Mostrar mensagens com a etiqueta estratégia. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta estratégia. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, fevereiro 28, 2025

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?


Mão amiga fez-me chegar às mãos recorte do jornal "Barcelos Popular" com o artigo "Rombo no sector têxtil faz exportações reduzirem 12% em Barcelos" onde basicamente se repete o comunicado da Associação Comercial e Industrial de Barcelos (ACIB).

Recordo os temas:
Com base no conteúdo das páginas 2 e 3 do Barcelos Popular, fica evidente que a ACIB enfatiza a necessidade de intervenção pública para sustentar um sector têxtil em declínio. Enquanto a narrativa enaltece a região como um motor de empreendedorismo e capacidade industrial, paradoxalmente, reivindica subsídios para manter empresas cuja produtividade e competitividade são questionáveis.

A questão central reside na incoerência entre o discurso e a acção: defende-se o aumento da produtividade e da inovação, mas, simultaneamente, solicita-se financiamento público para sustentar empresas que, por razões estruturais ou de modelo de negócio ultrapassado, não conseguem manter a sua viabilidade. No contexto de uma União Europeia que privilegia a sustentabilidade económica e boas condições de vida, insistir na manutenção de um sector pouco competitivo à custa dos contribuintes parece ser uma estratégia míope.

Resta saber se a associação tem uma visão de futuro que vá além da dependência do Estado ou se continuará a perpetuar um ciclo de subsidiação sem uma estratégia real de adaptação e modernização. O locus de controlo está, claramente, no exterior, mas é crucial que se invista em soluções de longo prazo em vez de insistir numa lógica de curto prazo que já demonstrou falhas.

A forte dependência de subsídios e apoios públicos pode ter implicações sérias na produtividade e competitividade de longo prazo da economia de Barcelos. Se as empresas locais se habituarem a recorrer a ajudas externas sempre que enfrentam dificuldades, corre-se o risco de enfraquecer os incentivos à eficiência e à inovação. Uma economia que sobrevive à base de subsídios pode cair na armadilha de adiar ajustes necessários, criando empresas menos produtivas ou "zombies" mantidas artificialmente. 

No caso em análise, a ACIB insiste que as "empresas precisam de apoios, infraestruturas e acções colectivas bem executadas" para enfrentar a crise. Sem dúvida, infraestruturas melhores e colaboração podem aumentar a competitividade (por exemplo, melhor logística e cooperação sectorial). No entanto, se os apoios financeiros servirem apenas para cobrir prejuízos ou prolongar a vida de modelos de negócio ultrapassados, a competitividade e produtividade estrutural da região tende a estagnar ou deteriorar-se. É duro, mas aquele título de há dias, "It's no longer about how you do it; it's about what you do," mostra como é difícil ou quase impossível que os apoios pedidos ajudem a resolver a situação.

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?

Ontem de manhã vi este tweet na mouche:

A Teoria do Cavalo Morto é uma metáfora que se refere ao acto de continuar a investir tempo, esforço ou recursos em algo que claramente já falhou ou não tem mais hipóteses de sucesso. A expressão vem do ditado:

"When you discover that you are riding a dead horse, the best strategy is to dismount."

Ou seja, se um cavalo está morto, não adianta continuar a montá-lo – o mais lógico é aceitar a realidade e seguir em frente. No contexto empresarial, a metáfora é usada para descrever situações onde empresas, governos ou pessoas insistem em estratégias, projectos ou modelos de negócios falidos em vez de mudarem de abordagem.

domingo, fevereiro 23, 2025

Quando o gigante cai: Empresas e nações em risco

Esta semana, durante a minha habitual conversa com o meu parceiro das chamadas "conversas oxigenadoras", falámos sobre os perigos da dependência excessiva. Começámos por discutir uma empresa que vive à sombra de um único cliente grande. Imaginem uma pequena ou média empresa (PME) que, de repente, é escolhida por uma gigante para ser fornecedora regular. Cresce rapidamente, adapta-se às exigências desse cliente, mas acaba prisioneira da relação. Não é o Euromilhões que parece à primeira vista.

Os riscos são claros. Se o cliente reduzir pedidos, atrasar pagamentos ou romper o contrato, a empresa enfrenta uma crise financeira imediata. O poder de negociação fica desigual: a gigante impõe preços baixos, prazos longos ou condições difíceis — como se viu recentemente num e-mail da Simoldes aos seus fornecedores mais pequenos. Sem alternativas, aumentar lucros torna-se quase impossível. Pior, o foco num só cliente trava a inovação e a busca por novos mercados. A empresa especializa-se tanto que, se o cliente desaparecer, adaptar-se a outros torna-se um desafio. A longo prazo, o crescimento estagna e atrair investidores fica mais difícil. Um colapso é um risco real. Uma vida sem autonomia estratégica.

Enquanto reflectia sobre isto ao almoço na sexta-feira, ocorreu-me uma ideia: e se aplicarmos esta lógica a uma escala maior? O que acontece a um país cuja economia depende de poucas empresas dominantes? Pensei num Portugal com cinco ou seis Autoeuropas, onde um punhado de gigantes controla sectores estratégicos e sustenta grande parte do PIB. As fragilidades saltam à vista.

Se uma dessas empresas/sectores tropeçar — por dificuldades financeiras, perda de competitividade ou deslocalização —, o impacto no país pode ser devastador. Economias concentradas em sectores como o turismo, a indústria automóvel ou o petróleo ficam mais expostas a crises globais. Essas gigantes influenciam políticas públicas, limitam a concorrência e dificultam o surgimento de novos negócios. Despedimentos em massa afectam o emprego nacional, e trabalhadores especializados podem ficar sem opções. As PME, por sua vez, lutam por crédito e apoios, já que os recursos se concentram nos grandes. Se os lucros dessas empresas caem, as receitas fiscais também, forçando o governo a oferecer incentivos para as manter, mesmo que sejam insustentáveis.

A analogia entre uma PME dependente e um país refém de poucas empresas é reveladora. Veja-se a Alemanha: outrora um modelo de sucesso, hoje enfrenta um declínio económico, como noticiou o Wall Street Journal a 21 de fevereiro, "Germany Goes From Model to Broken Economy". A sua indústria encolheu, os custos subiram, as exportações caíram. Faltou diversificação e coragem para mudar, dizem os analistas. Será um exemplo perfeito desta dependência?

"A decade ago, Germany was the model nation. Its economy hadn't just withstood the ascendance of China; it was thriving in its wake. Its balanced public finances stood out in a world of huge government debt. And while British and U.S. lawmakers were caught up in the culture wars, German politicians continued to practice the art of compromise.
Today, Germany has gone from paragon to pariah. Its economic model is broken, its self-confidence shattered and its political landscape fractured. Europe's former growth engine has shrunk for two years in a row, erasing any recovery made since the Covid-19 pandemic. Its manufacturing output is down about 10% over the same period and its companies, squeezed between rising costs and falling exports, are shedding thousands of jobs a month. 
...
There are external causes for this malaise, from the war in Ukraine to U.S. protectionism and China's economic slowdown.
Yet some analysts, economists and historians think Berlin mismanaged its response. The reason: the preference for the status quo over change, for reaction over action and for caution over risk.
This is partly the wage of success. As long as Germany's economy was growing, brushing aside the financial crisis and the eurozone debt crisis, there was no pressure to course-correct, said historian Timothy Garton Ash, author of "Homelands," a history of Europe in the past 50 years."

Recordo o meu último trabalho por conta de outrem. Em apenas um ano, a empresa passou a produzir num dia o que antes fazia em duas semanas. Cresceu, sim, mas ficou quase totalmente dependente de um cliente. Os outros tornaram-se um estorvo. É uma lição simples, mas poderosa: depender de poucos, seja numa empresa ou numa nação, é jogar com o equilíbrio na ponta de uma faca. Será que Portugal — ou mesmo a Alemanha — pode diversificar antes que o fio se parta?

sexta-feira, fevereiro 21, 2025

Curiosidade do dia

Mão amiga fez-me chegar este artigo "These are the most brazen product counterfeits of 2025

"This year, the Plagiarius campaign intends to draw attention to the issue again by awarding the dreaded negative award "Plagiarius." The prize is meant to highlight brazen one-to-one imitations "that deliberately look deceptively similar to the original product, are reckless and morally reprehensible, and lead to stagnation instead of progress and diversity." Although the award does not specify whether an imitated product is legally permissible or unlawful, it represents an expression of the association's opinion."

Não apoio de forma alguma a cópia descarada de produtos, especialmente quando prejudica empresas inovadoras e engana consumidores. No entanto, questiono a afirmação de que as imitações "lead to stagnation instead of progress and diversity". No sector da moda e da marroquinaria, onde a ausência de patentes permite a livre replicação e adaptação de designs, vemos precisamente o oposto: uma constante renovação, diversidade e inovação. A cada estação surgem novas tendências, muitas vezes inspiradas em criações anteriores, o que impulsiona a criatividade e mantém o mercado dinâmico. Claro, há uma diferença entre inspiração e cópia directa, mas generalizar que todas as imitações travam o progresso parece um exagero.

Recordo agora outro postal "Num mundo sem patentes... tudo é acelerado" acerca do impacte do fenómeno da cópia na cerâmica.

O mundo do Red Queen Effect:

No mundo do Red Queen Effect, a sobrevivência exige movimento constante—não basta inovar uma vez, é preciso correr para se manter relevante. Assim como na biologia, onde as espécies devem evoluir continuamente para não serem ultrapassadas pelos concorrentes e pelo ambiente em mudança, o mercado funciona de forma semelhante. A cópia e a adaptação forçam as empresas a reinventarem-se sem cessar, impulsionando ciclos de inovação cada vez mais rápidos. No fundo, o progresso não estagna por causa das imitações; pelo contrário, elas obrigam os verdadeiros inovadores a manterem-se sempre um passo à frente.

BTW, no JdN de hoje pode ler-se:

"Birkenstock "não são obras de arte", diz tribunal alemão
A Birkenstock recorreu aos tribunais para travar a cópia das suas famosas sandálias por outros fabricantes. Para se proteger, defendeu junto das instâncias judiciais que a sandálias com sola de cortiça e tiras de látex são obras de arte, mas o tribunal não tem a mesma opinião. Para o serem, "os produtos têm de ter algum tipo de característica única" diz a justiça alemã."

quinta-feira, fevereiro 20, 2025

Again, perceber a necessidade de sair do carreiro

No JN do passado dia 17 de Fevereiro encontrei o artigo ""A flor da amendoeira é festa que não chega ao bolso dos agricultores"".

Interessante, fez-me recuar à transição para este século e ao impacte do choque da China no mundo das PME portuguesas.
"O baixo preço da amêndoa pago ao produtor está a desmotivar muitos agricultores transmontanos de continuarem a manter esta cultura, que é uma das mais emblemáticas dos concelhos do Douro Superior, no distrito de Bragança. A região, até março, enche-se de turistas ansiosos por se deslumbrarem com as encostas pintadas de branco, repletas de amendoeiras floridas.
"É bom que venham visitantes, mas, ao bolso dos produtores, não chega o dinheiro que cá gastam", garante Jorge Sousa, produtor de amêndoa na aldeia de Felgar, em Torre de Moncorvo."

Imagino o impacte da recente produção alentejana nos circuitos de comércio regional Portugal-Espanha.

 ""Tenho três hectares de amendoal, que já foram rentáveis. Agora não são. O preço do miolo de amêndoa baixou para menos de metade em meia dúzia de anos. Passou de sete para cerca de três euros por quilo"

...

O valor da amêndoa é definido pela produção da Califórnia. Flutua em função de haver muita ou pouca quantidade nos Estados Unidos da América, bem como pelo consumo do produto.

...

nos últimos anos, o Alentejo equiparou-se com um grande investimento em amendoais de cultura intensiva, graças à rega da barragem do Alqueva.

... 

O amendoal intensivo tem um potencial produtivo elevado. No Alentejo, 100% dos pomares são regados.

...

Pedro Ricardo entende que é preciso promover o que distingue a amêndoa transmontana das restantes. "Tem mais qualidade do que a do Alentejo e a estrangeira, porque é toda produzida em modo biológico", afiança."

Há dias escrevi este título, ""It's no longer about how you do it; it's about what you do."" No entanto, como neste caso, às vezes não é possível mudar o que se faz (bom, na verdade é, basta seguir as pegadas do velho canadiano conhecido deste blogue). Então, é altura de mudar de mercado. Recordar a artesã de Bragança ou o burel de Manteigas.

Como poderiam os produtores de amêndoa aumentar o seu rendimento?

  • Criar produtos derivados da amêndoa. Eu sou um grande adepto da manteiga de amêndoa que faço em casa. Será que faz sentido? Será que não há mercado, não para o produto comoditizado da Prozis, mas para o produto com marcação da região, marcação da quinta, marcação do produtor?
  • Criar certificação da região. Promover a diferenciação. Ainda há tempos li e escrevi sobre o stress das oliveiras.
  • Apostar na certificação biológica feita por entidades espanholas.
  • Criar experiências turísticas, visitas a pomares e degustações para aumentar os rendimentos com a presença de visitantes. E depois, vender os produtos derivados da amêndoa. Algures no blogue está um artigo sobre explorações pecuárias nos Estados Unidos que fazem mais dinheiro com a venda de produtos e restauração do que com a produção de leite. Fazer um modelo deste tipo
Imaginem se eles trabalhassem o posicionamento... BTW as câmaras parece que estão cheias de dinheiro, porque não lideram um projecto para este tipo de marketing comunitário?
  • Diferenciação pela qualidade - Valorizar a amêndoa transmontana como um produto de qualidade superior, promovendo-a como biológica e tradicional.
  • Marketing territorial: Vincular a amêndoa ao turismo da floração e a um estilo de vida saudável, promovendo-a como um produto premium. 
  • Sustentabilidade e inovação: Apostar em práticas sustentáveis para atrair consumidores preocupados com o meio ambiente.
  • Venda directa ao consumidor: Criar canais de venda online ou em mercados locais não tanto para reduzir a dependência de intermediários, mas para chegar a consumidores em busca de outra proposta de valor que não o preço mais baixo.
Mais uma vez, é preciso pensar como David junto ao ribeiro de Elah (ribeiro dos Pistácios), quando mirou o gigante e se abaixou para colher uns seixos rolados.


Convido a ler o significado de David aqui: Perceber a necessidade de sair do carreiro

segunda-feira, fevereiro 17, 2025

Crescimento e sustentabilidade

No WSJ do passado dia 15 de Fevereiro encontrei, "Chefs Say No Thanks To Michelin Star Rating".

O artigo aborda o impacte de ganhar uma estrela Michelin e porque alguns chefs optam por recusar esse reconhecimento.

Ganham pressão e expectativas elevadas:

"The Tuscan eatery had been awarded the star in 2019 for its traditional Italian food with a modern flair, such as potatoes with squid sauce, chanterelles and spicy parsley. Then came new clientele with heightened expectations. The owners, who desired a more relaxed environment, had come to think of the award as a burden."

 Aumenta o desafio financeiro:

"Although the Michelin Guide says that only factors such as quality of cooking and mastery of technique are considered, some restaurant owners including Olesen feel they would need to maintain perfection at every level in exchange for a star, down to the ply of the toilet paper in the bathrooms.

This can make it hard to run a restaurant, owners said. A star can lead to an uptick in business and sales, but a slump almost inevitably follows, according to a 2021 report on the impact of the Michelin star on restaurants in New York City published in the Strategic Management Journal, a research publication. For some places, this can be a fatal blow, as they struggle to sustain new costs such as higher-quality ingredients, rising rents from landlords who re-evaluate their property and staff who demand pay commensurate with their perceived newfound value, the report said."

Aparece a censura criativa e o medo de falhar:

"In some respects [a star] can be a little stifling," said Scott Nishiyama, the chef and owner at Ethel's Fancy in Palo Alto, Calif., who trained under Michelin-star chefs before opening his own restaurant. He said the possibility of a Michelin inspector walking through the door at any moment could be unnerving: "You don't have that necessary freedom or joy to make discoveries and to make mistakes because you're simply worried about losing that star, or trying to achieve that first star.""

A reavaliação dos objectivos de vida:

"Such recognition represents the highest achievement a young chef can aspire to," said Stefano Terigi, a chef at Giglio. "We didn't have time to figure out if it was truly our path; we didn't seek it out."

...

"If I wanted to get myself to that caliber [of a star], it would require a lot more time and energy on my end to put that together," said Justin Kent, a U.S. chef who trained with the esteemed David Toutain and Alain Passard before opening his own Paris eatery, Milagro, which was featured without a star in France's 2024 guide.

...

"I'm very happy with my life the way it is," he said. Kent regularly brings his tiny dog Tofu to work, delighting the customers."

E o extraordinário impacte no imobiliário e no custo do pessoal. Os proprietários reavaliam o valor do espaço e aumentam as rendas e os trabalhadores esperam/exigem aumentos dado o valor da estrela.

Assim:

"Last fall, the restaurant Giglio in Lucca, Italy, made a surprising request: to have its Michelin star removed from the 2025 guide."

O artigo pode ser utilizado para discutir estratégia para PME, especialmente em sectores onde a reputação e a qualidade são factores críticos. Algumas lições podem ser:

Tal como um restaurante pode decidir entre procurar ou evitar uma estrela Michelin, as PME devem definir se querem competir por um estatuto de alta qualidade/prestígio ou priorizar um modelo de negócio mais sustentável e acessível. Ou seja, a importância de escolher um posicionamento. 

Recordar a lição das salamandras de Estarreja, espelhada nas dificuldades das Orsted e das Vale da Rosa. O crescimento rápido pode gerar desafios financeiros e operacionais. As empresas precisam avaliar se estão preparadas para lidar com custos crescentes e expectativas mais elevadas antes de procurarem reconhecimento no mercado.

Para algumas PME, um grande reconhecimento pode aumentar a procura, mas também gerar pressões que dificultam a operação eficiente. Ter um crescimento controlado pode ser mais vantajoso do que um sucesso instantâneo.

Tal como alguns chefes preferem manter um restaurante com ambiente descontraído, os empresários devem refletir sobre o impacte do crescimento na sua qualidade de vida e bem-estar. Há muitos anos aprendi o que era um "life style business". Um tipo de empresa criada principalmente para sustentar o estilo de vida desejado pelo proprietário, em vez de focar exclusivamente o crescimento máximo ou a maximização dos lucros. 

Por vezes, menos pode ser mais. Para as PME, isto significa que a procura incessante por prémios, estatuto e crescimento pode ser prejudicial se não estiver alinhada com a visão e a sustentabilidade do negócio.

sábado, fevereiro 15, 2025

"a problem money may be unable to solve"

A propósito de "It's no longer about how you do it; it's about what you do" mão amiga fez-me chegar cópia do artigo "Money Alone Can't Stop Europe's Industrial Twilight" publicado no passado dia 13 na revista "Politico Europe".

O exemplo do encerramento de uma fábrica da Michelin em Cholet é apresentado no artigo como exemplo. Apesar dos milhões de euros em subsídios e incentivos fiscais, empresas como a Michelin continuam a encerrar fábricas na Europa e a transferir a produção para países com menores custos. O encerramento da fábrica da Michelin em Cholet é um sintoma da desindustrialização europeia, que não é resolvida apenas com incentivos financeiros.

"Despite Michelin receiving millions of euros in government assistance, management said the factory in this small French city could no longer compete with its Asian rivals."

O governo francês gastou milhares de milhões de euros para apoiar a indústria, mas os resultados são decepcionantes. Entre 2020 e 2022, a França gastou 27 mil milhões de euros por ano em apoio financeiro ao sector industrial, o desemprego parou de cair e estabilizou nos 7%, mas as fábricas continuam a encerrar.

"Between 2020 and 2022, France spent approximately €27 billion per year in financial support to the industrial sector, according to a recent report by France's court of auditors."

O problema central não é a falta de subsídios, mas sim a dificuldade estrutural da Europa em competir globalmente, especialmente em sectores de baixo valor acrescentado. Macron prometeu revitalizar a indústria, mas os empregos continuam a desaparecer porque a Europa não resolve os desafios de produtividade e inovação.

"The fate of the workers in Cholet, one of two factories Michelin closed in France last year, offers an illustration of a problem money may be unable to solve."

Este "a problem money may be unable to solve" tem tudo a ver com o "It's no longer about how you do it; it's about what you do." Enquanto a Europa tenta proteger indústrias tradicionais, Taiwan e outras economias asiáticas investem fortemente em inovação e tecnologia de ponta. Empresas como a Michelin alegam que não podem competir porque produzem bens pouco diferenciados e enfrentam concorrência feroz da Ásia.

"They told us that the Chinese are stealing our jobs, but this is totally false," said Jacques Roux, a Michelin worker and the picket line."

A União Europeia continua a apostar em subsídios generosos e regras proteccionistas para tentar salvar sectores industriais tradicionais. Um novo pacote de estímulos planeado para Fevereiro inclui o relaxamento de regras de ajuda estatal, mostrando que Bruxelas ainda acredita que a solução é apenas financeira, e não estrutural. 

"As Brussels launches an effort to make the European economy more competitive by slashing regulation and ramping up public spending - a new package of measures is due on Feb. 26."

No entanto, como o artigo mostra, o encerramento da Michelin e a crise industrial na Europa demonstram que despejar dinheiro não resolve a falta de competitividade global da indústria europeia. O que é necessário não é mais subsídios, mas sim uma estratégia clara para reposicionar a Europa em sectores de alto valor acrescentado, como Taiwan faz com a TSMC.

Ou seja, Bruxelas está como Portugal. Os salários dos trabalhadores dos sectores tradicionais só podem aumentar se houver novos sectores a reformular a média, basta recordar o exemplo do barbeiro de Londres.

Entretanto, outra mão amiga ontem fez-me chegar "TSMC plans to build a 1-nm gigafab in Taiwan". É outro campeonato.

Enquanto a França e o resto da Europa tenta manter empregos em indústrias que já não são competitivas, Taiwan está focada no que faz a diferença na economia global - semicondutores de última geração.

A TSMC, ao investir no fabrico de chips de 1 nm, está a consolidar a sua posição como insubstituível na cadeia de valor global. Isto não é apenas sobre como produzir chips, mas sobre o que está a ser produzido. Do you get the point?

O sucesso de Taiwan não vem de subsídios sem estratégia, mas de investimento pesado em I&D, talento e tecnologia de ponta.

O artigo sobre a Michelin mostra que a Europa está encalhada numa lógica de subsídios que não aumenta a produtividade, não cria empregos sustentáveis e atrasa a evolução porque o subsídio vai resolvendo, vai zombificando mais e mais.

A França e a Europa está a tentar proteger o passado; Taiwan está a construir o futuro. Again: "It's no longer about how you do it; it's about what you do".

Tudo a ver com os gansos voadores.

segunda-feira, fevereiro 10, 2025

O jogo não é apenas sobre jogar


"Adam Mastraonni describes the pre-scientific history of man as one in which people were sure that Zeus (or perhaps his daughter, Dike) controlled random events. When people roll the dice, Zeus is controlling the outcome. 

...

No one is controlling the dice, but if we're smart, we can choose a set of dice that are more likely to get us what we seek. Loaded dice and a stacked deck can be found if we look for them."

Há muitos anos que escrevo sobre a batota, "loaded dice", aqui no blogue. E o que é a concorrência imperfeita senão uma forma de fazer batota para fugir das condições "ideais" que beneficiam os que têm mais escala. No mundo dos negócios, a manipulação consciente das probabilidades é precisamente o que separa os que apenas jogam dos que realmente ganham. A concorrência perfeita é uma ilusão teórica que beneficia aqueles que já têm vantagem estrutural, seja pela escala, pelo acesso a recursos ou pelo domínio das regras do mercado. Para os que não têm essa vantagem, jogar com os dados "limpos" significa aceitar um jogo viciado desde o início – e é aqui que entra a necessidade de "fazer batota", ou melhor, de encontrar maneiras legítimas e criativas de alterar as condições do jogo. Ninguém controla os dados – mas podemos escolher um conjunto de dados que aumente as nossas probabilidades de sucesso.

Afinal, o jogo não é apenas sobre jogar: é sobre saber como o jogo realmente funciona. Nunca esquecer: "Lesson #1: Do not play a strictly dominated strategy".

Recordo desde 2007:

 

domingo, fevereiro 09, 2025

Não é só sobre crescer, mas sobre tornar-se indispensável



Conheço uma PME que está a fazer o seu caminho de forma positiva até agora. Acompanho o seu CEO nos últimos anos e por duas vezes ele procurou criar parcerias com empresas estrangeiras.

Quando ele me falava das negociações para essas parcerias eu perguntava sempre, o que é que empresas muito maiores têm a ganhar em trabalhar convosco? Nunca conseguimos uma resposta clara. Essas parcerias nunca chegaram a dar frutos. 

Agora leio:
"Trust leads to trust. Influence creates influence. The network effect is the dynamic of our time, and most of us don't even notice it.
The value of a network goes up exponentially as more people engage with it.
People don't engage with your network because it's good for you. They do it because it's good for them. The network effect challenges system architects to create assets that provide value for users that increase when they invite their colleagues to join in.
...
It's not only the fax machine, or Fight Club, or Alcoholics Anonymous. The network effect powers any system that deserves it.
This isn't a competition of effort or obvious performance metrics. The work doesn't get the network effect it deserves based on how much you insist on people joining you. Instead, networks catch on because the network being built is attractive, sticky, and persistent. Does it work better for me if my friends join in?
Networks create value for those who choose to join them, and part of that value comes from the status and affiliation bump that evangelists of the system receive.
People only invite others to join a network if they benefit from doing so.
If you don't begin with a network effect as a significant benefit for users, it's almost impossible to build it in later."

Há muitos anos que trabalho estas "networks" com as PMEs, por exemplo, de 2007: "Subir na escala de valor"

Um erro comum em muitas PMEs: focam-se na sua necessidade de crescer e procuram parceiros maiores sem uma proposta de valor clara sobre o que esses parceiros têm a ganhar. No entanto, os ecossistemas bem-sucedidos são aqueles que criam um efeito de rede natural - em que cada novo participante torna a rede mais valiosa para os outros.

Boas networks, bons ecossistemas não se vendem, tornam-se inevitáveis. Se uma PME quer atrair parceiros estratégicos, precisa criar um modelo onde a participação traga benefícios imediatos e exponenciais. Seja pelo conhecimento partilhado, pelo acesso a mercados ou pelo reforço de reputação e influência, o valor da rede tem de ser evidente desde o primeiro momento.

No fundo, construir um ecossistema empresarial não é só sobre crescer, mas sobre tornar-se indispensável.

Trechos retirados de de "What is Strategy" de Seth Godin.


sábado, fevereiro 08, 2025

Outra vez: Uma estratégia nunca é eterna

"This leads to Schumpeter's creative destruction. Any strategy, scaled big enough, cannot be sustained, and it will be replaced by a new set of conditions, players, and rules.
In other words: Every successful organization will fail unless it becomes something different before it does."

Nenhuma estratégia de sucesso dura para sempre. Quando uma abordagem se torna dominante, ela desgasta-se e torna-se ineficiente, abrindo espaço para novos modelos e players. A velha poesia de Beinhocker: "Uma estratégia nunca é eterna":

“Likewise, we cannot say any single strategy in the Prisioner’s Dilemma ecology was a winner. .

Lindgren’s model showed that once in a while, a particular strategy would rise up, dominate the game for a while, have its day in the sun, and then inevitably be brought down by some innovative competitor. Sometimes, several strategies shared the limelight, battling for “market share” control of the game board, and then an outsider would come in and bring them all down. During other periods, two strategies working as a symbiotic pair would rise up together – but then if one got into trouble, both collapsed.”

We discovered that there is no one best strategy; rather, the evolutionary process creates an ecosystem of strategies – an ecosystem that changes over time in Schumpeterian gales of creative destruction.”

Ainda esta semana no postal "Quando se esquece a razão de ser..." citamos:

""Well-established companies should ask themselves a simple question, says McGrath: "Who in the company is in the business of looking after its future?

"In most of the companies I work with, it's in between the head of innovation, with no power, and the C-suite, where it isn't taken really seriously. And I think that's a problem.""

Depois, vêm queixar-se dos chineses, dos concorrentes desleais, dos consumidores, dos clientes, do governo, dos trabalhadores ... 

Texto inicial retirado de "What is Strategy" de Seth Godin.

quinta-feira, fevereiro 06, 2025

Quando se esquece a razão de ser...


Um excelente artigo, "Have America's industrial giants forgotten what they are for?"

O artigo termina assim:
"Well-established companies should ask themselves a simple question, says McGrath: "Who in the company is in the business of looking after its future?
"In most of the companies I work with, it's in between the head of innovation, with no power, and the C-suite, where it isn't taken really seriously. And I think that's a problem.""

Alguns trechos do artigo:

"Ortberg also went to the heart of what many believe is the reason Boeing, once an icon of US manufacturing pride and engineering prowess, had lost its way. "We... need to focus our resources on performing and innovating in the areas that are core to who we are," he wrote.

...

Boeing "abandoned its larger reason for being — the values and sense of purpose that had fuelled the firm's success throughout the 20th century".

...

Maximising one measure of success - and ignoring information not related to that metric - distracts companies from innovation and better long-term staff relations, he adds. [Moi ici: Interessante, isto tem tudo a ver com a experiência do gorila]

...

Size is one potential threat to a coherent industrial culture.

...

"Companies develop, they pick up a lot of 'stuff' — rules that don't make any sense, a lot of bureaucracy," she adds. "Unless you have companies that bring these things into balance, the entropy of just being a large company takes over."

[Moi ici: O artigo volta ao velho exemplo da Kodak e culpa Wall street pela pressão exercida que impediu a empresa de dar o salto para o mundo digital porque estava focada em manter o negócio do filme com elevadas margens. No entanto, as empresas que não estão em bolsa também sofrem esta pressão para apostar no negócio que está a dar em detrimento do que poderá vir a dar num futuro incerto, têm de pagar salários, têm de pagar impostos, têm de ...] "a Kodak moment" is now more likely to be used to describe a failure to spot an approaching technological change than a memorable scene worth photographing.

But Kodak had been exploring digital imaging since the 1970s. It was Wall Street that pressured the company to continue milking its high-margin analog film business, even as it became clear that consumers would inevitably switch to digital."

Pensam que o problema só existe com as empresas grandes? Recordo de Maio de 2023:

"Então com empresas familiares é muitas vezes doloroso ... A única pessoa que pode dedicar tempo a isto está a conduzir um empilhador para arrumar paletes, ou está a substituir um operário especializado que está de baixa... e quem pensa no futuro da empresa? Quem encara de frente o monstro da erosão competitiva?"  

Voltando ao artigo, enquanto o lia várias vezes fui recordado do que aqui tenho escrito ao longo das décadas sobre a doença anglo-saxónica. Por exemplo neste postal de Março de 2020 faço uma resenha sobre o tema.

terça-feira, fevereiro 04, 2025

O regresso dos comerciantes

Em Janeiro de 2024 escrevi o postal "Não é impunemente ...". Depois na mesma onda estes outros de Outubro de 2024 "Outro mindset - cada vez mais uma necessidade" e ""Businesses ought to be like artists, not paperclip maximisers"".

Agora na revista Bloomberg Businessweek deste mês de Fevereiro encontro, "Retailers' survival depends on putting merchants back in charge, says Amanda Mull":

"Bad in-store experiences have been, in a certain sense, the defining retail trend of the past 15 years. Between understaffing, locked-up products, metastasizing self-checkout kiosks and endless nudges to shop online, it's begun to feel like some retailers resent the necessity of hosting customers at all. Wouldn't it be more efficient and cost-effective, in the end, to operate something more like a big vending machine?

...

For decades, retailers had been run by merchants-people who directed overall assortment and strategy, usually with careers built if not in merchandising itself, then on the sales floor or as buyers or product developers. Many of them had spent decades in the retailers' now-diminished training programs, which groomed talent from the ground up. They learned how to spot trends, select products and analyze consumer interest. When the Great Recession kicked the legs out from under retail, management consultants, tech experts and corporate financiers without much or any industry experience flooded in, sometimes ascending to the top post, as they did at Gap, Barnes & Noble and, more recently, Nike. These executives were billed as clear-eyed outsiders-people who could transform a dusty industry, unencumbered by the baggage of its traditions.

The results were at best mixed, if not disastrous. [Moi ici: Durante anos, os retalhistas deram prioridade às análises financeiras e métricas em detrimento da experiência do consumidor e do conhecimento dos comerciantes. Isto levou a lojas mal geridas, experiências de compra negativas e ao declínio das marcas tradicionais, aquilo a que chamo aqui há muitos anos de hollowing. Algumas empresas começaram a perceber que colocar comerciantes experientes no comando novamente pode reverter esta tendência]

...

When traditional retailers began stocking up on those number-crunching outsiders in the early 2010s, many of the companies were already in some kind of trouble-department stores, for example, were buckling after decades of increasing pressure from big-box discounters. Instead of investing in new products or services to compete in the e-commerce era, executives arrived holding a knife. This theory of retail "is very much about cost control," says Neil Saunders, managing director of the retail practice at GlobalData PIc. "It's 'Let's reduce capex. How can we squeeze every cent out of the business?'"

The problem with trimming a retailer's operations down to the bone, though, is that the company still has to give people a reason to keep shopping with it. When the online competition offers rock-bottom prices, infinite selection and fast shipping, enticing shoppers with human customer service and intriguing displays to help them discover new stuff can give the old guard an edge. Merchant-led companies aren't infallible-think Bed Bath & Beyond, with all of its lumbering decision-making and bad bets-but the bean-counter method, even if it manages to improve financial optics in the short term, has often proved "a recipe for failure," Saunders says.

...

Bean counters in retail have spent so much time and money over the years trying to replace these kinds of traditional tactics with the wisdom of data. What B&N and A&F show is that people who've spent decades in finance and people who've done the same in merchandising can look at the same data and come to different conclusions."

Mais uma vez: Não é impunemente que se vivem e se acumulam experiências de gestão. 

BTW, recordar o Big Data ... tantos postais sobre o tema, basta seguir o marcador com a mesma designação.


quinta-feira, janeiro 30, 2025

Ver para lá do que se conhece (parte VI)

Ver para lá do que se conhece - Parte Iparte II, parte III, parte IV e parte V.

No FT do passado dia 19 de Janeiro, "Neurotechnology allows users to feel objects with bionic hands":
"Scientists have for the first time given a realistic sense of touch to people operating a robotic hand via signals sent from their brain, marking the latest advance in neurotechnology research to help overcome disabilities."
As descobertas e inovações na neurotecnologia, como o uso de mãos biónicas com sensação de tacto, terão um impacte significativo nas empresas que fabricam cadeiras de rodas e outros equipamentos para tetraplégicos. Conseguem imaginar? Conseguem mesmo?


Por um lado se as próteses neurais avançarem a ponto de permitir que pessoas com lesões na medula espinal recuperem funções motoras essenciais, a procura por cadeiras de rodas pode, a longo prazo, diminuir. Ao mesmo tempo que a procura diminuir, as empresas que fabricam equipamentos de mobilidade precisarão de investir em tecnologias mais integradas com interfaces neurais e próteses inteligentes para se manterem competitivas. Não será fácil. Custos elevados, podem limitar a adopção generalizada destas inovações. 

quarta-feira, janeiro 29, 2025

De vitória em vitória até à derrota final *

Ontem, durante a caminhada matinal sublinhei este trecho:

“winning all the short-term games is not the best strategy for long-term success”

E pensei nos políticos que ganham debate parlamentar atrás de debate parlamentar e acabam por perder as eleições seguintes. Vencer todos os jogos de curto prazo – seja em disputas eleitorais, decisões populares ou manobras parlamentares – não garante sucesso ou relevância duradoura. Um verdadeiro líder político é aquele que equilibra as exigências do presente com uma visão clara para o futuro, investindo em políticas que geram impacte real e sustentável. O legado de um político não se constrói com tácticas, mas com estratégia, visão e compromisso com a sociedade a longo prazo.

A citação de Seth Godin sobre o impacte limitado de vencer "jogos de curto prazo" é especialmente relevante para empresas que operam com um foco exclusivo em "esperteza táctica", sem uma estratégia clara para o futuro. Essas empresas tendem a dar prioridade a soluções imediatas, frequentemente à custa de práticas éticas, consistência de marca ou desenvolvimento sustentável, acreditando que pequenos truques ou atalhos constantes podem sustentar o sucesso.

No entanto, essa abordagem pode ser perigosa. Empresas que vivem de "esperteza" acabam por ignorar a importância de construir confiança, lealdade do cliente e reputação a longo prazo. Por exemplo:

  • Reduzir custos de forma extrema para ganhar mercado a curto prazo, mas comprometer a qualidade ou o serviço, e alienar clientes no futuro.
  • Usar campanhas de publicidade enganosas ou exageradas pode trazer um pico de vendas, mas prejudica a credibilidade a longo prazo.
  • Empresas que maximizam ganhos rápidos, sem investir em inovação, cultura organizacional ou sustentabilidade, frequentemente estagnam.

Essas práticas podem até levar a ganhos temporários, mas, como aponta Godin, a falta de visão estratégica maior impede que essas empresas alcancem um impacte significativo ou relevância sustentável. Um negócio verdadeiramente bem-sucedido precisa equilibrar tácticas ágeis com uma visão de longo prazo, onde a inovação, o respeito pelo cliente e os valores sólidos são as fundações do sucesso.

Entretanto, ontem à noite ouvi Piers Morgan a recordar-me esta citação de Churchill:

“O sucesso consiste em ir de derrota em derrota sem perder o entusiasmo.” 

Churchill recorda-nos que o sucesso não é linear e, muitas vezes, envolve passar por derrotas, erros e contratempos. No entanto, o que define o sucesso não é evitar falhas a curto prazo, mas sim perseverar e ter capacidade de aprender com elas para avançar rumo a um objectivo maior. A construção de um legado requer equilíbrio entre o pragmatismo táctico e a visão estratégica, aceitando que algumas derrotas fazem parte do caminho para um impacte sustentável.

Trecho retirado de "This is strategy" de Seth Godin.


* Quem se lembra desta expressão?

segunda-feira, janeiro 27, 2025

12 slogans

Outro recorte do livro "This is strategy" de Seth Godin:

"77. Twelve Slogans

What do we talk about when we talk about strategy? Consider these building blocks:
  • The future is an unvisited city, but we can see it from a distance [Moi ici: A visão estratégica consiste em reconhecer o que está à frente e em se preparar, mesmo sem conhecer o detalhe. Meter os pés ao caminho, acaba por construir o caminho... isto é Karl Weick e o mapa dos Alpes que afinal era dos Pirinéus
  • The audience can be chosen [Moi ici: Foco é essencial; escolher o público certo, os clientes-alvo, define o impacte e a relevância de uma estratégia]
  • Projects can be managed [Moi ici: Gestão é a ponte entre a ideia e a execução; projectos bem geridos trazem resultados. A mudança é operacionalizada por projectos]
  • We make decisions [Moi ici: Decisões são inevitáveis e moldam o caminho; a hesitação é o maior risco]
  • A difference can be made [Moi ici: Mesmo pequenas mudanças podem ter impactes significativos quando bem direccionadas. Estratégia no mundo dos negócios passa por decidir a audiência a servir e propor-lhe uma oferta que se diferencia das demais]
  • Assets can be built 
  • Networks can be created [Moi ici: O networking é um multiplicador de valor; as redes certas ampliam o alcance e os recursos. Por isso, escrevemos aqui tanto sobre ecossistemas]
  • Traction is the way forward [Moi ici: O progresso sustentável depende de ganhos consistentes que reforçam o movimento]
  • Sunk costs can be ignored [Moi ici: Evitar o bias do custo afundado permite decisões mais racionais e estratégicas]
  • Organizations change [Moi ici: A mudança é inevitável e necessária para a adaptação e evolução organizacional]
    • You're not sitting in traffic-you are traffic" [Moi ici: Reconhecer o papel no sistema permite novas abordagens para resolver problemas colectivos.

    quinta-feira, janeiro 23, 2025

    O que é importante para fazer a mudança acontecer

    Aquilo de que se fala quando se fala de mudança mudou:

    "In 1975, more than 80% of US corporate assets were tangible assets, things like factories, equipment and real estate... But now that situation has flipped and more than 80% of corporate assets are intangible. When we talk about change today we are usually talking about changes in people themselves, in how they think and how they act.

    ...

    To effectively tackle transformation today, we need to understand that the change environment has shifted significantly since the 1980s and 90s, when the traditional change management frameworks were first being formed.

    ...

    Just like you wouldn’t use early languages like FORTRAN or COBOL to design software today, we can’t merely port change ideas from the same period and expect them to be effective in today’s organizations."

    A diferença entre transformações estratégicas e comportamentais:

    Sobre transformações estratégicas:

    "Strategic transformations are leader-led and consensus driven. Clear, early and frequent communication is crucial to help everyone understand the change and participate in its success.

    ...

    In a strategic transformation like the one at Intel in the 80s, leadership has full power to push the transformation forward. They can approve investments, negotiate with partners and implement decisions. Therefore, it is important for management to communicate clearly from the start, informing the organizations what decisions are being made and why."

    Sobre transformações comportamentais:

    "Unlike in a strategic transformation, leaders can't dictate what people think and do the same way they can make decisions about investments and partnerships. Behavior transformations are also guaranteed to incur resistance. That's why leaders need to pursue behavioral transformation as something more akin to a social movement than to a strategy session.

    What leaders need to recognize is that the vast majority of transformations today are not strategic and consensus-driven, but focused on shifting behaviors and coalition-driven."

    Em 1975, 80% dos activos corporativos eram tangíveis (fábricas, equipamentos, imóveis). As transformações envolviam mudanças estratégicas nesses activos. Hoje, 80% dos activos são intangíveis (habilidades, conhecimento, comportamentos), o que requer foco no como as pessoas pensam e agem.

    As ferramentas tradicionais de gestão da mudança, criadas para lidar com activos tangíveis, são inadequadas para o contexto actual. 

    Trechos retirados de "Communicate A Vision To Shift Strategy, Shape Networks To Change Behavior"

    domingo, janeiro 19, 2025

    O guia narrativo

     


    "Just as a river is a lake with a current, a strategy is only possible when we consider time. As time moves forward, we find different conditions, different options, and different challenges. Our strategy is the narrative for how we will engage with our project over time."

    Para as PMEs, esta reflexão é particularmente relevante, uma vez que enfrentam, quase sempre, mercados altamente competitivos e em constante transformação. O planeamento estratégico para uma PME não deve ser encarado como um documento rígido, mas como um "guia narrativo", que evolui à medida que a empresa se adapta às circunstâncias. Isto é essencial para responder rapidamente a mudanças no mercado, aproveitar tendências emergentes e gerir recursos limitados de forma eficiente, sem se perder em contradições ditadas pelo pensamento do momento. Sim, convém que as diferentes tácticas façam parte de um padrão de fundo coerente.

    Trecho retirado de "What is Strategy" de Seth Godin.

    sexta-feira, janeiro 17, 2025

    Quando destapam a careca

    Em "Crise no automóvel castiga exportações dos têxteis, metalomecânica e componentes" apanhei  Rafael Alves Rocha, director-geral da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) a dizer:

    "Outra dificuldade, diz, é a escassez de mão-de-obra que afeta a generalidade dos setores, assim como o "agravamento dos custos laborais unitários resultante de aumentos salariais significativamente acima dos ganhos de produtividade, no contexto da referida escassez de mão-de-obra"."

    Espera aí, a fase não encerra uma contradição? 



    Sim, e está relacionada com as paletes de imigrantes e a minha incompreensão sobre o por que a esquerda não percebeu isto e abandonou os trabalhadores.

    Por um lado, é mencionado que há escassez de mão de obra, o que indica que as empresas enfrentam dificuldades para preencher vagas disponíveis. Em contextos assim, é comum que os salários aumentem, pois as empresas competem para atrair os poucos trabalhadores disponíveis.

    Por outro lado, o argumento sugere que os aumentos salariais são desproporcionais em relação aos ganhos de produtividade, o que agrava os custos laborais unitários. Esta queixa, no entanto, pode ser considerada contraditória, pois, num cenário de escassez de mão de obra, é expectável que:

    • As empresas aumentem os salários para atrair e reter trabalhadores.
    • Os ganhos de produtividade possam não acompanhar imediatamente os aumentos salariais, especialmente se a força de trabalho disponível for mais escassa ou menos qualificada.

    E esta é a beleza da teoria dos "Flying Geese". Com a teoria a funcionar, as empresas incapazes de pagar melhores salários ou fecham ou deslocalizam-se, e a produtividade do país aumenta. Quando a teoria não funciona, quem se deslocaliza são os melhores trabalhadores, ou os mais formados, ou os com mais iniciativa, mais atitude, e as empresas zombies não morrem, e a produtividade do país encalha e o país como um todo empobrece.

    A contradição surge porque se a escassez é real, as empresas não têm muitas alternativas senão aceitar os custos mais elevados de mão de obra, e culpar os aumentos salariais ignora que esse fenómeno é um efeito natural da dinâmica do mercado de trabalho.

    Em resumo

    A "contradição" é mais uma tensão inerente ao mercado de trabalho: é difícil conciliar salários competitivos para atrair mão de obra em tempos de escassez com a exigência de ganhos de produtividade imediatos. 

    quinta-feira, janeiro 16, 2025

    Um acto de renúncia



    Há tempos escrevi sobre este item 111, "Choose Your Customers and Choose Your Future", do último livro de Seth Godin "What is Strategy".

    Os items que se seguem são:
    • 112 - Choose Your Competition and Choose Your Future.
    • 113 - Choose the Source of Validation and Choose Your Future
    • 114 - Choose Your Distribution and Choose Your Future
    O acto de escolher é, por definição, um acto de renúncia. Quando se escolhe um público, um mercado, uma fonte de validação ou um canal de distribuição, automaticamente está a deixar-se outros de lado. Mas é exactamente isso que torna uma estratégia poderosa. A clareza nas escolhas permite investir energia e recursos onde realmente importa, construindo uma base sólida para o êxito.

    Não existe estratégia sem foco, e não existe futuro sólido sem escolhas conscientes. Quando se opta por não querer ser tudo para todos, abre-se espaço para ser algo indispensável para aqueles que mais importam.

    O segredo do êxito está nas escolhas – e a coragem de fazê-las define quem se será amanhã.

    Recordar de 2008: As encomendas mais importantes são as que se rejeitam.

    quarta-feira, janeiro 15, 2025

    Outra autópsia à distância

    Quando comecei a usar este blogue em 2004 pensei que seria uma espécie de base de dados para pesquisar e acessar material das formações e workshops. 

    Julgo que foi com postais como este "Autópsia de uma estratégia, feita à distância (parte I)" e este outro "Autópsia de uma estratégia, feita à distância (parte II)" em Outubro de 2007 que comecei a ver o blogue de outra maneira.

    Ontem, no WSJ li "Skechers' Focus on Casual Shoes Pays Off" e voltei a recordar estas autópsias feitas à distância.

    Para destacar a importância de uma estratégia bem definida, é essencial observar como a Skechers adaptou a sua abordagem para competir com gigantes do sector, como a Nike e a Adidas, concentrando-se na compreensão do seu público-alvo e na diferenciação. Again, estratégia não é sobre como vencer a concorrência, mas sobre como ganhar a preferência dos clientes-alvo.

    "Nike has superstars. Hoka has tapped into hardcore runners. Tech bros are willing to pay up for On shoes. Skechers thrives on retirees looking for comfortable kicks and families looking for something more affordable for their children."​

    A Skechers compreendeu claramente que "Nike has superstars" e que competir directamente no segmento da alta performance e com grandes celebridades não seria a sua estratégia mais eficaz. Em vez disso, a empresa optou por abordar mercados negligenciados, posicionando-se como uma marca de calçado acessível e confortável, perfeita para "retirees looking for comfortable kicks and families looking for something more affordable for their children." Este foco ajudou a Skechers a estabelecer uma ligação directa com consumidores que procuravam qualidade e conforto a preços acessíveis.

    "Skechers shifted in recent years into the performance arena to fill what its leaders see as openings left by Nike and others.

    The business got a boost from Nike's decision during the pandemic to exit from many retailers that catered to lower-income consumers and focus on selling directly to consumers. 

    Nike also cut back on styles that sold for less than $100."

    Além disso, a empresa percebeu a oportunidade de capitalizar sobre as lacunas deixadas pelos seus concorrentes. Evitar o confronto directo. Enquanto a Nike cortou estilos que custavam menos de $100, a Skechers decidiu expandir a sua linha para atrair consumidores de rendimento baixo e médio. Como mencionado, "Skechers shifted in recent years into the performance arena to fill what its leaders see as openings left by Nike and others." Esta adaptação demonstrou a capacidade da empresa em identificar nichos de mercado e aproveitar lacunas estratégicas deixadas pelos seus concorrentes.

    "It is on track to net $10 billion in revenue by 2026, without achieving the coolness status that can juice demand for a brand.

    Skechers did it by capturing parts of the market that are largely neglected by its competitors."

    Outro ponto de destaque foi o uso de inovação acessível, como a linha de Slip-ins, que permitiu à Skechers criar produtos diferenciados sem a necessidade de "achieving the coolness status that can juice demand for a brand." Em vez de competir directamente pelo prestígio, a empresa focou-se em oferecer valor prático, tornando-se a terceira maior empresa de calçado do mundo em vendas.

    "Skechers does work with designers, street artists and celebrities, but executives said they don't rely on projects that are limited releases because they don't think limited releases generate the same hype and awareness as they do for other brands.

    "That's not really our consumer," said Vandemore, the finance chief. "That's not what somebody's looking for us to do.""

    Estes exemplos ilustram como compreender os consumidores-alvo, aliada a uma estratégia focada na diferenciação, pode gerar resultados expressivos, mesmo num mercado dominado por gigantes. Ter clareza sobre "who your customer is" e sobre "what holes exist in the market" é essencial para que as empresas possam prosperar num ambiente competitivo.

    Há uns 5/6 anos durante aqueles dias em que o chão está molhado aconteceram-me várias coisas com o calçado que me levaram a olhar para as solas com um outro cuidado. 

    Primeiro, cuidado com calçado barato, com solas pouco flexíveis e que rapidamente sofrem micro fissuras por onde a humidade entra e, qual papel mata borrão, é absorvida pelas meias gerando uma sensação de desconforto e o receio de apanhar uma constipação.

    Segundo, cuidado com solas que não geram atrito suficiente e que, quando as condições se proporcionam - chão molhado e branco das passadeiras, facilitam quedas.

    Decidi pesquisar solas que me dessem garantias e foi assim que cheguei às botas da Skechers. Um par durou-me 3 Invernos, ainda o tenho e uso de vez em quando, depois outro, que estou a calçar agora, e isso levou-me aos slip-ins. Hoje, tirando as sapatilhas que só uso para correr, todo o resto do calçado é da Skechers.

    Para as empresas de calçado em Portugal: Portugal tem uma longa tradição de excelência no fabrico de calçado, mas o futuro exige mais do que qualidade técnica. É hora de as empresas portuguesas explorarem como uma estratégia bem definida pode transformar a produção numa vantagem competitiva.

    Seja mais do que um fornecedor. Observe como empresas como a Skechers construíram um império focando-se no que os concorrentes negligenciaram: acessibilidade, conforto e inovação prática. Mesmo sem se concentrar em tendências passageiras ou celebridades, a Skechers tornou-se uma das maiores marcas mundiais.

    E se as suas solas não fossem apenas solas, mas soluções para problemas do consumidor final? Questione-se: quem é o cliente-alvo dos seus clientes? Que falhas existem no mercado que podem ser aproveitadas? Como pode a sua experiência contribuir para estratégias diferenciadas?

    terça-feira, janeiro 14, 2025

    "Choose Your Customers and Choose Your Future"

    Praticamente desde o início deste blogue que chamamos a atenção para a importância da determinação dos clientes-alvo. Determinação é a palavra porque deve ser uma escolha consciente. Não se pode ser tudo para todos:

    "Every project has customers. It might be the patients your non-profit serves, or your donors. It might be the person who walks into the coffee shop to deal with you when you're working as a clerk, or it might be your boss.
    As the song says, "You've got to serve somebody." When we choose our customers, we embrace their worldview and the system they are part of. Their budgets become our budgets. Their priorities become ours as well. [Moi ici: Muitas empresas não percebem que têm de escolher os clientes que devem servir, não devem considerar que todo o tipo de clientes deve ser servido]
    Customers can be a choice. We can be passive and take what we get, or we can choose to be active and seek out the customers we'd like to work with. [Moi ici: Muitas empresas permanecem passivas, aguardando que os clientes as procurem, sem perceberem que, ao serem activas, podem atrair os clientes mais adequados aos seus objectivos estratégicos. Esta mudança exige um esforço deliberado de comunicação e posicionamento no mercado.] It used to be simple. The customer walked into your shop and gave you money. There was a retail storefront, a way of getting the word out, and the customer, You no longer have to take all orders or simply wait for who's next. Instead, we have a chance to send a message and let potential customers know who we're there for. [Moi ici: Na era digital, as empresas têm ferramentas para definir a sua mensagem e atrair os clientes certos. Não precisam de ser generalistas - recordar Bruce Jenner - nem de aceitar todos os pedidos. Uma mensagem clara e focada nos valores da empresa ajuda a segmentar e a captar clientes alinhados]
    Here are some of the choices that customers and clients dictate:
    • The price
    • Support and service
    • Exclusivity
    • Co-creation
    • Durability
    • The status it brings
    • Public persona of the brand
    • Sustainability [Moi ici: Cada tipo de cliente exige adaptações estratégicas. Por exemplo, um cliente que valoriza exclusividade espera um serviço personalizado, enquanto um cliente focado em sustentabilidade quer garantias claras sobre o impacte ambiental. Escolher o cliente certo é alinhar estas exigências com o que a empresa pode oferecer sem comprometer os seus valores ou margens]
    ...
    We often get stuck in a customer loop, dancing ever faster for the customers we have instead of spending time and resources replacing these folks with the customers we'd like to have instead. [Moi ici: Muitas empresas focam-se em satisfazer os clientes que já têm, mesmo quando estes não são os mais lucrativos ou estratégicos, o que impede o crescimento a longo prazo. Rever a carteira de clientes regularmente e investir em novos perfis pode ser mais rentável]
    The best way for a freelancer to succeed is to find better customers. Better customers that pay more, demand more, and spread the word as well. Better customers aren't always easy to find, which is why the more common and convenient approach is to take what you can get.
    You can choose your customers, and train and reward the ones you'd like to keep. By rewarding some behaviors over others, by keeping some promises but not making others, by having standards, you get the audience you deserve.
    ...
    The customers you pay attention to - and those you fire—change the way you spend your days (if you're not firing customers, you're surrendering your future to whoever walks in the door). [Moi ici: Há clientes que consomem desproporcionalmente tempo e recursos sem trazer o retorno adequado. Aprender a "despedir" clientes pouco rentáveis ou desalinhados é essencial para garantir o foco nos clientes estratégicos e no futuro da empresa. Conhece a curva de Stobachoff da sua empresa?]
    You can identify and reward the customers you'd like to spend your days with. You have the freedom and power to do this if you choose.
    It's not easy to persuade someone to want what you want.
    It's much more productive to find people who already want to go where you'd like to take them."

    Trechos retirados de "This is strategy" de Seth Godin.