Um desafio para quem está satisfeito com o rumo que as coisas estão a ter no curto-médio prazo?
Supostamente, implementar um sistema de gestão passa por chegar a uma empresa tirar uma série de fotografias sobre como é que a empresa funciona, comparar com os requisitos da norma de referência e colmatar as lacunas.
Assim, arranja-se um consultor, um suposto especialista na norma de referência, e colmatam-se as lacunas.
Desta forma implementamos um sistema que responde aos requisitos da norma de referência, obtemos a certificação, mas não obtemos um verdadeiro sistema de gestão. Recordar Carl Sagan. O vídeo agora está aqui.
Um verdadeiro sistema de gestão é um sistema que estabelece uma orientação estratégica, uma resposta à pergunta: O que devemos fazer? Depois, traduz essa resposta num conjunto de objectivos claros e promove as mudanças necessárias para os conseguir atingir.
É claro que uma empresa quer aumentar as vendas e o lucro, mas isso é uma consequência do que se faz. Querer aumentar as vendas e o lucro nada nos diz sobre o que a empresa deve fazer para o conseguir. Recordar a obliquidade.
Numa empresa formula-se uma política da qualidade e ambiente e um conjunto de objectivos da qualidade e ambiente. Depois, têm de se definir que planos de trabalho devem ser seguidos para cumprir esses objectivos.
Obter a certificação é importante? Claro que sim, senão a empresa estaria a desperdiçar dinheiro, mas certificar a empresa sem ficar com um verdadeiro sistema de gestão é uma oportunidade perdida.
Em que mundo vive a empresa?
Há dois tipos de pessoas no mundo e à frente das empresas, as que têm o locus de controlo no interior e as que têm o locus de controlo no exterior. As que têm o locus de controlo no exterior acreditam que o poder para mudar a realidade está no exterior. Por isso, estão sempre à espera que o governo, ou a associação X, ou a União Europeia, ou ... faça, dê.
Em conversa numa empresa, ao perceber a incomodidade com os objectivos comerciais, pensei ser um caso clássico de locus de controlo no exterior. No entanto, algum tempo de reflexão sobre o tema pôs-me a pensar que se calhar a falha teria sido minha por não ter sido mais exigente na formulação da política da qualidade e ambiente, supostamente a redacção da orientação estratégica.
Foi registada uma análise do contexto que não sei se circulou o suficiente e se foi objecto de reflexão e discussão interna. Estamos a falar de coisas demasiado importantes e pessoais de uma empresa para que um consultor consciente tenha a veleidade de impor o que quer que seja. Na análise do contexto, que pode estar incompleta, há duas grandes forças:
- o aumento dos custos - uma espécie de onda longa. Pode agora estar a ter um pico exagerado por causa da guerra, mas é uma tendência de longo prazo que as empresas dos sectores tradicionais não podem ignorar. A evolução demográfica, a pressão da emigração, a pressão dos impostos de um estado gordo e irreformável, a pressão dos salários
- uma tendência de reindustrialização da Europa que no curto prazo aumenta a procura pela produção europeia de produtos tradicionais e de mais tudo o resto. Ou seja, no médio prazo os sectores tradicionais terão de competir por trabalhadores com outros sectores com melhores margens. Acredito que no médio prazo acontecerá aos sectores tradicionais em Portugal o mesmo que na Alemanha dos anos 70, só ficarão empresas mais pequenas a trabalhar para nichos de mercado capazes de suportar preços mais elevados. Acredito também que as pequenas séries, a variabilidade de modelos e a rapidez de resposta será cada vez mais importante.
Estas duas forças vão condicionar o futuro do sector da empresa, na minha opinião, mas eu não sou mágico e não conheço o futuro. Se tiverem outras ideias incluam-nas.
Admitindo que estas forças vão realmente condicionar o futuro do sector, o que deve a empresa fazer para continuar a ter futuro nesse futuro exigente?
Só depois de responder a esta pergunta é que faz sentido pensar em objectivos.
Que tipo de empresa, a trabalhar para que tipo de clientes pode fazer sentido para ter futuro no futuro?
Um grande desafio mesmo. Quem tem cabeça para pensar no depois de amanhã, quando hoje e amanhã o sol vai aparecer e o dia vai estar agradável?
Quem é este morcão para me vir falar de problemas quando tudo corre bem?