Toda a gente fala e escreve sobre aumentar a produtividade. A produtividade é um rácio que relaciona o valor do que sai de um processo produtivo face ao custo do que entra nesse mesmo processo produtivo. É, de certa forma, uma espécie de medida da capacidade de um processo produtivo em criar riqueza a partir de um certo custo de entrada.
Durante quase 100 anos fomos condicionados a pensar que aumentar a produtividade passa por aumentar a quantidade de peças, ou serviços que conseguimos vomitar por unidade de tempo. Pouca gente já atingiu que a forma mais inteligente de aumentar a produtividade passa por focar a atenção no valor do que se produz, mais do que no custo em que se incorre. O velho: "If the customer doesn't care about the price, why should you care about the cost?"
Quando eu tinha 20 anos, lembrem-se da frase de Napoleão, a típica PME trabalhava para o mercado interno e, quando pontualmente tinha um convite para exportar, fazia-o a preços mais baixos do que os praticados no mercado interno, um mercado protegido por barreiras alfandegárias. Bastava cobrirem os custos variáveis para já ganharem. Recordo esta época neste postal de 2016, ""um atestado de desconhecimento da realidade" (parte IV)".
Hoje vivemos num mundo completamente diferente. A economia portuguesa é muito aberta. Assim, os preços praticados no mercado nacional são baixos e qualquer PME exportadora, por norma, consegue preços mais altos a exportar do que a vender para o mercado interno. Os exemplos neste blogue são clássicos: preço do calçado exportado versus o preço do calçado importado; o mesmo para o mobiliário, para os têxteis, para a fruta, ...
Assim, uma das formas de aumentar a produtividade, passa por exportar, porque permite aumentar os preços do que se vende, ou seja, aumentar o numerador do rácio referido acima. É claro que o que se vende para fora não é o mesmo que se vende para o mercado interno, ou o que se vende para fora é para outro tipo de consumidor, que valoriza coisas diferentes das valorizadas pelos consumidores portugueses.
Esta semana passei os olhos pelo semanário Vida Económica e reparei em vários artigos acerca do preço do leite.
- José Martino em "De quem é a culpa na crise do leite?"
- Maria Marramaque em "Preço do leite está estagnado há 20 anos"
Entre algumas perguntas interessante que José Martino faz, também encontro perigosas sugestões de introduzir limitações à liberdade económica. Por exemplo, proibir as cadeias de supermercados de terem produção própria.
No texto de Maria Marramaque encontro um discurso estranho. Se um sector tem excesso de produção como pode querer aumentar preços? Se um sector compete de forma amadora com gigantes europeus como pode querer aumentar preços?
Esta figura ilustra bem o que se passa:
Enquanto uns estão no negócio e tratam-no como se fosse
mistério, outros tratam-no como um algoritmo. Recordo os números acerca do tamanho das
unidades de produção leiteira: uma vacaria com 100 vacas nunca poderá competir de igual para igual com uma vacaria com 30 mil vacas.
No texto de Maria Marramaque ainda encontro:
"O Governo, os produtores e os consumidores à indústria pedem inovação, produtos inovadores e de maior valor acrescentado, para logo a seguir tudo ser depreciado. Olhe-se por exemplo do leite de pastagem. E pergunto, será que o leite biológico vai pelo mesmo caminho? Poderá ser passada para o consumidor a percepção que o leite de pastagem/biológico têm os mesmos custos que o leite convencional?"
Em 2008 decorei esta frase:
"Milk is the ultimate low-involvement category"
Não basta ser inovador! Consigo diferenciar-me? Pode alguém argumentar que é leite de pastagem quando não o é e não passa nada?
Mas voltemos ao ponto de partida, à produtividade.
A forma mais rápida de aumentar a produtividade é tentar apelar ao consumidor endinheirado e que dá valor ao modo de produção do leite. Lembram-se de quando a marca Portugal representava algo, antes de ser abastardada por Odemira?
O que é que o sector do leite fez a esta possibilidade?
Uma nota final, se não pertence ao clube dos produtores grandes e com connections talvez esteja na altura de repensar o negócio: Façam as malas e viagem pela Europa,
aprendam a lição do canadiano, em vez de procurarem mercado para escoar os produtos, procurem mercados que valorizem algo que possam oferecer de forma distinta. Comecem pelo fim,
comecem pelo outcome, não pelo output.