O editorial do jornal Público de hoje fez-me logo recordar a estória da Galinha dos Ovos de Ouro, a estória do quem tudo quer tudo perde.
"O empreendimento do Alqueva pode muito bem ser o símbolo do Portugal extractivista, megalómano e irracional que resistiu à democratização, à Europa e à modernização e se consolida no Alentejo como testemunho de um passado difícil de expurgar.Começo a discordar de Manuel Carvalho quando ele sonha:
...
Erguido o betão e acumulada a água do Guadiana, entrámos no desvario. Não houve um plano de ordenamento pensado e prudente e os 120 mil hectares de área regada tornaram-se uma imensa monocultura sustentada por pouca água, é certo, mas por métodos intensivos que recorrem a químicos danosos para o ambiente. Não houve prudência na leitura das tendências do clima e autorizaram-se centenas de proprietários a instalar culturas regadas fora do perímetro da rega. E numa decisão que hoje se pode erguer como um monumento à ambição desmesurada, pediram-se financiamentos para aumentar a área regada em 40 mil hectares."
"Precisava de um projecto incentivado pelo Estado e adoptado pelos agricultores que garantisse a diversificação de produções que faz parte de todas as economias sólidas."O estado? Ainda ontem apanhei esta estória no Jornal de Notícias:
No edifício dos Direitos Sociais utentes com cadeiras de rodas ficam à porta, mais, alguns trabalhadores do serviço que andam de cadeiras de rodas tiveram de mudar de serviço ou passar a trabalhar de casa. Acham mesmo que o estado consegue pensar a longo prazo?
Há dias fiz like a mais um tweet de Nassim Taleb:
— Nassim Nicholas Taleb (@nntaleb) November 19, 2019
Não devíamos esperar ou dar poder a um estado composto por gente de carne e osso tão falível como cada um de nós individualmente. Gostamos de dar mais poder quando lá estão os da nossa cor, os Obamas desta vida, depois segue-se um Trump e ...
Devíamos ter mecanismos sadios que impedissem por si só os abusos individuais, as Tragédias dos Comuns que resultam da ganância individual suportada no poder dos amigos, ou parceiros no estado.
Independentemente deste editorial, nos últimos quinze dias o Público tem publicado artigos onde por um lado se canta a canção da falta de água, das alterações climáticas, da ... para noutros a seguir se apresentarem contas e mais contas sobre mais áreas a regar, sobre a monocultura intensiva (os Amorins até sobreiros querem regar), sobre os químicos que estão a envenenar o Alentejo, sobre a desgraça da apanha nocturna, sobre a destruição de charcas, de sítios arqueológicos, tudo em nome do eficientismo.
Quem acompanha este blogue sabe que este libertário em construção nunca foi à bola com a socialista Cristas, mas há uma frase dela que retenho: "Cristas quer colar a Portugal o rótulo de país da "joalharia da agricultura"".
Um país pequeno nunca pode competir pela quantidade (preço baixo) de forma sustentável. Um país pequeno tem de competir com uma marca que signifique valor. A marca Portugal valia algo na agricultura, mas está a ser abastardada e todos vão perder. Um país pequeno tem de fugir de estratégias cancerosas.
Ia jurar que já o tinha escrito por aqui no blogue, mas a verdade é que não encontro. Neste postal refiro um livro que o amigo Serafim me ofereceu. Já lhe disse que não me devia ter oferecido o livro e eu não o devia ter lido. O livro ilustra como a floresta é uma área da economia onde os DDT (sim, os donos-disto-tudo) continuam a mandar. É impressionante o carrocel de gente das celuloses para o governo, do governo para as celuloses, dos serviços do estado para as celuloses. Basta ler o que foi publicado ontem sobre os milhões a distribuir aos accionistas da Navigator e estas pérolas que um cínico apanha:
apoio encapotado às celuloses https://t.co/cyfy7Lm7zc a lata— Carlos P da Cruz (@ccz1) November 21, 2019
Quantos milhões irão para seduzir mais uns trouxas a plantarem eucaliptos, ou para que outros não abandonem a sua cultura?
Alqueva é mundo dos DDT na agricultura, assim como o saque em Odemira.
Não, não comparem estes investidores na agricultura com os meus queridos espalhadores de bosta, esses legam a terra aos descendentes, têm skin-in-the-game, estes quando a terra morrer, quando a água escassear, deitam abaixo o pau da lona e, como gafanhotos que são, vão para outro país recomeçar o saque.