sábado, outubro 10, 2020

A cláusula van Hallen nas fábricas portuguesas

 Há dias o amigo D. Pedro IV recordou-me a clássica estória sobre a cláusula van Hallen.

Na sexta-feira estive numa fábrica onde, mais uma vez, me contaram um episódio típico do calçado em Portugal.

Uma ficha técnica segue para a produção com toda a informação necessária. As pessoas na produção, porque não estão habituadas a ler, porque estão habituadas a seguir ordens, não olham para a ficha técnica. Pensam:

- Ah! já fizemos este modelo. Eu sei como é!

O que  não sabem, porque não lêem a ficha técnica, é que este modelo, porque é para um cliente diferente, em vez de uma sola preta, leva uma sola azul, ou em vez de uma fivela dourada, leva uma fivela prateada.

Ao ouvir o episódio recordei a minha lição sobre as promessas de prémio nos relatórios. Depois de ler uma estória num livro de Tom Peters apliquei-a na minha situação. Tinha entrado para uma empresa, e foi-me dito que tinha de escrever um relatório mensal em inglês, durante o primeiro ano, com o relato das minhas actividades nesse mês. Ao fim de um ano escrevi algo deste género no referido relatório mensal:

"Com este relatório, finalizo os 12 relatórios mensais solicitados aquando da minha entrada para a empresa. Assim, deixarei de elaborar este relatório a menos que o contrário me seja solicitado."

Passados uns meses o director-geral a propósito de não sei o quê disse-me:

- Ó Carlos Cruz você deixou de escrever os relatórios mensais...

Aí, contei-lhe o que tinha escrito no décimo segundo relatório. Ele ficou vermelho e começou a rir-se:

- Agora é que você me apanhou!

Tom Peters apresentava um teste para saber se um trelatório era lido por alguém, escrever algures no meio do relatório:

"Entrega-se uma nota de x dólares a quem a vier pedir a fulano x"

O que propus ao meu interlocutor na fábrica de calçado foi começar a introduzir aleatoriamente a mesma mensagem nas fichas técnicas:

"Entrega-se uma nota de 5 euros a quem a vier reclamar com base nesta ficha técnica!"

Isto é uma correcção, não uma acção correctiva. Uma acção correctiva passará por um trabalho de fundo que crie pessoas habituados a espírito crítico nas linhas de produção.

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