Há tempos, usei esta imagem:
E outra parecida, para promover umas
sessões de coaching sobre sistemas de gestão. Na "landing page" escrevi:
"Procedures written years ago — by people who've already left.
Too much paperwork nobody reads.
Too little connection between what’s written and what’s done."
Era — e continua a ser — o retrato fiel de muitas organizações.
Os procedimentos foram escritos aquando da implementação inicial do Sistema de Gestão da Qualidade: uma espécie de "instalação 1.0". O tempo passou, o contexto mudou, as pessoas que conheciam o sistema saíram, e aquilo que era claro e útil começou a encher-se de pequenas camadas: anexos, remendos, excepções, atalhos, práticas antigas que ninguém usa, mas que continuam lá, fossilizadas.
"Layering over, not uninstalling."
Acrescenta-se. Nunca se remove. Até que, imperceptivelmente, o sistema transforma-se num monstro: pesado, incoerente, difícil de seguir, impossível de explicar.
A imagem do Frankenstein é perfeita exactamente por isto: cada parte foi, em algum momento, adicionada com a melhor das intenções. Mas o resultado final? Uma criatura desajeitada, lenta, disforme e incapaz de cumprir o papel para o qual foi criada.
E é curioso como o seu argumento é exactamente o que tenho visto e escrito ao longo dos anos — mas dito com a clareza conceptual que só ele tem. Martin explica que os sistemas de gestão, quando não são mantidos, acumulam camadas — regras, procedimentos, políticas e artefactos que já não se encaixam entre si:
“Management systems tend to accumulate over time like barnacles on the hull of a ship.”
Barnacles. Cracas presas ao casco de um navio.
E tal como as cracas tornam o barco mais lento, instável e ineficiente, os sistemas de gestão cobertos de resíduos do passado transformam-se em máquinas de fricção. Não ajudam — atrapalham.
O resultado?
Desvio estratégico. Lentidão. Capacidade de execução reduzida. E uma sensação difusa de que a organização está sempre atrasada, sempre presa, sempre a entrar em reuniões para discutir o que "já devia estar a funcionar".
Martin resume numa frase aquilo que qualquer consultor, auditor ou gestor sente todos os dias:
"In this way, if the WTP/HTW choice is the heart of strategy, then MHC are the muscles and EMS its nervous system — the network of signals, incentives, and feedback loops that translate strategic intent into coherent, day-to-day action."
Ou seja: O sistema nervoso tem de fazer com que os músculos trabalhem ao serviço do coração.
Traduzido para a realidade das organizações:
- O sistema tem de reflectir a realidade, não uma ficção confortável.
- O sistema tem de orientar as decisões, não de as bloquear em nome de uma conformidade bacoca.
- O sistema tem de simplificar a acção, não de adicionar camadas de complexidade.
- O sistema tem de ligar a execução ao que realmente interessa — a estratégia, o propósito, a criação de valor.
Um SGQ que não faz isto é apenas papel. Papel morto. Papel que assusta, se arrasta e olha para nós com aquele ar de Frankenstein institucional.
O que Martin chama “barnacles”, eu vejo todos os dias como:
- procedimentos com 20 páginas quando bastariam 2;
- instruções escritas há 10 anos por pessoas que já nem lembramos;
- práticas que mudaram no chão de fábrica mas continuam no papel;
- auditorias internas feitas como checklists automáticas;
- equipas que já não acreditam no sistema porque o sistema já não acredita nelas.
No fundo, tanto Martin como eu estamos a dizer a mesma coisa: Um sistema de gestão deve ser vivo. Respirar.
Atualizar-se. Acompanhar a mudança.
Ser uma ferramenta de clareza — nunca de confusão.
E se isso não está a acontecer?
Então não tem um sistema de gestão.
Tem um Frankenstein.