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terça-feira, abril 16, 2024

Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas (parte II)

Em "Libertar a economia do colete de forças fiscal" sublinhei:

"O investimento privado reflete a saúde das economias. Se as expectativas e se o contexto são favoráveis, este indicador rapidamente espelha essa confiança. É por esse motivo que a decisão, tomada por este Governo, de acelerar o desagravamento fiscal sobre o trabalho, duplicando, até ao verão, a descida que estava prevista no Orçamento do Estado, tem de ser sublinhada e valorizada. As famílias precisam de espaço de manobra - já. A redução do IRC ao longo da legislatura também contribuirá para libertar recursos financeiros, permitindo finalmente a sua aplicação em fatores produtivos que puxem os negócios e a economia para a frente.

O aumento da produtividade está diretamente ligada ao investimento. Se o nosso pais tem hoje trabalhadores mais qualificados e empresários igualmente mais preparados, o que nos tem faltado é precisamente capital para investir. Passo a passo, com políticas públicas coerentes e com o propósito de criar riqueza e não apenas redistribuir o pouco que existe, Portugal tem hipóteses de crescer mais, desenvolver-se mais e, deste modo, fazer subir a maré para todos - isto é, aumentar os rendimentos das pessoas, aproximando os salários dos valores que são pagos nas economias europeias mais desenvolvidas."

É pena o jornalismo não ter gente dedicada ao tema da produtividade. Perceberia esta frase:

Mais uma vez:

"Alguém diz ao filho com 5 anos?

- A actuação do vosso ano na Festa de Natal do jardim-escola foi uma valente porcaria!" 

Perceberia que isto que se segue não faz qualquer sentido:

"aumentar os rendimentos das pessoas, aproximando os salários dos valores que são pagos nas economias europeias mais desenvolvidas"

Nunca será possível chegar ao nível dos salários das economias europeias mais desenvolvidas a produzir com o mesmo perfil de economia que temos. Isto é duro de ouvir. Por isso é que ninguém tem coragem de o dizer. Por mais que a produtividade na produção de [colocar aqui um exemplo] aumente, o limite para os salários é o preço a que se consegue vender (não pensem que o conseguem pelo aumento da produtividade física).

Assim, continuam alegremente neste jogo de sombras: A produtividade não aumenta porque [colocar aqui um culpado externo que sirva de bode expiatório]. Esta postura desculpa os intervenientes, pobres vítimas dos governos de turno... 

Imaginem um governo ter a coragem de dizer isto Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas e de explicar porquê.

terça-feira, março 19, 2024

Cuidado como cresce

 Li no ECO "Parar de crescer é começar a morrer":

"Se uma empresa não cresce, definha e morre.

...

crescer é mais do que um objetivo, é um desígnio essencial. 

...

A internacionalização só contribui a sério para o fortalecimento, a valorização e a preservação a longo prazo do capital acionista se as empresas tiverem escala. Dos que não se lancem a sério, com coragem, em processos de crescimento ambiciosos não vai rezar a História, nem sequer no mercado doméstico."

Sabem qual o meu problema com este artigo? Crescer à custa da escala (volume).

As empresas podem crescer à custa da escala (volume), à custa do denominador da equação da produtividade a produzir mais do mesmo, ou podem crescer à custa da subida na escala de valor, à custa do numerador da equação da produtividade a produzir coisas diferentes, coisas com maior valor acrescentado.

O racional é o mesmo do agricultor que só consegue aumentar a produção trabalhando mais e mais terra, é a via cancerosa

Entretanto, já depois de escrever o que está para trás. Deparo com este tweet:


E termino com o bacalhau islandês e a cerveja Kirin.



 

domingo, dezembro 17, 2023

Acerca da produtividade

"A produtividade é uma medida da eficiência dos fatores usados numa economia para produzir os bens e serviços. Como o valor acrescentado dos bens produzidos é equivalente, ao rendimento dos fatores que produzem esses bens, a produtividade é, no fundo, também uma medida do rendimento dos fatores produtivos. 

Nesse sentido o Produto Interno Bruto (PIB) per capita entre diversos países comparamos a produtividade dos fatores produtivos, como o trabalho, e o rendimento desses mesmos fatores.

Em termos agregados, a produtividade do trabalho é calculada como a relação entre o produto total e o trabalho utilizado para produzi-lo. [Moi ici: Tenho de escrever sobre isto. Por que é que se pede a uma empresa para quantificar a sua produtividade e ... ela não o consegue fazer. BTW, já leram o que se escreveu na semana passada acerca da produtividade e da experiência da semana de quatro dias? Leiam e façam um esforço para não rir/chorar. Tenho de escrever sobre isso] Há muitas formas diferentes de fazer esse cálculo, mas, em termos gerais, o objetivo é o mesmo. No fundo o bem-estar médio numa economia só pode subir se a produtividade do trabalho aumentar.

...

Aumentar a produtividade da economia é, a médio prazo, o único ingrediente para aumentar o bem-estar das pessoas na sociedade. Medidas como alterações no salário mínimo ou nas taxas de imposto podem ser populares e adequadas, por razões de equidade. Mas o seu impacto na produtividade pode ser nulo ou até negativo. [Moi ici: O seu impacte pode ser nulo ou até negativo porque não deixamos os zombies morrerem. Recordar o Chapeleiro Louco no país do absurdo] De igual modo sistemas fiscais que beneficiem as empresas de menor dimensão podem ser populares na perspetiva da opinião pública, mas são normalmente negativas em termos de produtividade. [Moi ici: Outra falha clássica na análise da produtividade: atrabuir as falhas às empresas/empresários existentes sem nunca pensar nos mastins dos Baskerville

...

para a economia portuguesa, os indicadores mais preocupantes são do seu baixo crescimento da produtividade relativamente às economias europeias de dimensão semelhante. A especialização setorial da economia portuguesa também pode ser prejudicial aos ganhos de produtividade. Por exemplo, a fileira do turismo tende a ter produtividades do trabalho relativamente baixas. Isso não significa que Portugal possa prescindir do Turismo, mas sugere que se o turismo crescer acima da média da economia a nossa produtividade do trabalho irá provavelmente baixar. Em termos empresariais o discurso da produtividade é normalmente impopular. Os trabalhadores sabem que esse discurso vem acompanhado de medidas de eficiência que são percebidos como cortes nos benefícios. [Moi ici: Este trecho faz-me recordar um postal clássico deste blog acerca dos engenheiro e da produtividade. Achar que a produtividade só aumenta à custa da eficiência] Em parte, isso explica porque no ambiente eleitoral os vários partidos fazem tanta questão de evitar falar na importância do crescimento da produtividade.

...

O crescimento da produtividade, em particular do trabalho, continua a ser o principal desafio da economia portuguesa. [Moi ici: Vamos chegar ao final deste texto e só vamos ficar com a ideia de que a produtividade só aumenta à custa de mexidas no denominador... nem uma pista sobre o Evangelho do Valor ] É aí que reside a chave da criação de empregos melhor remunerados. Condição necessária para evitar a saida do país de muitos jovens que procuram apenas salários suficientes para terem uma vida normal."

Trechos retirados de "A produtividade", publicado no Expresso desta semana.

segunda-feira, julho 10, 2023

"Bigger isn't the goal, better is"

"In the industrial age, the math of scale is pretty compelling. [Moi ici: Há anos que escrevo aqui no blogue sobre isto. Por exemplo, de há 10 anos Mas claro, eu só sou um anónimo engenheiro da província] More machines and more sales directly translate into more profits, which gives you the ability to buy more machines and generate more sales.

But if a significant organization is built on community and innovation, adding more employees doesn't make you more effective. In fact, it might do the opposite. When Facebook or Amazon lays off ten thousand people at a time, it's clear that a CFO somewhere is treating people like a resource, not like humans.

...

Bigger isn't the goal, better is."

Trechos retirados de "The Song of Significance: A New Manifesto for Teams" de Seth Godin.

sábado, julho 08, 2023

Trabalhar o denominador ou o numerador

A continuar a minha leitura de "Flawless consulting: a guide to getting your expertise used" de Peter Block encontrei este trecho:

"In the second edition of this book at the turn of the century, what was new in the discovery phase were the whole-system methodologies described in Chapter Eleven. Since then, probably the most interesting new development in discovery is the growing interest in looking at a system's gifts, capacities, and possibilities. This approach is used in addition to, or sometimes in contrast to, looking at problems - their causes and their solutions.

This approach goes under many names: asset-based community development, positive deviance, positive psychology, appreciative inquiry, future search, and more. Each of these is based on the premise that looking at what in our history we want to preserve, or what is working in a system now, or what a system longs to create in the future is a powerful way to build commitment and sustainability into any consultative or change process."

A abordagem tradicional a que o autor se refere é a de melhorar o que existe através do ataque às causas das falhas, a abordagem nova referida neste trecho é a de procurar os "system's gifts, capacities, and possibilities".

Entretanto, passei parte da semana a preparar uma acção de formação para introduzir um conjunto de pessoas à abordagem por processos para que participem num esforço de melhoria na senda da abordagem tradicional. 

A abordagem tradicional tem o seu lugar. No entanto, em algumas circunstâncias não é a mais adequada. Por isso, ao pensar no país escrevi em 2013: Redsigma - O fim da linha

Como exemplo da abordagem assente em "looking at a system's gifts, capacities, and possibilities" também de 2013: O repovoamento do interior também passa por isto.

De um lado lado temos o trabalhar o denominador (a abordagem tradicional), do outro o trabalhar o numerador (a abordagem dos gifts, capacities, and possibilities).

quinta-feira, junho 22, 2023

A concorrência "desigual" ou A evolução da produtividade (parte VII)

 Parte VI,  Parte VParte IVParte IIIParte II e Parte I.

A desglobalização em curso e as barreiras à entrada de emigrantes nos Estados Unidos geram este resultado inevitável. Por isso, é que o patronato é tão adepto da imigração.

O aumento dos salários na base da pirâmide não só beneficia as pessoas que o recebem, como promove a morte das empresas incapazes de os pagar, podendo contribuir para o aumento real da produtividade agregada do país (nos Estados Unidos ainda não está acontecer porque o numerador não está a crescer mais do que o denominador). Esta morte, como é natural, e não imposta por um governo, liberta recursos para outras empresas quando são precisos e sem que fiquem por aplicar. É, sem tirar nem pôr, ao vivo e a cores, o Flying Geese a funcionar.

Os responsáveis pelas empresas que vão morrendo argumentam como o actual governo de Portugal:

"A secretária de Estado da Promoção da Saúde admitiu esta quarta-feira dificuldades em contratar especialistas de obstetrícia e ginecologia para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), alegando a concorrência "desigual" do setor privado.

...

Segundo disse a governante, o "problema" na contratação destes especialistas para os hospitais públicos reside na "concorrência com os privados que é desigual"."

Havendo mão de obra barata ao preço da chuva ... Portugal não irá crescer se continuar a “exportar ‘mais do mesmo’”

Não há acasos, está tudo relacionado.

terça-feira, junho 20, 2023

A lente macro é tão ...

"When the world's business and political leaders gathered in 2018 at the annual economic forum in Davos, Switzerland, the mood was jubilant. Growth in every major country was on an upswing. The global economy, declared Christine Lagarde, then the managing director of the International Monetary Fund, "is in a very sweet spot." Five years later, the outlook has decidedly soured.

...

A lot has happened between then and now: A global pandemic hit; war erupted in Europe; tensions between the United States and China boiled. And inflation, thought to be safely stored away with disco album collections, returned with a vengeance. But as the dust has settled, it has suddenly seemed as if almost everything we thought we knew about the world economy was wrong. [Moi ici: Mas quem é que achava que estava tudo bem?]

The economic conventions that policymakers had relied on since the Berlin Wall fell more than 30 years ago - the unfailing superiority of open markets, liberalized trade and maximum efficiency look to be running off the rails. [Moi ici: Este blogue sempre achou errada a crença absoluta na maximização da eficiência, basta recordar os marcadores eficiência, eficientismo e denominador]

...

Globalization, seen in recent decades as unstoppable a force as gravity, is clearly evolving in unpredictable ways.  [Moi ici: Outra tema caro a este blogue, há mais de 17 anos que escrevemos aqui sobre as forças a minar a globalização. Recordo O regresso dos clientesEspeculação - um epílogo?] The move away from an integrated world economy is accelerating. And the best way to respond is a subject of fierce debate.

...

As the consulting firm EY concluded in its 2023 Geostrategic Outlook, the trends behind the shift away from ever-increasing globalization "were accelerated by the Covid-19 pandemic - and then they have been supercharged by the war in Ukraine."[Moi ici: Nunca esqueço de Maio de 2020 - El coronavirus actúa como acelerador de cambios que ya estaban en marcha]

...

Associated economic theories about the ineluctable rise of worldwide free market capitalism took on a similar sheen of invincibility and inevitability. Open markets, hands-off government and the relentless pursuit of efficiency would offer the best route to prosperity. [Moi ici: Recordo aquilo a que chamo a doença anglo-saxónica, recordo as críticas que fazemos há anos à automatização - Especulação sobre mais um falhanço da automatização, recordo o que escrevo sobre Kevin O'Leary]

...

The story of the international economy today, said Henry Farrell, a professor at the Johns Hopkins School of Advanced International Studies, is about "how geopolitics is gobbling up hyperglobalization. [Moi ici: O que me impressiona nestas análises é que me parecem demasiado macro. Há mais de uma década que a globalização está a recuar por causa de Mongo, por causa do fim do modelo do século XX, por causa de "We are all weird"]

...

"Ignoring the economic dependencies that had built up over the decades of liberalization had become really perilous," Mr. Sullivan, the U.S. national security adviser, said. Adherence to "oversimplified market efficiency," he added, proved to be a mistake." [Moi ici: O que me impressiona nestas análises é a crença de que a economia é como a física newtoniana, quando a economia é a continuação da biologia"]


Trechos retirados do artigo, "Failures of Globalization Shatter Long-Held Beliefs", publicado no NYT do passado Domingo. 

domingo, junho 11, 2023

A evolução da produtividade (parte IV)

Parte IIIParte II e Parte I.

Em Acerca do Evangelho do Valor uso esta equação:

A maioria das empresas trabalha para reduzir os custos, trabalha o denominador. Uma minoria valoriza acima de tudo o trabalhar o numerador. 

Quem mete todas as fichas no denominador acaba quase sempre na chamada race to the bottom (ver parte III):

No último livro de Seth Godin, "The Song of Significance: A New Manifesto for Teams" pode ler-se:
"The truth is simple: Widget production [Moi ici: Trabalhar o denominador] is fairly straightforward to measure and increase. But those metrics (and methods) don't work for human interactions, insight, or innovation. [Moi ici: Trabalhar o numerador]
...
When we consider the four kinds of work, we can lay them out in a two-by two grid with stakes and trust as the two axes.
High-stakes, low-trust work is the work assigned by the industrialist. [Moi ici: Trabalhar o denominador até mais não, solução para lidar com commodities] This is meeting spec. Test and measure. Surveillance. Traditional management lives in this quadrant. This is how you successfully run a fast-food franchise. Every customer is important, and every output needs to be identical.
Low-stakes, low-trust work is similar, except it's easily outsourced. This isn't work your organization needs to take seriously or personally.
...
The next quadrant is for work that is low stakes but high trust. This is the work of culture creation, of community, of people we care about showing up each day to contribute a bit to the whole. The work is consistent, but it's human, not industrial. The shifts caused by pandemic disruptions, outsourcing, work from home, and AI have disrupted this quadrant.
And the final quadrant, the most important one, is the work with high stakes and high trust. This is significant work, important work, work on the edge. This is the work that creates human value as we connect with and respect the individuals who create it.
It doesn't pay to industrialize this work or to create it under duress. Because then it becomes industrialized and once again joins the race to the bottom.
...
This is a race you don't want to run. Because you might win. Or worse, come in second.
This is the industrialist's race, the race of productivity. [Moi ici: Não esquecer esta frase "the race of productivity", voltaremos a ela numa próxima parte. Recordar Reinert e o Uganda. Por que não associamos produtividade a high trust? Talvez por causa da doença dos engenheiros] This is the challenge of more for less, of mass-market quality at scale.
The race to the bottom also offers low prices, average quality, and plenty of room for excuses about our lack of humanity and a focus on the short term. The race to the bottom is filled with shortcuts and with competitors who are willing to sacrifice integrity for a slight edge.
At first, heading to the bottom is thrilling, because a small head start feels like an extraordinary boon. The sales and profits quickly arrive.
But inevitably, when a competitor shows up, it becomes a race. And to win that race, all the elements that attracted you to the work quickly disappear."

Continua.

sexta-feira, junho 09, 2023

A evolução da produtividade (parte III)

Parte II e Parte I.

 

Vamos mais uma vez adiar as participações de Seth Godin e Porter nesta série, porque entretanto apareceu-me este artigo “Indústria do vidro na Marinha Grande sem mão-de-obra: "Não conseguimos contratar um único português, nem sequer temos candidaturas"”.

 

Há dias numa rede social alguém publicava uma série de fotos de árvores em contexto urbano mutiladas por podas exageradas, e depois referia que um jardineiro em Portugal ganha uma miséria à hora, mas que no Luxemburgo é bem remunerado. Veio-me logo à mente aquela frase “It takes a village” transfigurada em “It takes the whole country”.

 

Aqui no blogue e no Twitter costumo referir o que aprendi com Reinert exemplificando com os motoristas e com os barbeiros:

·     Existem tarefas que podem ser transferidas para o exterior da zona onde vivemos, por exemplo, produzir peças de vidro na Marinha Grande. E existem tarefas que não podem ser transferidas para o exterior da zona onde vivemos, por exemplo, cortar o cabelo, transportar pessoas, arranjar o jardim da nossa cidade.

No caso das tarefas que podem ser transferidas para o exterior da zona onde vivemos os salários são limitados por três factores:

  • A capacidade de criar valor percepcionado pelo cliente; 
  • Os preços praticados por quem produz no exterior da zona onde vivemos;  
  • O poder de compra da generalidade dos consumidores na zona onde vivemos e no exterior

No caso das tarefas que não podem ser transferidas para o exterior da zona onde vivemos os salários são limitados por três factores:

  • A capacidade de criar valor percepcionado pelo cliente; 
  • Os preços praticados por outros produtores da zona onde vivemos; 
  • O poder de compra da generalidade dos consumidores na zona onde vivemos;

Vamos analisar o que acontece com os produtos ou serviços que não criam um grande valor percepcionado pelos clientes, (commodities, portanto) admitindo que existe competição entre os fabricantes de produtos ou prestadores de serviço.

 

No caso dos produtos ou serviços transaccionáveis com forte competição externa e sem marca forte, ou alguma distinção: 

  • O preço de venda ditado por quem consegue produzir mais baixo limita o numerador da equação da produtividade, por isso as empresas neste contexto fixam-se no eficientismo.

No caso dos produtos ou serviços não-transaccionáveis com forte competição e sem marca forte, ou alguma distinção:

  • O preço de venda é limitado pelo poder de compra da generalidade dos consumidores na zona onde vivemos, o que limita o numerador da equação da produtividade, por isso as empresas neste contexto fixam-se no eficientismo.

No modelo seguido no Japão e outros países asiáticos, no caso dos produtos ou serviços transaccionáveis com forte competição externa funciona o tal modelo dos Flying Geese. Este modelo obriga a que as actividades com cada vez menos valor acrescentado sejam abandonadas e os recursos transferidos para outras actividades com mais valor acrescentado, o que permite pagar melhores salários e aumenta a produtividade.

 

No modelo que estamos a seguir em Portugal as actividades com cada vez menos valor acrescentado em vez de serem fechadas, recorrem a estratégias de abaixamento dos custos da mão de obra (actuação no numerador da equação da produtividade). Por isso, estas empresas crescem pouco ou não crescem mesmo, geram pouco valor acrescentado e pagam baixos salários. Assim, a sua contribuição para a melhoria dos salários das outras profissões é negativa, porque estes assalariados contribuem para o poder de compra dos consumidores na zona onde vivemos.

 

A contribuição para o aumento da produtividade ou é negativa ou é muito baixa, porque se concentra mais na redução dos custos do que na criação de valor. Nunca esquecer Marn e Rosiello e o Evangelho do Valor “It takes the whole country” para aumentar o poder de compra,

Os salários praticados são limitados pela capacidade de criar valor para o cliente. Quanto mais valor for acrescentado pelo fabricante às matérias-primas e componentes, mais elevado pode ser o preço praticado e mais elevado pode ser o salário oferecido. Tudo o que não passe por trabalhar o numerador é insuficiente para a revolução necessária na produtividade agregada.

O que os jornalistas relatam com candura e ingenuidade é a chamada ...


... e nem se apercebem disso.

sexta-feira, fevereiro 17, 2023

"Tudo depende do valor (relativo) por que se vendem"

"Não querendo ser redutor, a produtividade - especialmente ao nível empresarial - não está no quanto se produz, mas antes no valor do que se produz. Servir cafés à mesa não tem necessariamente menor produtividade que fabricar BMW. Tudo depende do valor (relativo) por que se vendem [Moi ici: Tão raro encontrar este apelo à aposta no numerador da equação da produtividade] cafés à mesa. Simplisticamente, é uma questão de modelo de negócio! Talvez seja porque em Portugal se dá pouca atenção ao modelo de negócio - i.e. o valor do que se produz - que a mão de obra mais qualificada procura oportunidades na emigração. A nossa sina parece ser a falta de um tecido empresarial que valorize as competências da nova geração, tida como a mais bem formada. [Moi ici: Não sei se será a melhor maneira de colocar o tema. As empresas não existem para dar trabalho, as empresas dão trabalho como instrumento para ganhar dinheiro. O ponto é mais a dificuldade, ou a não necessidade de subir na escala de valor (satisficing) para sobreviver. Só a aposta na subida na escala de valor traz como consequência o recurso a gente com mais competência. Não para fazer caridade, mas por puro interesse próprio] Se a maior realização é encontrada no estrangeiro, o sistema educativo fez um bom serviço. Não há como o negar A questão central talvez seja outra, relacionada com avarias noutros "elevadores sociais" de origem nacional."

Trecho retirado do artigo "Elevadores nacionais" de Álvaro Nascimento e publicado ontem no JdN.

quarta-feira, janeiro 25, 2023

Mais do que a redução do custo.

"A Purchase Is Always Based on Value and Never on Price! 

...

What I mean is that if a consumer perceives that they must give more than they get from a transaction, they will stop buying. Ergo, if the price is higher than the utility of the product, there will not be any exchange. In other words, the utility describes whether the value is positive. To obtain sales, one must therefore either increase the value or reduce the cost to sell the product.

...

Perceived value is the consumer’s overall assessment of the utility of a product based on the perception of what is received (benefits) and what is given (costs). This means that value is individual and personal. It is a compromise based on what you get versus what you give.

...

Price is defined as what one sacrifices (money, time, risk) to acquire a product. Price in this context is more than the money you pay for a product."

Aumentar o valor decorre de trabalhar o numerador e/ou de trabalhar o denominador. 

Há anos que escrevo aqui sobre a importância e impacte de aumentar o valor (produtividade) através do numerador, embora a acção mais comum das empresas se foque no denominador com a redução dos custos, para poder reduzir o preço. Aproveito para salientar que ao nível do denominador também se pode trabalhar o tempo e o risco.

Trechos retirados de "Pricing" de Ragnhild Silkoset.

terça-feira, janeiro 03, 2023

Aumentar a produtividade? No way!

Na passada segunda-feira, 2 de Janeiro de 2023, o JdN trazia este gráfico:

Conclusão?




PREOCUPANTE!!!

O que é a produtividade?
A produtividade é um rácio, a produtividade mede um efeito de alavanca.
Investimos numa série de entradas (custos) - o que representa um valor monetário A. 
Obtemos como resposta uma série de saídas que após venda (só após venda, pois isso é que prova que o produto tem valor para o cliente. Não conta produzir um artigo que vai "apodrecer" no armazém sem procura) - o que representa um valor monetário B. 
A produtividade é o rácio B/A. A produtividade mede o retorno do investimento em A?

Como temos escrito aqui no blogue ao longo dos anos, como é que se pode aumentar a produtividade?

Fácil!
Aumentar B ou reduzir A. A tal diferença entre trabalhar o numerador ou trabalhar o denominador.

Só que há um pormaior. A maior parte das pessoas quando pensa em aumentar a produtividade fixa-se em reduzir o A e mantém o B constante. Ora como referi, pela enésima vez, em E o burro era eu! o impacte de trabalhar o B é muito maior do que o impacte de trabalhar o A. 

Ou seja, voltando à aqui famosa pirâmide de Larreché:
A maioria das empresas concentra-se a melhorar a produtividade nas zonas onde o retorno do esforço é menor. 

Aumentar o B significa trabalhar na "Originação de valor", significa aumentar o preço do que se vende porque se cria mais valor para os clientes-alvo. Ou porque se melhora a qualidade do que se produz (aqui melhorar qualidade não é reduzir defeitos), ou porque se começa a trabalhar para clientes-alvo diferentes que dão mais valor à oferta específica que fazemos.

Voltemos ao gráfico do JdN:
  • Reduzir pessoal - trabalhar o A e, como se aprende com Marn e Rosiello, é a medida que menos retorno traz
  • Investir em tecnologia - presumo que seja trabalhar o A. A tecnologia é apenas uma ferramenta
  • Reorganizar os procedimentos e processos - trabalhar o A por excelência. Voltar aos anos 90 do século passado e à reengenharia. Michael Hammer de novo?
  • Flexibilizar o horário de trabalho - muito provavelmente trabalhar o A. O politicamente correcto tem horror a dizer que a produtividade é baixa porque os trabalhadores são preguiçosos. No entanto, os mesmos adeptos do politicamente correcto são os primeiros a defender que trabalhadores com horário mais flexível, ou com melhor salário, serão mais produtivos. Acho estranha esta contradição que mais ninguém refere. 
  • Investir na formação em liderança e gestão - Incógnita ... se continuarem com mentalidade de engenheiro é trabalhar o A
  • Redefinir cadeias de abastecimento - trabalhar o A
  • Não se aplica/não responde - ainda perdidos.
Chegado aqui, interrogo-me: por que deveria esperar um resultado diferente? Basta recordar o Forum para a Competitividade.





segunda-feira, outubro 03, 2022

A brutal realidade de uma foto

Imaginem uma empresa sujeita ao aumento dos custos. Os aumentos podem ser mais rápidos do que a capacidade de criar valor para os suportar. Por exemplo, no caderno de Economia do semanário Expresso da passada semana, no artigo, "Gerir quando quase tudo É "volátil" e "imprevisível"", encontramos este trecho:

"Já em 2022, quando o custo do aço inoxidável aumentou 300%, voltaram a pensar na Herdmar o mesmo mas, mais uma vez, "felizmente, não se verificou". Mas, desde junho, quando terminou o contrato de preço fixo de eletricidade que tinham, a fatura aumentou 500% face ao que pagavam no início do ano, mesmo com os sistemas de produção em autoconsumo que instalaram em 2021."

Agora olhem para a foto que ilustra o artigo, uma foto da Herdmar:


Espero que a foto seja uma montagem artística e não um apanhado do quotidiano da Herdmar. Imaginem os minutos humanos incorporados na manufactura daquela colher, segundo a foto. Quantas colheres são produzidas por aquele humano por mês? Quanto valor é gerado por essa quantidade mensal de colheres?  Quanto desse valor sobra, depois de pagar matérias primas e consumíveis, para pagar salários e o custo do futuro?

Agora reparem como é o pensamento do mainstream em Portugal (no mesmo artigo):
"Por isso é que o economista Leonardo Costa diz que a prioridade do Governo devia ser o aumento da produtividade, a retenção da mão de obra qualificada no país e a melhoria da gestão nas PME, onde "há chefias que têm menos qualificações que os seus trabalhadores", comenta."

Portanto, o aumento da produtividade que o país precisa será obtido à custa da melhoria da gestão nas PMEs existentes, e para isso será fundamental a actuação do governo... 

Pois, em A amostra errada mostro como essa ideia está errada. A única actuação que vejo para o governo é a de criar condições para que empresas de outro campeonato encontrem interesse em vir instalar-se na Sildávia do Ocidente. Não cabe aos governos guiar as empresas no aumento da produtividade, ou na melhoria da gestão, não cabe aos governos escolher vencedores. Deixem as empresas morrer!!! 

Tanta gente precisava de ter esta citação afixada no local de trabalho:

BTW, olhem para os governos que temos tido... acham mesmo que são um exemplo de gestão? TAP, EFACEC, BES, ...

domingo, outubro 02, 2022

A amostra errada

Em Janeiro passado escrevi, Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas. Empresas com elevados níveis de produtividade, empresas com margens que permitem pagar muito melhores salários, têm o mundo para escolher onde se devem localizar.

Em Julho passado escrevi, Depois do hype: O mastim dos Baskerville! onde escrevi:

"Deixem os empresários que estão a trabalhar em paz. Saúdem o seu esforço. Concentrem-se no que chamo o mastim dos Baskerville. Concentrem-se nas empresas e nos empresários que não existem. As melhorias de produtividade que o país precisa dependem das empresas e dos empresários que não existem."

Recordo isto por causa de um texto no último caderno de Economia do Expresso, "Confiança na política fiscal desce para mínimos", onde encontro esta figura:

Pensem na diferença abismal entre os níveis médios de produtividade de Portugal e da União Europeia ... pensam que vai ser colmatada pelas empresas existentes? Pensam que são os incumbentes, craques na obtenção de subsídios e apoios do governo de turno, que vão fazer essa viagem? Não é que eles não queiram, não sabem. Recordar, os macacos não voam.

Portanto, podem fazer todos os inquéritos que quiserem, mas esquecem-se de uma coisa, estão a inquirir a amostra errada.




 

quinta-feira, janeiro 20, 2022

Criar as condições para que as empresas do futuro surjam

A falta de trabalhadores é também um sinal de que muitas empresas terão de fechar. Terão de fechar porque não geram a rentabilidade suficiente para serem atraentes.

O mesmo que aconteceu na Alemanha e na França dos anos 70 do século passado, quando as suas fábricas nos sectores tradicionais fecharam para abrir em Portugal e noutros países mais baratos.

Anotei isto na semana passada. E agora recordo alguém que numa fábrica de calçado há cerca 4 anos me dizia: “Dentro de 10 anos mais de metade das pessoas que trabalham aqui não vão cá estar, vão estar reformadas. Quem as vai substituir?”

Ontem li "Valérius afasta para ¡á produção da Dielmar em Marrocos":

"Anotícia surgiu na semana passada no Jornal Têxtil: a Valérius, o grupo que quer pegar na Dielmar – empresa do mesmo sector que se encontra em processo de insolvência – admitia a deslocalização da produção da empresa de Castelo Branco para Marrocos, ficando em Portugal a parte do design. Mas em conversa com o Jornal Económico, a CEO da Valérius, Patrícia Ferreira, diz que a questão não se põe neste momento, apenas se colocará em dez a 15 anos.

...

“Segundo avançam todos os estudos sectoriais sobre o tema, o têxtil nacional vai confrontar-se com a evidência de “em dez, 15 anos”, deixar de ter mão-de-obra especializada disponível."

Ontem também tive oportunidade de ler a entrevista de Teixeira dos Santos no JdN do dia 17:

"Os salários são uma questão política importante, delicada, e por isso têm estado presentes no debate político mais recente. Mas são também uma questão essencialmente económica e não podemos retirar a economia do tema. É importante não ignorar que tem de haver um alinhamento muito grande entre a evolução dos salários e da produtividade. Isto em termos de salários reais. Em termos de salários nominais, alinhar o salário nominal com a evolução da inflação mais a produtividade. Ir para além disto é comprometer a competitividade das empresas."

Ao ler isto, recordei Avelino de Jesus e pensei: "Deve ter sorrido"

Por fim, recordei Jorge Marrão:

"Se nós eliminarmos a empresa mais improdutiva, a produtividade do sector sobe muitíssimo"

Tudo relacionado. Sem dramas, à la finlandesa, devíamos evitar os presentes envenenados e criar as condições para que as empresas do futuro surgissem:

No JdN de hoje a coluna de Nogueira Leite é sobre transições energéticas mal preparadas e suas consequências. Também aqui estamos a cozinhar uma transição do perfil da economia mal amanhada. Forçamos a velocidade de encerramento das empresas do perfil antigo, mas ao mesmo tempo não criamos as condições para que as empresas do perfil novo se instalem em quantidade suficiente.

domingo, janeiro 16, 2022

Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas

Na passada sexta-feira fixei-me na mensagem desta imagem na capa do JdN:


No interior do jornal sublinhei esta frase do ministro da Economia:
"Não acreditamos que uma baixa de impostos pura e simplesmente ponha por magia a economia a crescer."

De que fala o ministro quando fala em competitividade? Recordo um postal publicado em Novembro último, com base num texto de Eric Reinert, "Competitividade, absurdo, lerolero e contranatura".

Reinert refere que há quem use a palavra competitividade para significar empresas mais competitivas pelo preço, e há quem use a palavra competitividade para significar empresas mais competitivas por causa do valor criado. Foquemos a nossa atenção naquela que aqui pregamos com o Evangelho do Valor, a segunda.

Queremos que aumente a competitividade que permite o aumento dos salários por causa do aumento do valor percepcionado pelos clientes. Ou seja, outra forma de dizer que queremos um aumento da produtividade à custa do valor criado e não da redução de custos (foco no numerador e não no denominador).

O que aprendemos com os finlandeses:
"It is widely believed that restructuring has boosted productivity by displacing low-skilled workers and creating jobs for the high skilled."
Mas, e como isto é profundo:
"In essence, creative destruction means that low productivity plants are displaced by high productivity plants." Por favor voltar a trás e reler esta última afirmação.
E o grande finale:
"As creative destruction is shown to be an important element of economic growth, there is definitely a case for public policy to support this process, or at least avoid disturbing it without good reason. Competition in product markets is important. Subsidies, on the other hand, may insulate low productivity plants and firms from healthy market selection, and curb incentives for improving their productivity performance. Business failures, plant shutdowns and layoffs are the unavoidable byproducts of economic development."

Ou seja, para que a produtividade agregada do país cresça precisamos de empresas novas. Quem as vai criar? Quem tem o know-how para trabalhar nas zonas mais altas da escala de valor? Entra Nassim Taleb com:

"Systems don’t learn because people learn individually – that’s the myth of modernity. Systems learn at the collective level by the mechanism of selection: by eliminating those elements that reduce the fitness of the whole, provided these have skin in the game"[Moi ici: Isto é duro! Pensem nos Saraivas deste mundo, ou nos Fóruns para a Competitividade. Come on!]

Aprendam a receita irlandesa:

"Gostei de ouvir muitas das coisas que Alexandre Relvas disse, não todas. No entanto, saltou-me a tampa quando Alexandre Relvas disse que os empresários portugueses tinham muito a aprender com os empresários irlandeses.

Não acredito! - Pensei. Ele pensa que o salto de produtividade e PIB irlandês foi feito à custa dos empresários irlandeses? Come on! Esta gente não analisa os números?

Enquanto conduzia debaixo de chuva pensava em como mostrar o quão longe da realidade está o pensamento de Alexandre Relvas. Onde posso ir buscar tais números?

Lembrei-me de Hausmann e do seu trabalho no MIT acerca dos product spaces. Já em casa, depois de comer algo fui ao site do MIT (agora está em Harvard) e analisei a evolução do perfil de exportações da Irlanda e de Portugal entre 1995 e 2018. Entretanto, já hoje de manhã durante a caminhada matinal recordei-me deste artigo "A Tale of Two Clusters: The Evolution of Ireland’s Economic Complexity since 1995". 

Reparem nesta comparação entre as empresas de capital estrangeiro e as empresas de capital irlandês a operar na Irlanda (número de trabalhadores, facturação e número de empresas por sector)"

Portanto, para aumentar a competitividade/produtividade como eu defendo (através do numerador), temos de captar investimento estrangeiro. Agora reparemos no presente envenenado que queremos que os estrangeiros comam: No international Tax Competitiveness Index, quanto ao "Corporate Tax Rank" e ao "Cross-Border Tax Rules Rank" vêmos coisas que não lembram ao careca ... Portugal (35º lugar) é menos atractivo que a França (34º lugar) para as empresas. Quem diria!!!


Conclusão: Baixar o IRC pode não ser suficiente, mas é certamente necessário. Temos de trabalhar para melhorar o posicionamento no "Corporate Tax Rank". A mexida no IRC não é para melhorar a competitividade de empresas que venham para cá, mas é para tornar o país atractivo para os decisores dessas empresas que racionalmente procuram o melhor para elas.

Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas.

terça-feira, dezembro 28, 2021

"esta obsessão dos cêntimos"

No livro, "Strategy Pathfinder" encontrei esta imagem:
Ainda acrescentaria algumas entidades a este ecossistema. Por exemplo, os influenciadores, ou os prescritores.

Voltei a recordar-me desta imagem ao ler, "Fábricas cortam intermediários para chegar ao consumidor", um tema já tratado recentemente em "É preciso trabalhar na originação de valor.". Uma evolução positiva, mas que me deixa com algumas reticências. Sorrio porque esta gente está a seguir um conselho antigo deste blogue, "Outra forma de David bater Golias". 

No entanto, o tema que queria sublinhar neste postal é outro:
"“Como conseguimos mais do que vender produtos, vender conceitos, estatuto. Qualquer coisa mais que nos preencha, além do produto. E não tenhamos medo de falar do preço. Em Portugal há sempre um bicho papão quando chegamos a esse momento. Se andamos com esta obsessão dos cêntimos, não vamos sair do mesmo lugar. Portugal vive aprisionado no preço”, desabafa."

Sim, a concentração no denominador, na eficiência, no custo, em vez da concentração no numerador, no valor:

Enquanto esta revolução mental não for feita por uma massa crítica ...

BTW, não esquecer o conselho dos velhos estóicos, nunca apostar mais do que se pode perder sem arruinar o empreendimento, "Tail risks can screw you up".

segunda-feira, abril 05, 2021

Produtividade à moda antiga

Volto ao postal "A ratoeira" por causa desta figura:

As melhorias de produtividade são canalizadas para a competição pelo preço.

Volto a um postal escrito em Outubro de 2006 e já com todos os elementos que interessam para o truque alemão ou a doença anglo-saxónica.

Ontem tive a oportunidade de ler "U.S.’s Long Drought in Worker Productivity Could Be Ending" e não pude deixar de o associar à doença anglo-saxónica... a produtividade sobe porque se produz mais do mesmo com menos recursos. Bem longe do Evangelho do Valor. Parece que não fazem ideia de que o truque é subir na escala de valor:
"After a decadelong drought, worker productivity might be about to accelerate thanks to pandemic-induced technological adoption, which could lift economic growth and wages in coming years while staving off inflation pressure.
...
This is enabling companies to raise productivity, which is defined as output per hour worked. Stronger productivity growth is key to the economy’s long-term success. Economic growth depends on the number of workers and how much they produce. Without productivity growth, economic growth must rely on more workers, which might be hard to achieve since the workforce is aging and the pandemic pushed millions of Americans out of the labor force.
...
Higher productivity growth should also put more money into people’s pockets because wages are tied to how much workers produce. [Moi ici: Mais dinheiro para quem fica, é preciso não esquecer os que vão para o desemprego. Ver parágrafo seguinte e recordar porque é que o salário médio cresceu em Portugal no ano passado] That would enable companies to raise wages without raising prices, damping inflation pressure.
...
Last year it accelerated to 2.4% in the fourth quarter of 2020 from the same period a year earlier, although that was because the coronavirus triggered steep job losses in lower-wage sectors that tend to be less productive.
...
A shift toward e-commerce should push up productivity by eliminating workers needed in bricks-and-mortar stores,"


terça-feira, março 23, 2021

Subir na escala de valor e calçar os sapatos do outro (parte II)

Parte I.

A empresa A do exemplo anterior, apesar de preguiçosa, apesar de ter um desempenho de zombie vai sobrevivendo à custa de artimanhas legais e desinteresse dos outros concorrentes em servir os seus clientes.

Entretanto, a China entra em jogo e começam a aparecer os produtos superbaratos com os quais as empresas A não podem competir:
E assim, em t4 as empresas tipo A morrem às mãos da concorrência amarela (chinesa).
Em t5, as empresas A já não existem, e agora a perseguição é às empresas C.

A velocidade de subida na escala de valor das empresas chinesas, e a constante entrada em campo de players com custos baixos (Turquia et al) dizima empresas em Portugal a uma velocidade superior aquela a que as empresas, ou os sectores se podem regenerar naturalmente.

A incapacidade de calçar os sapatos do outro impede ver que o que chineses e turcos nos fazem, é o que nós fizemos aos alemães e franceses que trabalhavam nas indústrias tradicionais, quando o país aderiu à EFTA. Por isso, falam em dumping social, ou em batota, ou associam o sucesso a negócios como o contrabando de droga.

Também existem os Peter Pan. Os Peter Pan são as empresas que operam em mercados em que os chineses ainda não entraram, mas que também sentem a concorrência de quem oferece o mesmo produto ou serviço por um preço extremamente mais baixo. Os Peter Pan não conhecem, ou não ouviram falar do modelo de Kano:
Sentem-se injustiçados, então até dão boas condições aos seus trabalhadores e aparecem uns maus que praticam preços de arrasar a estragar tudo.

Como o ginásio de topo com que trabalhei em 2011 e que se zangava com os velhos clientes que o trocavam por opções mais baratas em pleno descalabro do mercado interno. Não, não são os clientes os maus, os maus são os que não evoluem e não arranjam mais truques, mais novidades para continuar a seduzir os clientes.

E assim chegamos aos truques, e ao truque alemão. A necessidade imperiosa de estar sempre a trabalhar para subir na escala de valor, para aumentar o peso do numerador na equação da produtividade. A velocidade a que a empresa portuguesa-tipo faz isto é muito baixa. Maliranta e Nassim Taleb explicam (ver parte I).

E aqui entra o exemplo irlandês. O exemplo irlandês não tem a ver com os empresários irlandeses, tem a ver com o capital estrangeiro injectado como investimento directo:

Recordar Irlanda e João Duque:

Em 1990 a trabalhar com uma empresa japonesa levei-os a visitar uma fábrica de grades de cerveja na Figueira da Foz. Apesar da desarrumação, da sujidade, das máquinas da empresa, o japonês gostou da empresa, confidenciou-me que a super-ocupação do espaço com máquinas o faziam lembrar as fábricas japonesas (BTW, outro japonês com que trabalhei, chegava a uma empresa e via-a super arrumada e com muito espaço e não conseguia compreender o desperdício de dinheiro, o valor do m2 no Japão era exorbitante, ficava logo de pé atrás). Imaginem, uma fábrica de grades de cerveja arrastada por uma empresa estrangeira para uma subida na escala de valor... qual o valor líquido co-criado por grama de polímero, ou por minuto de injecção, a fabricar grades de cerveja ou componentes para automóveis. Hoje, essa empresa é um player no negócio de componentes para automóveis.

A rapidez e a dimensão da subida na escala de valor requer este know-how estrangeiro como semente para puxar pelas empresas portuguesas. A seguir ao 25 de Abril o que interessava era produzir, mas num mundo com excesso de produção quem manda é quem compra (B2B). E quem compra tem de dominar as cadeias de fornecimento, tem de mandar nas prateleiras. Um país sem marcas não pode ter essa veleidade, mas pode trabalhar e subir na escala de valor ao servir essas empresas.