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domingo, janeiro 17, 2021

Contexto da moda

"El Covid-19 se come un 26% de las ventas del comercio de moda en 2020":

"[Moi ici: Números para os Estados Unidos] La moda fue el sector que peor evolucionó en el último año, seguida de cerca por los bares y restaurantes. [Moi ici: Não tinha essa percepção] La facturación del conjunto del retail se incrementó un 0,6% gracias a la alimentación.

...

La moda cierra un año para olvidar. En Estados Unidos, donde nunca llegó a decretarse un confinamiento a escala nacional, las tiendas especializadas en ropa y complementos redujeron su facturación un 26,4% en 2020, según el avance publicado hoy por el US Census Bureau.

En su conjunto, el retail y los servicios de alimentación incrementaron su facturación un 0,6% en el último año, gracias al empujón de las tiendas de alimentación, que crecieron un 11,5%, y a las de materiales de construcción y jardinería, con un incremento del 14%.

...

También se dispararon a doble dígito las ventas en los que el US Census Bureau denomina nonstore retailers, es decir, distribuidores que venden por catálogo o a través de Internet. Este tipo de comercios se incrementaron un 22,1%, hasta 971.554 millones de euros.

Sólo en diciembre, las ventas de moda se hundieron un 16% respecto al mismo mes del año anterior, mientras otros comercios como los de materiales de construcción se dispararon a doble dígito."

sexta-feira, janeiro 08, 2021

"does not imply desperation"

Na sequência de:

"a pivot is a substantive change to one or more of your business model facets, be it your product, your customer segment, your channel, pricing logic, resources, activities, or partners. But note that pivoting market shapers should keep one foot on the ground, true to the origins of the metaphor in basketball. In other words, apply your learnings from past success and failure to the new area. Note, too, that pivoting does not imply desperation. It can be a clever leadership tool to discover growth opportunities.

At its best, pivoting is a systematic, hypothesis-driven process of experimentation (hence overlap with another of our Es), to drive and evaluate market opportunities. You translate your market vision into falsifiable business model hypotheses, test the hypotheses using minimum viable set-ups, then decide whether to persevere with the existing model, or pivot by changing some elements.

Pivots continue after the start-up phase. Many a successful company have pivoted both in their start-up phase and over longer periods."

Trecho retirado dSMASH: Using Market Shaping to Design New Strategies for Innovation, Value Creation, and Growth de Kaj Storbacka e Suvi Nenonen.  

terça-feira, janeiro 05, 2021

Calçado - Fazer a transição

Em "Rust never sleeps" (Agosto de 2020) usei esta figura:

Em "A fase "wonder"" (Dezembro de 2020) usei esta figura:
E escrevi:
"As empresas de calçado têm de fugir da fase "war" e avançar para a fase "wonder"... "wonder" é magia, é surpresa, é ... arte!!!

Ainda esta semana numa empresa alinhavam-se mentes em torno da relevância dos nichos para o futuro da organização."

Avançar, que neste contexto no mapa de Swardley quer dizer recuar para a esquerda, tal como na primeira figura acima.

Em "Longe do mainstream" (Setembro de 2020)  voltei a citar algo que escrevi em Fevereiro deste ano acerca do sector do calçado português:

"Vamos entrar numa Fase 4

O número de empresas vai voltar a diminuir

A quantidade de pares produzidos vai voltar a diminuir

O número de trabalhadores vai voltar a diminuir

O preço médio por par vai novamente dar um salto importante"

Tenho escrito aqui ao longo dos anos acerca da nichização. A nichização a longo prazo imporá a especialização das empresas que servem cada nicho. O meu velho "Tu não és meu irmão de sangue!"(Setembro de 2014), porque as tribos têm uma paixão assimétrica.

O caderno de Economia do semanário Expresso da passada semana trazia o artigo "Uma têxtil rendida ao colorau" com uma entrevista a Mário Jorge Silva CEO da empresa Tintex:

"colocou a inovação e a sustentabilidade no ADN da empresa para fintar a concorrência, certo de que este era “o grande trunfo e o passaporte para o futuro” da fileira.

“Apostámos na sustentabilidade logo em 1989, muito antes de esta ser uma palavra da moda”,

...

aceitou o desafio lançado por alguns clientes e deixou a têxtil onde trabalhava para lançar o novo projeto cheio de “grandes esperanças” na sua receita assente “na diferenciação e criação de valor, não na guerra de preços”.

...

A procura de uma oportunidade para se diferenciar num mundo onde o verde ainda não estava na moda

...

Hoje, desdobra-se em vários projetos de investigação e desenvolvimento (I&D), em parceria com empresas têxteis e de outros sectores de atividade, centros tecnológicos e universidades. [Moi ici: Trabalhar o ecossistema. Parceiros e fontes de know-how teórico]

...

Outra frente de trabalho prioritária é a área médica,

...

E noutra linha de ação no segmento dos têxteis técnicos e da alta performance promete mais uma solução inovadora para ajudar a recuperação do atleta depois do esforço, lendo indicadores e dando até 13 possibilidades de tratamento em simultâneo.

...

No currículo, apresenta incursões no tingimento da fibra de milho biodegradável e em métodos de tingimento mais sustentáveis e reutilização de materiais, a par de uma série de certificações que garantem reconhecimento mundial na área dos têxteis sustentáveis porque “as pessoas têm de acreditar no que oferecemos”. [Moi ici: Trabalhar o ecossistema. Influenciadores que trazem credibilidade]

“As novas gerações valorizam saber o que compram por isso faz sentido criar nos têxteis uma cultura idêntica à que existe à volta do vinho e dos terroirs"[Moi ici: Muito interessante este conceito. Poderá ser relacionado com Mongo?]

Este artigo pode ilustrar uma estratégia baseada na inovação e concretizada a servir um conjunto de nichos: sustentabilidade; área médica; desporto de alto rendimento. 

Uma crítica que muitos empresários me fazem é a de que os nichos são pequenos, não lhes sustentam a estrutura das empresas. 

1º - Recordar o que prevejo para a Fase 4 - Empresas mais pequenas.

2º - Quando um nicho ainda está na fase "wonder" ainda permite que seja servido por um especialista, não por um super-especialista. Assim, talvez trabalhar para 2 ou 3 nichos ajude a fazer a transição.

quarta-feira, dezembro 23, 2020

A fase "wonder"

Neste vídeo, que já tinha citado aqui, Simon Wardley refere o uso da palavra inovação em diferentes fases evolutivas de um negócio ou de um modelo de negócio. A inovação na fase Genesis, na fase "wonder", não tem nada a ver com a inovação na fase Commodity, nas fase "war":
No entanto, usamos a mesma palavra inovação para as diferentes situações.

O que me faz recuar a Março deste ano onde neste postal, por causa da escrita deste manual, escrevi:
"dei comigo a pensar que a inovação que o calçado precisa nesta altura não é mais do mesmo, não é a “sustained innovation” de que Clayton Christensen falava, e ao qual o fluxograma acima se aplica

As empresas de calçado devem manter e tirar o máximo partido da actividade que conseguem ter através do modelo de negócio actual. Paralelamente, devem criar uma empresa, ainda que virtual, dedicada a desenvolver o negócio do futuro. E para desenvolver o negócio do futuro essa empresa tem de se comportar como uma startup: sem clientes, sem negócios, apenas com hipóteses de produtos e de clientes."
As empresas de calçado têm de fugir da fase "war" e avançar para a fase "wonder"... "wonder" é magia, é surpresa, é ... arte!!!

Ainda esta semana numa empresa alinhavam-se mentes em torno da relevância dos nichos para o futuro da organização. Porquê nichos? 

Onde estão os potenciais clientes/utilizadores apreciadores de "arte", corajosos o suficiente para serem pioneiros e viverem na fase "wonder"? 

A fase "wonder" é a fase de uma intensa relação com o produto.

segunda-feira, dezembro 07, 2020

"Come on! Esta gente não analisa os números?"

O título tirei-o deste postal de Outubro último, "Tamanho, produtividade e a receita irlandesa".

Se há coisa que não gosto é de gente que não analisa os números. Gente que fala de cor e constrói explicações assentes em areia.

Em Junho último em "that model died this year" escrevi: 

"México = Marrocos, Turquia, Roménia e Bulgária."

Em Agosto passado em "A caminho da Sildávia, portanto" escrevi:

"No final da conversa João Duque brinda-nos com uma ilustração da ligeireza com que o mundo académico segue a micro-economia. Segundo João Duque o sucesso do calçado nos últimos anos foi baseado no desenvolvimento de marcas... de marcas? Come on! Quantas marcas ganham dinheiro? Quantas marcas ao fim de 5 anos ainda estão vivas? Desenvolver marca é uma forma de sacar dinheiro de projectos europeus, mesmo que bem intencionada, mas que morre quando acaba o financiamento. O que foi desenvolvido e bem foi a marca "Made in Portugal" para que marcas estrangeiras viessem para Portugal aproveitar a sua "uniqueness" da proximidade produção-consumo (rapidez, flexibilidade, qualidade). BTW, mas é outra conversa, esta uniqueness já se foi graças à Turquia, Roménia, Marrocos, Argélia, Tunísia, Bulgária, ..."

Pelos vistos também estava a incorrer num erro, porque não tinha olhado para os números com olhos de ver. Assim, aproveitei o empréstimo que a colega Rita me fez do World Footwear 2020 Yearbook, publicado pela APICCAPS, e olhei para os números.

Primeiro, na tabela que se segue não vamos encontrar a Argélia porque as exportações são residuais, não chegaram a um milhão de pares em 2019.

Afinal a Roménia e Marrocos passaram a década em queda na exportação de calçado. A Tunísia está, ao fim de 10 anos, a voltar ao nível das exportações de 2010. Foram 5 anos a cair com a Primavera Árabe, e 5 anos a recuperar. A Bulgária tem-se mantido estagnada em torno dos valores de 2010. 

O que ressalta é a evolução turca e albanesa. Em 2010 a Turquia exportava cerca de 75 milhões de pares de sapatos, em 2019 exportou 275 milhões de pares a um preço médio de 3.29 USD. A Albânia em 10 anos duplicou as suas exportações. Presumo, pelo preço médio de cada par, que há ali mão de know-how italiano.

Assim, temos dois países próximos do centro da Europa com custos de produção muito baixos.

Lá em cima fala-se de uniqueness, no postal anterior falava-se, metaforicamente, em superpoderes. O factor proximidade ... foi-se. Como li há dias no livro SMASH: Using Market Shaping to Design New Strategies for Innovation, Value Creation, and Growth de Kaj Storbacka e Suvi Nenonen. 

"finding a sustainable competitive advantage may not be that important. What is important, however, is that companies have a contingency plan to deal with the upcoming prospects for an expansion of available resources or possible constraints created by other actors in the market."

Tudo é transiente, tudo é temporário. 


 

sábado, outubro 10, 2020

A cláusula van Hallen nas fábricas portuguesas

 Há dias o amigo D. Pedro IV recordou-me a clássica estória sobre a cláusula van Hallen.

Na sexta-feira estive numa fábrica onde, mais uma vez, me contaram um episódio típico do calçado em Portugal.

Uma ficha técnica segue para a produção com toda a informação necessária. As pessoas na produção, porque não estão habituadas a ler, porque estão habituadas a seguir ordens, não olham para a ficha técnica. Pensam:

- Ah! já fizemos este modelo. Eu sei como é!

O que  não sabem, porque não lêem a ficha técnica, é que este modelo, porque é para um cliente diferente, em vez de uma sola preta, leva uma sola azul, ou em vez de uma fivela dourada, leva uma fivela prateada.

Ao ouvir o episódio recordei a minha lição sobre as promessas de prémio nos relatórios. Depois de ler uma estória num livro de Tom Peters apliquei-a na minha situação. Tinha entrado para uma empresa, e foi-me dito que tinha de escrever um relatório mensal em inglês, durante o primeiro ano, com o relato das minhas actividades nesse mês. Ao fim de um ano escrevi algo deste género no referido relatório mensal:

"Com este relatório, finalizo os 12 relatórios mensais solicitados aquando da minha entrada para a empresa. Assim, deixarei de elaborar este relatório a menos que o contrário me seja solicitado."

Passados uns meses o director-geral a propósito de não sei o quê disse-me:

- Ó Carlos Cruz você deixou de escrever os relatórios mensais...

Aí, contei-lhe o que tinha escrito no décimo segundo relatório. Ele ficou vermelho e começou a rir-se:

- Agora é que você me apanhou!

Tom Peters apresentava um teste para saber se um trelatório era lido por alguém, escrever algures no meio do relatório:

"Entrega-se uma nota de x dólares a quem a vier pedir a fulano x"

O que propus ao meu interlocutor na fábrica de calçado foi começar a introduzir aleatoriamente a mesma mensagem nas fichas técnicas:

"Entrega-se uma nota de 5 euros a quem a vier reclamar com base nesta ficha técnica!"

Isto é uma correcção, não uma acção correctiva. Uma acção correctiva passará por um trabalho de fundo que crie pessoas habituados a espírito crítico nas linhas de produção.

terça-feira, setembro 29, 2020

Imaginem o impacte disto nas PMEs portuguesas na área da moda

 Imaginem o impacte disto nas PMEs portuguesas na área da moda:

"But what does hibernation mean for fashion on the shop floor? These will be items that never made it as far as stores in the first place, so you will probably not be able to tell whether something that you’re looking at in a shop in 2021 was originally intended to be sold in 2020

...

A possible negative impact of stock hibernation (aside from the costs associated with storing a large quantity of product) may be that jobs are lost throughout the manufacturing process as a result. From designers who are no longer needed to create a new spring 2021 collection, to factories which will no longer receive the orders, implications would arise from ‘skipping’ a season - problems which are simply a delayed result of the initial store closures."

Trechos retirados de "Retailers are 'hibernating' their unsold stock for next summer

Calçado e Inovação -KPIs no setor do calçado

"É costume dizer-se que o que não se pode medir não se pode gerir. Quando uma empresa começa a medir, descobre que pode medir muita coisa. E se medir muita coisa corre o risco de se perder no meio de tantos sinais, de tantas mensagens. É o que se chama ficar paralisado pela análise. Assim, há que escolher quais os indicadores, quais os sinais mais importantes para gerir uma empresa, executar a sua estratégia e avaliar os resultados. Ou seja, as empresas precisam de escolher um conjunto de indicadores-chave, um conjunto de indicadores fundamentais, aquilo que em inglês se chama de key permance indicators, KPIs, indicadores-chave de desempenho. 

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O CTCP promoveu a criação deste guia do empresário, designado de: Calçado e Inovação -KPIs no setor do calçado,  que apresenta um conjunto de KPIs para medir a execução e a eficácia de uma estratégia baseada na inovação.

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Começa por fazer um enquadramento do sector e evolução histórica e a inevitabilidade da inovação, apresenta alternativas de inovação, algumas sugestões  sobre o cliente do futuro e formas de medir a inovação."

terça-feira, setembro 08, 2020

Longe do mainstream

Interessante!
Os gurus deste país sonham com empresas grandes que possam ser mais eficientes e produtivas. Recordo o recente "Ignorar uma realidade básica" e o mais antigo "Mas claro, eu só sou um anónimo engenheiro da província".

Neste último postal, de Maio de 2013, cito esta afirmação:
"Há 12 anos éramos 500 pessoas e tínhamos cinco clientes activos. Hoje somos 160 e temos mil clientes activos"
Sintomático que, julgo que em 2018, a empresa de onde provinha esta citação tenha encerrado.

O que é que este consultor anónimo da província prevê para o grosso do sector do calçado em Portugal?

  • Há 20 anos éramos 500 pessoas e e tínhamos cinco clientes activos.
  • Há 7 anos éramos 160 pessoas e tínhamos mil clientes activos.
  • Daqui a X anos seremos 20-30 pessoas e teremos 50 clientes activos.
Recordo a minha previsão sobre a próxima fase do sector do calçado em Portugal, "Quantas empresas? (parte I)":
"Vamos entrar numa Fase 4
O número de empresas vai voltar a diminuir
A quantidade de pares produzidos vai voltar a diminuir
O número de trabalhadores vai voltar a diminuir
O preço médio por par vai novamente dar um salto importante"
Como é que isto acontece? Mudando de modelo de negócio!

Uma das vias que está mais desenvolvida é a da nichização. Contudo, a maioria das empresas ainda não está a diminuir de tamanho porque os nichos são o meu velho fiambre que vem complementar o singelo pão com manteiga. Os nichos são ainda vistos como um complemento.

Entretanto, li um artigo que me sugere outra alternativa para a Fase 4, "The ‘Zero Inventory’ Solution". Sim, trabalhar para marcas da gama alta que assentam o seu modelo de negócio na ausência de inventário.
"Nearly everything sold by Stòffa, a Manhattan-based maker of classic luxury menswear, is made-to-order or made-to-measure.
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Building such a business takes time and patience. First, they had to establish relationships with manufacturers and suppliers in Italy that were willing to work this way. [Moi ici: Este modelo de negócio não assenta na presença nas clássicas feiras. As empresas portuguesas poderão tirar partido da marca "Made in Portugal" e da sua flexibilidade e rapidez de resposta] Then, they had to build up a client base, which they did through their own networks and city-by-city trunk shows.
...
But it wasn’t until Lever Style began working with newer brands that he transformed the way the company was managed and operated by focusing less on achieving minimums with one large brand and more on servicing many brands in a more efficient manner. Today, 50 percent of Lever Style’s sales come from brands that require quicker turnaround and smaller runs of product. Some of the companies he works with generate just a few million dollars a year in sales.
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Last year, Lever Style’s gross margin was 29 percent; higher than the industry average for a manufacturer that doesn’t have its own consumer brands."


domingo, agosto 16, 2020

Rust never sleeps

"Portugal é conhecido mundialmente pela indústria do calçado e está na lista dos 20 melhores produtores. [Moi ici: Não, não é a lista dos melhores produtores. Se existe essa lista estaremos no top 10. É a lista dos maiores produtores. O que, nos tempos que correm, não é nada abonatório. Quantidade significa preço mais baixo. Quantidade significa cada vez mais importação para vir a Portugal pôr o selo de "Made in Portugal"] Os consumidores de várias nacionalidades estão dispostos a pagar mais pelo sapato português e o facto de ter a etiqueta a dizer Made in Portugal aumenta em 28% o valor do sapato." [Moi ici: Claro que se puderem pagar menos agradecem]
 Rust never sleeps - é o nome de um album de Neil Young (escrever isto fez-me ir buscar o "Powderfinger" para ouvir e regressar ao meu 1982) - Rust never sleeps é o significado da figura:
A maior parte das empresas quando adopta um modelo de negócio não o faz de forma consciente. Limita-se a copiar o exemplo de quem está a ter sucesso, e quem está a ter sucesso já está na fase da exploração. Só que a seguir à fase da exploração segue-se a fase da obsolescência do modelo, é inevitável. Rust never sleeps.

Aqui no blogue e na minha vida profissional desafio as empresas a subirem preços. A maioria pensa que tem de fazer isto:

Isso é um suicídio, ponto!!!

Os clientes actuais seguem o gráfico de Kano, que aprendi no mundo da qualidade dos anos 80 do século passado:
"Aquilo que num momento é atraente e faz a delícia de um cliente, passado algum tempo passa a ser trivial, expectável e básico. Com o tempo, aquilo que gerava satisfação, aquilo que era crítico, passou a ser algo que nunca gerará satisfação, só insatisfação se as coisas correrem mal e indiferença se as coisas correrem bem"
À medida que o tempo passa os clientes fazem força para que os preços baixem e não estão para aturar fornecedores que querem subir preços.

Os clientes actuais são úteis para pagar a estrutura, são úteis para nos dar o pão com manteiga. Se queremos melhores preços, para termos pão com fiambre, temos de procurar outros clientes, mas não é para lhes oferecer o mesmo. Esses outros clientes têm de ser diferentes dos actuais, têm de procurar ofertas que tenham custo de produção mais elevado, não mais barato. Custos de produção mais elevados são um proxy para margens mais elevadas.

Rust never sleeps. Quando os clientes lhe pedem para baixar preços estão a fazer a sua parte. Se não tem um plano B a culpa é sua. Sim, sua, porque dormiu à sombra dos louros do sucesso. E o sucesso é sempre passageiro.

Texto inicial retirado de "Qual é o sapato mais caro made in Portugal? É feito com pele de alligator do Mississípi e pode custar 7.500 euros"

segunda-feira, agosto 03, 2020

Quantidade versus valor

Leiam "Portugal regressou ao Top 20 dos maiores produtores de calçado" e deixem os factos mergulhar bem fundo.
"Nove em cada dez pares de sapatos são produzidos na Ásia, que reforçou o seu domínio no panorama mundial em 1,2 pontos percentuais para 87,4%. Portugal regressou ao Top 20 dos maiores produtores mundiais, para a 20ª posição, destronando o Egipto. [Moi ici: Acham isto, regressar ao top 20 dos maiores produtores mundiais em número de pares, bom ou mau?]
...
Com 11.497 milhões de dólares exportados em 2019, a indústria italiana é a terceira maior exportadora mundial em valor, num ano em que voltou a distanciar-se dos seus principais concorrentes reforçando o seu preço médio exportado em 2,5% para 57,11 dólares. Portugal, pelo contrário, caiu duas posições na tabela, para 15º, o que não admira, já que as exportações nacionais de calçado caíram 5,7% em 2019. O preço médio do calçado nacional exportado foi de 26,26 dólares, quase 2% a menos que no ano anterior."[Moi ici: Acham isto, cair duas posições na tabela, para 15º maior produtor em valor, bom ou mau?]
Olhando para estes resultados e fazendo a comparação com a minha previsão, a título de ponto da situação, feita na parte I da série "Quantas empresas?" temos:
O número de empresas e de trabalhadores já está a diminuir. O número de pares exportados continua a aumentar. No entanto, já não à custa da produção interna, mas à custa da exportação de calçado importado. O preço médio por par continua a sofrer a erosão de um modelo que já se esgotou. Ainda estamos a espremer o que resta do modelo actual e a leva-lo até o mais à direita possível no mapa de Wardley.

Recordar a orientação:
Temos de copiar a Itália.
Quase de certeza que não. Não temos tradição de marcas próprias bem sucedidas.
Como é que empresas em regime de private-label podem subir na escala de valor? Apostando mais e mais na batota da co-criação, no co-design. Claro que não serão empresas com a mesma estrutura e capacidade de produção.

domingo, junho 28, 2020

Produtividade e tretas académicas

Ontem escrevi sobre "Como se aumenta a produtividade por hora de trabalho?"

Depois, durante o dia perguntaram-me se tinha algum conselho geral sobre como se aumenta a produtividade. 

Quem pretende aumentar a produtividade num país deve pensar em aumentar a produtividade nas empresas concretas que povoam cada sector de actividade. E quando se olha para um sector de actividade encontra-se uma grande variabilidade de produtividades, uma grande variabilidade de rentabilidades.

Recordo a frase:
Existe mais variabilidade dentro de um sector de actividade do que entre sectores de actividade.

Assim, para cada sector de actividade, sugiro estudar as diferenças entre empresas concretas no topo da produtividade e comparar com as empresas na média do sector.

Entretanto, ao final da tarde de ontem encontrei o suplemento do Jornal Económico, "Relançar a Economia", publicado a 26.06.2020. Aí, no artigo "A reindustrialização nas mãos da economia portuguesa" sublinhei com desânimo alguns trechos proferidos por João Duque:
"João Duque defende que Portugal tem de “procurar setores de elevado valor acrescentado e com valor de marca. E, para isso, é fundamental o associativismo de setor e o estímulo a esse associativismo. Ganhar escala para sermos visíveis, como tão bem fizeram os industriais do calçado, por exemplo." [Moi ici: OMG! Aposto que João Duque nunca estudou o sector do calçado. Recordo a evolução do tamanho das empresas no sector em "Não vai ser nenhum 'lay-off' que as vai preparar para essa transição". Recomendaria a João Duque a leitura da série "Quantas empresas"]
Um outro trecho escandaloso, porque revela a falta de noção, a falta de estudo, a falta de percepção do que é a realidade concreta e não treta de macroeconomia:
"“Para começar, acho que podemos ir à lista de importações e começar a fazer o que importamos. Se conseguimos passar a fazer ventiladores, porque não outras coisas?”"
 Leram isto? Agora, deixem mergulhar bem fundo na vossa consciência o significado de um comentador económico e professor universitário proferir esta afirmação.

Portugal importa calçado? Sim
Portugal exporta calçado? Sim
Faz sentido Portugal produzir internamente o calçado que importa? Nope! quem pagaria os salários desses operários? 

"preço médio de um par de sapatos exportado de Portugal: 26.08 USD
preço médio de um par de sapatos importado para Portugal: 10.76 USD"
"Acaso a indústria portuguesa de mobiliário pode competir, num mercado aberto, com os preços do mobiliário asiático?
 E, no entanto:
"A taxa de cobertura das exportações pelas importações do período em referência é de 235%.""
 Nós produzimos para exportação a preços mais altos e importamos o barato para consumo interno. O futuro da economia portuguesa não é a reduzir importações, mas a exportar mais ainda. Sublinho:
"The Dutch (56%) are more then twice reliant on exports than Greece (21%), Turkey (20%), Portugal (26%) and Italy (24%)"
Assim se percebe a quantidade de treta académica do comentariado que enche o espaço no panorama mediático nacional. 

domingo, maio 24, 2020

Não vai ser nenhum 'lay-off' que as vai preparar para essa transição (parte II)

Parte I.

Quem sofre com os stressors é pressionado a testar alternativas.
"What doesn’t kill me makes me stronger
Shelter in place is a mass extinction event for many industries. Not every business will survive. But what will emerge are businesses that diversified their offerings better positioned to withstand future volatility by providing complementary channels and offerings. And they’re opening up new ways service providers can scale to more customers.
...
The Seven-Step Small Business Pivot Process:
  • Create an MVP or MVS, Minimum Viable Service
  • Do Customer Discovery
  • Rapidly test your idea
  • Refine your offering
  • Market on all your channels
  • Rely on tried-and-true tools
  • Share with the community"
Trechos retirados de "Seven Steps to Small Business Recovery"

Não vai ser nenhum 'lay-off' que as vai preparar para essa transição

Na semana passada assisti a um webinar em que Simon Wardley apresentava a sua metodologia.

A certa altura ele apresentou um slide parecido com este:
Uma espécie de Lei da Termodinâmica nos negócios. Se nada for feito, a concorrência perfeita actua e ganha o mais eficiente, o que crescer mais depressa.

Num outro slide Wardley defende:

A comoditização permite libertar recursos para apostar num novo nível do jogo baseado em mais valor ou mais velocidade.


Como não fazer a relação com a evolução do calçado:


Fase 3 (entre 2010 e 2017)
Crescimento do número de empresas  22%
Crescimento da quantidade de pares produzidos  33%
Crescimento do número de trabalhadores  24%
Crescimento do preço médio por par  2%

Vamos entrar numa Fase 4
O número de empresas vai voltar a diminuir
A quantidade de pares produzidos vai voltar a diminuir
O número de trabalhadores vai voltar a diminuir
O preço médio por par vai novamente dar um salto importante

Recordar a série "Quantas empresas". Quantas empresas serão capazes de fazer a transição da fase 3 para a fase 4?

O número de empresas vai voltar a diminuir

Não vai ser nenhum 'lay-off' que as vai preparar para essa transição.


sábado, maio 23, 2020

Para reflexão (parte II)

Parte I.
"Covid-19 could spur the biggest economic contraction since World War II, hitting every sector from finance to hospitality. Yet fashion, due to its discretionary nature, is particularly vulnerable. The average market capitalisation of apparel, fashion and luxury players dropped almost 40 percent between the start of January and March 24, 2020 — a much steeper decline than that of the overall stock market.
...
We estimate that revenues for the global fashion industry (apparel and footwear sectors) will contract by 27 to 30 percent in 2020 year-on-year, although the industry could regain positive growth of 2 to 4 percent in 2021. For the personal luxury goods industry (luxury fashion, luxury accessories, luxury watches, fine jewellery and high-end beauty), we estimate a global revenue contraction of 35 to 39 percent in 2020 year-on-year, but positive growth of 1 to 4 percent in 2021. If stores remain closed for two months, McKinsey analysis approximates that 80 percent of publicly listed fashion companies in Europe and North America will be in financial distress. Combined with the McKinsey Global Fashion Index (MGFI) analysis, which found that 56 percent of global fashion companies were not earning their cost of capital in 2018, we expect a large number of global fashion companies to go bankrupt in the next 12 to 18 months.
...
The crisis is affecting our daily lives, instilling anxiety and uncertainty in the minds of almost everyone. Indeed, consumer pessimism about the economy is widespread, with 75 percent of shoppers in the US and Europe believing that their financial situation will be impacted negatively for more than two months.
...
Even online sales have declined 5 to 20 percent across Europe, 30 to 40 percent in the US and 15 to 25 percent in China."
Vamos ficar todos bem! 

Trechos retirados de "The State of Fashion 2020 - Coronavirus Update"

domingo, maio 03, 2020

"Seasonless 'continuity' collections are growing in importance"

"El coronavirus actúa como acelerador de cambios que ya estaban en marcha...”

Em 2011 escrevi:
"Há anos ouvi no CITEVE, numa conferência que não consigo recordar, alguém dizer que o sector têxtil devia aspirar a 52 épocas por ano em vez das tradicionais duas. Com 52 épocas por ano não haveria hipótese de recurso à Ásia."
Agora em "Why Fashion 'Seasons' Are Obsolete":
"Some say there are too many seasons, while others note that the timing of these seasons, disfigured by the demands of major department stores, no longer aligns with real-world seasons, meaning spring clothes arrive in the middle of winter and winter coats hit stores in summer. But it’s worth taking a step back.
...
As the fashion industry debates the merits of the traditional fashion calendar, surely a sensible starting point is dropping the fiction of universal fashion seasons in the first place.
.
Seasonless 'continuity' collections are growing in importance to limit exposure to end-of-season discounting and reflect the reality that a large slice of luxury sales growth is still driven by first-time customers in emerging markets, who are eager for the classics. But as virgin markets dry up, fashion will also need to move faster to create and deliver fresh products to lure established luxury consumers from Shanghai to Lagos who now expect newness at the speed of Instagram.
...
And as the movement to rethink the fashion calendar gathers momentum, there is an unmissable opportunity to rip up and replace the industry’s archaic, Eurocentric seasons with a more sophisticated system of small-batch drops that can be better targeted to address the growing diversity of fashion’s global customer base. Let's not waste it."

sexta-feira, maio 01, 2020

Não vai ser fácil

Comecei a leitura de "Where Should Fashion Brands Manufacture Now?" com a ideia de que ia chegar a uma conclusão. O artigo condensa uma série de entrevistas com players com skin-in-the-game baseado na Ásia e todos chegam à mesma conclusão, bem diferente do que eu pensava. Por exemplo, esta foi a resposta de um "freelance consultant in sourcing and supply chain management" baseado na Ásia:
"“Most retailers and brands are unsure about the market situation ✅ [but] obviously, the order size is going to be much lower compared to last year. ✅ [The best strategy is] to try some small orders and put the products on the market and see the reaction and make a quick decision on a re-order. ✅ That means they need quicker speed in their supply chain management. ✅ [Moi ici: Até aqui o racional é básico e julgo que pouco há para discordar o meu ✅ é sinal de concordância. Agora daqui chegar à conclusão de que a resposta certa é a China... por essa não esperava] Southeast Asia, Bangladesh or Myanmar are focused on huge quantities and long delivery times. If we focus on quick delivery in 45 days, even 25 days, that makes China the big player, [so] international brands will have to look to China because they lead the way in that.”
Tentando calçar os sapatos do outro e perceber o porquê do seu racional, para lá do básico, "defender o seu negócio" vem-me isto à cabeça lido numa entrevista a uma consultora italiana(?) no mesmo artigo:
"approximately 60 percent of the world’s fashion is still produced in China, if you take into consideration raw materials, fibres, textiles, trims, and accessories, such as elastic, zippers and hang tags."
A verdade é que uma PME portuguesa que se dedica a produzir pequenas séries de calçado, por exemplo, tem de vencer uma dificuldade tremenda, toda a cadeia de fornecimento está montada para fornecer grandes séries. OK, até podem vender uma pequena quantidade de pele com uma dada cor e espessura. Se o cliente voltar a pedir outra encomenda da mesma pele ... o mais provável é não conseguirem replicar a cor, o acabamento, a regularidade da espessura. E enquanto as amostras andam para baixo e para cima o tempo está a contar e a marca internacional não vê a entrega ser realizada na data prevista. O que é que os decisores da marca pensam? Agora é tão difícil vender. Encontramos um produto com mercado e os fornecedores não nos entregam como prometido... não podemos contar com eles.

Usando a linguagem da indústria automóvel, uma empresa até pode querer estar neste negócio das entregas rápidas de pequenas quantidades, mas falhar porque o Tier 1 e Tier 2 de fornecedores não está para aí virado, continua cioso dos seus custos afundados, continuará agarrado o mais possível ao seu modelo mental, ao seu modelo de negócio. Sei o que isto é, sei as dores de parto que uma empresa de calçado tem passado ao tentar entrar num nicho técnico, quando os seus fornecedores ainda estão noutra.

terça-feira, abril 07, 2020

Eu tenho muito mais dúvidas do que certezas (parte II)

Parte I.




Não podia estar mais de acordo com este tweet, particularmente para as empresas que fecharam durante o período de quarentena.

Vivemos aqueles minutos em que a água da praia recua, expondo áreas e profundidades sempre submersas. Depois virá o tsunami económico.

Por cá, com um hipocondríaco na presidência, o regresso ao trabalho que ainda existirá, será atrasado o mais possível, prolongando e aprofundando o caos económico.

Há dias citei:
"El coronavirus actúa como acelerador de cambios que ya estaban en marcha..."
Em Fevereiro e Março passados, ao reflectir sobre o futuro do calçado em Portugal escrevi uma série de nove postais intitulados - Quantas empresas?

No nono postal escrevi:
"As empresas de calçado devem manter e tirar o máximo partido da actividade que conseguem ter através do modelo de negócio actual. Paralelamente, devem criar uma empresa, ainda que virtual, dedicada a desenvolver o negócio do futuro. E para desenvolver o negócio do futuro essa empresa tem de se comportar como uma startup: sem clientes, sem negócios, apenas com hipóteses de produtos e de clientes."
Muito provavelmente, para muitas empresas, isto já não será apenas uma opção, terá de ser a realidade.

segunda-feira, março 16, 2020

Quantas empresas (parte XI)


Na minha infância, antes do saco plástico, o leite do dia era comprado em garrafas de vidro que vinham com uma tampa de alumínio:

Suil era a marca do leite que se bebia em São João da Madeira em 1969.

Nesses tempos era comum as cozinhas terem uma peça como esta para limpar o interior das garrafas:
Ontem à noite tive oportunidade de ler o capítulo 3 do livro “Nine Rules for Thriving in the Twenty-First Century” de Adam Davidson. Um capítulo sobre a “Braun Brush, um negócio com sede em Long Island e gerido por uma família - Braun Brush, the “Makers of Specialty Brushes Since 1875”. 

Um capítulo que se enquadra bem nesta série e ilustra como as empresa de calçado podem dar o salto para a descoberta do cliente. Divido a história da Braun Brush em quatro fases:
A Fase I - Artesanal
O fundador da empresa começou por ser alguém que trabalhava numa fábrica que engarafava o leite e, tinha a função de lavar as garrafas devolvidas pelos consumidores. Além de ser uma tarefa morosa, estava constantemente a ser repreendido pelo chefe quando a limpeza não ficava bem feita. Tinha um problema, tinha uma dor, e começou a trabalhar numa solução que lhe facilitasse a vida. Ele era o inovador e, em simultâneo, o cliente da sua inovação. Como cliente foi rechaçando as inúmeras soluções que ia testando. Depois de anos de trial & error chegou a uma escova que resolvia o seu problema. O que fazia num dia passou a ser feito numa hora.

Patenteou a sua solução. Despediu-se e começou a fazer escovas. Fabricava as escovas durante a noite e, durante o dia visitava potenciais clientes para lhes apresentar/entregar o produto.

Os anos de experiências fizeram dele um especialista em escovas, quer no tipo de materiais usados, quer em formas e outras possibilidades. Nesta fase o Braun fundador não tinha acesso à escala, era um artesão. O know-how adquirido permitiu que desenvolvesse escovas para animais, para culinária, para têxteis, até para queijos. O seu entusiasmo e paixão era o adequado para uma economia local e artesanal, embora já tivesse uma pequena fábrica. Era um artista, sempre pronto a desenhar soluções específicas para problemas específicos. Por exemplo, desenvolveu uma escova para limpar ecrâns de cinema, uma actividade em crescimento na altura dos primeiros anos da empresa.

A Fase II - Industrial
Anos 50 do século passado, a fase artesanal entrou em declínio. A empresa passou para as mãos do genro do filho do fundador. O investimento público em vias de comunicação tornou a economia americana nacional em vez de local. [Moi ici: Como não recordar "Decisões de localização (parte I)"] Assim, um pequeno fabricante de escovas em New York podia servir clientes no Alabama, Colorado e Oregon. 

Enquanto durante duas gerações a Braun apostou na diversidade de escovas para fins específicos, os novos tempos exigiam abraçar a comoditização. Seleccionar as escovas com maior mercado potencial, descartar as restantes e escalar a produção o mais possível para vencer a corrida
Os anos 50 do século passado representaram a transição do artesanal para a linha que aprendemos com Terry Hill:
Redução da variedade de modelos ao mínimo, para evitar a perda de tempo em alterações de setup. Era mais lucrativo produzir em massa e encontrar novos mercados para escoar a mercadoria. A empresa já não precisava de artistas, a ciência e a gestão eram a solução.

O actual CEO entrou na empresa chefiada pelo pai nos anos 80 do século passado. Ao longo dos anos 90 ele almoçava diariamente com o pai, analisavam os números do negócio e estavam sempre em desacordo num ponto: o filho (Lance) dizia ao pai que a empresa deveria voltar às suas raízes iniciais e  concentrar-se na criação de novos tipos de escovas, escovas UAU!, escovas com emoção. Ao longo desses primeiros 10 anos Lance tinha feito amizade com um artista que fazia esculturas com as escovas. O pai ria-se e dizia que ele era tolo.

A Fase III - O choque chinês (Recordar esta série de 2010)
Entretanto, ao longo desses anos 90, os fabricantes chineses começaram a enviar um grande número de escovas para os Estados Unidos. Inicialmente concentraram-se nos modelos mais baratos vendidos   pela distribuição grande. Eram escovas de qualidade inferior. No entanto, ano após ano, as escovas importadas da China ficavam cada vez melhores e começavam a invadir áreas mais especializadas. 

Durante as conversas ao almoço com o pai, Lance avisava-o que os chineses em breve começariam a fazer mossa no seu negócio. O pai ria-se. Em 2002, no entanto, as fábricas chinesas começaram a fazer exatamente os tipos de escovas que a Braun produzia. As escovas chinesas eram muito mais baratas e, Lance teve que admitir, quase com a mesma alta qualidade quanto as da Braun. Os seus avisos para o pai tornaram-se cada vez mais desesperados. Ele temia que um dia o negócio colapsasse. O pai achava que ele era um exagerado.

Entretanto, o pai autorizou a compra do primeiro computador, que o filho aproveitou para criar bases de dados sobre os clientes, as vendas e os custos. Assim, ficou cada vez mais ciente da mutação em curso no mercado.

Lance e o pai pertenciam a mundos diferentes e tinham desenvolvido visões totalmente diferentes sobre a Braun Brush e, mais amplamente, sobre a economia americana na era da tecnologia e comércio. O pai, cresceu na América do pós-guerra, quando os Estados Unidos dominavam quase todos os mercados globais com seus produtos, um mundo em que a chave para um negócio bem-sucedido era o volume de vendas. Nesse tempo, a maioria das empresas prosperava vendendo commodities: jogando pelo seguro e vendendo a mesma coisa repetidamente. O pai queria vender o maior número possível de escovas ao maior número possível de pessoas. O seu objetivo era nunca perder uma venda. Se fosse preciso baixava os preços, prometia entregar escovas mais rapidamente - qualquer coisa para conseguir essa venda.

Lance irritava-se com este posicionamento da empresa, usava o computador para mostrar ao pai que linhas inteiras de modelos da empresa não eram lucrativas, ou que podiam vender milhões de certos tipos de escovas e continuar no mesmo sítio. A famosa maldição da Rainha Vermelha.

Até que o pai morreu... duas semanas para fazer o luto e, depois.

A Fase IV - Mongo
A propósito de Mongo - recordar "1 Origem de uma metáfora", ou "Estranhistão ... weirdistão"

Ao regressar começou logo a trabalhar na mudança. Reuniu a equipa comercial e comunicou que a partir desse dia não venderiam uma única escova em concorrência directa com as importações baratas da China. Se uma fábrica chinesa pudesse fazer um modelo de escova razoavelmente semelhante, a Braun sairia completamente dessa linha. A Braun deixaria o negócio das commodities e entraria no campeonato das escovas altamente especializadas. A Braun deixaria a competição pelo preço e volume. Voltariam às raízes do bisavô, voltariam à arte e à Economia da Paixão. Como não recordar o Evangelho do Valor!!!

As escovas especializadas, tinham grandes margens de lucro. Elas seriam desenhadas para clientes com necessidades tão específicas que não haveria concorrência. O problema era o esses clientes serem raros. Lance disse à equipa que o sucesso não viria do número de vendas que eles fizessem, mas da qualidade das vendas. E mais, passou a mensagem de quanto mais baixo o tamanho da encomenda, menor a probabilidade de haver concorrentes a competirem por essa mesma encomenda. E se não houvesse concorrência, a Braun poderia apresentar preços baseados no valor que aportavam aos clientes e não com base nos custos. Clientes em busca de uma escova única pagariam um preço-premium por ela.

Lance iniciou a transição para uma empresa de escovas especializadas aproveitando uma oportunidade inesperada. Recordar o princípio da limonada na parte X. Recebeu um telefonema de uma pessoa que acabara de concluir uma inspecção de rotina a uma central nuclear. Esse inspector percebeu que as escovas que estava a usar na limpeza do sistema de refrigeração da central geravam riscos de segurança. Lance desenhou uma escova, levou várias para a central e, após uma bateria de testes, conseguiu provar que eram seguras. 

Hoje, essas escovas são usadas em geradores nucleares em todo o mundo. E as centrais nucleares economizam milhões de dólares por ano à custa de um modelo de escova que custa 12 dólares em matérias-primas.

É exatamente isto que os empresários da Economia da Paixão devem procurar: um produto cujo preço seja determinado pelo valor que fornece ao cliente, não pela matéria-prima usada para fabricá-lo.

Hoje a empresa ainda faz pincéis, é claro, mas seus lucros não provêm da fabricação de um produto físico. Os seus lucros provêm da criatividade, do conhecimento e do pensamento que entram nesses produtos. Os seus lucros provêm do valor que é gerado na vida dos clientes. Lance tornou-se um especialista em pincéis personalizados. 

Lance descobriu algo que suspeitava nos dias em que implorava ao pai que mudasse a estratégia da empresa: é possível ganhar muito mais dinheiro produzindo muito menos escovas quando as escovas criadas resolvem problemas fora do comum de uma empresa ou de um indivíduo. Lance costuma cobrar milhares de dólares por essas escovas, e os seus clientes pagam a conta com prazer porque as escovas permitem-lhes economizar muito mais do que isso.

Lance agora faz quinze mil tipos diferentes de escovas com uma equipe de trinta fabricantes de pincéis - ou, mais precisamente, artesãos. Ele vende várias escovas exclusivas, feitas sob medida para as necessidades específicas de uma pequena base de clientes. Recordar esta figura de "Muitos picos, muita arte"
Além disso, Lance faz algo que teria horrorizado seu pai. Anualmente, elimina centenas de referências de escovas do catálogo da empresa. Frequentemente, essas referências são exactamente as escovas que têm o maior volume de vendas, mas a menor margem de lucro. Se alguém na China pode fazer a mesma escova com aproximadamente o mesmo nível de qualidade, a Braun abandona a linha.

Outro exemplo, a Marlin:


domingo, março 15, 2020

Quantas empresas (parte X)

Parte I, parte II, parte IIIparte IVparte Vparte VIparte VIIparte VIII e parte IX.

Este é percurso a seguir por uma empresa virtual de calçado em busca do próximo modelo para funcionamento na Fase IV.


É preciso descobrir o(s) novo(s) mercado(s), seleccionar aqueles que parecem ser os primeiros clientes, validar essas hipóteses, para só então começar a fazer crescer o negócio.
É preciso aprender a perceber os problemas, as expectativas e necessidades dos hipotéticos novos clientes, é preciso desenvolver um modelo de abordagem comercial, um modelo de venda que possa ser replicado, é preciso criar e gerir a procura para, por fim, transitar um modo de descoberta e aprendizagem, um modo de tentativa e erro, para um modo de empresa, um modo de execução eficiente.

Descoberta do cliente
Descobrir quem são os clientes, qual o nicho a servir, qual o produto procurado e qual o problema que esses clientes procuram resolver. A tal startup, ainda que virtual, referida na Parte IX, não é uma réplica em escala reduzida de uma empresa. Uma start-up é uma experiência. Os empreendedores têm uma ideia que nunca foi testada no mercado. Essa ideia tem clientes? Quais? Onde estão? Essa ideia materializa-se em que tipo de produto ou serviço?

Qualquer start-up, numa fase inicial, está em modo "search", pesquisando sucessivas hipóteses de clientes e produto. Nesta fase o "fail often, fail well, fail fast" é fundamental: testar hipóteses sobre a combinação clientes-produto e descartar rapidamente as que não funcionam, o que no mundo das startups é conhecido como "pivoting". Nesta etapa, o empresário tornado empreendedor, não tem ninguém por quem copie sobre o que fazer para ter sucesso. Tem de criar o seu futuro, tem de testar alternativas de futuro. Saras Sarasvathy e a sua Teoria da Efectivação pode ser útil. Segundo a Teoria da Efectivação o empreendedor é como um piloto na cabine de um avião, o futuro é algo que se pode influenciar como base nas decisões que se tomam, ou seja, o empreendedor pode criar as suas próprias oportunidades:

Os quatro princípios da efetivação são:
  • Um pássaro na mão: O empreendedor precisa criar soluções com os recursos que tem disponíveis aqui e agora.
  • O princípio da limonada: Erros e surpresas são inevitáveis e podem ser usados para procurar novas oportunidades.
  • A colcha criativa: Entrar em novas parcerias pode trazer ao projecto novos fundos e novas direcções.
  • Perda comportável: O empreendedor deve investir apenas o quanto estiver disposto a perder.

Assim, o melhor que o empreendedor pode fazer é começar por si, pela sua empresa da Fase III.

Olhar para nichos de clientes com os quais tem uma relação especial, com os quais continua a ganhar bom dinheiro, e gerar perguntas, e gerar hipóteses: Que experiência foi adquirida ao longo do tempo?
É olhar para nichos de clientes actuais, e gerar hipóteses: por que é que este tipo de clientes me continua a comprar? Quais são as vantagens que a minha empresa actual tem? 

Qual é mesmo o negócio em que está metido ao trabalhar para esse tipo de clientes de nicho? É muito provável que a resposta certa não seja a primeira que lhe vem à cabeça. Um cliente de nicho não compra sapatos, compra uma paixão, compra a solução de um problema, compra o diálogo e a capacidade de comunicar, experimentar, compra a cumplicidade de alguém que o percebe. Os sapatos são como que contratados para fazer um trabalho na sua vida. Qual é mesmo esse trabalho?

O empreendedor deve perguntar: Quem conhecemos? Conhecemos alguns potenciais clientes de nichos? Conhecemos alguém que conheça potenciais clientes de nichos? Conhecemos alguém que conheça intervenientes no modelo de negócio dos clientes de nichos?

O empreendedor deve começar com o que tem, arriscar o que pode pagar, estar aberto a surpresas positivas e procurar relacionar-se com outros.

A ideia é seleccionar um nicho com potencial, desenvolver uma proposta de produto, uma amostras ou protótipos, e sair da empresa e ir para a rua, e ir para o mercado à procura da validação do cliente.

Continua.