da alteração das condições de mercado em que está inserida. Se ele gerir apenas a futura (e negligenciar a presente) a empresa nunca chegará a atingir esse futuro. Ficará pelo caminho.

Sendo assim, a competitividade de uma empresa depende de uma boa gestão de curto prazo (a empresa do presente) e da introdução de saltos qualitativos (a empresa do futuro)."

Ignoremos a provocação infantil e impensada do primeiro-ministro, disse 20% como podia dizer 10% ou 30%. O que é verdadeiramente preocupante é a revelação da manutenção deste locus de controlo no exterior nas posições mais influentes. Que os empresários tenham o locus de controlo no exterior é triste, mas eles todos os dias põem o pescoço no cepo. Nenhuma empresa tem o futuro assegurado, a última palavra é sempre dos clientes. Agora que os líderes associativos partilhem do mesmo modelo... isso é, para mim, verdadeiramente assustador.