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domingo, setembro 22, 2024

Como dar este salto? (parte III)

Parte I e parte II.

Acabamos à parte II com esta pergunta: Como saber quais os indicadores que devem ser maximizados e quais os indicadores que devem subordinar-se a esses?

A chave para responder a essa pergunta é olhar para a estratégia de uma empresa e perceber que padrões de actuação devem ser privilegiados. Recentemente ouvi Roger Martin usar esta definição de estratégia:

"Strategy is about making an integrated set of choices that compels desired customer action."

Recordo os dinossauros e as bolas azuis, pretas e vermelhas e o esquema de Terry Hill, diferentes estratégias implicam diferentes conjuntos de escolhas às quais depois tudo se subordina.

Recordo a Dow e a Xiameter, recordo a Lusomedicamenta e os seus clientes. Outra vez, diferentes estratégias implicam diferentes conjuntos de escolhas às quais depois tudo se subordina.

Por fim, recordo o clássico de Porter, "What is strategy?" e o exemplo que ele dá com o mapa do conjunto de escolhas integradas do IKEA:

"Competitive advantage grows out of the entire system of activities. The fit among activities substantially reduces cost or increases differentiation. Beyond that, the competitive value of individual activities-or the associated skills, competencies, or resources-cannot be decoupled from the system or the strategy. Thus in competitive companies it can be misleading to explain success by specifying individual strengths, core competencies, or critical resources. The list of strengths cuts across many functions, and one strength blends into others. It is more useful to think in terms of themes that pervade many activities, such as low cost, a particular notion of customer service, or a particular conception of the value delivered. These themes are embodied in nests of tightly linked activities."
Se uma estratégia industrial passa por serviço, por exemplo, a facilidade de fazer alterações tem de se sobrepor à tentação de reduzir as alterações ao mínimo porque cada alteração aumenta custos e reduz eficiência.

Portanto, ao tentar responder à pergunta:


Não podemos olhar isoladamente para um indicador, temos de equacionar qual é a estratégia da organização e como é que esse indicador se integra junto de outros indicadores para perceber qual a direcção e qual a escala de subordinação.

Por exemplo, um objectivo sobre "savings" com a compra de matérias-primas pode ser muito, muito importante, mas se for levado ao extremo, pode pôr em causa a capacidade de satisfazer os clientes-alvo com prazos de entrega rápidos, ou enxamear a produção de problemas por causa da menor qualidade das compras. No entanto, se a produção é "make-to-stock" e os produtos são clássicos, é bem provável que a maximização dos savings esteja alinhada com a estratégia da organização e contribua para o sucesso comercial e financeiro.

Também, não podemos olhar isoladamente para um indicador, temos de equacionar o impacte que actuar sobre ele vai ter sobre outros. Uma coisa interessante: melhorar o desempenho de uma organização como um todo, não é o mesmo que melhor o desempenho de todas as suas partes, o todo é diferente da soma das partes.

Isto são cuidados a ter, mas como se dá o tal salto?

Recomendo recordar Ackoff, as três setas e as cinco posições face ao futuro.

Gosto de pensar que os resultados actuais são um produto perfeitamente normal da forma como trabalhamos. Não há acasos!

Ou seja, os resultados de uma empresa não são como meteoritos caídos do céu, nem são obra de um jogo de roleta, nem uma consequência de artimanhas de "terroristas", intervenientes maldosos que fazem mal de propósito. Assim, se não há acasos, os resultados da empresa de hoje são resultados perfeitamente normais, são uma consequência natural da forma como a empresa trabalha hoje:

Se não gostamos dos resultados de hoje, temos de mudar a empresa de hoje. Se pretendemos atingir resultados futuros desejados diferentes, então, nesse futuro desejado teremos de ter uma empresa diferente, uma empresa capaz de gerar os resultados desejados de forma perfeitamente normal:

Para avançar temos duas alternativas:
  1. Começar por descrever como trabalhamos actualmente;
  2. Começar por descrever o que tem de ser alterado.

Durante muito tempo considerei as duas alternativas equivalentes. 

  • Começar por 1 e depois 2, para voltar a 1 e aplicar as alterações.
  • Começar por 2 e depois 1, para depois aplicar as alterações em 1.
Hoje estou convencido que começar por 1 e depois 2, para voltar a 1 e aplicar as alterações é a melhor alternativa. Descrever como trabalhamos corresponde a mapear a organização como um conjunto de processos que interagem entre si. Ou seja, como um conjunto de actividades que transformam entradas em saídas.

 Quando mapeamos uma organização, listamos as actividades realizadas. O que se faz deixa de ser teoria, deixa de ser abstracção e passa a ser algo concreto. Olhar para a sequência de processos, olhar para as suas actividades, é um potente alimentador de hipóteses sobre o que pode estar na origem do desempenho actual, e sobre o que merece ser investigado. Ainda esta semana numa empresa, algo que teoricamente deveria durar x, pode na verdade quase chegar a durar 3x em determinadas circunstâncias. Como se descobriu? Seguindo as actividades, indo ao local e observando, medindo e perguntando porquê.


Continua.

terça-feira, agosto 13, 2024

Come on. Como se pode ser tão básico?

Acerca do vinho tenho escrito alguns postais ao longo dos anos. Recordo de há anos um focado no problema de fundo, a incapacidade de subir na escala de valor: O crescimento canceroso (de Dezembro de 2018).

Recentemente escrevi sobre a incapacidade de todos os intervenientes, desde o governo aos produtores de uva, enfrentarem a situação de frente e falarem verdade. Não falando verdade, qualquer hipótese de melhoria fica ferida de morte (recordar o que Roger Martin escreveu recentemente). Por isso escrevi:
Em Julho escrevi "Julgo que nunca verei esse dia... uma tristeza." onde citei dados da produção e consumo mundial de vinho e do crescente desencontro. Consumo desce e produção sobe. Qual a reacção em Portugal? Destilar vinho e culpar importações. E mudar? Não isso não é com os produtores.

Ontem, no FT li "Australian wine sector suffers from shift upmarket":
""Three years ago, the industry was in the best position it has been in. Now it's the worst it's been," he said.
The woes of the sector, which employs more than 160,000 full and part-time workers, have prompted an exodus of established operators.
Treasury Wine Estates, Australia's largest wine producer and the maker of some of the best-known labels on UK supermarket shelves, including Wolf Blass and Blossom Hill, announced this week that it would sell its commercial wines division with a A$290mn (US$189mn) writedown.
It was the latest in a series of deals involving Australian wine.
...
Globally, wine consumption has also been declining. UK per capita wine consumption peaked in 2009, except for a temporary boost during the coronavirus pandemic, with British drinkers now consuming 14 per cent less than they did in 2000.
Some of the world's largest alcohol companies are shifting from the commercial end of the wine marketbrands that retail for less than $10 a bottle - towards higher-margin and faster growing segments, such as spirits and premium wine.
...
"The reality is biting in Australia. [Moi ici: Esta é a linguagem de olhar para os factos e não de arranjar culpados ou pedir botijas de oxigénio, aka destilação] We are in a global oversupply situation. This is a crucible moment in the industry."
Trevor Stirling, an analyst at Bernstein, said winemakers globally had been forced to cut prices to remain competitive. "Wines that were once upon a time considered premium are now seen as mainstream," he said. "The only bit of 'Three years ago, the industry was in the best position it has been in.
Now it's the worst it's been' the wine industry in the world making money is rosé and upmarket wines.""

Também ontem, mas no JdN, apanhei, "Exportações de vinhos crescem até junho 8,6% em volume, mas só 1,25% em valor" [Moi ici: Esta matemática é impressionante!]

"As exportações totais de vinho português aumentaram nos primeiros seis meses deste ano 8,58% em volume, mas apenas 1,25% em valor, comparativamente com o mesmo período de 2023. 

...

[Moi ici: Os dois parágrafos que se seguem são de chorar. Não percebem como isto não tem nada a ver com sustentabilidade? Basta recordar os números de Simon e Dolan e o impacte assimétrico da redução de preços na rentabilidade. Esta gente não percebe que vender mais, e ganhar menos dinheiro, apesar de ter mais trabalho, mais custos, mais inventário é uma forma antieconómica de operar?] Em seu entender, "o aumento de 8,58% em volume demonstra a forte procura pelos nossos vinhos nos mercados internacionais, contribuindo para a sustentabilidade do setor".

No entanto, salienta que "continuamos a ter um desafio no que toca ao preço médio, que reduziu em vez de aumentar, como era a nossa expectativa"."

Não enfrentamos os problemas de frente, não olhamos para os dados e iludimos-nos com "vanity metrics": aumentar vendas, enquanto se perde dinheiro. Come on. Como se pode ser tão básico?

O mundo muda e temos de mudar de vida, mudar de estratégia, mudar de mercado, mudar de clientes, mudar de produto, mudar de modelo de negócio. Não podemos querer perpetuar uma postura de mercado e esperar que outros nos paguem para a manter.

O mais grave é ninguém falar como adulto suportado em números... sempre a velha estória da festa de Natal do nosso filho de cinco anos...

sábado, julho 27, 2024

Et honte ?

 Ainda bem que preferi ver Hill Street Blues e o A-Team no canal RTP Memória

quarta-feira, agosto 17, 2022

Falta de alinhamento ao vivo e a cores

Neste blogue, ao longo dos anos, tenho registado vários casos que são um absurdo em termos de estratégia. Por exemplo:
Ontem encontrei mais um exemplo do que me parece um absurdo em termos de estratégia. Aprendi primeiro com Porter no seu clássico "What is strategy?" (A evolução da ideia de mosaico estratégico (parte III)), e depois com Terry Hill (As mudanças em curso na China - parte II), a importância do alinhamento estratégico. Ou seja, se se quer ter marca de luxo não se pode vender o artigo ao desbarato na feira do preço baixo. Se se quer ser competitivo no custo/preço não se pode ao mesmo tempo investir na diferenciação da marca.

O exemplo em causa estava no DN sob o título, "Carnes da Montana quer chegar às cantinas públicas":
"Marca que representa sete raças autóctones bovinas existentes em Portugal está a inovar oferta e explora novos mercados. [Moi ici: Marca e raças autóctones aponta para diferenciação, qualidade, e baixas quantidades]

Os produtores de sete raças autóctones de bovinos identificadas em Portugal encontraram um novo canal para fazer chegar as suas produções diretamente ao consumidor, através da loja online Carnes da Montanha. Vão lutar para que o produto chegue às cantinas públicas e assim estimule a preservação de um efetivo que é "muito mais do que carne", como descreve Idalino Leão, administrador da empresa. [Moi ici: Produtores de raças autóctones querem escoar a carne através de um canal que não valoriza a qualidade, mas a conformidade. Querem escoar a carne como se fosse uma commodity. Não percebem que o negócio das cantinas públicas é o negócio do preço/custo mais baixo?]
...
"Orgulhoso por poder exibir as nove medalhas de ouro atribuídas a produtos da Carnes da Montanha no último Concurso Nacional de Carnes Tradicionais Portuguesas, que se realizou em junho, em Santarém,"  [Moi ici: Qual o valor destas medalhas? Ou as medalhas não prestam, ou as Carnes da Montanha não sabem como as utilizar. As medalhas se valerem algo devem ser usadas para reforçar a proposta de valor para mercados que valorizam a diferenciação]
...
 "o objetivo é convencer os municípios a usarem estes produtos sempre que nas ementas das cantinas públicas (hospitais, escolas, universidades) esteja previsto o consumo de carne de vaca" [Moi ici: Acham que estas entidades nadam em dinheiro? Compram ao preço mais baixo e, por isso, têm de ser fornecidas por produtores com raças muito eficientes]
...
Segundo o administrador, em Portugal, 60% dos clientes estão em Cascais, Oeiras e Ericeira, 20% no Algarve os restantes no resto do país." [Moi ici: Como não recordar a artesã de Bragança e os outros, têm de mudar de mercado, mas não é para baixo, é para cima. Pena que o administrador seja "também o presidente da Agros e da Confagri", formatado no negócio do preço baixo, não tem nem experiência nem tempo para apostar numa estratégia de preço alto]

sexta-feira, abril 08, 2022

quando há uma catástrofe ... uns choram, outros vendem lenços

Ontem de manhã antes de sair de casa, li na diagonal no Jornal de Negócios o artigo, "Escalada de preços pode ameaçar o verão". Depois, durante a caminhada matinal ouvi o programa de Camilo Lourenço. Mesmo a chegar ao fim (a partir do minuto 21:50) oiço-o dizer:

- O que se pode propor para resolver isto? Nada!

Surpreendeu-me. Nada?! Não se pode fazer nada?

Ele assume que a alta de preços vai reduzir a procura e, por isso não há nada a fazer. Sim, acredito que a procura global vai cair, mas porque é que os operadores turísticos portugueses hão-de aceitar que a sua procura natural caia, sem procurar atraír nova procura que eventualmente estivesse destinada a outros mercados?

Claro, se estiverem à espera do governo... deste ou outro, quando é preciso agilidade, não vão a lado nenhum.

Na semana passada numa conversa a caminho de Bragança recordei uma experiência pessoal. Algures por volta de 1991, ao final da tarde, na esquadra de Hill Street (era assim que o meu local de trabalho era conhecido internamente, um open space onde 12 ou 13 pessoas tinham a sua secretária e, por causa disso, às vezes parecia replicar o reboliço da esquadra da série televisiva. Às vezes estavam mais de 20 pessoas com 4 ou 5 conversas em simultâneo), os cinco jovens engenheiros, estavam com os pés em cima da mesa a trocar cromos sobre o dia de trabalho, sobre o que leram nas revistas que a empresa fazia circular, sobre o campeonato de futebol, ... Um dia a conversa caiu sobre um artigo de uma revista e umas contas que um colega de Espinho e outro de Coimbra tinham feito sobre uma cena chamada cogeração. A nossa empresa produzia vapor a 30 bar, usava-o a 30 bar e a 20 bar. Com a cogeração além do vapor necessário para o processo podia-se produzir energia. A conversa aqueceu, muito entusiasmo. Eles fizeram um memorando que enviaram à administração. Cerca de 6 meses depois um cogerador da Mitsubishi estava a entrar pela fábrica. O investimento tinha um retorno estupidamente alto, pagava-se em meses. O meu colega de viagem para Bragança disse: 
- Se fosse agora. Primeiro perguntavam se havia apoio, se havia algum financiamento comunitário. Depois, ficavam meses à espera que abrisse o apoio, depois que abrissem as candidaturas, depois o habitual calvário das exigências da treta, depois os atrasos... o investimento tarde ou nunca avançaria.

Voltando ao turismo, há que recordar a frase: quando há uma catástrofe ... uns choram, outros vendem lenços.

quarta-feira, novembro 17, 2021

Por alguma razão Cortez queimou os barcos...

Ontem de manhã, enquanto conduzia a caminho de Guimarães, ouvia nas rádios falar-se da produtividade e do salário mínimo. Tantas generalidades... até me arrepiei. Até me lembrei de uma das cenas mais anedóticas deste blogue, a superior produtividade portuguesa no Luxemburgo, segundo um embaixador do Luxemburgo em Portugal é motivada pela saudade. A sério, não estou a brincar.

Uma das perguntas que não obteve resposta foi: porque é que o salário mínimo e o salário médio estão a convergir?

Primeiro, um exemplo do calçado. O preço médio do calçado exportado em 2020 foi de 27,80 USD. Conheço algumas empresas com um preço médio do calçado que produzem e exportam na casa dos 52 USD. As empresas que vendem a 52 USD pagam salários mais ou menos iguais às que exportam a 27,80 USD. As empresas pagam o que o mercado está a pedir e o que o mercado pede é o que a média das empresas do sector consegue pagar. É uma espécie de lei inversa da que se passa quando um nigeriano, motorista de autocarro, emigra para a Noruega para conduzir autocarros. faz exactamente a mesmo coisa, mas por causa do contexto diferente, passa a ganhar cerca de 16 vezes mais do que na Nigéria. Enquanto não se deixarem morrer as empresas menos produtivas não sairemos da cepa torta.

Toda a gente pensa que a diferença de produtividades entre Portugal e a Europa Ocidental tem a ver com eficiência ... come on!!! A diferença resulta de se produzirem coisas diferentes. Recordar "Acerca da produtividade, mais uma vez (parte I)"

Em The "flying geese" model, ou deixem as empresas morrer!!! apresentei a figura:

Reparem como a evolução em cada país se dá quando o grosso do capital e dos trabalhadores avança para outro sector, capaz de suportar margens superiores. Reparem como a evolução não é de vestuário low-cost para vestuário high-price. Ela existe, mas é marginal (recordar a não-bruxaria de ontem). Eu, como consultor, a trabalhar com uma empresa individual que não tem de salvar o país, que tem de fazer pela sua vida, posso apoiar o processo de descoberta e construção que permite que uma empresa tradicional continue num sector tradicional, como o denim japonês, o mais caro do mundo, com margens superiores. No entanto, isso não é escalável para todo um sector. 

Verdade, algumas empresas conseguem fazê-lo, a fabricante de botas de borracha acabou a fazer telemóveis da marca Nokia, ou a Wartsila que começou como uma serração, mas são as excepções à regra. Pela enésima vez vou colocar aqui o que aprendi com Maliranta talvez em 2007, é a primeira citação na coluna de citações à direita do blogue:
""It is widely believed that restructuring has boosted productivity by displacing low-skilled workers and creating jobs for the high skilled."Mas, e como isto é profundo: "In essence, creative destruction means that low productivity plants are displaced by high productivity plants." Por favor voltar a trás e reler esta última afirmação."
Moisés disse ao faraó: Deixa o meu povo partir!
Eu prego no deserto: Deixem as empresas morrer!

Ontem, neste artigo "To Understand The Future Of Diversification, Compare Microsoft And IBM" sublinhei o seguinte trecho:
"IBM is shedding IT services, once a cornerstone of its 1990s recovery.
...
IBM’s IT service business is labor intensive. It has 90,000 employees generating sales of $19 billion, which translates into just over $200,000 per employee. On average even Wal-Mart staff bring in more money. Once the spin-off is completed, IBM can concentrate on higher margin cloud software and solutions.
...
The value creation lens makes it obvious that the IBM spin-off—similar to the other headline grabbing announcements—is fundamentally a decision to move out of an unattractive position. In 2016 Microsoft actually did the same when shutting down the phone hardware business it previously bought from Nokia."
O mesmo artigo refere que a Johnson & Johnson também pretende avançar com um spin-off. Interessante, este blogue tem registado uma década nada abonatória nessa empresa. Recordo "Dá que pensar..." como o exemplo das empresas que abandonam a inovação e se concentram na eficiência operacional, o tal fenómeno do hollowing.

Quando não se tem tempo, nem massa cinzenta para pensar o futuro, e o quotidiano manda ... não se fazem spin-offs, não se fazem escolhas mais ou menos dolorosas ... Ah! Recuar 20 anos e ouvir este, hoje "angolano", director técnico perguntar: "Qual é o truque, qual é o segredo?"



Recordar Terry Hill e o Verão de 2008:
"the most important orders are the ones to which a company says 'no'."

 Como é que está lá em cima?

"Once the spin-off is completed, IBM can concentrate on higher margin cloud software and solutions."

Quando não se corta com os produtos do passado, não há foco suficiente no futuro. Por alguma razão Cortez queimou os barcos... 

Querer aumentar a produtividade, ao mesmo tempo que se apoiam as empresas com baixa produtividade... não vai dar em nada.

Agora imaginem a empresa que estando bem, resolve fazer o que a IBM vai fazer, concentrar-se em produtos de margens mais elevadas. Como não existe mercado para comprar a parte "clássica" da empresa, a empresa teria de encolher. Imaginem as manifestações contra uma malvada empresa que estando bem, resolve cortar postos de trabalho e abandonar bons clientes para poder aumentar a produtividade...

domingo, junho 13, 2021

"the Age of Diverse Markets"

Longe vão os tempos do: qualquer cor desde que seja preto.

Ao longo dos anos tenho escrito sobre Mongo, ou o Estranhistão. A metáfora que uso para ilustrar o abandono do monolitismo do século XX e o advento da variedade e diversidade do século XXI.

"Today, business is transitioning from one major era, the Age of Mass Markets, to another, which we call the Age of Diverse Markets. [Moi ici: Aquilo a que chamo de Mongo, ou o Estranhistão]
...
The Age of Mass Markets, which extended through most of the prior century, was characterized by fast-growing homogeneous markets. [Moi ici: A visão monolítica que a Economia aplica à realidade para a poder matematizar. Depois, chega a modelos e a conclusões sem adesão à realidade e não percebe, e enterra a cabeça na areia]
...
[Moi ici: In the Age of Mass Markets] These companies were characterized by massive economies of scale in nearly every business function (production, distribution, advertising, and so on), which ensured that as they increased their sales, their unit costs dropped, giving them ample profits to invest in getting more sales and in further reducing their costs by increasing the efficiency of their production and distribution systems. Both prices and distribution costs were relatively uniform, so reporting tools based on averages—like aggregate revenues, costs, and gross margins—were sufficient.
The key management imperative was to get big fast. The rules of thumb were that all revenues were good and all costs were bad. [Moi ici: Como não recuar a 2012 e a "Como surgem os Golias e pistas para o aparecimento de Davids". Em Portugal, os mesmos da tríade ainda sonham com empresas grandes. Em Mongo, "Giants invariably descend into suckiness"] Companies segregated their functional departments to individually optimize their revenue-maximizing or cost-minimizing objectives, and they coordinated them at the top through periodic planning sessions and period-end financial reports.
Today’s Age of Diverse Markets, which began its widespread acceleration around 2000, is completely different. Today, there are very few mass markets, while there are more and more diverse markets where product offerings, pricing, and service packages are uniquely configured, if not by individual customer, than at least by highly segmented target markets.
Today, markets are heterogeneous and fragmenting down to the individual customer in many cases. Throughout our economy, pricing is becoming much more varied, both within market segments and even between one customer and the next. In parallel, the cost to serve each customer is becoming increasingly diverse, depending on the customer relationship, product-service mix, and other factors. This change has already overtaken the business-to-consumer (B2C) markets, and it is rapidly transforming the business-to-business (B2B) markets as well."
"In the Age of Mass Markets, products were “king.” To a large extent, companies succeeded by selling the same products to as many customers as possible. In the Age of Diverse Markets, in contrast, customers are “king.” Companies succeed by microtargeting particular customers and tightly specified market segments and providing them with tailored packages of products and related services."
Comecei a reler “Choose Your Customer: How to Compete Against the Digital Giants and Thrive” de Jonathan S. Byrnes. Primeiro, o título. Qual a primeira decisão estratégica? Escolher os clientes-alvo! Recuar ao Verão de 2008 e a Terry Hill e à sua frase "the most important orders are the ones to which a company says 'no'.". Julho de 2007, a primeira vez que usei o marcador "clientes-alvo" aqui no blogue. Apesar de já o fazer em textos anteriores. Segundo, Jonathan S. Byrnes. Um autor que aprecio há mais de 10 anos.

domingo, fevereiro 14, 2021

How can we use the process approach (part IVa)


5.Processes and strategy

5.1 Anything about strategy in ISO 9001 and ISO 9000?

ISO 9000:2015 defines strategy as:
plan to achieve a long-term or overall objective
When you remember the old article from Henry Mintzberg, The Strategy Concept I: Five Ps for Strategy, published in October 1987 by California Management Review. 
Summarizing the strategy in a plan is too little, too poor. 

What about ISO 9001:2015, where does the strategy come in? 

Clause 4.1:
The organization shall determine external and internal issues that are relevant to its purpose and its strategic direction
Interestingly, not many people realize that relevant external and internal issues and their classification are a function of strategic orientation.

Clause 5.1.1:
ensuring that the quality policy and quality objectives are established for the quality management system and are compatible with the context and strategic direction of the organization;
OK, alignment of quality policy with context and strategic direction.

Clause 5.2.1:
is appropriate to the purpose and context of the organization and supports its strategic direction;
Again, alignment of quality policy with context and strategic direction. Quality policy should derive from strategic orientation.

Clause 9.3.1:
Top management shall review the organization’s quality management system, at planned intervals, to ensure its continuing suitability, adequacy, effectiveness and alignment with the strategic direction of the organization.
OK, this is understandable, it is peaceful. 

That’s it!!!

Not very useful as a guide to work with strategy.

Let us try another door. One of the quality management principles is customer focus. ISO 9000:2015 states:
The primary focus of quality management is to meet customer requirements and to strive to exceed customer expectations.
One of the things that worries me about ISO 9001 is that it uses the language "customer" instead of "target customer".

Seth Godin in his book “We Are All Weird” writes:
"The mass market — which made average products for average people was invented by organizations that needed to keep their factories and systems running efficiently.
Stop for a second and think about the backwards nature of that sentence.
The factory came first. It led to the mass market. Not the other way around.”
“For a hundred years, industrialists have had a clearly stated goal: standardized workers building standardized parts”, [Another text by Seth Godin, from his blog]. This resulted, as a business model, while demand was bigger than supply. When demand is bigger than supply, the boss, the one calling the shots, is the one who produces. And when that is the case, whoever is more efficient wins. Everyone tries to compete for the lowest cost. 
In this world, the competitive landscape can be compared to a single mountain and all competitors try to climb that mountain, the higher they rise, the higher the yield, but the higher they climb, the fewer the number of companies that survive, because in this landscape of a single mountain, the one that wins is the one that uses the effect of scale, grow in volume to lower unit costs and be more competitive.

As soon as supply started to exceed the level of demand, the economic world began a transformation towards more variety. In terms of the competitive landscape, this translates into many, more and more mountains. And those who climb one do not compete with those who climb the other:
In an economic world full of different peaks in a rugged landscape there are many types of customers. Different customers look and value different things. 

Let us stay away from statistics and look customers in the eye, literally and metaphorically. If we look at customers who value price above all else, what satisfies them? 
Satisfied customers do not happen by chance, they are the normal and natural result of work done upstream to achieve the results they value. 

What do we have to do upstream to produce these results in a perfectly normal, systematic, and sustainable way? 
This market is highly competitive, different competitors seek to improve their efficiency, whoever is more efficient wins, whoever stretches the frontiers of operational excellence wins. 

Amateurs cannot compete with paranoid competitors.

Now, let's look at another type of customer, the one who wants tailor-made service, or a customized product. What do they value? 
What kind of priorities are behind these results?
Finally, let's look at another type of customer, the one who wants innovation, or values design above all. What do they value? 
Again, what kind of priorities are behind these results?
Now imagine an organization that wants to serve the three types of customers at the same time
What a big mess it will be! A typical stuck-in-the-middle situation.
The following figure is taken from an article called “Using Product Profiling to Illustrate Manufacturing-Marketing Misalignment” by Terry Hill, Rafael Menda, and David Dilts and published in July 1998.

One can look into an organization and evaluate its products and markets, its manufacturing structure, and its infrastructure. 
For example, about the products and markets: organizations can have wide or narrow product ranges, high or low rate of new product introductions. High or Low frequency of schedule changes. And different order winners, the most relevant topic at the eyes of certain groups, certain segments of customers.
For example, for manufacturing: organizations can have small or large production run sizes, high or low set-up frequencies, low or high set-up costs.
For example, for infrastructure: organizations may be designed to new product introductions or for process improvements to improve efficiency. Manufacturing Managers’ tasks may be dedicated to schedules or to quantity.

Let us see two examples.
The blue company is a company that bets on innovation, they have a wide range of products, they have a high rate of new product introductions, They are flexible enough to accommodate and thrive in the middle of a high frequency of schedule changes. Customers love the innovative products and the brand. Their manufacturing is aligned by being able to run small production sizes, handle a high frequency of set-ups and their cost is low. Infrastructure is aligned with product introductions and meeting schedules.
On the other side, one can think about a green company. A company that bets on low cost to compete on price, they have a narrow range of products, they have a low rate of new product introductions. A new product introduction is a headache, is more entropy. They try to minimize the frequency of schedule changes, which reduces throughput, that reduces efficiency. Customers love their low prices. Their manufacturing is aligned by being able to run large production sizes without stop, they minimize set-ups, and their cost is high. Infrastructure is aligned with efficiency and process improvements process in and throughput.
Different organizations, different strategies, different processes, different mindsets.

Now consider the example of a third company, a company that has a weak or unclear strategy, a company not aligned.
They have a wide product range, an average rate of new product introductions, an average frequency of schedule changes, and their order winners are based on price. Things don’t fit nicely together
They run small to average production run sizes and average set-up frequency and cost.
Their mind is in searching for efficiency but at the same time, they look to meet schedules to satisfy different customers looking for different products in small quantities.
This company is a mess, is stuck in the middle trying to serve everybody and fighting with conflicting priorities.

Continue.

domingo, novembro 01, 2020

O respeitinho excelentíssimo senhor phd doutor engenheiro arquitecto

 


Ao ler esta estória "Polémica no Politécnico por causa da palavra “colegas”" lembrei-me logo da estória dos acidentes de aviação na Korean Airlines relatados por Malcolm Gladwell no livro "Outliers".

"Gladwell did not return a request for comment, but in summarizing his ideas for Fortune magazine in November 2008, he said Korean Air's problem at the time was not old planes or poor crew training. "What they were struggling with was a cultural legacy, that Korean culture is hierarchical," he said.

"You are obliged to be deferential toward your elders and superiors in a way that would be unimaginable in the U.S." he added. That's dangerous when it comes to modern airplanes, said Gladwell, because such sophisticated machines are designed to be piloted by a crew that works together as a team of equals, remaining unafraid to point out mistakes or disagree with a captain.

To Gladwell, this may have explained why Korean Air Flight 801 crashed into a hill while on approach to an airport in Guam in 1997, killing 223 people. In addition to a series of misfortunes, including bad weather, an offline warning system, and outdated charts, the co-pilot was afraid to question the poor judgment of the pilot, wrote Gladwell—a fatal mistake.

Similarly, Gladwell assigned blame for the 1990 crash of Avianca Flight 52 in Long Island, New York, to human error caused by cultural differences. The plane ran out of fuel while circling JFK, leading to 73 fatalities. The pilots of the Colombian airline did not assert themselves enough with air traffic control when communicating that they were running out of fuel, wrote Gladwell.

Gladwell argued that in Colombia, as in Korea, cultural norms tended to dictate that people avoid directly questioning authority—in this case, the authority of controllers who had asked the Avianca plane to keep holding."

Trechos retirados de "Could Malcolm Gladwell's Theory of Cockpit Culture Apply to Asiana Crash?"

segunda-feira, março 16, 2020

Quantas empresas (parte XI)


Na minha infância, antes do saco plástico, o leite do dia era comprado em garrafas de vidro que vinham com uma tampa de alumínio:

Suil era a marca do leite que se bebia em São João da Madeira em 1969.

Nesses tempos era comum as cozinhas terem uma peça como esta para limpar o interior das garrafas:
Ontem à noite tive oportunidade de ler o capítulo 3 do livro “Nine Rules for Thriving in the Twenty-First Century” de Adam Davidson. Um capítulo sobre a “Braun Brush, um negócio com sede em Long Island e gerido por uma família - Braun Brush, the “Makers of Specialty Brushes Since 1875”. 

Um capítulo que se enquadra bem nesta série e ilustra como as empresa de calçado podem dar o salto para a descoberta do cliente. Divido a história da Braun Brush em quatro fases:
A Fase I - Artesanal
O fundador da empresa começou por ser alguém que trabalhava numa fábrica que engarafava o leite e, tinha a função de lavar as garrafas devolvidas pelos consumidores. Além de ser uma tarefa morosa, estava constantemente a ser repreendido pelo chefe quando a limpeza não ficava bem feita. Tinha um problema, tinha uma dor, e começou a trabalhar numa solução que lhe facilitasse a vida. Ele era o inovador e, em simultâneo, o cliente da sua inovação. Como cliente foi rechaçando as inúmeras soluções que ia testando. Depois de anos de trial & error chegou a uma escova que resolvia o seu problema. O que fazia num dia passou a ser feito numa hora.

Patenteou a sua solução. Despediu-se e começou a fazer escovas. Fabricava as escovas durante a noite e, durante o dia visitava potenciais clientes para lhes apresentar/entregar o produto.

Os anos de experiências fizeram dele um especialista em escovas, quer no tipo de materiais usados, quer em formas e outras possibilidades. Nesta fase o Braun fundador não tinha acesso à escala, era um artesão. O know-how adquirido permitiu que desenvolvesse escovas para animais, para culinária, para têxteis, até para queijos. O seu entusiasmo e paixão era o adequado para uma economia local e artesanal, embora já tivesse uma pequena fábrica. Era um artista, sempre pronto a desenhar soluções específicas para problemas específicos. Por exemplo, desenvolveu uma escova para limpar ecrâns de cinema, uma actividade em crescimento na altura dos primeiros anos da empresa.

A Fase II - Industrial
Anos 50 do século passado, a fase artesanal entrou em declínio. A empresa passou para as mãos do genro do filho do fundador. O investimento público em vias de comunicação tornou a economia americana nacional em vez de local. [Moi ici: Como não recordar "Decisões de localização (parte I)"] Assim, um pequeno fabricante de escovas em New York podia servir clientes no Alabama, Colorado e Oregon. 

Enquanto durante duas gerações a Braun apostou na diversidade de escovas para fins específicos, os novos tempos exigiam abraçar a comoditização. Seleccionar as escovas com maior mercado potencial, descartar as restantes e escalar a produção o mais possível para vencer a corrida
Os anos 50 do século passado representaram a transição do artesanal para a linha que aprendemos com Terry Hill:
Redução da variedade de modelos ao mínimo, para evitar a perda de tempo em alterações de setup. Era mais lucrativo produzir em massa e encontrar novos mercados para escoar a mercadoria. A empresa já não precisava de artistas, a ciência e a gestão eram a solução.

O actual CEO entrou na empresa chefiada pelo pai nos anos 80 do século passado. Ao longo dos anos 90 ele almoçava diariamente com o pai, analisavam os números do negócio e estavam sempre em desacordo num ponto: o filho (Lance) dizia ao pai que a empresa deveria voltar às suas raízes iniciais e  concentrar-se na criação de novos tipos de escovas, escovas UAU!, escovas com emoção. Ao longo desses primeiros 10 anos Lance tinha feito amizade com um artista que fazia esculturas com as escovas. O pai ria-se e dizia que ele era tolo.

A Fase III - O choque chinês (Recordar esta série de 2010)
Entretanto, ao longo desses anos 90, os fabricantes chineses começaram a enviar um grande número de escovas para os Estados Unidos. Inicialmente concentraram-se nos modelos mais baratos vendidos   pela distribuição grande. Eram escovas de qualidade inferior. No entanto, ano após ano, as escovas importadas da China ficavam cada vez melhores e começavam a invadir áreas mais especializadas. 

Durante as conversas ao almoço com o pai, Lance avisava-o que os chineses em breve começariam a fazer mossa no seu negócio. O pai ria-se. Em 2002, no entanto, as fábricas chinesas começaram a fazer exatamente os tipos de escovas que a Braun produzia. As escovas chinesas eram muito mais baratas e, Lance teve que admitir, quase com a mesma alta qualidade quanto as da Braun. Os seus avisos para o pai tornaram-se cada vez mais desesperados. Ele temia que um dia o negócio colapsasse. O pai achava que ele era um exagerado.

Entretanto, o pai autorizou a compra do primeiro computador, que o filho aproveitou para criar bases de dados sobre os clientes, as vendas e os custos. Assim, ficou cada vez mais ciente da mutação em curso no mercado.

Lance e o pai pertenciam a mundos diferentes e tinham desenvolvido visões totalmente diferentes sobre a Braun Brush e, mais amplamente, sobre a economia americana na era da tecnologia e comércio. O pai, cresceu na América do pós-guerra, quando os Estados Unidos dominavam quase todos os mercados globais com seus produtos, um mundo em que a chave para um negócio bem-sucedido era o volume de vendas. Nesse tempo, a maioria das empresas prosperava vendendo commodities: jogando pelo seguro e vendendo a mesma coisa repetidamente. O pai queria vender o maior número possível de escovas ao maior número possível de pessoas. O seu objetivo era nunca perder uma venda. Se fosse preciso baixava os preços, prometia entregar escovas mais rapidamente - qualquer coisa para conseguir essa venda.

Lance irritava-se com este posicionamento da empresa, usava o computador para mostrar ao pai que linhas inteiras de modelos da empresa não eram lucrativas, ou que podiam vender milhões de certos tipos de escovas e continuar no mesmo sítio. A famosa maldição da Rainha Vermelha.

Até que o pai morreu... duas semanas para fazer o luto e, depois.

A Fase IV - Mongo
A propósito de Mongo - recordar "1 Origem de uma metáfora", ou "Estranhistão ... weirdistão"

Ao regressar começou logo a trabalhar na mudança. Reuniu a equipa comercial e comunicou que a partir desse dia não venderiam uma única escova em concorrência directa com as importações baratas da China. Se uma fábrica chinesa pudesse fazer um modelo de escova razoavelmente semelhante, a Braun sairia completamente dessa linha. A Braun deixaria o negócio das commodities e entraria no campeonato das escovas altamente especializadas. A Braun deixaria a competição pelo preço e volume. Voltariam às raízes do bisavô, voltariam à arte e à Economia da Paixão. Como não recordar o Evangelho do Valor!!!

As escovas especializadas, tinham grandes margens de lucro. Elas seriam desenhadas para clientes com necessidades tão específicas que não haveria concorrência. O problema era o esses clientes serem raros. Lance disse à equipa que o sucesso não viria do número de vendas que eles fizessem, mas da qualidade das vendas. E mais, passou a mensagem de quanto mais baixo o tamanho da encomenda, menor a probabilidade de haver concorrentes a competirem por essa mesma encomenda. E se não houvesse concorrência, a Braun poderia apresentar preços baseados no valor que aportavam aos clientes e não com base nos custos. Clientes em busca de uma escova única pagariam um preço-premium por ela.

Lance iniciou a transição para uma empresa de escovas especializadas aproveitando uma oportunidade inesperada. Recordar o princípio da limonada na parte X. Recebeu um telefonema de uma pessoa que acabara de concluir uma inspecção de rotina a uma central nuclear. Esse inspector percebeu que as escovas que estava a usar na limpeza do sistema de refrigeração da central geravam riscos de segurança. Lance desenhou uma escova, levou várias para a central e, após uma bateria de testes, conseguiu provar que eram seguras. 

Hoje, essas escovas são usadas em geradores nucleares em todo o mundo. E as centrais nucleares economizam milhões de dólares por ano à custa de um modelo de escova que custa 12 dólares em matérias-primas.

É exatamente isto que os empresários da Economia da Paixão devem procurar: um produto cujo preço seja determinado pelo valor que fornece ao cliente, não pela matéria-prima usada para fabricá-lo.

Hoje a empresa ainda faz pincéis, é claro, mas seus lucros não provêm da fabricação de um produto físico. Os seus lucros provêm da criatividade, do conhecimento e do pensamento que entram nesses produtos. Os seus lucros provêm do valor que é gerado na vida dos clientes. Lance tornou-se um especialista em pincéis personalizados. 

Lance descobriu algo que suspeitava nos dias em que implorava ao pai que mudasse a estratégia da empresa: é possível ganhar muito mais dinheiro produzindo muito menos escovas quando as escovas criadas resolvem problemas fora do comum de uma empresa ou de um indivíduo. Lance costuma cobrar milhares de dólares por essas escovas, e os seus clientes pagam a conta com prazer porque as escovas permitem-lhes economizar muito mais do que isso.

Lance agora faz quinze mil tipos diferentes de escovas com uma equipe de trinta fabricantes de pincéis - ou, mais precisamente, artesãos. Ele vende várias escovas exclusivas, feitas sob medida para as necessidades específicas de uma pequena base de clientes. Recordar esta figura de "Muitos picos, muita arte"
Além disso, Lance faz algo que teria horrorizado seu pai. Anualmente, elimina centenas de referências de escovas do catálogo da empresa. Frequentemente, essas referências são exactamente as escovas que têm o maior volume de vendas, mas a menor margem de lucro. Se alguém na China pode fazer a mesma escova com aproximadamente o mesmo nível de qualidade, a Braun abandona a linha.

Outro exemplo, a Marlin:


quinta-feira, março 12, 2020

Second-order thinking...


Na última semana recordei duas frases da autoria do Aranha:

  • "Não me venha com os seus factos que eu tenho os meus argumentos!"
  • "Quando o empresário português tem um problema, saca da carteira e compra uma máquina!"
Na mesma última semana várias conversas acabaram por aflorar dois temas clássicos no blogue:
Há um ditado que volta e meia Nassim Taleb usa:
  • Good fences make good neighbours
Hoje em dia, quando vejo imagens de gente que quer deitar para o caixote do lixo da História a existência de fronteiras penso sempre nos jogadores amadores de bilhar e no tal ditado.

Há dias, enquanto conduzia ouvi "Chesterton’s Fence: A Lesson in Second Order Thinking". Recomendo vivamente a leitura:
"When we seek to intervene in any system created by someone, it’s not enough to view their decisions and choices simply as the consequences of first-order thinking because we can inadvertently create serious problems. Before changing anything, we should wonder whether they were using second-order thinking. Their reasons for making certain choices might be more complex than they seem at first. It’s best to assume they knew things we don’t or had experience we can’t fathom, so we don’t go for quick fixes and end up making things worse."
Este trecho que se segue fez-me recordar "Most thinking stops at stage one":
"Second-order thinking is the practice of not just considering the consequences of our decisions but also the consequences of those consequences. Everyone can manage first-order thinking, which is just considering the immediate anticipated result of an action. It’s simple and quick, usually requiring little effort. By comparison, second-order thinking is more complex and time-consuming. The fact that it is difficult and unusual is what makes the ability to do it such a powerful advantage." 
Na última Terça-feira vimos as imagens do primeiro-ministro holandês fazer um discurso sobre novos comportamentos e, depois, o seu lado "fast" actuou e instintivamente fez o contrário do que tinha acabado de pregar. Pena que a cena dos amadores a jogar bilhar seja tão comum quando se toma a decisão de comprar uma máquina e, não se considera se ela viola as orientações estratégicas à la Terry Hill.

terça-feira, julho 16, 2019

Azeite, estratégia e valor

"O azeite do olival superintensivo tem qualidade?
Em 31 azeites premiados no mais importante concurso nacional, 27 nasceram das nossas variedades tradicionais e 4 de variedades estrangeiras. Curioso, não?"
Não! Não tem nada de curioso.
Curioso seria os produtores do olival superintensivo andarem no campeonato dos concursos sobre qualidade de azeite.

A produção superintensiva está no campeonato da eficiência, no campeonato do volume, no campeonato do custo mais baixo. Por isso, recorre a variedades de azeitona que maximizem a capacidade produtiva, não necessariamente o sabor ou outros parâmetros valorizados no azeite. O que interessa é maximizar a produção de algo que legalmente seja considerado azeite. E é azeite.

Quem participa em concursos para ganhar está no campeonato do preço mais alto. Por isso, cultiva a diferenciação, por isso cultiva coisas como autenticidade, tradição, experiência, sustentabilidade, humanidade. Um campeonato completamente diferente.

Enquanto o primeiro grupo está na race to the bottom, sempre em busca de umas migalhas de percentagem de mais eficiência, e concentra a sua atenção no denominador, o segundo grupo cultiva o numerador, trabalha para a eficácia.

Os concursos são uma forma de influenciar a percepção dos potenciais compradores acerca da qualidade do azeite através da opinião de painéis de especialistas e connaisseurs (influenciadores).

Qualidade tanto é ausência de defeitos (e mais qualidade é mais barato), como é mais atributos (e mais qualidade é mais caro).
“The reason the alchemists gave up in the Middle Ages was because they were looking at the problem the wrong way – they had set themselves the impossible task of trying to turn lead into gold, but had got it into their heads that the value of something lies solely in what it is. This was a false assumption, because you don’t need to tinker with atomic structure to make lead as valuable as gold – all you need to do is to tinker with human psychology so that it feels as valuable as gold. At which point, who cares that it isn’t actually gold?
If you think that’s impossible, look at the paper money in your wallet or purse; the value is exclusively psychological. Value resides not in the thing itself, but in the minds of those who value it. You can therefore create (or destroy) value it in two ways – either by changing the thing or by changing minds about what it is.”
Recordando os azuis, vermelhos e pretos de Terry Hill:
Produtores de olival superintensivo a participar em concursos fariam o papel dos vermelhos da figura,  organizações sem estratégia, stuck-in-the-middle.


Trecho retirado de "Alchemy: Or, the Art and Science of Conceiving Effective Ideas That Logical People Will Hate" de Rory Sutherland.

quarta-feira, fevereiro 20, 2019

Paisagens enrugadas

O que acontece à necessidade, quanto á importância de ter uma estratégia e de monitorar as consequências da sua adopção quando se caminha para Mongo?
Mongo significa paisagem cada vez mais enrugada.
"An adaptive landscape is a mapping from a high-dimensional space of genotypes onto fitness or some other related quantitative phenotype, which defines the ‘elevation’ of each coordinate in genotype space. Evolution can be viewed as a hill-climbing process in an adaptive landscape, where populations tend to move towards peaks as a consequence of natural selection.
...
An adaptive landscape that is smooth and single peaked does not pose any obstacle to evolutionary exploration. It is therefore highly navigable, in that it is possible to reach the global peak via positive selection through a series of small mutations that only move ‘uphill’. In contrast, a rugged landscape can block the approach to the highest peak by entrapping populations on local suboptimal peaks.
...
We define landscape navigability as the ability to access a global peak via an evolutionary exploration involving random mutation and natural selection. Landscape navigability is highest when all mutational paths to the global peak exhibit a monotonic increase in binding affinity, which implies a landscape that is smooth and single peaked. Landscape navigability is lowest when no mutational paths to the global peak exhibit a monotonic increase in binding affinity. This implies a rugged landscape with many peaks.
...
The number of peaks in an adaptive landscape is an important indicator of its navigability. The more peaks a landscape has, the less navigable it becomes, if the peaks are of unequal height."
Trechos retirados de "A thousand empirical adaptive landscapes and their navigability" de José Aguilar-Rodríguez, Joshua L. Payne and Andreas Wagner, publicado por Nature Ecology & Evolution 1, 0045 (2017)

quarta-feira, janeiro 30, 2019

É nestes momentos de mudança ... (parte V)

Parte Iparte IIparte III e parte IV.

Vamos lá então começar a partir daqui:
Voltemos ao "soul searching", à busca do ADN:
E vamos usar um exemplo que só conheço dos jornais (aqui e aqui). Por isso, vamos efabular. Como não temos relação com a empresa temos liberdade de inventar.

Imaginem uma empresa que trabalha o vidro e o alumínio fabricando caixilhos e janelas. É mais uma empresa entre tantas e tantas na área. Uma área que fornece o sector da construção civil, um sector que em Portugal, entre 2001 e 2014, esteve sempre a cair, mês após mês. Imaginem que algures, naquele período negro da construção civil, a gestão da empresa deliberadamente olhou para si, olhou para o que tinha, olhou para o seu CV ...

- Não podemos continua assim!!! Os clientes estão sempre a apertar com reduções de preço!

Este é o mundo da empresa:
Produz janelas a pedido de empreiteiros pequenos e grandes na sequência de propostas que elabora de acordo com cadernos de encargos. Para ganhar as adjudicações sabe que o cliente basicamente só valoriza uma coisa, o preço. 

Porque a empresa não tem dimensão para ter a vantagem da escala, competir pelo preço sem ter custos competitivos é uma violação da primeira lição da Teoria dos Jogos: "Do not play a strictly dominated strategy". Então, alguém recorda:

- Lembram-se do trabalho que fizemos para o arquitecto X? Não o conhecíamos de lado nenhum, porque ele mora aqui perto passou por cá com uma ideia na cabeça. Ajudámo-lo a desenvolver a ideia. Ele gostou do que viu e deu ordens ao empreiteiro da obra em que estava a trabalhar para nos encomendar as janelas.

- Sim, nesse trabalho o empreiteiro não nos espremeu como é costume, porque tínhamos o arquitecto do nosso lado.

- Até que ponto é que podemos trabalhar com mais arquitectos na elaboração dos cadernos de encargos?

Na prática estão a descobrir que o seu negócio não deve ser janelas e caixilharias, mas serem uma ferramenta, um instrumento ao serviço dos arquitectos. Estão a imaginar um novo mundo para a empresa:
- Quem nos paga, os clientes, os empreiteiros, têm de ser bem servidos, para não levantarem ondas junto dos arquitectos, mas quem manda são os arquitectos.

Tenho de meter aqui um trecho de Richard Normann que explica o que está em curso:
"take stock of what (one has), yet distance (oneself) from it and explore new territory. The crane [Moi ici: um processo conceptual e experimental para desenhar Sistemas de Criação de Valor] must be able to bend minds. I must open up a conceptual space beyond what is known and can be imagined today, and it must then allow (one) to fill that conceptual space with new design. It must start from where (one is) — here and now, take (one) into unchartered territory, yet allow (one) to come back with new insights and start concrete construction work on a reframed business strategy."
- Então, temos de nos concentrar nos arquitectos. Que arquitectos? Todos? Ou algum grupo em particular? Por que é que esses arquitectos hão-de querer trabalhar connosco? Por que é que esses arquitectos hão-de recear trabalhar connosco?

Uma descoberta importante... a descoberta da heterogeneidade da procura. Recordar Hill em 2008 e o "watering down" de anteontem. A verdade é que há muitos arquitectos, a maioria, que se está marimbando para as janelas e caixilharias, mas há um grupo que as valoriza. Há um grupo que sabe que é valorizado, e quer distinguir-se perante os seus clientes, e perante os seus pares, por introduzir arte e desafiar as limitações dos materiais e da engenharia. Acabamos de introduzir mais outra parte interessada:
- Por que é que um Gabinete de Arquitectura há-de escolher os nossos serviços?
Na parte III falámos no exemplo de Bruce Jenner, por causa da necessidade de alinhamento de uma organização com a sua proposta de valor:
E o alinhamento começa pela actividade comercial. Uma actividade comercial que procura fugir do preço como o "order winner" e que se desenvolve em torno da resposta a um conjunto de questões:
  • Onde é que estes arquitectos andam? Que "prateleiras" metafóricas visitam?
  • Quem os pode influenciar?
  • Quem manda neles?
  • De que têm medo?
  • O que os motiva?
  • O que os pode impedir de optar pelas nossas soluções? (Ansiedade e inércia)
  • O que os pode levar a optar pelas nossas soluções? (Dificuldades actuais e magnetismo do sucesso)
As respostas a estas perguntas dão matéria-prima para definir o que fazer sistematicamente para se dar a conhecer a potenciais arquitectos: feiras; comunicação; conteúdos.

As respostas a estas perguntas fazem aparecer a necessidade de trazer para o ecossistema uma nova entidade: parceiros que trazem know-how sobre novas formas de trabalhar os materiais, e de esticar as fronteiras de uso do vidro:
Podem ser fornecedores, podem ser universidades, podem ser entidades que ajudam a empresa a encontrar novas soluções. Gente que tem de ser trabalhada e visitada, gente que tem de ter a porta aberta para ganharem algo também.

O retrato das razões porque um arquitecto-alvo há-de trabalhar com a empresa pode ser actualizado:


Pára tudo!

Quando é que falas do balanced scorecard?

Quando chegar a altura. O balanced scorecard é uma boa ferramenta para executar e monitorizar a execução de uma estratégia, mas primeiro temos de formular a estratégia.

Continua.