sábado, maio 31, 2025

Curiosidade do dia


Quando falo sobre o tema recordo sempre:
  • Mt 10, 14
  • Mc 6, 11
  • Lc, 9, 5

"An exodus of educated Italians searching for better opportunities abroad is exacerbating the economic strain of a rapidly ageing labour force, the governor of the Bank of Italy has warned.

Fabio Panetta said Italy must take more action to retain its human capital - and ensure young people are productively employed to support growth. "Attractive employment opportunities need to be created for the many Italians who leave the country in search of better prospects," said Panetta yesterday.

About 156,000 Italians left the coun try last year for Germany, Spain, the UK and elsewhere, a 36.5 per cent increase over those who emigrated in 2023.

At just under 191,000, the total number of people who left Italy in 2024 - including 35,000 long-term foreign residents, mainly Romanians returning home - was at the highest level in a quarter of a century, according to Italy's official statistics agency, Istat.

...

Panetta said one factor driving people overseas was that real wages in Italy are currently below the levels they were in 2000, pushed down by the inflationary impact of the post-pandemic period."

Itália está semelhante:

A geração do Maio de 68 é uma desgraça.

Trechos retirados do FT de hoje em "Italy's exodus of young talent worsens population squeeze".  

Inovação vs tamanho



Este trecho do podcast levanta uma questão recorrente mas sempre pertinente: porque razão são, tantas vezes, as empresas pequenas mais inovadoras do que as grandes?

De forma quase caricatural — mas não menos verdadeira — Sinek descreve o paradoxo:

As empresas grandes têm dinheiro, talento e acesso aos mercados... e, mesmo assim, são das organizações menos inovadoras do planeta.
As pequenas empresas, sem recursos, sem notoriedade e a operar em condições de mercado adversas, conseguem frequentemente apresentar ideias disruptivas.
Resultado: as grandes compram as pequenas quando querem inovar. Não criam, adquirem inovação.
A explicação que Sinek propõe é particularmente interessante:
"I think the reason is because when you're small your ambitions are bigger than the resources you have to achieve those ambitions. Every small business has outsized ambitions"
Ou seja, a inovação nasce não do conforto, mas da tensão entre o desejo e a limitação. A pequena empresa está numa espécie de estado de sobrevivência visionária: precisa de provar que merece existir, de conquistar espaço, e para isso tem de ser criativa, rápida, audaz — até irracional. As suas aspirações parecem, por vezes, “objectivamente estúpidas” quando comparadas com os meios que tem... e, no entanto, algumas conseguem.

Nas empresas grandes, pelo contrário, o excesso de recursos tende a gerar inércia. Os processos são mais rígidos, a aversão ao risco é maior, a ambição já foi convertida em controlo — e quando a inovação ameaça destabilizar o status quo, é mais fácil ignorá-la ou comprá-la do que cultivá-la.

Este trecho é um excelente ponto de partida para discutir o papel da escassez como catalisador de criatividade, e da abundância como âncora da repetição.

Ou, dito de forma provocatória: as ideias nascem da falta, não do excesso.

sexta-feira, maio 30, 2025

Curiosidade do dia

Em 2018, a Payless ShoeSource, uma retalhista norte-americana de calçado a preços acessíveis, realizou uma campanha de marketing invulgar para desafiar percepções sobre valor e marca no sector da moda.

A Payless criou uma loja fictícia de luxo chamada "Palessi" num centro comercial para o segmento alto em Los Angeles, ocupando o espaço anteriormente utilizado por uma loja da Armani. A loja foi meticulosamente decorada com manequins dourados, uma estátua de anjo e expositores elegantes para simular uma boutique de designer, ver o vídeo abaixo. Foram também criadas uma presença online e contas em redes sociais para dar credibilidade à marca inexistente. 

A empresa convidou cerca de 60 influenciadores de moda para a inauguração da loja, apresentando os sapatos como criações do fictício designer italiano "Bruno Palessi". Os calçados, na realidade, eram produtos da Payless, normalmente vendidos entre $20 e $40, mas foram etiquetados com preços até $645.

Os influenciadores elogiaram a qualidade e o design dos sapatos, descrevendo-os como "elegantes" e "sofisticados", sem suspeitar da verdadeira origem dos produtos. Alguns chegaram a pagar centenas de dólares por pares que, na verdade, eram modelos económicos da Payless. Após as compras, a empresa revelou a verdadeira identidade dos sapatos, reembolsou os participantes e permitiu que ficassem com os produtos.

A iniciativa visava demonstrar que a percepção de valor está frequentemente mais associada à marca e à apresentação do que à qualidade intrínseca do produto. A campanha gerou ampla cobertura mediática e discussão nas redes sociais, destacando como o branding pode influenciar significativamente as decisões de compra dos consumidores. 

Mais informação aqui

Para reflexão por quem anda entretido com tarifas alfandegárias sobre a Temu ou a Shein.

Está na moda. Mas será que muda? (Parte V)

Parte Iparte II, parte III e parte IV.

Na passada terça-feira de manhã publiquei aqui no blogue a parte IV desta série onde referi:

"O paralelismo com a inteligência artificial (IA) é evidente: as empresas que apenas "acoplam" ferramentas de IA aos processos actuais não verão grandes benefícios. A transformação verdadeira exige reconfiguração organizacional, redesenho de processos, revisão de papéis e até de modelos mentais."

Depois, no Think Tank ao final do dia ouvi, entre o minuto 14,00 e o minuto 15,30.


Ainda me lembro de familiar a trabalhar no estado, durante os anos de Sócrates, a ter formação sobre processos e ... a sua equipa achar que um processo é uma pasta que reúne informação sobre um aluno ou um professor. 

Dá para ter uma ideia da qualidade da formação.

Mas o ponto é, sem mapear processos, sem cartografar o que se faz por quem e quando, como ponto de partida, tudo o resto é conversa.

quinta-feira, maio 29, 2025

Curiosidade do dia

Em Outubro de 2010 escrevi em "Qual é o recurso mais escasso?":

"Pobre indústria têxtil ... acorrentada a uma associação que ainda não viu a luz, que ainda não percebeu que as empresas portuguesas não podem competir com o Paquistão, não por causa do Paquistão, mas por causa da qualidade de vida dos operários portugueses na indústria têxtil e por causa da saúde económica das empresas têxteis portuguesas.

Enquanto não virem a luz vão continuar a comportar-se como um animal acossado a um canto, entretido a defender-se de um tsunami e a desperdiçar a oportunidade de mergulhar num mundo diferente, no mundo da moda, do speed-to-market, da flexibilidade, da diferenciação, do alto valor acrescentado..."

Em Março de 2013 escrevi ""Por que é que calçado e têxtil têm tido desempenhos tão diferentes?""

Agora estamos em 2025 e continuam distraídos a defender o passado com "Têxtil português exige taxa de 20 euros aplicada àscompras na Temu e Shein". O mundo gira, a moda reinventa-se, a inteligência artificial escreve editoriais — mas a indústria têxtil portuguesa continua firmemente agarrada à bóia do proteccionismo. Desta vez, não é contra o tsunami. É contra a Temu e a Shein. Sim, em vez de nadar, pedem ao Estado que baixe a maré: “Exigimos uma taxa de 20 euros sobre compras nestas plataformas!”

Pensem bem: quando Trump ameaçou erguer barreiras alfandegárias, não faltou quem gritasse contra o proteccionismo retrógrado e as taras do nacionalismo económico. Mas eis que, no conforto da indústria nacional, se ergue a mesma bandeira, agora bordada em pano doméstico e com um selo de “urgência estratégica”.

Talvez um dia percebam que o inimigo não está na China — está na cronologia. E que competir com o século XXI usando argumentos do século XX tem tanto futuro como uma linha de produção a vapor no meio de um desfile da Paris Fashion Week.

Outra vez a treta do "erro humano"

No FT do passado dia 22 de maio encontrei esta peça de horror: "M&S blames human error' for hack":

"Chain says breach came via supplier and warns of £300mn hit to profits

Marks and Spencer expects a £300mn hit to operating profits this year from a cyber attack caused by "human error", as the retailer warned disruption to its online operations would last until July. M&S said yesterday it expected to halve the hit to profits from the attack, which has severely disrupted its business and led to the theft of customer data, through "management of costs, insurance and other trading actions". The cyber attack forced the retailer to shut down its online clothing business for more than three weeks, left it unable to stock its food stores adequately and wiped almost €750mn from its market capitalisation. M&S disclosed for the first time last week that some personal customer data had been stolen.

Chief executive Stuart Machin declined to say whether M&s had paid a ransom to the hackers and said the attack was a consequence of "human error", rather than weakness in its IT systems or cyber defences.

"Threat actors only have to be lucky once, and we didn't leave the door open, so this wasn't anything to do with underinvestment," he added.

Machin confirmed that cyber criminals accessed its systems through socalled social engineering tactics via a third-party supplier, where criminals trick IT staff into changing passwords and resetting authentication processes to gain access. He declined to name the supplier that was compromised."

Recordo sempre um postal de 2006, "Erro humano", mas também estes outros de 2013 e 2018.

É simplesmente doentia a argumentação do CEO da M&S:

Trata-se de um "human error" de um fornecedor - Trava-se a análise no nível mais visível; é cómodo que a acção de investigação cesse a esse nível base. A organização nega a dimensão sistémica; trata-o como acidente isolado a eliminar.

"Threat actors only have to be lucky once, and we didn't leave the door open, so this wasn't anything to do with underinvestment," - Reforça a ideia de azar e exonera a própria estrutura ("não há sub-investimento"), escudando a instituição.

A narrativa pára na porta do fornecedor “culpado” e liberta a organização da introspecção dolorosa que perguntaria, por exemplo:

  • Que lacunas no on-boarding e monitorização de terceiros permitiram o acesso privilegiado?
  • Que controlos de zero-trust ou autenticação multifactor falharam?
  • Porque é que a resposta à intrusão demorou semanas em vez de horas?
  • O equilíbrio entre rapidez de transformação digital e segurança está a ser correctamente ponderado?

Enquanto a justificação de “erro humano” for suficiente para apaziguar accionistas e opinião pública, a cultura de responsabilização individual continuará a impermeabilizar a organização contra a autocrítica sistémica. Só quando a frequência ou a gravidade das quebras se tornar “inaceitável” é que acontecerá a verdadeira reinvenção dos processos. Até lá, ficar-se-á pela gestão de danos – remédio rápido – em vez da cura profunda. Ao tornar o erro explicação suficiente a organização protege-se do incómodo de questionar o sistema. Para evitar reincidências de grande impacto, a organização terá de transitar do ciclo de controlo do quotidiano (apagar incêndios) para o ciclo de melhoria – redesenhar processos, tecnologia e cultura. Caso contrário, a próxima “aspirina” poderá não chegar para baixar a febre.

quarta-feira, maio 28, 2025

Curiosidade do dia

 

Produtividade? Nunca esteve no horário — esteve no recibo. A grande lição do SNS é que o cérebro humano não atinge o pico da concentração às 9 da manhã com café, mas sim ao fim de 35 horas, quando começa a facturar à parte. Afinal, não trabalhamos melhor com menos horas... trabalhamos melhor com mais euros por hora.

Esqueçam a "semana de quatro dias" e a ladainha da flexibilidade: o segredo da motivação não está na gestão do tempo, mas na gestão do suplemento remuneratório. 

O que Rui Tavares não percebeu é que a produtividade não nasce do bem-estar, mas da perspectiva de um acréscimo salarial após o expediente. Estamos, portanto, perante uma revolução epistemológica: o "burnout" não se cura com descanso, cura-se com avenças.

Talvez esteja na hora de repensarmos os modelos de gestão pública: que tal transformarmos todo o horário normal em horário extraordinário? É a única forma garantida de salvar o SNS... e quem sabe, a economia. 

Há automação e automação

Há cerca de um mês publiquei "Fábricas robotizadas? Só se for para montar iPhones, não sapatos". Nele argumentei que a automatização industrial só faz sentido económico quando a produção é altamente repetitiva e pouco variável. A robotização exige estabilidade, previsibilidade e grandes volumes para compensar o investimento. Quando há complexidade, personalização ou variabilidade — como no caso do fabrico de calçado - as máquinas falham em substituir o trabalho humano especializado. 

O artigo era sobre o caso da Nike e o insucesso dos seus projectos de automatização nos EUA, dando muito mais informação sobre os motivos da sua decisão, algo que a Adidas nunca revelou.

Entretanto, na semana passada no WSJ li "Shoemaker Leans on Automation To Expand Its U.S. Production". O artigo é sobre a Keen, um fabricante de calçado nos EUA, e oferece um contraponto interessante à experiência da Nike e da Adidas com a automatização — e permite explorar com mais nuance o tema da viabilidade da produção automatizada em indústrias com uma forte componente manual.

A Keen vai abrir uma nova fábrica no Kentucky que quase duplicará a sua capacidade de produção nos EUA, apostando fortemente na automatização para tarefas repetitivas, enquanto mantém uma parte significativa da produção na Ásia. A automatização será apenas na execução de tarefas básicas, porque continuará a manter trabalhadores humanos para as tarefas mais especializadas.

Podemos fazer o contraponto entre a Keen e a Adidas/Nike:

Keen plans to rely heavily on automation at its new facility, using machinery to handle mundane, repetitive tasks while employing human workers to handle more precise work.” [Moi ici: Tal como Nike e Adidas descobriram, a Keen parece ter aprendido pela observação: automatiza o que é possível (tarefas repetitivas), mas não tenta substituir o saber manual nas partes críticas da produção. Assim, evita o “conto da automatização total” e opta por uma automação parcial, bem aplicada — não substitui, complementa]

A eficiência não está em eliminar o humano, mas em combinar humano + robôt de forma complementar.

Claro que a "senhora gorda" ainda não cantou e apesar de tudo também esta experiência pode vir a falhar.

terça-feira, maio 27, 2025

Curiosidade do dia

O papel da marca, do consultor, da universidade, é o de guia. 

O cliente é sempre o herói e a marca deve assumir o papel de guia - tal como Yoda orienta Luke Skywalker. Os heróis (clientes) acordam "em apuros" e procuram alguém que demonstre empatia e competência; a marca deve fornecer-lhes um plano simples para vencer o "lado negro" que enfrentam. 

Se a marca, o consultor, ou a universidade, se coloca como herói, disputa protagonismo com o cliente e este desliga-se; se se apresenta como guia, conquista confiança e lealdade.


Há pouco mais de uma semana critiquei aqui no blogue umas afirmações do reitor da Universidade de Coimbra. Agora volto a fazer o mesmo a propósito de uma entrevista publicada pelo jornal ECO, "Os nossos empresários não são propriamente inovadores". Algumas pérolas:

""Os nossos empresários, maioritariamente, não são propriamente inovadores, vamos pôr a coisa assim... Não quer dizer que não sejam bons empresários, mas enfim", diz Amílcar Falcão 
...

Embora acredite que o tecido empresarial português "certamente gostaria de acompanhar" a capacidade de inovação das universidades, o facto de ser composto na esmagadora maioria por microempresas — que "têm dificuldade na área de inovação porque vive o dia-a-dia quase muitas vezes de sobrevivência. A inovação não se compadece com isso" — compromete esse objetivo. Até porque "não há instrumentos atrativos" para corrigir a situação.
Amilcar Falcão orgulha-se de ter aumentado o número de patentes registas de 260, em 2019, quando entrou para reitor, para mais de 600."
O reitor generaliza negativamente sobre o tecido empresarial, dizendo que "os nossos empresários... não são propriamente inovadores" , em vez de reconhecer casos de sucesso e promover pontes de colaboração. Centra a responsabilidade da inovação nas empresas, ignorando que as universidades também devem adaptar investigação, linguagem e prazos às realidades do mercado ("as empresas têm uma lógica própria que os investigadores normalmente não acompanham").

Desvaloriza as microempresas, afirmando que vivem "de sobrevivência" e, por isso, "a inovação não se compadece com isso" , quando estas representam a maioria do tecido produtivo e podem inovar de forma incremental.
Foca-se em patentes e royalties como métricas-chave de transferência de tecnologia, esquecendo outros indicadores de impacto industrial (co-desenvolvimento, protótipos, adopção no mercado).

Ou seja, ao colocar o ónus quase exclusivo nas empresas e destacar predominantemente métricas internas da universidade, o reitor posiciona-se como "herói" da inovação académica, em vez de agir como guia que compreende os desafios quotidianos das empresas e lhes oferece planos concretos, simples e partilhados para inovar - ele, ou a universidade, é que é o herói... e isso mina tudo o resto.

Está na moda. Mas será que muda? (Parte IV)



Parte I, parte II e parte III.

Na parte I escrevi:

"Durante a conversa nocturna a certa altura recordei o paralelismo entre a transição do vapor para a electricidade, e fiquei com a incerteza sobre como será a transformação com a inteligência artificial e quanto tempo demorará. (Voltarei a este paralelismo mais tarde)"

Agora recordo:

A transição do vapor para a electricidade não foi imediata nem automática, demorou cerca de 30 a 40 anos. As fábricas inicialmente só acrescentaram a iluminação para ganhar mais uma hora de trabalho, depois trocaram o motor central sem repensar a disposição das máquinas. Só mais tarde, ao perceberem o novo potencial (motores eléctricos junto às máquinas), é que reconfiguraram as linhas e foram capazes de libertar ganhos exponenciais.

O paralelismo com a inteligência artificial (IA) é evidente: as empresas que apenas "acoplam" ferramentas de IA aos processos actuais não verão grandes benefícios. A transformação verdadeira exige reconfiguração organizacional, redesenho de processos, revisão de papéis e até de modelos mentais.

A IA, como a electricidade, não é apenas uma nova tecnologia, mas um novo paradigma de funcionamento. Ignorar isso é correr o risco de ficar preso num “modelo mental a vapor com ferramentas eléctricas”.

A IA exige dados e clareza; se os processos forem confusos ou tácitos, é impossível automatizar ou optimizar com inteligência, e se os dados são compilados em folhas de Excel ... 

Um consultor com experiência real em processos pode:
  • Diagnosticar ineficiências escondidas: onde o trabalho humano serve apenas para compensar as falhas do sistema.
  • Redesenhar processos com vista à automação: identificando tarefas repetitivas, decisões baseadas em regras, ou pontos de manuseamento de dados.
  • Mapear o fluxo de dados e conhecimento: pré-requisito para qualquer aplicação de IA útil.
  • Formar equipas para pensar em termos de processos, e não de departamentos: condição essencial para aproveitar o potencial da IA.
Se a sua empresa está a “ligar motores eléctricos” mas continua organizada como uma fábrica a vapor, talvez esteja na altura de parar para repensar.

A inteligência artificial só cria valor real quando assenta sobre processos claros, dados fiáveis e equipas preparadas para trabalhar de outro modo.

Se sente que há vontade de avançar mas falta estrutura, linguagem comum ou clareza nos processos — é aí que posso ajudar.

Mapear, clarificar, redesenhar: o ponto de partida não é o algoritmo. É o processo.

Fale comigo. Vamos descobrir onde está o seu potencial por desbloquear.

Continua.

segunda-feira, maio 26, 2025

Curiosidade do dia

Hoje no JdN, "Cerca de 30% das subvenções do PRR estão a pagar despesas correntes":

"Apesar de desaconselhado, as regras do PRR permitem financiar algumas despesas correntes específicas relacionadas com investimentos e reformas a concretizar. Em Portugal, 4.310 milhões foram usados para pagar esse tipo de despesa.

...

parte do envelope financeiro a que Portugal tem direito, está a ser usada para pagar despesas correntes. Uma análise do Eurostat revela que cerca de 30% das subvenções do PRR"

Qual é a novidade? Os apoios comunitários servem para assar sardinhas com fósforos

Uma tristeza que confirma o que há muito escrevo no blogue sobre o uso de apoios e subsídios para reduzir custos, para adiar a morte:

Estratégia e a equipa de vendas

 

Os trechos que se seguem parecem retirados deste blogue ao longo de toda a sua existência. Trechos acerca da importância de focar a atenção nos clientes-alvo, de perceber quem são, o que valorizam e qual é a nossa proposta de valor:
"If you're trying to lead growth of any kind, from revenue to margin expansion, it's critical that your sales organization has a clear understanding of your go-to-market strategy. Here are three areas to focus on to ensure your sales team not...
Does your organization sell what you want, to whom you want, the way you want? Or do you have too many instances of selling whatever you can, to whomever you can, however you can? If your strategy is built on winning in specific target markets with solutions you've invested in to drive high-margin growth, the latter approach undermines that focus.
...
If you’re trying to lead growth of any kind—from revenue to margin expansion, to market share, wallet share, etc.—it’s critical that your sales organization has a clear understanding of your go-to-market strategy. This starts with the CEO and executive team members, and how well they communicate the strategy. Then it cascades to every level of sales leadership in the company."
Depois, os autores sistematizam o que comunicar à equipa de vendas:
  • 1. Identify the kinds of business you expect sales not to pursue: Muitas equipas comerciais desperdiçam recursos com clientes que não são adequados. Para evitar isso, é fundamental alinhar a estratégia da empresa com as acções da equipa de vendas, definindo com precisão o perfil do cliente-alvo — incluindo sector, dimensão e contexto — e identificando quem tem autoridade real para efectuar a compra. O erro mais comum nas vendas B2B é concentrar esforços em contactos sem poder de decisão, ignorando aqueles que podem realmente comprar.
  • 2. Clarify your company's competitive advantage: Para cada tipo de cliente ou potencial cliente, há geralmente algumas razões específicas pelas quais escolherão a sua empresa em vez da concorrência. As equipas de vendas devem conhecer com clareza quais as vantagens competitivas que devem realçar, compreendendo profundamente os pontos de valor e diferenciação da empresa, bem como os problemas e objectivos dos clientes que justificam as soluções premium oferecidas. Sem este entendimento, os vendedores tendem a recorrer a listas genéricas de características e benefícios. 
  • 3. Emphasize how the sales experience is the customer experience (CX): A experiência de vendas é uma parte fundamental da experiência do cliente e representa, por si só, 25% ou mais da decisão de trabalhar com uma empresa — mais do que o serviço ou a marca, e apenas superada pelos próprios produtos ou serviços. Se essa primeira etapa não for convincente, os potenciais clientes afastam-se logo no início. Num mercado onde as ofertas são cada vez mais semelhantes, é a qualidade da experiência de vendas que pode fazer a diferença. Os vendedores devem compreender que cada interacção com o cliente é uma oportunidade para concretizar a estratégia de experiência do cliente da empresa.

domingo, maio 25, 2025

Satigny

Quando eu for grande quero morar aqui:






Acerca dos artesãos


No The Times do passado dia 19 de Maio li "Our hard graft to save rare crafts".

O artigo do The Times destaca o esforço de um pequeno grupo de artesãos no Reino Unido para preservar competências artesanais consideradas em risco de extinção. 

A reportagem sublinha que, apesar da sua raridade e aparente falta de aplicabilidade prática, estas competências são cultural e artisticamente valiosas. A sua sobrevivência depende de oportunidades de transmissão entre gerações, reconhecimento público e esforço contínuo para adaptar tradições ao mundo contemporâneo.

Um artigo que me deixa com mixed feelings e que retrata a situação de muitas PME. Por um lado:
  • Investir numa competência rara ou num saber fazer especializado pode ser um poderoso factor de diferenciação. Em vez de competir por preço, uma PME pode destacar-se pela qualidade, originalidade ou exclusividade da sua oferta.
  • Há oportunidades de negócio em nichos que outros abandonaram. O facto de algo ser considerado "fora de moda" ou "não escalável" pode ser uma vantagem competitiva — desde que haja clientes que valorizem essa proposta.
  • Contar a história da empresa, dos produtos e das pessoas que os criam pode acrescentar valor aos olhos do cliente. Autenticidade, sustentabilidade e qualidade percebida podem justificar preços mais elevados e fidelizar clientes.
  • Preservar o legado não significa resistir à mudança. Muitas PME com raízes artesanais ou familiares podem modernizar-se sem perder a alma — desde que consigam adaptar processos, canais e linguagens às exigências actuais.
Por outro:
  • Muitos ofícios artesanais não garantem um rendimento estável nem previsível. Mesmo com produtos de qualidade e prestígio, os mercados são pequenos, sazonais ou dependentes de encomendas pontuais. A ausência de escala e a dificuldade em fixar preços que reflictam o trabalho envolvido tornam estes ofícios financeiramente pouco atractivos para novos talentos.
  • Longo tempo de aprendizagem, retorno lento. Profissões como a pietra dura ou o fabrico artesanal de vidros exigem anos de prática, precisão e paciência, o que desincentiva numa cultura habituada a resultados rápidos. Não há equivalência formal ou reconhecimento imediato dessas competências no mercado de trabalho tradicional.
  • Apesar do valor artístico e patrimonial, estas profissões não têm prestígio mediático nem projecção social como outras áreas (ex.: tecnologia, marketing, medicina). "This niche industry that no one knows about and everybody needs", diz o fabricante de máquinas de carpetes — ou seja, são invisíveis aos olhos do público.
  • Muitos destes ofícios não têm formação técnica disponível em escolas profissionais ou programas públicos, dificultando o acesso e a renovação geracional. Quando há formação, falta muitas vezes ligação ao mercado ou apoio empresarial para transformar a competência numa actividade económica viável.

sábado, maio 24, 2025

Curiosidade do dia

 









As vítimas... não são agentes livres?

Li no The Times do passado 5 de Maio "Appeal for farmers to earn more from food".

A baronesa Minette Batters, ex-presidente da National Farmers' Union no Reino Unido e actual líder de uma revisão sobre a rentabilidade agrícola, alerta que os agricultores devem ganhar mais com a produção de alimentos do que com subsídios ambientais como painéis solares ou projectos de reflorestação (rewilding). Actualmente, produzir comida muitas vezes é menos rentável do que outras formas de uso da terra.

"Batters stressed that the review would prioritise treating farms as businesses that needed to be economically viable in order to survive. Central to the review is the issue of how little farmers receive from the sale of their produce compared with what they invest in producing it."

Batters defende que as explorações devem ser tratadas como negócios viáveis, e denuncia práticas injustas dos supermercados, que pagam tarde e mal, aumentando a pressão económica sobre os produtores.

Inglaterra igual a Portugal. A incapacidade de olhar para as coisas como elas são. Então os agricultores não são livres? Não têm o poder de tomar decisões?

Recordo:

"Treating farms as businesses" - Esta frase sugere uma vontade de encarar a agricultura com racionalidade económica, o que é, à partida, uma boa notícia. Ou seja, abandonar a visão romântica ou meramente subsidiada da agricultura e centrar o debate na viabilidade económica da actividade agrícola.

"How little farmers receive compared with what they invest" - Aqui Batters aponta para um desequilíbrio entre custos de produção e rendimentos obtidos - uma crítica recorrente de agricultores em muitos países. O subtexto é que os preços pagos aos agricultores são tão baixos que colocam em causa a sobrevivência do sector.

Na prática, Batters parece colocar o ónus apenas no Estado e nas cadeias de distribuição, dizendo que:

  • o governo deve rever o equilíbrio entre subsídios ambientais e apoio à produção alimentar,
  • os supermercados pagam mal e pagam tarde, e que 
  • a agricultura deve ser tratada como negócio — mas sem implicar que os agricultores tenham de ajustar o seu modelo de negócio.

Ou seja: reclama-se viabilidade, mas não se discute a responsabilidade empresarial do agricultor.

O que está ausente nesta declaração?

Não há referência à melhoria de produtividade. Nem à diferenciação de produto. Nem à organização dos produtores para ganhar poder de negociação. Nem à inovação nos modelos de negócio ou canais de distribuição.

É como se a viabilidade económica dependesse apenas do contexto externo (subsídios e preços, ou seja, o locus de controlo externo), e não da capacidade de gestão e adaptação dos próprios agricultores. Isso pode gerar uma leitura passiva do papel do agricultor — como se fosse apenas uma vítima e não também um agente económico com margem de acção.

O que falta dizer é que: A viabilidade também depende da capacidade de cada agricultor em gerir bem, inovar e adaptar-se. A agricultura é uma actividade económica, e como qualquer negócio, implica risco, decisão e responsabilidade.

A caricatura diz "Os alemães que trabalhem" e é tipicamente tuga. Em Inglaterra será antes: "Os saxões que trabalhem".

sexta-feira, maio 23, 2025

Curiosidade do dia

"In November and December last year YouGov, a pollstercommissioned by Bible Society, a non-profit organisation that invites people "to see the Bible through fresh eyes"-asked some 13,000 adults in England and Wales about their religious views and habits. The findings are striking: a 56% rise since 2018 in those claiming to attend church at least once a month. Young people, in particular young men, are leading the charge. In 2018 just 4% of 18- to 24year-olds claimed they went to church regularly; by 2024 some 16% did so.

But the newly pious aren't flocking to the Church of England. They're showing up at Catholic mass. So much so that, for the first time in five centuries, Catholic worshippers in England and Wales may soon outnumber Protestants. Among the young they already do. Six years ago a third of young churchgoers were in the Anglican pews. Now only a fifth are, and 41% are at Catholic mass (see chart).

The pandemic may have been a godsend for the Catholic Church. Aidan Geboers, a 29-year-old banker living in Lewisham, in south London, says lockdown prompted his search for a community. He found it in Farm Street Church, a Jesuit temple in Mayfair. Farm Street's young-adult service regularly attracts around 180 people. "Ten years ago numbers might have been half that," says Father Kensy Joseph, a leader in its young-adult ministry.

To young people in Britain (and elsewhere), Catholicism seems to appeal for two, opposing, reasons. Partly the practice of contemplation and dedication to ritual appear to be a potent antidote to the online world. But the internet is also a major route to evangelism. Bishop Robert Barron, an American founder of a Catholic media organisation, and Father Mike Schmitz, a podcaster and campus minister, have amassed hundreds of thousands of followers on social media. Bishop Barron celebrates a new "macho Christianity", where men can be "heroes".

Graham Greene, a novelist, described his Catholic faith in a way that may reflect its attraction to young churchgoers today. It was "something fine and hard and certain, however uncomfortable, to catch hold of in the general flux".

Trechos retirados da revista The Economist de 12 de Maio passado em "Young British men are turning to Catholicism in surprising numbers" 

Curiosidade do dia

 


Atrasos? Ou Margens? O que realmente ameaça 400 mil empresas portuguesas

Um artigo recente da Executive Digest com base no European Payment Report 2025 da Intrum alerta: mais de 400 mil empresas portuguesas correm o risco de fechar nos próximos dois anos. A principal razão apontada? Atrasos nos pagamentos e incerteza política e económica.

Mas eis o paradoxo: Portugal apresenta a mais baixa taxa de atrasos de pagamento da Europa — apenas 10,6% das receitas são pagas com atraso. Acho estranho, estava à espera de um valor bem maior. Como é possível que sejamos simultaneamente o país com menor atraso e o que mais empresas em risco declara?

"Entre os fatores mais críticos está o problema persistente dos atrasos nos pagamentos. As PME, com margens mais estreitas e menor resistência financeira, são especialmente afetadas. Os atrasos no pagamento por parte dos clientes comprometem o fluxo de caixa, reduzem a liquidez e limitam a capacidade de investir, pagar salários e cumprir obrigações financeiras.

...

Em Portugal, as empresas estimam que, em média, 10,6% das suas receitas são pagas com atraso – o valor mais baixo entre todos os países analisados no estudo, o que demonstra um desempenho relativamente positivo. No entanto, apesar deste bom resultado, a persistência dos atrasos continua a ser uma preocupação para os decisores, que ponderam adotar uma postura mais firme sobre o tema."

A resposta não está nos atrasos. Está nas margens. 

É fácil culpar os atrasos nos pagamentos: são visíveis, mensuráveis e emocionalmente carregados. Mas os próprios dados citados no estudo mostram que:

  • A situação tem vindo a melhorar nos últimos anos;
  • As empresas implementaram medidas para reforçar a cobrança;
  • As expectativas quanto ao risco de incumprimento estão a cair.

Mesmo assim, fala-se em falência iminente de quase metade do tecido empresarial. O verdadeiro problema é mais estrutural — e menos confortável de admitir.

O tecido económico português, particularmente entre as PMEs, assenta num modelo de:

  • Margens estreitas;
  • Baixa capitalização;
  • Forte dependência de crédito de curto prazo (muitas vezes, dos próprios fornecedores);
  • Pouca diferenciação na cadeia de valor.

Neste contexto, qualquer perturbação - mesmo pequena — pode ser fatal. Não porque o sistema de pagamentos seja desastroso, mas porque as empresas não têm margem de erro.

Só se pode pagar o que a margem liberta. E quando a margem é nula, a tesouraria transforma-se num terreno minado.

Os atrasos nos pagamentos são um sintoma, não a causa. O problema de fundo é que continuamos a ter um modelo económico baseado em competir por preço, onde se vive do volume e se morre na margem. Um modelo onde os negócios se sustentam a crédito, com pouca resiliência para resistir à instabilidade — seja ela económica, fiscal ou política.

Não basta melhorar os prazos médios de pagamento. É preciso:

  • Apostar na diferenciação e na subida na escala de valor;
  • Reduzir a dependência de modelos de volume com margens apertadas;
  • Reforçar a autonomia financeira das empresas; e sim
  • Melhorar práticas de gestão de risco e de planeamento de tesouraria.

Portugal precisa de empresas que sobrevivam não porque os clientes pagam a tempo, mas porque os modelos de negócio são sólidos, sustentáveis e com margem para respirar.

quinta-feira, maio 22, 2025

Curiosidade do dia



Quando ontem li no JdN, ""Mão indiana" salva austríaca KTM de abrir falência", o que não encontrei no artigo e que levantou a minha curiosidade foi: como é que a KTM chegou a este estado?

Então, parece que a KTM acumulou uma dívida de aproximadamente 3 mil milhões de euros, quase tanto quanto o dinheiro dos contribuintes que Pedro Nuno Santos queimou alegremente na TAP. Esta situação levou a empresa a declarar insolvência em Novembro de 2024 e a entrar num processo de reestruturação sob administração própria, conforme as leis austríacas de insolvência. 

E agora as causas, a crise foi agravada por uma combinação de factores, incluindo a sobreprodução de motociclos que não atendiam aos novos padrões de emissões Euro 5+, resultando num excesso de inventário de cerca de 130 mil unidades. O total de motos não vendidas ronda as 265 mil (o equivalente a um ano de produção). Além disso, a insistência em manter altos níveis de produção, mesmo com a desaceleração das vendas, contribuiu para um aumento significativo nos custos de armazenamento e uma necessidade de liquidez superior a 440 milhões de euros.

Cuidado com uma produção não alinhada com a procura.
Cuidado com a concentração em produtos de gama alta ou demasiado nicho, isso implica uma empresa mais "magra" na parte operacional, não se pode querer trabalhar para um nicho e jogar a cartada do volume.
Cuidado com avanços tecnológicos ou novos produtos que não estão ancorados em modelos de negócio sustentáveis e alinhados com as reais condições do mercado.

Aborrecidos mas lucrativos



Volta e meio aparecem-me na minha timeline do Twitter vídeos como este:

Entretanto, ao final do passado dia 19 encontro no WSJ este artigo "‘Stealthy Wealthy’ Are Making Money With Boring Businesses".

O artigo mostra que, nos EUA, muitas das pessoas que pertencem ao top 1% mais rico não ficaram ricas por lançar startups tecnológicas ou trabalhar em Wall Street, mas sim por possuírem negócios regionais de média dimensão – muitas vezes discretos, pouco glamorosos, mas extremamente lucrativos.

Exemplos incluem empresas de tapetes (a forma como neste caso concreto o fundador começou o negócio é incrivelmente simples) , máquinas para escolas, distribuidores de bebidas, peças de automóveis, entre outros. Estes negócios geram receitas de centenas de milhões de dólares e, embora "aborrecidos", são estáveis, necessários e altamente rentáveis.

A principal mensagem positiva é que há espaço para criação de riqueza sustentável fora do mundo da tecnologia ou da especulação financeira. Os dados mostram que resolver problemas simples com persistência, foco regional (na Europa o termo região pode ser interpretado de forma distinta) e um bom modelo de negócio pode ser uma via segura para o sucesso económico.

Além disso, o artigo valoriza o empreendedorismo realista, baseado em necessidades constantes/recorrentes, que gera emprego local e cria impacto económico duradouro.

Isto reafirma que ainda há oportunidades para as PME, especialmente se explorarem nichos pouco disputados mas essenciais.

quarta-feira, maio 21, 2025

Curiosidade do dia

Mão amiga mandou-me esta imagem que se segue:


Material interessante para acrescentar à compreensão do contexto e situar este postal "Não devia ser um drama, quase que podia ser celebrado".

O nosso problema é não criarmos condições para que as empresas que se seguem acima na escala de valor, (Flying Geese), venham para cá para criar os postos de trabalho que geram mais valor acrescentado e, por isso, têm produtividade superior. E, por isso, podem pagar melhores salários.


Está na moda. Mas será que muda? (Parte III)


Parte I e parte II.

A propósito de "Estado emprega 760 mil funcionários públicos, um novo máximo histórico", na parte I mencionei um podcast. Entretanto, encontrei este trecho inicial:

Ao ouvir este podcast, enquanto fazia o meu jogging, lembrei-me logo das "estórias" que conheço, por causa de confidências familiares, (por exemplo, sobre o mundo da ineficiência nas escolas).

A inteligência artificial (IA) está a eliminar empregos com tarefas repetitivas — mas o estado multiplica-os.

No vídeo, é dito de forma clara:

"If your job is as routine as it comes, your job is gone in the next couple of years."

Trabalhos de introdução de dados, operadores de processos administrativos, controlo da qualidade básico, entre outros, estão a ser automatizados globalmente — e até nas empresas privadas portuguesas.

Mas o estado português?

"O Estado emprega quase 760 mil funcionários públicos, um novo máximo histórico."

A função pública está a crescer à boleia de contratações nas autarquias, educação e saúde — áreas onde muitas tarefas poderiam ser parcialmente automatizadas para libertar recursos humanos para funções de maior valor acrescentado.

O estado continua a funcionar segundo o paradigma "mais pessoas = melhor serviço"

Enquanto no vídeo o alerta é acerca de um futuro onde:

"We're going to go into a high-velocity economy with careers that last 10 to 36 months..."

... o estado português mantém contratos vitalícios, crescimento salarial garantido e estruturas pouco flexíveis. Exemplo:

"Na administração local, foram contratados mais 3.714 trabalhadores, dos quais 1.999 técnicos superiores."

Pouco se fala de requalificação, muito menos de usar ferramentas como IA para optimizar processos repetitivos, melhorar a decisão administrativa ou libertar tempo dos profissionais de saúde e educação.

O estado ignora o papel das ferramentas inteligentes como meio de libertar pessoas para tarefas mais humanas.

No vídeo, discute-se que a IA pode:

"Allow us to be the best version of ourselves."

Mas se aplicássemos esta visão à Administração Pública, poderíamos:

  • Automatizar a análise de dados e a geração de relatórios financeiros, libertando técnicos para tarefas analíticas.
  • Criar assistentes virtuais para apoio a cidadãos, reduzindo filas e redundâncias.
  • Usar IA na triagem de processos (educação, saúde, justiça), concentrando os recursos humanos onde há risco real ou decisão complexa.

Em vez disso, o Estado cresce como se a única solução para melhorar o serviço fosse contratar mais.

Tudo isto faz-me lembrar um episódio de "Yes, minister":


Continua.

terça-feira, maio 20, 2025

Curiosidade do dia

No The Times de 19.05 li "As the sun sets on the old world of debt economics, pain lies ahead".

O artigo defende que o preço mais importante da economia mundial neste momento é o dos títulos de dívida pública japonesa, dado o seu impacte global. Durante décadas, o Japão manteve taxas de juro baixíssimas, inflação controlada e um enorme volume de dívida pública — o que permitiu financiar economias externas, mantendo estabilidade interna.

No entanto, essa dinâmica está a mudar. A "experiência japonesa" começa a desfazer-se, com o aumento da inflação e da taxa de juro a longo prazo. Isto tem consequências internacionais significativas, pois o Japão detém mais de 1,1 biliões (europeus, à americana seria triliões) de dólares em dívida pública dos EUA. Os investidores japoneses, perante melhores rendimentos no seu próprio mercado, exigem agora retornos mais elevados no exterior, pressionando os mercados obrigacionistas globais.

Lembrei-me do "yen carry trade" de que tanto se ouviu falar depois de 2008. com o seu fim o dinheiro vai ficar mais caro, e o dólar vai cair ainda mais.

Não se pode esperar por certezas

"How can companies plan ahead when it feels like tomorrow may look nothing like today? It's the question hanging over boardrooms as business leaders contend with a barrage of challenges - from AI disruption and geopolitical tensions to tariffs and financial market fluctuations driven by how trigger-happy the US president is on social media. The heightened uncertainty is palpable.
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In this climate, it's no wonder the tools used to stress test corporate strategies are under scrutiny. For decades, scenario planning has helped organisations map out a range of futures based on variables including economic shifts, technological leaps and regulatory changes. Pioneered at Shell - which foresaw the 1973 oil shock - scenario planning has become a corporate staple. But as boxer Mike Tyson famously said: "Everyone has a plan until they get punched in the face." Or as one UK board chair told me: "The one scenario everyone seems to have forgotten to plan for is the one where all the scenarios are wrong."
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It's a common refrain among business leaders that they're in a wait-and-see mode. But wait too long and companies lose momentum, become less innovative and enter into a state of decision paralysis. Act too soon and businesses might make costly choices that require backtracking. [Moi ici: Esperar pode parecer prudente, mas muitas vezes leva à inércia. As PME precisam de manter ciclos curtos de decisão, Boyd again, experimentação e correcção — mesmo que à escala pequena. É melhor testar uma ideia imperfeita hoje do que lamentar a paralisia amanhã. Recordar o estoicismo para PME]
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says there is a high degree of "wishful thinking" at most companies at the highest levels. "Everybody is looking for certainty and wants to land on one model for the future," [Moi ici: Não esperar por certezas para agir. As PME que adiam decisões à espera de “certeza” arriscam-se a perder agilidade, inovação e até viabilidade. A incerteza não vai desaparecer — o que muda é a capacidade de navegar dentro dela. Decidir com base em informação imperfeita é hoje uma competência de gestão, não uma falha
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But scenario planning was never about predicting the future — it's about training for it. [Moi ici: Não se trata de adivinhar o futuro, mas de preparar respostas para diferentes hipóteses. Uma PME não precisa de modelos sofisticados. Basta reunir a equipa e perguntar: E se perdermos o nosso maior cliente? E se um novo concorrente oferecer o mesmo serviço por metade do preço? E se o nosso fornecedor principal parar a produção? Simular reacções é mais importante do que tentar prever datas. Planeamento de cenários não é futurologia — é preparação] Asking "what if?" has clear benefits. David Niles, a strategic adviser to chief executives, tells his clients that "it's not about getting the forecast right - it's about having a series of plays ready, so when the unexpected happens, you're not frozen".
It's one thing to imagine alternative futures, but another to know when to shift course. In the short term, leaders need to buy themselves time. [Moi ici: A flexibilidade estratégica não é só pensar em alternativas — é saber quando agir. As PME devem identificar sinais precoces (clientes a pedir algo novo? custos a subir? comportamento de concorrentes?) e preparar decisões de desvio antes de serem forçadas a reagir em pânico]
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One chief financial officer told me: "In this environment, it's easier to identify risks than it is to see the opportunities." If companies focus only on downside protection, they may miss the upside in moments of disruption. The goal of scenario planning isn't just to survive one crisis after another. It's also to become the kind of organisation that can adapt and grow no matter what's around the corner." [Moi ici: As PME não controlam o contexto, mas podem controlar a sua capacidade de resposta. O investimento em competências de adaptação, em equipas capazes de agir sem esperar ordens, em processos flexíveis — isso sim, é o verdadeiro seguro contra o futuro]

Trechos retirados de “Never-ending uncertainty is a stress test for scenario planning” publicado no Financial Times do passado dia 13 de Maio.



segunda-feira, maio 19, 2025

Curiosidade do dia


A gente lê "Reitor da Universidade de Coimbra pede que empresas contratem doutorados para "ir mais além na inovação"" e fica algo perplexa com a argumentação básica, ingénua mesmo:
""Há uma coisa que temos de fazer: os nossos empresários não podem continuar a eferir contratar três pessoas a salário mínimo do que uma pessoa doutorada. Isso é algo que nos inibe e nos impede de ir mais além na inovação", ", afirmou Amílcar Falcão,
...
“a inovação, para funcionar, tem de ter um modelo de negócio” que “começa na capacitação dos jovens que entram na universidade para o empreendedorismo,
...
Para tal, segundo Amílcar Falcão, é necessário “conseguir financiamento europeu”, sendo Coimbra a universidade portuguesa com mais financiamento europeu para a investigação. “Isso reflete-se nas patentes: em seis anos, mais do que duplicámos as patentes no mercado. É com este impulso financeiro que depois conseguimos fazer diferente e ir procurar parcerias a outros locais”, realçou."

Dizem-nos agora que a solução para a economia nacional é simples: trocar três trabalhadores a salário mínimo por um doutorado. É, pelo menos, o que prega o reitor da Universidade de Coimbra, indignado com a avareza dos empresários que preferem “três pessoas a salário mínimo do que uma pessoa doutorada”, escolha que - garante - “inibe” o país de “ir mais além na inovação”

A receita soa maravilhosa: basta uma caneta, um carimbo e… abracadabra! — substituem-se operários por investigadores como quem muda fusíveis. Alterar modelos de negócio? Reformular estratégia? Mudar de cultura de gestão? Pormenores irrelevantes. A única KPI que conta é o número de teses por metro quadrado.

Para condimentar o plano, acrescente-se o velho fetiche das patentes. Se já temos doutores, convém ter também montanhas de registos na OMPI — porque, como toda a gente sabe, cada patente é um euro no bolso. Só que não. O Financial Times lembrou, neste mesmo 2025, que o crescimento explosivo de patentes inglesas não se traduziu necessariamente em mais receitas — muitas vezes nem sequer em lucro.

Ah! BTW, é uma fofura ver a universidade a erigir-se em oráculo do empreendedorismo: docentes vitalícios que nunca passaram pelas tormentas de uma folha de salários no fim do mês explicam às empresas como captar investimento, enquanto laboratórios subsidiados por fundos públicos ensinam a "gestão do risco" sem nunca terem arriscado um cêntimo do próprio bolso — a mais pura forma de coragem académica, feita à prova de falência.

Está na moda. Mas será que muda? (parte II)



Na revista The Economist do passado dia 12 de Maio encontrei um artigo do obrigatório Bent Flyvbjerg intitulado "Why so many IT projects go so horribly wrong".

Muitos projectos de TI correm tão mal porque combinam complexidade elevada, fraca visibilidade e governação deficiente. Ao contrário dos projectos de infra-estruturas, o software é intangível — é mais difícil de inspeccionar, acompanhar ou estabilizar. Essa abstracção abre caminho ao alargamento descontrolado do âmbito (“scope creep”), onde gestores e intervenientes vão acrescentando novas funcionalidades ao longo do tempo.

Além disso, os projectos de TI ainda não assentam em padrões profissionais maduros: muitos responsáveis de projecto não têm formação formal, e quem decide frequentemente não domina a tecnologia. Estes projectos implicam mudanças profundas na forma de trabalhar das organizações, o que desencadeia resistências internas e conflitos políticos.

O planeamento apressado, a excessiva personalização e a indefinição de responsabilidades agravam ainda mais o risco. Como mostra o estudo de Flyvbjerg, quando um projecto de TI corre mal, tende a correr muito mal — com derrapagens massivas e impacto sistémico.

Qual a implicação disto para os projectos de inteligência artificial (IA)? 

A principal implicação para os projectos de IA é que estes estão expostos aos mesmos riscos estruturais dos projectos de TI tradicionais — mas em grau ainda mais elevado.

Porquê? 

Porque a IA é uma tecnologia ainda mais nova e menos compreendida. Muitos dos decisores não têm literacia técnica suficiente para avaliar o que é viável, o que é seguro ou o que faz sentido implementar. Isso favorece decisões precipitadas e expectativas desajustadas. 

Porque os projectos de IA são, por natureza, ainda mais abstractos. Não há um "produto final" claramente visível ou testável até fases tardias. Isto dificulta o controlo, favorece alterações constantes e torna o risco de "falhar em silêncio" mais provável.

Porque a IA altera profundamente a forma como as pessoas trabalham. Ao contrário de um novo software de gestão ou uma nova máquina de produção, a IA mexe com a autonomia, os processos de decisão e até com a identidade profissional das equipas. Isso aumenta o risco de resistência interna, conflitos e sabotagem passiva.

Porque existe um entusiasmo exagerado e pressão para "implementar depressa". As chefias, muitas vezes pouco informadas, querem "usar IA" sem perceber o que implica ou para que serve. Esta pressa compromete o tempo necessário de planeamento, testes e ajustamentos que são essenciais em tecnologias com efeitos imprevisíveis.

Continua.

domingo, maio 18, 2025

Curiosidade do dia

A gente lê "Ministro da Economia quer Europa como "oásis antiburocracia" para ganhar competitividade" e não acredita na "lata":

"Pedro Reis pede que UE corte na regulação para 'dar oxigénio' às empresas

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'Fazer da Europa um oásis anti-burocracia e deixar as empresas respirar' foi o apelo feito esta quarta-feira pelo ministro da Economia, Pedro Reis, na XVIII Cimeira da COTEC Europa.

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'Para ganhar escala são precisos instrumentos jurídicos comuns. Se Bruxelas retirar burocracia, as empresas agradecem' ', defendeu Pedro Reis.

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'Enquanto perdemos tempo a discutir, os nossos concorrentes internacionais vão crescendo e acelerando... É bom que a Europa recupere algum espaço', apelou."

É sempre enternecedor ver um ministro português — um país onde um simples alvará pode levar mais tempo do que uma vinha a dar uvas — erguer-se em bicos de pés para pregar a Bruxelas a cartilha do anti-burocratês. 

A ironia? Cá dentro, o mesmo Estado continua a exigir certidões em triplicado, selos em duplicado e assinaturas presenciais "reconhecidas por semelhança" — porque a assinatura digital, essa, ainda é tratada como feitiçaria. Enquanto se sonha com um deserto europeu livre de carimbos, persiste-se num oásis nacional de papelada, onde as PME se afogam em formulários e portais que nunca funcionam à primeira (nem à segunda).

Talvez valha a pena arrumar primeiro a casa — ou pelo menos desentupir o portal — antes de evangelizar o continente. Afinal, como é que se pode ensinar alguém a nadar quando mal se sabe boiar na própria piscina de requisições, licenças e guichés?