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quarta-feira, outubro 15, 2025

Tratados como Figos (parte III)

Parte I, parte II e parte (II e 1/2) e parte (II e 3/4).

O Japão deixou há muito de competir em têxteis de baixo custo. A produção massificada emigrou para a China, para o Sudeste Asiático e para o Bangladesh. Ainda assim, a Matsukawa Rapyran — fundada há mais de um século — não apenas sobreviveu: modernizou-se, especializou-se e hoje paga salários dignos porque vende exactamente onde o preço deixa de ser o único critério. Fê-lo através de uma combinação de nicho, integração e reputação. Em vez de disputar a t-shirt de dois euros, orientou-se para tecidos e artigos de maior valor acrescentado, com qualidade de tecelagem elevada, desenho cuidado e identidade cultural “made in Japan”. 

Hoje, o coração do negócio é B2B e técnico: a empresa tece labels/etiquetas de marca em gamas que vão da alta à ultra-alta densidade, capazes de reproduzir logótipos e padrões finos com precisão. Acrescenta “inteligência” ao tecido com soluções funcionais como QR codes tecidos (patente JP-5038915), numeração/serialização e códigos de barras, bem como fios com propriedades desodorizantes (M-Clear) e 100% reciclados (PET) para aplicações em gestão de activos, uniformes e indústrias que exigem rastreabilidade e sustentabilidade.

Para sustentar a reputação e ampliar a marca junto do consumidor, a empresa desenvolveu uma linha B2C sob a insígnia Rapyarn Ribbon: ribbons de várias larguras e padrões e pequenos artigos feitos com ribbon — carteiras/bolsas, camera straps, fukusa e outros acessórios — vendidos a preços que reflectem um posicionamento artesanal-premium. Outras lojas próprias e parcerias (ORI-EN, Fu-Wappen, Minne) oferecem máscaras, omamori, emblemas e chaveiros, reforçando a ligação entre a tradição local de Fukui/Echizen e um design contemporâneo que o público reconhece.

É assim que a Matsukawa Rapyran permanece competitiva: não porque concorra com o Bangladesh, mas porque ocupa um espaço próprio onde qualidade, design, funcionalidade e tradição permitem praticar preços compatíveis com salários competitivos. A integração vertical reduz desperdícios e falhas; a automação sustenta produtividade; a diferenciação técnica — densidades elevadas, QR tecido, fios funcionais e reciclados — resolve problemas concretos de clientes empresariais; e a narrativa “Echizen-ori / feito em Fukui” dá coesão à marca. Resultado: uma empresa centenária que soube evoluir do volume para o valor, do barato para o criterioso — e que prova, com factos, que herança cultural e inovação podem caminhar lado a lado com lucro.

Tradução de trechos a partir da página da Matsukawa Rapyran na internet.



quarta-feira, outubro 08, 2025

Tratados como Figos (Parte II e 3/4)

Parte I, parte II e parte (II e 1/2).

Eu bem quero avançar para a parte III, para descrever a composição em concreto da oferta da Matsukawa Rapyarn. Contudo, outras prioridades impõem-se.

O Jornal de Negócios publicou "Espanhola Nextil prestes a fechar compra de três têxteis em Portugal" o que despertou a minha curiosidade. Uma empresa têxtil espanhola quer comprar empresas em Portugal? Qual o segredo para o seu sucesso? Sobretudo agora que tantas empresas fecham.

A empresa tem origem em 1954, quando a Dogi abriu a primeira fábrica em El Masnou (Barcelona). Ao longo dos anos operou como Dogi International Fabrics, S.A., especializada no fabrico de tecidos elásticos para lingerie, swimwear e sportswear. Em meados da década de 2010, a marca alterou o nome para Nextil / Nueva Expresión Textil como parte de uma reestruturação estratégica e reorientação do negócio. 

Em 2009, a Dogi entrou em suspensão de pagamentos na sua parte espanhola, com dívidas substanciais, o que forçou uma recapitalização para garantir a continuidade da operação. 

A partir dessa crise, a empresa passou por uma profunda reestruturação:

  • Passou por uma reorganização dos negócios, focando-se nas unidades mais rentáveis e desinvestindo ou fechando as menos eficientes.
  • Transferiu a sua sede da Catalunha para Madrid em 2017, num contexto de instabilidade política catalã, alegando também optimização operacional e relações com investidores.
  • Unificou produção espanhola das unidades Dogi e Ritex em El Masnou, no novo centro que opera como NEFE (Nextil Elastic Fabrics Europe).
  • Em tempos mais recentes, sob nova liderança (César Revenga desde 2023), a Nextil conseguiu reverter prejuízos, reduzir dívidas e retomar a rentabilidade
  • A empresa está a expandir-se internacionalmente, com operações na Guatemala e crescente presença em Portugal para produção de vestuário de luxo.

Qual o modelo de negócio e posicionamento?

  • A Nextil opera hoje de modo verticalizado: desde o design do tecido até à confecção da peça.

  • Tem várias divisões de produto: luxo, desporto, banho, íntima e médica. Ou seja, nichos.

  • Nos seus objectivos estratégicos está a aposta na sustentabilidade e inovação, certificações como OEKO-TEX, GOTS, entre outras, e desenvolvimento de tinturaria sustentável (Greendyes) como diferencial.

Desafios actuais e oportunidades

  • A Nextil, como muitos grupos têxteis europeus, enfrenta forte concorrência global, especialmente da Ásia, onde os custos de produção podem ser muito mais baixos. Para contrabalançar, ela aposta em nichos de valor acrescentado, luxo e têxteis técnicos

  • Recentemente a empresa alcançou lucro após anos de perdas, o que indica que a reestruturação está a dar resultados.

  • Ambiciona atingir mais de 100 milhões de euros de facturação até 2026, diversificando produção fora de Espanha e focando-se em mercados estratégicos como os EUA.

  • Um ponto crítico será manter competitividade frente à pressão de custo, sem perder o foco em inovação, sustentabilidade e diferenciação.

A metamorfose da Dogi em Nextil mostra o dilema de muitas empresas têxteis europeias: a concorrência asiática empurra para baixo os preços, e a única saída viável é subir na cadeia de valor, apostando em inovação, sustentabilidade e especialização. É um percurso arriscado, cheio de contradições, mas inevitável se a indústria quiser sobreviver fora da lógica da simples competição por custo.

BTW, até sou capaz de imaginar uma ou duas destas empresas que a Nextil quer comprar.

Na parte III vamos ver o que faz a Matsukawa Rapyarn em concreto.

Na parte IV vamos fazer a comparação entre Portugal e o Japão.

segunda-feira, outubro 06, 2025

Tratados como Figos (parte II e meio)



Parte I e parte II.

No caderno de Economia do semanário Expresso deste fim de semana li o artigo ""A bola de neve ainda só está a começar a rolar.""

O artigo começa com uma extensa lista de encerramentos e falências no sector têxtil:

"A par da falência de pequenas texteis, como a Leansofi, Protagonist Cotton, Quimera, Linolito, Cleverfil, Summer Gather, Rosa Maria Batista Confeções e RS Bobinagem de Fios Têxteis (muitas delas com menos de 50 trabalhadores), grandes grupos, como a Polopiqué e a J. F. Almeida, enfrentam reestruturações. A Confiberica fechou na semana passada, a Têxtil André Amaral e a Storia di Moda K acabam de apresentar pedidos de PER, a Bedex foi alvo de um pedido de despejo. Na StampDyeing, na Pamtext e na Passos os trabalhadores encontraram as portas fechadas no regresso de férias. No Parlamento, o PCP denunciou pagamentos feitos com atraso na Tearfil e na Somelos e, no retalho, a Classe e Distinção (Mike Davis) entrou em PER com créditos de €17,5 milhões. Em 2025, segundo um levantamento feito pelo Expresso, já foram publicadas no portal Citius oito listas de credores da fileira têxtil, com montantes por pagar que ascendem a €190 milhões (dois desses processos são PER iniciados já em dezembro de 2024)."

Depois há três trechos que gostava de comentar aqui. Primeiro:

"As exportações têxteis ainda estão equilibradas, com uma queda de apenas 0,1% nos primeiros sete meses do ano, para €3,58 mil milhões, mas este "é um movimento em crescendo no Norte do país"."

Este trecho faz-me recuar a um gráfico que fiz em 2013 e que voltei a comentar em 2021:


 Então, comparava as exportações de 2012 com as de 2006. O valor era o mesmo, mas enquanto que em 2006 existiam 8000 empresas, em 2012 já só existiam 5000 empresas. E a evolução continua, o que é bom, significa mais produtividade: menos empresas e menos trabalhadores exportam o mesmo. Não porque cada empresa ou trabalhador produza mais unidades, mas porque produz unidades com maior valor acrescentado. Entretanto, aqui temos dados da evolução recente, não dos exportadores, mas do sector do ITV como um todo. Confesso que não estava a par do aumento do número de trabalhadores no sector entre 2013 e 2028. 

Segundo:

"Apesar de o número de desempregados estar a engordar, "as dificuldades em contratar continuam e há muitos empresários a queixar-se disso mesmo", comenta César Araújo, presidente da ANIVEC"

Estima-se que desde o Verão já se tenham perdido mais de mil postos de trabalho. E, no entanto, os empresários continuam a dizer que não conseguem contratar mão de obra. Como explicar esta contradição?

A resposta não é moral — não é porque os patrões sejam “sovinas”. A raiz é estrutural: o negócio não gera margens suficientes para pagar salários que garantam uma vida digna. O sector compete no espaço da comoditização, onde os preços são ditados por cadeias globais de fast fashion, e onde países como Marrocos, Turquia ou Bangladesh conseguem sempre oferecer custos mais baixos. Na documentação oficial das associações do sector não é isso que aparece. Por exemplo, no documento que linko acima pode ler-se "estratégia assente na inovação, qualidade e internacionalização, competindo através do seu valor e diferenciação." No entanto, vejam o dicurso do presidente da ANIVEC no terceiro trecho que cito mais abaixo

O dilema é antigo e está bem descrito na metáfora dos Flying Geese: os países mais avançados abandonam gradualmente os sectores de baixo valor acrescentado, que são ocupados por outros países em fase de desenvolvimento. O Japão já passou por isso: nos anos 1950 era campeão mundial do têxtil; hoje, restam apenas nichos altamente especializados e inovadores.

Em Portugal, repetimos o padrão:

As empresas que não conseguem subir na escala de valor fecham.

As que sobrevivem são mais pequenas, mais tecnológicas, mais diferenciadas, mas empregam muito menos gente. Estatisticamente, a produtividade média sobe, mas à custa de milhares de empregos perdidos.

Por isso, quando os empresários dizem que não conseguem contratar, o que querem dizer é que não conseguem pagar o suficiente para atrair trabalhadores num mercado onde existem alternativas. Tal como escrevi: “Por que é que um motorista de autocarro em Oslo ganha muito mais do que no Porto a fazer exactamente o mesmo? Porque, se não ganhasse mais, ninguém quereria ser motorista”

Não podemos ter ao mesmo tempo preços de Marrocos e salários de Alemanha. A única saída possível é anichar, diferenciar, subir na escala de valor. Sem isso, o sector continuará a definhar, como um fóssil vivo — resistente, mas cada vez mais deslocado numa sociedade que exige produtividade e rendibilidade.

Terceiro:

"comenta César Araújo, presidente da ANIVEC, certo de que, mais do que as tarifas de Donald Trump sobre a importação de bens, o quadro atual reflete a abertura da Europa à concorrência desleal de produtos asiáticos."

Recordo o que escrevi aqui em 2010 relativamente ao director-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal: "Arrepiante"

Na parte III vamos ver o que faz a Matsukawa Rapyarn em concreto.

Na parte IV vamos fazer a comparação entre Portugal e o Japão.

sexta-feira, outubro 03, 2025

Tratados como Figos (parte II)

Parte I.

Como é que uma empresa têxtil consegue operar no Japão? Olhemos para a imagem do Flying Geese:


O Japão é o país A. Em 1950 era o maior exportador mundial de têxteis.

Nas décadas de 1950 e 1960, o Japão tornou-se o maior exportador mundial de têxteis, empregando mais de 1,3 milhão de trabalhadores em dezenas de milhares de fábricas. A proposta de valor era simples e directa: produção em massa a baixo custo, assente no algodão, na seda e, cada vez mais, em fibras sintéticas como o nylon e o poliéster. O grande objectivo era exportar para os Estados Unidos e para a Europa, ao mesmo tempo que o consumo interno aumentava com a prosperidade do pós-guerra.

Nos anos 1970 e 1980, o sector entrou em fase de maturidade, com cerca de 60 mil empresas e 1,1 milhão de trabalhadores. Perante a concorrência crescente da Coreia do Sul e de Taiwan, o Japão reposicionou-se: deixou de apostar apenas no volume e procurou competir pela qualidade e pela diferenciação. Investiu em fibras químicas e tecidos técnicos, manteve a liderança em inovação, mas começou a sentir o peso das restrições comerciais impostas pelo Ocidente. Uma Nota: O "ataque" às empresas do sector têxtil é feito em duas frentes: a externa com a concorrência de países mais baratos; e a interna com a concorrência de outros sectores para "roubar" trabalhadores. E esse é o significado da evolução horizontal para cada país no esquema dos Flying Geese. A concorrência internacional não permite a um sector acompanhar os outros nos salários porque não consegue aumentos de produtividade que os sustentem. O sector encolhe porque perde mercado com a concorrência internacional e porque perde trabalhadores.

A partir da década de 1990, com o colapso da bolha económica e a aceleração da globalização, o sector entrou em crise profunda. O número de trabalhadores caiu para 600 mil em 1999 e para menos de 250 mil em 2015. A maior parte da produção em massa foi deslocalizada para outros países da Ásia, e o Japão passou a ser importador líquido de vestuário. Para sobreviver, as empresas que resistiram tiveram de apostar em produtos de alto valor acrescentado: fibras especiais, tecidos antirugas, têxteis técnicos para o automóvel e para a medicina, bem como nichos da moda de luxo.

Hoje, o sector representa cerca de 3,5 mil milhões de ienes (dados de 2015), com cerca de 15 mil empresas e aproximadamente 250 mil trabalhadores, (segundo o Ministério da Economia, Comércio e Indústria do Japão existem cerca de 9,4 mil empresas fabricantes de vestuário e cerca de 5,2 mil fabricantes de tecidos e fibras). A proposta de valor assenta na inovação tecnológica, mas também na tradição e na sustentabilidade. O Japão é uma referência em fibras de alta performance — poliéster avançado, fibra de carbono, nanofibras, têxteis inteligentes — e, ao mesmo tempo, valoriza a sua herança cultural, com o renascimento de tecidos artesanais e a reinvenção do quimono como peça de design.

Em poucas décadas, o Japão passou de campeão da produção em massa nos anos 1950 para especialista em inovação e tradição no século XXI. Perdeu escala, mas manteve relevância mundial graças à tecnologia, à qualidade e à diferenciação.

Em linha com o que escrevo aqui há anos: anichar, anichar, anichar.

Se recordarmos o que escrevi recentemente sobre a evolução do têxtil em Portugal, Se unirmos os pontos que imagem aparece?

Na parte III vamos ver o que faz a Matsukawa Rapyarn em concreto.

Na parte IV vamos fazer a comparação entre Portugal e o Japão.

 

terça-feira, setembro 30, 2025

Tratados como Figos (parte I)


No FT de ontem encontrei este artigo, "Why Japan is sprucing up its shabby offices."

Gosto de ler o que encontro sobre a economia japonesa por causa da demografia. Gosto de perceber como um país com um desafio demográfico, todos os anos o mercado de trabalho encolhe 600 mil trabalhadores, o ultrapassa.

Houve um tempo em que ingenuamente também eu pensava que seguiríamos por essa via. É uma via que valoriza os trabalhadores. Tudo o que é escasso é valioso. Ao longo dos anos percebi que os trabalhadores em Portugal nunca serão tratados como Figos (Comecei a usar a metáfora do Figo ainda antes do Ronaldo aparecer, são muitos anos). A importação de paletes de mão de obra barata resolve o problema. Esta solução tem duas consequências, ... aliás, três consequências.

Primeiro, os trabalhadores nunca serão tratados como Figos e o seu poder negocial baixará à medida que a importação progride. BTW, segundo o artigo, no Japão:
"Matsukawa Rapyarn is one of thousands of Japanese companies pouring money into office makeovers, as the battle to attract workers becomes fiercer than ever.
...
Employees' power to choose where they work is forcing companies to fight to attract them, propelling once-unthinkable shifts in management behaviour."

Segundo, como as empresas não têm de competir a sério por trabalhadores, sentem menos um stress para subir na escala de valor, sobretudo se trabalham para o mercado nacional.

Terceiro, sem subida na escala de valor as empresas não podem pagar bons salários a quem tem potencial, e isso contribui para mandar essas pessoas para a emigração.

O mesmo FT trazia também um outro artigo sobre Espanha, "Spain has become Europe's standout economy." 
O artigo retrata a Espanha como a economia de maior destaque da Europa, crescendo a uma média anual de 3% desde 2024, bem acima da média da zona euro (cerca de 1%). A recuperação do turismo, os fundos europeus e o investimento em energias renováveis têm ajudado, mas o principal motor tem sido a imigração: desde 2022, entraram cerca de 600 mil imigrantes por ano, maioritariamente em idade activa, o que impulsionou o emprego e o consumo.
No entanto, o artigo alerta que este crescimento precisa de ser acompanhado por ganhos de produtividade, caso contrário os níveis de vida podem estagnar. A maioria dos migrantes tem ocupado empregos de baixos salários em setores como hotelaria e construção.
"For all its success so far, the immigrant-led growth boom must be managed carefully. First, although Spain's real GDP, on a purchasing power parity basis, has risen by about 6.8 per cent since 2019, in per capita terms it has grown by just 3.1 per cent. Migrants have mainly filled gaps in lower valueadded sectors, including hospitality and construction. To ensure living standards also grow, Spain's languid productivity growth needs to improve too."
Espanha e Portugal nisto são como irmãos gémeos. Não há subida na escala de valor, não aumenta a produtividade.

Voltemos ao artigo "Why Japan is sprucing up its shabby offices." O artigo descreve como a empresa têxtil japonesa Matsukawa Rapyran (com mais de 100 anos de história) sobreviveu à crise de atractividade no mercado de trabalho através da renovação do espaço físico e da modernização das condições oferecidas aos trabalhadores.
A remodelação das instalações (mobiliário moderno, cantina elegante, zonas de descanso) não só melhorou a imagem da empresa, como teve um impacte directo no recrutamento e retenção de pessoal, ajudando a competir num contexto de forte escassez de mão-de-obra no Japão, agravada pela demografia e pela pandemia.
O caso é apresentado como exemplo de uma tendência mais ampla: as empresas japonesas estão a investir em espaços de trabalho mais atractivos (e também em benefícios como subsídios de habitação, redução de horas de trabalho, empréstimos a estudantes) para enfrentar a falta de trabalhadores e garantir sobrevivência e crescimento.

Sabem o que me despertou mais curiosidade neste artigo? O terceiro parágrafo:
"The encounter prompted the 66-year old to invest Y460mn ($3.1mn) in anew office for the company's 95 employees. It was a huge sum for the family-owned Matsukawa Rapyarn. But in the most labour-constrained prefecture of the world's most aged country, this was no run-of-the-mill renovation. The sleek wooden furniture, café canteen and relaxation areas represented a decisive move in a fight to secure the 100-year old textile manufacturer's survival."

Uma empresa japonesa ainda a operar no sector têxtil. Vale a pena investigar.

Continua.

segunda-feira, setembro 29, 2025

Se unirmos os pontos que imagem aparece?

No JN de ontem o artigo "Confiberica fecha e manda mais 160 para o desemprego no Ave." Depois, o subtítulo que me intriga:
"Empresa que trabalha para o grupo da Zara tem uma filial em Marrocos que vai continuar a laborar."

E ainda mais alguns sublinhados:

"As associações do setor querem medidas para enfrentar a falta de encomendas.

...

Segundo Francisco Vieira, a Confiberica trabalhava para a Inditex (detentora de marcas como a Zara, Pull & Bear, Massimo Dutti, Bershka, entre outras), e tinha 160 trabalhadores.

...

Segundo o sindicato, esta têxtil tem também uma unidade em Marrocos a produzir igualmente para o grupo Inditex, que não vai encerrar. 

...

As associações do setor queixam-se de falta de encomendas e pedem medidas de apoio: lay-off simplificado, apoios à tesouraria, e maior flexibilidade para reestruturar as empresas."

Comecemos pelo fim "As associações do setor queixam-se de falta de encomendas" ... não é absurdo? Queixam-se a quem? Ao governo? Se não têm clientes a pedir-lhes trabalho, a culpa é de quem? Quem tem a missão de ganhar clientes? O governo? Os trabalhadores?

Ou seja, é uma forma de pressionar o governo para obter protecção pública face a um problema de mercado. Os contribuintes que paguem.

Cliente Inditex e unidade em Marrocos. Aquele subtítulo... estavam à espera que fechasse a unidade em Marrocos? Come on. São os Flying Geese ao vivo e a cores a funcionar. 

No artigo ainda pode ler-se:

"As situações de empresas têxteis com problemas financeiros, após o verão, têm sido recorrentes: Polopiqué, Stampdyeing (grupo Mabera - Coelima), J.F. Almeida."

Se juntarmos os pontos:


Se nos abstraímos dos casos particulares e subirmos na escala de abstracção para ver as forças de fundo, vemos o estertor (já há muito anunciado aqui no blogue) de um modelo de negócio. 

Ainda recentemente escrevi sobre o futuro de quem trabalha no fast-fashion:

"Proibição do fast/fashion como modelo dominante: pressão regulatória contra ciclos curtos de produção/consumo."

Não adianta pôr sal na ferida. Sim, eu sei, costuma resultar, os tótós do governo de turno libertam uns milhões cobradas aos impostos sobre os saxões, e as empresas comatosas, verdadeiras zombies, em vez de mudar de vida, ou fecharem, sobrevivem até à próxima injecção de capital à custa dos impostos.

sábado, setembro 27, 2025

Calçado e têxtil - uma directiva transformacional!!!



Eu sei que é fim de semana e que muita gente ao fim de semana desliga, mas o mundo continua a girar.

Amigos do calçado e do têxtil, já olharam para a Directiva (UE) 2025/1892 do Parlamento Europeu e do Conselho de 10 de setembro de 2025 que altera a Diretiva 2008/98/CE relativa aos resíduos? 

Acreditem, esta directiva para o têxtil e para o calçado é transformacional (vai mudar modelos de negócio, produtos e custos).

Por exemplo:
  • Responsabilidade alargada do produtor obrigatória: terá de financiar recolha, triagem, reutilização e reciclagem dos produtos colocados no mercado.
"(22) Em conformidade com o princípio do poluidor-pagador, referido no artigo 191.°, n.° 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), é essencial que os produtores que disponibilizem pela primeira vez no mercado no território de um Estado-Membro determinados produtos têxteis, relacionados com os têxteis e de calçado assumam a responsabilidade pela gestão dos mesmos na fase de fim de vida
...
(34) Os produtores deverão ser responsáveis pela criação de sistemas de recolha de todos os produtos têxteis, relacionados com os têxteis e de calçado usados e em fase de resíduo, bem como pela garantia de que os mesmos são posteriormente sujeitos a triagem para reutilização, preparação para reutilização e reciclagem," 

  • Taxas moduladas: pagam mais se os produtos não forem concebidos para circularidade; pagam menos se incluírem fibras recicladas, forem reparáveis e duráveis. 
"(39) Além do mais, a modulação de taxas de responsabilidade alargada do produtor é um instrumento económico eficaz para incentivar uma conceção de têxteis mais sustentável que, por seu lado, conduzirá a uma melhor conceção, que esteja em consonância com os princípios da circularidade. A fim de proporcionar um forte incentivo à conceção ecológica, tendo simultaneamente em conta os objetivos do mercado interno e a composição do setor têxtil, onde predominam as PME, é necessário harmonizar os critérios para a modulação das taxas de responsabilidade alargada do produtor com base nos parâmetros de conceção ecológica mais pertinentes,"

  • Proibição do fast/fashion como modelo dominante: pressão regulatória contra ciclos curtos de produção/consumo. 
"(40) As práticas industriais e comerciais, como a moda rápida e ultrarrápida, influenciam a duração da utilização do produto e a probabilidade de um produto se tornar um resíduo devido a aspetos não necessariamente relacionados com a sua conceção, e baseiam-se frequentemente na segmentação do mercado. Tais práticas poderão fazer com que o produto seja descartado prematuramente, antes mesmo de chegar ao fim da sua vida útil potencial, o que resulta num consumo excessivo de produtos têxteis e, consequentemente, numa produção excessiva de têxteis em fase de resíduo. A fim de identificar melhor essas práticas e permitir a ecomodulação das taxas de responsabilidade alargada do produtor, os Estados-Membros poderão considerar critérios como a largura da gama de produtos, entendida como o número de referências de produtos oferecidas para venda por um produtor, com limiares definidos por segmento de mercado, a frequência das ofertas, entendida como o número de referências de produtos por segmento de mercado oferecido para venda por um produtor num determinado período, ou os incentivos à reparação, entendidos como a probabilidade de o produto ser reparado com base no seu rácio de custos de reparação ou na prestação de um serviço de reparação pelo produtor."

  • Necessidade de redesenhar processos: inclusão de fibras recicladas, maior transparência na cadeia de fornecimento.
"(30) Além disso, a atual gestão de têxteis em fase de resíduo é ineficiente em termos de recursos, está desalinhada da hierarquia dos resíduos e conduz a danos ambientais, 
...
A responsabilidade alargada do produtor relativamente a produtos têxteis, relacionados com os têxteis e de calçado tem como finalidade assegurar um elevado nível de proteção do ambiente e da saúde na União, criar uma economia de recolha, triagem, reutilização, preparação para reutilização e reciclagem, em especial a reciclagem de fibras em novas fibras, bem como dar incentivos para que os produtores assegurem que os seus produtos sejam concebidos de acordo com os princípios da circularidade.
...
(31) e o apoio à investigação e ao desenvolvimento para a conceção ecológica de têxteis que não contenham substâncias que suscitam preocupação."
  • Risco para PMEs: encargos administrativos e financeiros elevados, mitigados se se associarem a organizações coletivas de RAP.
"(25) Tais regras deverão ainda ser mais pormenorizadas e harmonizadas para evitar a criação de um mercado fragmentado suscetível de ter um impacto negativo no setor, em especial nas microempresas e nas PME, 
...
(43) Uma vez que as PME compõem 99% do setor têxtil, é conveniente procurar reduzir, tanto quanto possível, os encargos administrativos decorrentes da aplicação de um regime de responsabilidade alargada do produtor"
Sim, eu sei, para muitos o copo está meio vazio e isto vai ser mais custos. A alternativa é abraçar a mudança e ver que oportunidades podemos encontrar ou desenvolver com esta novidade. Por exemplo, a directiva liga as contribuições financeiras à qualidade do design dos produtos: quanto mais alinhados com os princípios da circularidade, menos pagam as empresas. Na prática, isto traduz-se em:
  • Durabilidade: fabricar peças que resistam mais tempo ao uso, evitando descartes prematuros. 
  • Reparabilidade: facilitar a substituição de componentes (fechos, botões, solas, palmilhas) e disponibilizar peças de reposição ou serviços de reparação.
  • Uso de materiais reciclados: integrar fibras recicladas de qualidade, promovendo uma economia de ciclo fechado.
Para as PMEs portuguesas, muitas das quais já têm reputação internacional em qualidade e detalhe, esta exigência pode transformar-se numa vantagem competitiva: reforçar o posicionamento "premium" e diferenciar-se da produção de baixo custo asiática e não só.

Riscos fortes para as fábricas que dependem de ciclos de moda curta (fast fashion ou private label com colecções rápidas), elas vão sentir um choque. A própria directiva penaliza este modelo, associando-o a sobreprodução e desperdício. Quem continuar a apostar em quantidade, baixa durabilidade e colecções aceleradas verá os custos regulatórios disparar e enfrentará barreiras acrescidas na exportação.
Por outro lado, fábricas que se posicionem em nichos de qualidade, reparação, segunda vida e circularidade podem ganhar espaço:
  • Criando linhas de produtos "eco-premium" com selo de sustentabilidade.
  • Firmando parcerias com marcas que valorizam durabilidade e reparabilidade.
  • Explorando novos modelos de negócio (aluguer, retoma, revenda em segunda mão).
Ou seja, a directiva pode ser vista não apenas como um custo adicional, mas como um filtro de mercado: quem estiver preparado para competir pelo valor, pela sustentabilidade e pela inovação terá mais hipóteses de crescer.

Recordo o recente "Anichar, ao vivo e a cores" sobre as reparações.


Ainda acerca da reciclagem têxtil:
Isto já vai demasiado longo, vou escrever um outro postal sobre as oportunidades e riscos relacionados com esta directiva.

terça-feira, setembro 16, 2025

Um OVNI

No livro "Through the Looking-Glass, and What Alice Found There" Lewis Carroll, no Capítulo 2 - "The Garden of Live Flowers",  Alice encontra a Rainha Vermelha (Red Queen).

  • A Rainha pega na mão de Alice e começam a correr lado a lado.
  • Depois de correrem intensamente, Alice percebe que continuam no mesmo lugar.
  • É aí que a Rainha explica a famosa ideia: "Now, here, you see, it takes all the running you can do, to keep in the same place. If you want to get somewhere else, you must run at least twice as fast as that!"

Na biologia, o biólogo Leigh Van Valen (1973) usou a metáfora para formular a Red Queen Hypothesis:

  • As espécies precisam de evoluir continuamente, não para ganhar vantagem, mas simplesmente para sobreviver num ambiente em que todas as outras também evoluem.
  • Exemplo clássico: a corrida evolutiva entre predadores e presas (a gazela corre mais depressa para escapar, o leão precisa correr mais depressa para caçar).

Na economia a "corrida da Red Queen" tornou-se uma metáfora para situações em que o esforço é constante, mas o ganho líquido é nulo — porque todos estão a mover-se ao mesmo tempo.

  • Concorrência internacional: países investem continuamente em inovação só para não perderem quota de mercado.
  • Empresas em mercados maduros: precisam de melhorar produtividade, reduzir custos e lançar novos produtos só para manter a posição.
  • Trabalhadores: têm de se qualificar continuamente apenas para não ficarem para trás.

É uma descrição viva daquilo a que chamamos "correr para ficar no mesmo sítio".

Estão a ver onde isto nos leva ... podia escrever sobre os produtores de uva no Douro, mas vou fixar-me no sector automóvel e no têxtil e calçado.

Primeiro o sector automóvel, em Março passado citei aqui num postal:

"São diferenças "impossíveis de cobrir por via do aumento da produtividade" [Moi ici: Aqui produtividade como aumento de eficiência, como redução de custos, como redução do denominador da produtividade. O que se segue é um exemplo ao vivo e a cores daquilo a que chamo há muito tempo o jogo do gato e do rato.], assume a administração, depois de comparar o salário bruto médio mensal nas suas fábricas nestes países e a respetiva evolução desde 2019. Em Ovar, o valor passou de €808 para €1303, enquanto a Roménia apresenta valores de €464 em 2019 e de €821 em 2025. Na Bulgária, o salário subiu de €361 para €583, em Marrocos saltou dos €284 para os €362, e na Tunísia aumentou dos €163 para os €284. No Egito, onde só há dados do atual exercício, o valor é de €136.""

No Domingo à noite no LinkedIn mão amiga tinha-me enviado isto:


O que é isto senão outro exemplo ao vivo e a cores da teoria dos Flying Geese:

O país A deixa de ser competitivo (e aqui uso a palavra competitividade com toda propriedade) e o grosso da produção [escrever aqui ou têxtil, ou calçado, ou automóvel, ou ...] passa para o país B porque é mais barato. Mas o país A, ao evoluir na horizontal, da esquerda para a direita, ganha produtividade. E produtividade à custa do numerador e não do denominador, ou seja, ganhos muito superiores que ultrapassam as migalhas da melhoria da eficiência, como aprendi com Marn e Rosiello.

Começou na Alemanha (A), passou para Portugal (B) e está a passar para Marrocos et al (C). Recordar os relatos em primeira mão de Abril passado. Só não acontece mais depressa por causa do, peço desculpa pela palavra que vou usar, mas é para impressionar com a caricatura, suborno que os governos, com benesses fiscais e fundos comunitários, fazem para que a Autoeuropa atrase a decisão de sair. 

Passemos ao calçado e têxtil.

Ontem na capa do JN, "Calçado e têxtil despedem mil trabalhadores numa semana"

BTW, o calçado tem tudo a ganhar em afastar-se da colagem que lhe querem fazer ao têxtil. O têxtil é muito Caím, o problema nunca é dele, é sempre dos outros, dos chineses, dos paquistaneses, dos trabalhadores, dos políticos, em suma dos maus.

BTW, com um título destes "Calçado e têxtil despedem mil trabalhadores numa semana" como conseguem seduzir jovens atentos para o sector? Lembram-se do que escrevi aqui a propósito de:

"A industria é forte, mas precisamos de começar pela educação e formação. E fundamental tornar este setor atrativo para as camadas mais jovens...

"Portugal tem um problema crónico de recursos humanos. A pirâmide etária está invertida e sem jovens a renovação torna-se difícil."

"O grande problema é não conseguir que os funcionários atuais, cada vez mais próximos da reforma, tenham seguidores na empresa, porque os admitidos não estão disponíveis para aprender o ofício."

Também podemos recuar a Novembro de 2016 e a "É verdade, não é impunemente que se diz mal".

Não tenho analisado aqui os números mensais das exportações, mas tive curiosidade em ver como vão as exportações do têxtil e do calçado (primeiros sete meses de 2025 versus primeiros sete meses de 2024) e fiquei admirado. As exportações em 2025 são cerca de 99,8% das de 2024. Ou seja, não foi o mercado externo que colapsou. O problema estará nas margens: os custos sobem (energia, matérias-primas, salários), mas as empresas não conseguem aumentar preços. Resultado: o sistema implode por dentro.

Recordar de Fevereiro passado:

"Portugal exportou 68 milhões de pares de calçado para 170 países em 2024, um crescimento de 3,9% em volume, mas uma quebra de 5,4% em valor face a 2023, para 1.724 milhões de euros, segundo o INE."

Recordar de Abril passado, "Competitivos, mas frágeis: o custo invisível de competir sem diferenciação"

Um OVNI, foi o que chamei a um candidato autárquico que conheço pessoalmente e que vi na RTP com um discurso diferente de todos os outros candidatos.

Conhece mais alguém que fale de produtividade como aqui neste blogue? Pois, outro OVNI... só ganho inimigos.

quarta-feira, maio 07, 2025

É preciso passar da reacção à transformação (parte III)

Parte I e parte II.

No JN do passado dia 4 de Maio li o artigo "O futuro do têxtil faz-se com robes de aquecimento inteligente":

"Um robe com aquecimento inteligente, equipamentos de proteção individual que medem a temperatura corporal dos trabalhadores e um computador onde a inteligência artifícial permite detetar rasgões nos tecidos.

...

"Estamos a trabalhar em quatro temáticas tecnológicas: a robotização e a automação, a rastreabilidade e a otimização do processo produtivo, os têxteis inteligentes e o produto digital"

...

Numa altura em que são noticiadas dificuldades das empresas têxteis e o consequente fecho de fábricas, Adriana Cunha sublinha haver um "claro atraso" do setor face a outro tipo de indústrias. "O custo inicial de implementação [das tecnologias e dos equipamentos] é um bocadinho grande, mas as empresas estão hoje mais recetivas e percebem a necessidade do investimento", conclui."

Recordo, por exemplo, a série "é meter código nisso".

O título usa o exemplo do robe como metáfora de transformação. Mostra que a inovação e a tecnologia estão a tornar-se o novo "tecido" da indústria têxtil. O futuro do sector será feito de inteligência embutida, sensores, rastreabilidade, conectividade digital e sustentabilidade.

A indústria têxtil que quiser sobreviver e crescer não pode continuar a vender apenas "tecidos". Tem de criar valor com soluções tecnológicas integradas, adaptadas às novas exigências dos mercados — da segurança industrial à personalização do produto, da rastreabilidade ao conforto inteligente.

Ler que o futuro do têxtil passa por "meter código nisso" é muito positivo. É sinal de que a inovação está a infiltrar-se no tecido do sector. Mas há uma armadilha perigosa neste caminho, e muitas empresas caem nela.

Acreditar que mudar de produto é suficiente. Não é!

Subir na cadeia de valor implica muito mais do que incorporar tecnologia nos produtos. Exige mudar de modelo de negócio. E essa transição é tudo menos automática.

É comum ver empresas desenvolverem produtos sofisticados, com sensores, rastreabilidade, software, integração digital… e depois tentarem vendê-los com os mesmos comerciais, pelos mesmos canais, com o mesmo discurso de catálogo, a clientes que não sabem o que fazer com aquilo.

O resultado? Frustração, armazéns cheios, regressar ao “tecido base”.

Subir na escala de valor exige:

  • Comerciais que saibam vender soluções, não metros de tecido.
  • Canais que cheguem aos novos decisores — talvez um director de inovação ou um gestor de compras de tecnologia, e não o tradicional comprador têxtil.
  • Comunicação que fale de problemas resolvidos, não apenas de características técnicas.
  • Parcerias com integradores, empresas de software, sectores-alvo.
  • E, sobretudo, uma visão clara de que tipo de valor se está agora a vender.

A transição para soluções integradas não falha por falta de boas ideias. Falha porque não se prepara o resto da organização para vender, entregar e sustentar esse novo valor.

Been there, done that. Recordar este exemplo.

sexta-feira, fevereiro 28, 2025

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?


Mão amiga fez-me chegar às mãos recorte do jornal "Barcelos Popular" com o artigo "Rombo no sector têxtil faz exportações reduzirem 12% em Barcelos" onde basicamente se repete o comunicado da Associação Comercial e Industrial de Barcelos (ACIB).

Recordo os temas:
Com base no conteúdo das páginas 2 e 3 do Barcelos Popular, fica evidente que a ACIB enfatiza a necessidade de intervenção pública para sustentar um sector têxtil em declínio. Enquanto a narrativa enaltece a região como um motor de empreendedorismo e capacidade industrial, paradoxalmente, reivindica subsídios para manter empresas cuja produtividade e competitividade são questionáveis.

A questão central reside na incoerência entre o discurso e a acção: defende-se o aumento da produtividade e da inovação, mas, simultaneamente, solicita-se financiamento público para sustentar empresas que, por razões estruturais ou de modelo de negócio ultrapassado, não conseguem manter a sua viabilidade. No contexto de uma União Europeia que privilegia a sustentabilidade económica e boas condições de vida, insistir na manutenção de um sector pouco competitivo à custa dos contribuintes parece ser uma estratégia míope.

Resta saber se a associação tem uma visão de futuro que vá além da dependência do Estado ou se continuará a perpetuar um ciclo de subsidiação sem uma estratégia real de adaptação e modernização. O locus de controlo está, claramente, no exterior, mas é crucial que se invista em soluções de longo prazo em vez de insistir numa lógica de curto prazo que já demonstrou falhas.

A forte dependência de subsídios e apoios públicos pode ter implicações sérias na produtividade e competitividade de longo prazo da economia de Barcelos. Se as empresas locais se habituarem a recorrer a ajudas externas sempre que enfrentam dificuldades, corre-se o risco de enfraquecer os incentivos à eficiência e à inovação. Uma economia que sobrevive à base de subsídios pode cair na armadilha de adiar ajustes necessários, criando empresas menos produtivas ou "zombies" mantidas artificialmente. 

No caso em análise, a ACIB insiste que as "empresas precisam de apoios, infraestruturas e acções colectivas bem executadas" para enfrentar a crise. Sem dúvida, infraestruturas melhores e colaboração podem aumentar a competitividade (por exemplo, melhor logística e cooperação sectorial). No entanto, se os apoios financeiros servirem apenas para cobrir prejuízos ou prolongar a vida de modelos de negócio ultrapassados, a competitividade e produtividade estrutural da região tende a estagnar ou deteriorar-se. É duro, mas aquele título de há dias, "It's no longer about how you do it; it's about what you do," mostra como é difícil ou quase impossível que os apoios pedidos ajudem a resolver a situação.

Quem tem coragem para ter esta conversa olhos nos olhos?

Ontem de manhã vi este tweet na mouche:

A Teoria do Cavalo Morto é uma metáfora que se refere ao acto de continuar a investir tempo, esforço ou recursos em algo que claramente já falhou ou não tem mais hipóteses de sucesso. A expressão vem do ditado:

"When you discover that you are riding a dead horse, the best strategy is to dismount."

Ou seja, se um cavalo está morto, não adianta continuar a montá-lo – o mais lógico é aceitar a realidade e seguir em frente. No contexto empresarial, a metáfora é usada para descrever situações onde empresas, governos ou pessoas insistem em estratégias, projectos ou modelos de negócios falidos em vez de mudarem de abordagem.

sábado, janeiro 25, 2025

Parece que alguém dormiu

Recordar acerca da falta de quem recicle têxteis:

Recordar o que está a acontecer ao emprego/desemprego no sector têxtil e vestuário.

E considerar "Estonia to build largest textile recycling facility in Baltics"

Parece que alguém dormiu ao volante enquanto a Estónia pisava no acelerador, não é? Enquanto por cá estamos a discutir como vamos lidar com o tsunami de resíduos têxteis que mal conseguimos recolher, quanto mais processar, os estónios já estão a assinar contratos internacionais e a distribuir tarefas em três fábricas integradas. E, claro, tudo com uma boa fatia do bolo financeiro da UE.

Enquanto as nossas empresas de reciclagem têxtil se debatem com a qualidade duvidosa da "fast fashion" e a ausência de financiamento sustentável, os estónios montam uma operação que vai desde o reaproveitamento de materiais de alta qualidade até à criação de tábuas de construção com fibras sintéticas e plástico reciclado. Parece um sonho logístico. E por cá? Bem, por cá continuamos a perguntar: "De onde virá o dinheiro para os festivais e o fogo de artifício?"

Se o objectivo era aproveitar as metas climáticas da UE para impulsionar a economia local e ao mesmo tempo resolver problemas ambientais, a Estónia deu uma excelente lição.

quinta-feira, outubro 03, 2024

De liana em liana

A vida empresarial é este saltar de liana em liana sem pôr os pés no chão. Quem acredita que a liana actual (estratégia) é eterna ou morre, ou pede um apoio, ou uma protecçãozinha ao papá-estado.

Primeiro algo para contextualizar. Uma citação escrita aqui em 2007:

"What was the best strategy in the end? What Lindgren found was that this is a nonsensical question. In an evolutionary system such as Lindgren’s model, there is no single winner, no optimal, no best strategy. Rather, anyone who is alive at a particular point in time, is in effect a winner, because everyone else is dead. To be alive at all, an agent must have a strategy with something going for it, some way of making a living, defending against competitors, and dealing with the vagaries of its environment.

Likewise, we cannot say any single strategy in the Prisioner’s Dilemma ecology was a winner. Lindgren’s model showed that once in a while, a particular strategy would rise up, dominate the game for a while, have its day in the sun, and then inevitably be brought down by some innovative competitor. Sometimes, several strategies shared the limelight, battling for “market share” control of the game board, and then an outsider would come in and bring them all down. During other periods, two strategies working as a symbiotic pair would rise up together – but then if one got into trouble, both collapsed.

We discovered that there is no one best strategy; rather, the evolutionary process creates an ecosystem of strategies – an ecosystem that changes over time in Schumpeterian gales of creative destruction."

Agora, dois artigos que encontrei na imprensa recentemente.

Primeiro, no último Dinheiro Vivo, o artigo "8beaufort. Hamburg Lonas de velas velhas ganham nova vida em sapatilhas". O que retiro dele?

Clientes-alvo - um nicho de mercado:
  • A 8beaufort. Hamburg actua no nicho do calçado sustentável, com um foco em consumidores conscientes das questões ambientais. A marca diferencia-se ao utilizar velas de barcos recicladas para criar as suas sapatilhas, posicionando-se no segmento premium de calçado ecológico.
Vantagens competitivas:
  • A principal vantagem competitiva é o foco na sustentabilidade, usando velas descartadas e coletes salva-vidas para fabricar produtos únicos, o que ajuda a reduzir o desperdício e a poluição marinha.
  • A fabricação em Portugal reforça o compromisso da marca com a redução da pegada de carbono, já que evita o envio de materiais para a Ásia e cria uma cadeia de produção mais eficiente.
  • O uso de lonas de velas e outros materiais reciclados oferece aos clientes um produto exclusivo, com uma história de impacto ambiental positivo, o que pode atrair consumidores premium dispostos a pagar preços mais altos (159 a 249 euros).
  • A marca procura afirmar-se como uma escolha sofisticada para consumidores que buscam produtos sustentáveis e de alta qualidade.
Riscos:
  • A marca depende da aceitação dos consumidores no mercado de calçado sustentável, que, embora em crescimento, ainda pode ser limitado em comparação com mercados tradicionais de moda.
  • O posicionamento premium pode limitar a base de consumidores, especialmente em tempos de crise económica.
  • A recolha de materiais reciclados, como as velas, pode ser um desafio em termos de consistência no fornecimento. A dificuldade em obter matéria-prima suficiente ou de qualidade pode afectar a produção.
  • O mercado de moda sustentável tem atraído cada vez mais marcas, o que pode aumentar a competitividade e pressionar a 8beaufort.Hamburg a continuar a inovar para se diferenciar.
Acerca dos clientes-alvo recordo o que escrevi relativamente à APICCAPS. Eu aposto nisto:
"O sector do calçado vai encolher, e vai ter de subir ainda mais na escala de valor, ou seja, vai ter de anichar e trabalhar para segmentos de muito maior valor acrescentado, luxo mesmo talvez."

A APICCAPS aposta nisto:

"Para não concorrer pelo preço baixo, as fábricas portuguesas terão de assegurar encomendas de gama alta, moda e luxo, ou gamas específicas como o calçado técnico. Para isso, é fundamental ter capacidade de resposta a grandes encomendas. O que, por sua vez, obriga a repensar a forma como se trabalha." 

Isto faz-me lembrar o Mario Draghi e o seu "Whatever it takes", mas o anónimo da província sou eu. Ninguém quer falar do "encolhimento". 

O outro artigo encontrei no WSJ, "This Garment Maker Is Finding New York Manufacturing Is Back in Style". Pensei nas empresas de vestuário portuguesas que estão a ter um ano negativo a nível de exportações, e nos potenciais concorrentes que estão a conquistar o mercado de proximidade (nearshoring). Claro que quando não se olha para o contexto ... acredita-se que o que nos trouxe até aqui, continuará a levar-nos até ao fim do arco-íris. E não é só quota de mercado, mas também margens e preços.

A Ferrara Manufacturing sediada em New York é uma empresa de vestuário focada numa estratégia de nearshoring e fabricação local, concentrando-se na produção de roupas nos Estados Unidos, tanto para marcas quanto para contratos militares. A empresa busca capitalizar a crescente procura por produtos fabricados localmente, impulsionada por preocupações com cadeias de fornecimento globais, com sustentabilidade e com condições de trabalho.

Nicho de mercado - A empresa actua em dois nichos principais:

  • Produzir peças de luxo, como casacos de caxemira, para consumidores que valorizam a produção local e a qualidade premium.
  • Contratos militares e produtos "made in America": A Ferrara Manufacturing também serve o mercado de produtos militares dos EUA e de exportação para países como Japão e Coreia do Sul, onde há procura por itens únicos e feitos nos Estados Unidos.

Vantagens competitivas:

  • A produção doméstica torna a empresa uma escolha atraente para marcas que buscam diminuir riscos associados a longas cadeias de fornecimento internacionais e a reduzir tempos de entrega.
  • A empresa destaca-se ao oferecer uma cadeia de produção transparente, com benefícios para os trabalhadores, o que vai ao encontro das exigências das marcas que querem mostrar responsabilidade social.
  • Além do mercado interno, a Ferrara Manufacturing possui uma vantagem competitiva ao servir consumidores no exterior, especialmente no Japão e na Coreia do Sul, que valorizam e estão dispostos a pagar por produtos exclusivos feitos nos EUA.
  • O fornecimento para o sector militar oferece estabilidade e um fluxo constante de receita, diferenciando a Ferrara de empresas que dependem exclusivamente do mercado de consumo

Riscos:

  • Fabricar nos EUA tem custos mais altos em comparação com a produção em mercados com mão de obra mais barata. Isso pode impactar a competitividade de preços, especialmente no mercado de consumo em massa.
  • A empresa depende fortemente de dois nichos: produtos premium e contratos militares. Qualquer retracção na procura  por produtos de luxo ou mudanças nos contratos governamentais pode impactar as suas receitas.
  • A procura crescente por transparência e sustentabilidade, embora seja uma vantagem competitiva, também pode pressionar a empresa a manter altos padrões, o que pode aumentar os custos e reduzir a margem de lucro.
  • A produção premium pode ser afectada por flutuações económicas que impactem o poder de compra dos consumidores, tanto nos EUA quanto nos mercados internacionais.
Ontem, na minha leitura matinal de "Unreasonable Hospitality" de Will Guidara fixei esta frase de Jay-Z: 
“I believe you can speak things into existence.”
O futuro é construído sobre oportunidades, não sobre cortes nos custos. Reduzir custos pode comprar algum tempo, mas é a capacidade de identificar e agir sobre novas possibilidades que garante crescimento e sustentabilidade. O mundo empresarial está em constante transformação; o sucesso pertence àqueles que estão atentos ao contexto e preparados para inovar. Ficar preso à estratégia actual é o mesmo que ficar para trás. 

Não percamos as oportunidades que emergem – olhemos para o mercado e para os desafios como portas para o futuro, não como muros ameaçadores.

A frase de Jay-Z é importante porque o futuro não é intrinsicamente bom ou mau, é o que a nossa cabeça faz dele. Se ele mete medo, de certeza que vai ser mau.

quinta-feira, março 21, 2024

Por que é que continuamos tão dependentes de fundos europeus?

Este é mais um postal que me faz perder clientes, porque distingo o Carlos consultor do Carlos cidadão.

Ontem no seu programa matinal, "A Cor do Dinheiro", Camilo Lourenço disse que o sector têxtil é um sector de excelência. 


Sabem o que visualizei? 

Isto:
Poucos minutos depois, na rádio Observador, no programa "E o vencedor é...", ao minuto 08:07, José Manuel Fernandes disse:
"Por que é que continuamos tão dependentes de fundos europeus?
Neste caso, pelo que estamos a perceber, toda uma operação [Moi ici: Promoção internacional das empresas] que devia ser suportada por uma indústria, a indústria têxtil e de lanifícios do Norte, toda essa operação era paga em 50%, talvez mais, por fundos europeus."
Confesso que já pensei nisto várias vezes. Dão-se apoios para as empresas participarem em feiras, as organizações empresariais do sector informam-nos que essas feiras foram um sucesso, mas as empresas raramente se tornam independentes e continuam a precisar de doses futuras de apoios.

Porquê?

Por causa da figura acima? 



É-se competitivo sem se ser produtivo? Assim, ganham-se encomendas, mas não se acumula capital... o bom velho Schumpeter. Pagam-se os custos do passado, mas não se pagam os custos do futuro, a tal espécie de esquema Ponzi.

Outro exemplo sobre o qual já escrevi é o do tomate: uma produção tão competitiva, tão competitiva, tão competitiva, que sem apoios de fundos europeus, se afundará.

Remato esta reflexão com um postal que costumo citar aqui:

sexta-feira, janeiro 26, 2024

Análise do contexto, again

Trecho retirado do WSJ de ontem em "Retailers Shift Inventory Strategy".

"Retailers are reviving an old playbook to manage their inventory levels after four years of struggling to find the sweet spot of holding enough merchandise but not too much.

Merchants have worked through the excess inventory that piled up on store shelves and in warehouses over the past 18 months, and are now focusing on replenishing items rather than stocking up on goods to have on hand in case of supply-chain disruptions. The shift marks a return to the "just-in-time" inventory management strategy many companies had employed before pandemic-driven product shortages and volatile shifts in consumer demand prompted a switch to a "just-in-case" stockpiling approach.

Jamie Bragg, chief supply chain officer at Tailored Brands, said just-in-time inventory management is the goal. The Houston-based parent company of Men's Wearhouse and Jos. A. Bank worked over the past few years to get better visibility into orders that are still in production overseas, positioning it to adjust orders based on demand, he said.

...

Terry Esper, a logistics professor at Ohio State University, said companies are now better able to predict shopper demand and feel they can hold leaner inventories amid moderating spending growth and fewer supply-chain disruptions.

"Retailers have more confidence in the overall supply chain and the logistics network and the environment, and as a result, they're saying, 'Hey, I think we're at a point now where we're safe to go back to just-in-time," Esper said.

Companies typically prefer not to hold large inventories because the excess stock ties up capital, requires more space and people to manage it and runs the risk of becoming outdated as trends change, logistics experts say.

Retailers have been working to get inventories back in line with sales after bringing in too much merchandise that was no longer in demand in 2022 as consumers shifted spending from items such as home decor to office apparel and then toward travel."

Que implicações para fabricantes europeus que forneçam estes retalhistas?

  • Encomendas mais pequenas
  • Aumento da volatilidade da procura
  • Necessidade de mais flexibilidade e capacidade de resposta
  • Maiores requisitos de colaboração
  • Potencial para aumento da complexidade logística.

  • Riscos e oportunidades para os fabricantes europeus:

    Riscos:
    • Instabilidade financeira: tamanhos e frequência de encomendas flutuantes podem levar a fluxos de vendas menos previsíveis.
    • Aumento dos custos operacionais: Expedições mais pequenas e mais frequentes podem aumentar os custos de transporte e logística.
    • Desafios de produção: Adaptar os processos de produção para atender à maior variabilidade e ao imediatismo dos pedidos JIT pode ser um desafio.
    Oportunidades:
    • Parcerias mais fortes: Uma colaboração mais estreita com os retalhistas pode levar a relações mais fortes e de longo prazo.
    • Capacidade de resposta ao mercado: Os fabricantes que se adaptam de forma eficaz podem responder melhor às tendências e exigências do mercado, ganhando potencialmente uma vantagem competitiva.
    • Diversificação da base de clientes: A necessidade de mitigar o risco pode encorajar os fabricantes a diversificar a sua base de clientes e reduzir a dependência de um único retalhista.
    Riscos e oportunidades para este tipo de retalhistas

    Riscos:
    • Perturbações na cadeia de abastecimento: A dependência do JIT pode tornar os retalhistas mais vulneráveis a perturbações inesperadas na cadeia de abastecimento, o que pode levar a rupturas de stock.
    • Aumento da dependência dos fornecedores: A entrega pontual torna-se crucial, aumentando a dependência da capacidade dos fornecedores de cumprir prazos apertados.
    • Volatilidade do mercado: Mudanças rápidas na procura dos consumidores podem representar desafios na manutenção de níveis ideais de inventário.
    Oportunidades:
    • Custos de stock mais baixos: Níveis mais baixos de stock podem reduzir os custos de armazenamento e transporte.
    • Maior flexibilidade: o JIT permite que os retalhistas sejam mais ágeis na resposta às tendências do mercado e às preferências dos consumidores.
    • Melhor cash flow: Ao reduzir o excesso de stock, os retalhistas podem melhorar seu cash flow e alocar recursos de forma mais eficiente.
    Prepare-se, atenção à liquidez ou linhas de crédito para lidar com períodos de procura incerta ou mudanças rápidas no mercado, diversifique a base de clientes para não depender excessivamente de um pequeno número de grandes retalhistas, melhore a integração com os sistemas TI dos clientes.

    O resto já sabe daqui do blogue: Aumentar a flexibilidade e agilidade na produção, foco na qualidade e inovação.

    terça-feira, maio 02, 2023

    Como é que ninguém fala disto?

    Recordo o postal recente O que será utilizar bem os fundos comunitários?

    O que será preciso para aumentar a produtividade num sector tradicional como o têxtil?

    Não é preciso inventar, basta olhar para o sector têxtil alemão, sim alemão.

    Recuo a 2015 e ao artigo citado em Diferenciação permite coabitação:

    "Estive há tempos num congresso da indústria em Dresden [Alemanha] e quase não se falou de roupa. Falou-se sim da indústria automóvel, da aeroespacial ou da construção", nota Braz Costa, administrador do Citeve e do Centi, um centro de investigação nas áreas da nanotecnologia e dos materiais inteligentes com sede em Famalicão. Não admira por isso que o maior produtor e exportador têxtil da Europa seja a Alemanha. Não de peúgas ou de t-shirts, mas de materiais com que se fazem os painéis dos automóveis, próteses médicas, peças de motores ou asas de aviões."

    Qual o salário médio de um trabalhador têxtil alemão? Em 2020 foi de 2971 euros de acordo com dados do Statista. Qual o salário médio de um trabalhador têxtil português? Em 2020 foi de 939 euros de acordo com dados do INE.

    Como é que ninguém fala disto?

    Cada vez mais vou-me convencendo que os fundos comunitários funcionam como algo que torna esta evolução mais, muito mais lenta.

    Mais uma vez, não se chega lá trabalhando no denominador da equação da produtividade, mas no numerador.

    quarta-feira, dezembro 14, 2022

    Cuidado com os americanos

    "Esta semana, um empresário alemão andou no Vale do Ave a fazer contactos para deixar encomendas têxteis que costumava colocar na China e Turquia. "Está disposto a pagar 20% mais para reduzir a exposição numa zona que considera de risco" conta um industrial do sector, animado com a perspetiva do negócio

    ...

    Rafael Campos Pereira, vice-presidente da AIMMAP, a associação do sector metalúrgico, admite que 2022 vai fechar com exportações superiores a €20 mil milhões, 10% acima do recorde de 2021 e pelo menos quarto dos melhores registos mensais de sempre. Para isso, diz, pesam subidas nos principais mercados do sector Espanha, França e Alemanha além dos Estados Unidos, que deu um salto homólogo de 70% em oito meses

    ...

    Na fileira têxtil, as previsões apontam mais uma vez para um recorde nas exportações, depois de o terceiro trimestre fechar 19,2% acima de 2019 (€4,7 mil milhões). Em quantidade, o ganho é de apenas 6%, o que leva Mário Jorge Machado, presidente da associação setorial ATP, a sublinhar que "há valorização de produto, mas também há mão da inflação". Aliás, recorda, o ano obrigou muitas empresas a recorrerem a lay-off pela subida dos custos e por cortes nas encomendas de marcas preocupadas com a redução do consumo.

    ...

    muitas marcas americanas querem alternativas à Ásia,

    ...

    No calçado ainda ninguém assume que o recorde de €1,96 mil milhões de 2017 será batido na frente externa, [Moi ici: Mentira o presidente da APICCAPS assumiu-o no último número do Dinheiro Vivo] mas "este é seguramente um dos três melhores anos de sempre", admite Paulo Gonçalves, porta-voz da associação setorial APICCAPS,

    ...

    No caso da indústria do mobiliário, 2022 puxou os EUA do 5° para o 3º lugar no ranking dos maiores mercados, com um crescimento de 30% nas vendas, e Angola, "a beneficiar da alta do petróleo" para crescer 50%, regressou ao top 10."

    Qual o perigo do mercado norte-americano? A sua baixa sofisticação, afinal estamos a falar de clientes que estão a sair da Ásia. Recordo o que escrevi em 2018 aqui no blogue, Tanta coisa que me passa pela cabeça...:

    "Quem segue este blogue sabe que há muitos anos escrevemos e defendemos aqui que o mercado americano não pode competir com o europeu em preço unitário."

    Por exemplo, na última Monografia Estatística publicada pela APICCAPS podemos encontrar:

    • Preço médio de um par de sapatos importado pelos Estados Unidos - 11,37 USD
    • Preço médio de um par de sapatos importado por Portugal - 13,28 USD
    • Preço médio de um par de sapatos importado pela Alemanha - 17,94 USD
    • Preço médio de um par de sapatos importado por França - 18,26 USD

    Trechos retirados de "O sonho americano das exportações portuguesas" publicado no caderno de Economia do semanário Expresso do passado Sábado.

    segunda-feira, novembro 14, 2022

    Acredita no jornalismo da SIC?

    No passado Sábado na SIC assisti a um "artigo televisivo" sobre a antiga Fábrica de Mindelo. A certa altura ouvi:

    "Sucessivos erros de gestão originaram um passivo de 55 milhões de euros"

    Ou seja, para a SIC a falência da antiga Fábrica de Mindelo deveu-se a erros de gestão, deveu-se a factores internos e não a factores externos.

    Depois, a certa altura apanho esta imagem:

    Hummm! Isto cheira-me a design gráfico da treta ... vamos fazer um teste:

    Bem me parecia, a SIC apresenta um gráfico de barras que não começa a partir de zero. Ou seja, comete um erro básico! Usam um gráfico enganador. O que é que isto diz sobre a qualidade do jornalismo da SIC?

    Acham mesmo que a Fábrica de Mindelo faliu por sucessivos erros de gestão?

    O que diriam sindicatos, trabalhadores, governos, paineleiros e políticos da oposição se em 1992 a direcção da Fábrica de Mindelo decidisse encolher a empresa e despedir várias centenas de trabalhadores?

    O que diriam se a direcção da Fábrica de Mindelo apresentasse o argumento dos dinossauros azuis, pretos e vermelhos? Recordar As mudanças em curso na China - parte II. E para os que querem empresas maiores para aumentar a produtividade, mas não querem deixar morrer empresas nos sectores tradicionais recomendo de 2012 - 198 trabalhadores, e de 2017 recomendo O século XX continua por cá (parte II). Neste último postal salienta-se a evolução das empresas têxteis grandes em Portugal a partir da entrada da China no mercado global.



    BTW, no jornal de Domingo na RTP1 alguém, só ouvi, não vi a imagem, defendia com grande enfase que a Inditex comprava em Portugal por causa das práticas de sustentabilidade da indústria têxtil ... como é possível acreditar nestas tretas? Recordo Coerência e ambiente (parte III)