domingo, agosto 24, 2025

Melhorar o retorno da certificação ISO 9001 (parte X)


Voltemos à imagem das Parte VIII e Parte IX:


Foquemos a nossa atenção nos arquitectos. O que queremos é que eles na relação que desenvolvem com a Vitrumo percepcionem a sensação de satisfação como um resultado da interacção. E esse resultado é uma consequência natural de outros resultados:

O que é que a Vitrumo pode fazer de forma sistemática para que estes resultados sejam expectáveis? 
A figura que se segue lista o que a Vitrumo pode fazer (exemplo: Divulgamos os projectos que servimos nas universidades) e os desafios que a Vitrumo se propõe a cumprir (exemplo: Entregamos sem defeitos).


Para manter o esquema legível e manejável, não esquecer que um modelo é sempre uma simplificação, vamos usar focos de atenção: os objectivos estratégicos na perspectiva interna.
Ou simplificando:
Que indicadores, que KPI podemos usar para medir o desempenho, a evolução, de cada objectivo estratégico na perspectiva interna?

Por exemplo:
  • Criar o futuro comercial - Nº de eventos (exposições/concursos/feiras) em que a empresa participa; Nº de leads ou contactos gerados em cada evento; Nº de acções de divulgação realizadas em universidades; Nº de estudantes/professores envolvidos; Nº de webinars realizados; Nº de participantes nos webinars, Taxa de conversão de propostas; Nº total de propostas apresentadas
  • Criar o futuro tecnológico - Nº de parcerias formais activas com centros de I&D ou universidades; Nº de projectos de investigação ou inovação conjuntos
  • Co-desenvolver o projecto - Nº de workshops realizados por ano; Nº médio de arquitectos participantes; Satisfação dos participantes (questionário pós-evento); Nº de sessões de co-design em que a empresa participa; % de projectos relevantes com participação activa da empresa; Avaliação da utilidade da participação pelos parceiros
  • Controlar a produção - Percentagem de produtos entregues sem não-conformidades; Percentagem de entregas dentro do prazo acordado
  • Apoiar a montagem - Nº de incidentes críticos em obra por projecto; Índice de retrabalho em obra; Desvio médio ao plano de produção (com base em datas prometidas em dias)
Estes serão os objectivos da qualidade alinhados com a estratégia. Claro que se alguns destes KPI já tiverem um desempenho adequado, podem ser monitorizados e controlados pela gestão operacional da Vitrumo, e não precisam de ocupar a largura de banda de atenção da gestão de topo. Por exemplo, se a empresa tem um histórico de cumprimento dos prazos de entrega, pode retirar esse KPI da lista estratégica.

A estes KPI gosto de juntar os relacionados com a perspectiva de clientes (uso aqui a classificação de clientes quando na verdade os arquitectos são prescritores, não são clientes) que vimos na Parte IX:
  • Clientes ganhosNº de novos clientes no período; Nº de clientes ganhos por word-of-mouth
  • Clientes satisfeitos - Avaliação da satisfação após entrega; Taxa de reclamações
  • Clientes mantidos - Taxa de clientes recorrentes no período; % de vendas a clientes recorrentes
Trabalhando para atingir objectivos associados a estes indicadores está-se ao mesmo tempo a trabalhar para satisfazer os verdadeiros clientes, os que pagam o produto e serviço, nuns casos são os empreiteiros e noutros casos são os donos de obra.

É claro que os objectivos na perspectiva financeira são muito importantes, mas não os costumo incluir directamente como objectivos da qualidade, a menos que o cliente assim o entenda.

Os objectivos e metas não devem limitar-se a exortações como “Estar presentes nas universidades para inspirar e atrair talento”. Todos concordamos com a frase, mas onde estão definidos os critérios de sucesso? Onde se encontram os resultados desejados?

Falar de objectivos e metas é como traçar uma linha na areia: de um lado está o incumprimento, do outro o sucesso. Findo o prazo estabelecido, deve ser inequívoco perceber em que lado ficámos.


Um KPI sem meta é apenas um número; com meta, transforma-se num guia para a acção e para a melhoria. A cada indicador associamos dois resultados: um que traduz o desempenho actual e outro que reflecte o desempenho futuro que pretendemos. Essa diferença entre o presente e o desejado é a “tensão criativa” que mobiliza a organização. A meta dá sentido à medição, cria foco e alinhamento, gera compromisso, ajuda a priorizar recursos e alimenta a melhoria contínua.

Assim, a meta torna-se critério para avaliar de forma menos subjectiva a qualidade das nossas decisões e o valor do nosso esforço.

Seguindo este raciocínio, surge naturalmente a questão: por que é que vamos precisar de um espaço de tempo X para atingir o desempenho futuro desejado? Porque é que não estamos já lá? É aqui que a Teoria das Restrições oferece uma perspectiva útil, ao convidar-nos a olhar para a forma como trabalhamos e a identificar o que não está a ser feito, ou o que é feito de forma deficiente, que explica a diferença entre o desempenho actual e o futuro desejado. Onde estão os gargalos que limitam a nossa capacidade de melhorar? Que restrições do sistema impedem que os esforços se convertam em resultados consistentes? É ao identificar e actuar sobre essas restrições que se liberta o verdadeiro potencial de crescimento e de desempenho.

Estamos a entrar no terceiro passo. 
Que iniciativas, que projectos, que mudanças devemos executar para poder aspirar a fazer a transição:

 No próximo episódio vamos abordar o desenho das iniciativas.

sábado, agosto 23, 2025

Curiosidade do dia


Aqui no blogue, em 2010, escrevi:
"Qual é a minha primeira lei sobre a concorrência? Quando um mercado está saturado, a primeira via para eliminar concorrência é aumentar as barreiras burocráticas, tipo marcações CE, removem concorrentes sem se gastar dinheiro em aquisições e guerra de preços."
Que em 2019 nomeei como: A minha primeira lei sobre a concorrência?

Entretanto, ontem no WSJ em "The Tale of the Rent-Seeking Saw" um exemplo americano. O artigo critica o comportamento da empresa SawStop e da Comissão de Segurança de Produtos de
Consumo dos EUA (CPSC).
A história começa com a invenção de uma tecnologia que detecta dedos humanos e trava serras circulares para evitar acidentes. Em vez de competir no mercado vendendo este sistema como uma opção de segurança, a SawStop tentou que a CPSC tornasse obrigatório o uso da sua tecnologia em todas as serras. Isso teria dado à empresa um monopólio de facto, já que detém patentes sobre o mecanismo.
O artigo descreve como a CPSC considerou impor esta obrigatoriedade, mas acabou por recuar. A crítica é que tal decisão teria criado um monopólio protegido pelo governo, elevando preços e limitando a concorrência e a inovação.

E no final:
"This is one small story about one discrete product in one corner of one industry. Imagine what else goes on behind regulatory doors."

O medo como discurso político

Somos constantemente moldados pelo ambiente externo que nos rodeia. Durante o tempo da troika, para resistir ao pessimismo generalizado, procurei evitar os profetas da “espiral recessiva” que alimentavam um clima de desânimo. Não ver notícias era quase um antídoto contra o veneno da narrativa dominante. Aqui no blogue deixei os meus avisos:

"Não veja televisão. Não veja as notícias! São um veneno!" (Maio de 2013)

- Condenados pelos limites que nós próprios criamos para nós mesmos (Maio de 2013)

No país da espiral recessiva, ainda bem que há quem não veja notícias (Dezembro de 2013)

"The Moment of Clarity" (parte I) (Março de 2014)

Há dias, seguindo um conselho de Rory Sunderland, comecei a ler o livro Blindsight. O livro começa por relatar várias experiências. Por exemplo:

""Can People Distinguish Pâté from Dog Food?"" [Moi ici: Em testes cegos as pessoas não conseguem distinguir]

...

[Moi ici: Outro exemplo] If anyone should be able to taste something for what it is, it's a sommelier. These wine experts go through years of reading, drinking, eating, and testing, better known as formal wine education, to be formally certified. Soms' sense of taste is amazing. One sip and they are able to tell the wine they are drinking, the species of grapes involved, what country it is from, and the vintage year of the bottle.

In a deliciously devious experiment,? Frederic Brochet at the University of Bordeaux showed that taste is fallible even for these supertasters. He provided sommeliers with two different glasses of wine, one red and one white, and had them review each wine. Unknown to the sommeliers, the red wine was the exact same wine as the white, just with red food coloring added. Not only were the wines perceived as tasting completely different, but the "red" wine was described as if it had red ingredients. Tasters of the white wine described it with flavors like "honey" and "citrus," while the red wine was described as tasting like "raspberry" and "mahogany." This is despite identical information reaching the tongue. The dog-food eaters shouldn't feel too bad; the pros get fooled, too."

E agora vem o cerne:

"We don't experience the food we eat directly. There's a massive gap between the objective sensation of the food hitting our tongues and what our brains ultimately experience. As the late great philosopher Alan Watts describes, "We eat the menu, not the food." In other words, we're always one step removed-experiencing our own internal description of the world, rather than the world itself.

In neuroscience, this gap is humbling evidence of perceptual fallibility: we don't, perhaps can't, experience the world as it is. In marketing, this gap represents something else altogether: opportunity. The opportunity to tweak, influence, and fundamentally alter consumers' innermost experience of reality. What more could a marketer want, in their pursuit of persuasion, than the ability to alter reality itself in their favor?"

O que Blindsight mostra em laboratório — a falibilidade da percepção, a distância entre estímulo e experiência — confirma e reforça o que escrevi no tempo da troika: somos constantemente moldados pelo ambiente externo e pelas histórias que escolhemos (ou recusamos) ouvir. A experiência não é neutra; é construída. E, como no marketing, também na política e na vida social essa brecha entre realidade e percepção abre espaço para manipulação — ou, ao contrário, para libertação, se soubermos escolher as narrativas que nos alimentam. 

Entretanto, esta semana ouvi uma entrevista com David Priestley que recomendo vivamente. Segue-se um trecho de 1 minuto sobre o poder do contexto no mundo dos empreendedores: 


Mais uma vez, a mesma ideia: o ambiente molda perceções, decisões e comportamentos.

E é neste ponto que encontro eco numa entrevista recente de António José Seguro, que declarou ao Diário de Notícias: 
O meu papel é levar a esperança onde há medo. E hoje há muito medo na sociedade portuguesa.
O recurso à palavra “medo” não é inocente. Ao identificar uma emoção negativa, supostamente predominante, posiciona-se como o antídoto: a esperança. Procura vestir-se de messias, o candidato que traz redenção num clima dominado pela ansiedade. Ao mesmo tempo, capitaliza a insatisfação: se os portugueses estão desiludidos, não precisa ainda de apresentar soluções concretas — basta prometer uma mudança de atmosfera. A sua retórica desenha uma narrativa binária, medo versus esperança, convidando o eleitor a escolher entre permanecer no medo ou apostar na esperança. É uma mobilização emocional, já que tantas vezes se vota mais pelo sentimento do que pelo programa.

No entanto, esta estratégia tem riscos. Se enfatizar demasiado o medo, pode amplificar a ansiedade em vez de a atenuar. O eleitor pode pensar: “Se até o candidato diz que vivemos no medo, então a situação deve ser ainda pior do que eu imaginava”, afastando os que procuram serenidade. E, se a esperança não for acompanhada de propostas concretas, a mensagem corre o risco de parecer um slogan vazio, uma palavra bonita sem substância.

Estranho, por isso, que Seguro tenha apostado precisamente no medo como eixo central do seu discurso.


Estando ele numa posição de "influencer" pode alterar a realidade e fazer com que mais pessoas sintam medo.

BTW: Algo interessante, ao falar de medo de forma genérica, Seguro mantém a mensagem flexível, permitindo que cada eleitor projete no discurso o seu próprio medo e encontre nele correspondência. Por exemplo, ao ouvi-lo, um eleitor do Chega pode rever-se no medo acerca da imigração.

sexta-feira, agosto 22, 2025

Curiosidade do dia


Milei no final desta colorida intervenção diz algo que costumo afirmar com frequência. Cristo não nos propôs que fizéssemos caridade com o dinheiro dos outros. Convidou-nos a fazer caridade com o nosso dinheiro.


Métricas diferentes


"Portugal apresenta a mais baixa taxa de atrasos de pagamento da Europa — apenas 10,6% das receitas são pagas com atraso. Acho estranho, estava à espera de um valor bem maior."
No Jornal de Negócios do passado dia 19 de Agosto, encontramos o artigo "Estado demora mais 13 dias a pagar do que empresas. Pior só a Chéquia."

A fonte usada em Maio e a fonte usada pelo JdN é a mesma - o European Payment Report 2025 da Intrum — mas diferentes jornalistas chegam a narrativas diferentes. Tive de pedir ajuda para conciliá-las:
  • O artigo do JdN foca-se nos prazos médios de pagamento e recebimento (60 dias em Portugal, acima da média em sectores como a construção ou telecomunicações) (quantos dias demoram a pagar/receber).
  • O artigo do blog, baseado num artigo da Executive Digest, é sobre a taxa de atrasos (percentagem das receitas pagas fora do prazo) 
Os artigos abordam métricas diferentes.

Portugal pode ter um baixo volume relativo de atrasos (10,6%), mas como o prazo médio já é longo (60 dias, chegando a 81 na construção e 100+ noutros sectores), qualquer deslize extra pesa muito nas PME de margens reduzidas.



quinta-feira, agosto 21, 2025

Curiosidade do dia

"Vou ligar para o presidente da França, os primeiros-ministros da Alemanha e do Reino Unido e o presidente da África do Sul. Também vou ligar para Ursula Van Der Leyen, Presidente da Comissão Europeia, para que a UE passe a comprar mais produtos do Brasil", anunciou Lula, comentando que os países europeus citados, mesmo sendo ricos e tendo excelentes relações com o Brasil, compram poucos produtos brasileiros." (fonte)

Lula descobriu a pólvora: basta pegar no telefone, ligar para Macron, Merz, Starmer, Ramaphosa e até para Ursula, e zás — os europeus, ricos e distraídos, passarão a comprar contentores de feijão, soja e carne brasileira como quem adiciona um item ao carrinho da Amazon. Os agricultores da PAC até batem palmas.

O detalhe engraçado é que o Brasil mantém tarifas alfandegárias dignas de muralha medieval, mas quando os outros fazem o mesmo, é escândalo. É o clássico exercício do "cisco no olho alheio, trave no próprio", versão diplomacia comercial. 



Caneta e Six Sigma

"Take Six Sigma, the defect-minimization strategy that was all the rage in the 1980s: Its methodology involved certifying managers with progressively more prestigious colors to encourage their advance in skill level-rather as karate or judo belts do. (Even though these were color-coded paper certificates, I like to imagine the regional vice president for sales wearing a red belt over their suit.) No doubt, some firms found the exercise useful, but as the business writer Geoffrey James notes, employees typically found Six Sigma's implementation frustrating and confusing. And according to data from 2006, among the large companies that adopted the program, 91 percent wound up trailing the S&P 500 in stock performance."

Muitos críticos usam a estatística de 2006 - segundo a qual 91% das grandes empresas que adoptaram o Six Sigma ficaram atrás do S&P 500 em termos de desempenho bolsista - como prova de que a metodologia falhou ou foi mal implementada. Mas essa leitura parece-me demasiado simplista.

O Six Sigma nasceu num contexto em que a vantagem competitiva de várias indústrias estava associada à eficiência operacional: reduzir defeitos, cortar desperdício, padronizar processos. Nestes cenários, a lógica é clara: cada melhoria na eficiência traduz-se em ganhos de margem e em maior fiabilidade perante clientes industriais. Contudo, há um efeito estrutural a considerar. Empresas cujo modelo competitivo assenta sobretudo na eficiência operam normalmente em mercados maduros, com baixo valor acrescentado e onde a diferenciação é limitada. O espaço para crescer através da inovação ou da criação de novas categorias é reduzido; logo, mesmo sendo muito eficientes, essas empresas tendem a gerar retornos modestos no longo prazo quando comparadas com negócios que criam novas fontes de valor.

Assim, o número dos 91% não reflecte apenas uma suposta "ineficácia" do Six Sigma. Reflecte antes a realidade de que, se a uma proposta de valor é eficiência e baixo custo, dificilmente conseguirá bater em bolsa empresas que estão a construir novas necessidades, novos segmentos ou novas experiências para os clientes. É uma questão de tipo de vantagem competitiva mais do que da qualidade da ferramenta.

Aqui encontro um paralelo com o caso da Herdmar. A fotografia que partilhei mostrava bem o dilema: uma empresa pode ser brilhante em eficiência produtiva, em extrair cada gota de rendimento do seu processo, mas se o mercado valoriza diferenciação, marca e inovação estética, o máximo que a eficiência garante é sobrevivência - nunca liderança. O Six Sigma, aplicado fora do contexto certo, transforma-se numa corrida para estar "menos mal" do que os outros, mas não para estar "à frente" do mercado.

No fundo, a lição é esta: a eficiência é condição necessária, mas nunca suficiente. Dá disciplina, consistência e fiabilidade - mas raramente gera excedentes de valor que o mercado financeiro premie de forma continuada. Numa paisagem competitiva em que muitas empresas lutam para subir o mesmo pico, a eficiência serve apenas para garantir que não se escorrega na encosta. Mantém cada jogador no jogo, mas não muda o jogo. No topo desse pico há pouco espaço e margens cada vez mais apertadas. O verdadeiro salto competitivo acontece quando uma empresa decide procurar outros picos — criar novas categorias, novas experiências, novas formas de valor — em vez de se limitar a ser a mais resistente na escalada do mesmo monte.

Este é um tema que sigo aqui no blogue pelo menos desde 2007, não culpem a caneta quando a culpa é de quem escreve.

Trecho inicial retirado de "A Management Anti-Fad That Will Last Forever"

quarta-feira, agosto 20, 2025

Curiosidade do dia

Agosto é a altura do ano em que menos vejo televisão. Por exemplo, no Sábado passado a minha televisão esteve toda a tarde a transmitir via YouTube (abençoados Pat Metheny e Ennio Morricone). 

Sempre que tento ver notícias só me aparecem incêndios e, para esse peditório, já dei; mudo logo de canal. 

O que vejo é uma encenação repetida: o poder autárquico a reagir como uma Vestal, as populações centradas no seu umbigo, as oposições cheias de teorias sobre como resolver a situação, os bombeiros a reclamar mais poder, os lobbies a esfregar as mãos, os académicos com soluções "ready-made), os jornalistas ansiosos por mais uma transmissão em directo do Coliseu de Roma, em busca de audiência à custa do sangue e dos gritos de um combate entre gladiadores, e o governo de turno a reagir como que apanhado desprevenido. Em suma, a “indústria do fogo” no seu esplendor.

Esta encenação, feita de ruído, lembra-me uma metáfora usada várias vezes por Joaquim Aguiar, antigo comentador e analista político, no programa Think Tank (do canal de YouTube A Cor do Dinheiro, apresentado por Camilo Lourenço): 



um cão a ladrar para a roda de um carro que passa. Se ele realmente conseguisse agarrar a roda, o que faria com ela?”. A imagem capta bem o vazio de muitas reacções públicas: "ladram" muito, mas não sabem o que fazer se alguma vez “apanharem a roda” – isto é, se tiverem de assumir responsabilidades reais.

Tal como no fogo, também na política abundam actores que fazem barulho e críticas (como o cão que ladra furiosamente), mas poucos apresentam um plano sólido para governar ou vontade genuína de enfrentar as responsabilidades que advêm da vitória eleitoral. A metáfora ilustra a ironia de uma disputa em que os concorrentes fingem querer ganhar eleições, mas no íntimo receiam vencer. A ideia contra-intuitiva – a de que, em certas conjunturas, vencer é mais um fardo do que um triunfo – fica condensada na imagem do cão que não saberia o que fazer caso apanhasse aquilo que persegue.

Em resumo, Joaquim Aguiar usava a metáfora do cão e da roda para transmitir uma crítica mordaz: na política portuguesa, demasiadas vezes, quem faz mais barulho a querer “mudar tudo” não está verdadeiramente preparado para agir quando a oportunidade lhe cai nas mãos.

Mensagem para pais e avós


Na Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, capítulo 13, versículo 11.

“Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança; quando me tornei homem, deixei as coisas de criança.”

Quando falamos com as crianças usamos uma linguagem que elas entendem. Quando no 1º, 2º e 3º anos da catequese os catequistas falam de Jesus às crianças fazem-no numa linguagem que elas entendam, uma linguagem infantil.

Quando pegamos num livro infantil vemos um texto infantil, um enredo infantil, desenhos infantis, tudo adequado a fazer passar a mensagem às crianças.

Acontece que os vossos filhos/netos vão deixar de ser crianças. Quando os catequistas os recebem no 4º ano, eles quando muito, dão-lhes pelos ombros, mas quando acabam o 6º ano alguns são mais altos que os catequistas e os outros são tão altos quanto eles. E esta mudança, é a mudança exterior que qualquer pessoa pode ver. No entanto, há uma mudança mais importante que acontece ao mesmo tempo, a mudança na forma de pensar, a mudança no cérebro. 

O que é trágico é que muitas crianças abandonam a catequese na transição do 3º para o 4º ano após a Primeira Comunhão... vão crescer intelectualmente e ficar na memória com o Jesus que aprenderam até ao 3º ano, o Jesus infantil. Depois, a certa altura vão, naturalmente, começar a achar o Jesus infantil incompatível, insuficiente, incompleto para lidar com o mundo complexo dos adultos. E abandonam a fé. Volto a São Paulo: "quando me tornei homem, deixei as coisas de criança."

E aqui cabe lembrar: nunca é tarde para aprender, mas às vezes é demasiado cedo. Se a apresentação de um Jesus adulto chega antes do tempo, a criança não está pronta para o compreender; se chega demasiado tarde, ela já pode ter fechado o coração e a mente à fé.

O que se faz do 4.° ao 6.° ano da catequese é procurar fazer a transição do Jesus infantil para um Jesus adulto. É um autêntico contra-relógio, porque a qualquer momento uma criança pode deixar de frequentar a catequese.

Muitos pais pensam e dizem: O meu filho irá à catequese, irá à missa, se quiser. Não o vou forçar. Ele depois decide. No livro "Introdução ao Cristianismo", Joseph Ratzinger (futuro Bento XVI) explica que a fé cristã não nasce apenas de um raciocínio filosófico ou de uma demonstração lógica, mas de um encontro com o anúncio (pregação) de Jesus.

A filosofia e a razão podem preparar o terreno, mostrar que a fé é razoável e não contradiz a lógica.

Mas o passo decisivo para acreditar vem do facto de se ouvir uma mensagem viva, transmitida por alguém que já crê, e de essa palavra tocar o coração e mover a vontade. Por isso, quando um pai diz “o meu filho irá à missa ou à catequese, se quiser”, está a pressupor que a fé é algo que a criança descobrirá sozinha, como se fosse uma conclusão lógica a que se chega espontaneamente.

Mas Ratzinger lembrou-nos que sem pregação e testemunho concreto, a fé dificilmente desperta. Tal como ninguém aprende uma língua sem que alguém a fale com ele, ninguém aprende a “linguagem” da fé sem que lha transmitam e mostrem vivida.

Ou seja, a catequese, a missa e o exemplo dos pais não são imposição arbitrária, mas o contexto vital onde a pregação acontece, onde a criança ouve e vê a fé em acção, podendo depois fazer a sua escolha pessoal — mas com conhecimento real do que está a escolher. 

Melhorar o retorno da certificação ISO 9001 (parte IX)


A última imagem da Parte VIII pode ser melhorada acrescentando a satisfação, só por causa disso vamos conseguir (?) orquestrar um ecossistema em favor de todos, incluindo a nossa organização. E já agora, sublinhamos os tópicos que incluímos na politica e que caracterizam o nosso alvo (desta vez não escrevi cliente-alvo porque o arquitecto não compra os materiais à Vitrumo, mas prescreve-os ao empreiteiro):

Recordo o trecho da política retirado da Parte VII:
Relaciono também os trechos da política sobre os compromissos, a resposta a pergunta: em que é que temos de ser bons com a satisfação das partes interessadas (a figura acima não inclui todas, por exemplo faltam os centros de saber):

Recordo que queremos desenvolver objectivos relevantes para o negócio.

Pergunto: qual é o teste do ácido para sabermos se uma estratégia resulta ou não? 

Resposta: Resultados financeiros positivos! Lucro!

O lucro, a rentabilidade resulta de dois vectores:
Gastar menos significa ter mais produtividade:
Ter mais produtividade significa ter margem mais elevada:
A margem pode ser aumentada através da oferta de produtos/serviços de maior valor acrescentado, ou através do aumento da eficiência.
A maior parte das pessoas quando pensa em aumento da produtividade olha para a equação da produtividade e parte do princípio que o numerador, o que se oferece, é uma constante e que só se pode aumentar a produtividade actuando sobre o denominador. Nada mais errado!

Para leitura futura recomendo aqui no blogue dois temas:
BTW, aquele ou (V) na figura acima é essencialmente exclusivo. É claro que uma empresa pode e deve actuar no numerador e denominador, mas um será sempre preponderante em termos estratégicos. Por exemplo, gosto da citação: 
"If the customer doesn't care about the price, then the retailer shouldn't care about the cost."
É bom que a Ferrari trabalhe para ser eficiente, mas esse não será um objectivo da gestão de topo que deve antes ocupar a escassa banda de atenção na criação de valor. 

O teste do ácido para sabermos se uma estratégia resulta ou não é dado pelos resultados financeiros. Contudo, os resultados financeiros não devem ser vistos como um objectivo directo, mas como uma consequência de outras acções. Estamos a falar do tema da obliquidade:
Uma estratégia nunca é eterna, por isso devemos estar sempre atentos a objectivos na vertente financeira. Objectivos de rentabilidade, objectivos de vendas, objectivos de custos ou objectivos de margens. 

De onde é que o dinheiro vem?


Resultados financeiros são uma consequência natural de servir, satisfazer e manter clientes:

Assim, faz todo o sentido seguir objectivos sobre clientes ganhos (clientes novos e recorrentes), sobre clientes satisfeitos e clientes insatisfeitos (satisfação de clientes e reclamações), e sobre clientes mantidos (clientes perdidos, clientes recorrentes, clientes ganhos por word-of-mouth, ...). 

Aqui convém recordar o tema dos clientes-alvo. Para isso recomendo:
Na próxima reflexão vamos desenvolver os objectivos estratégicos para os processos da empresa.

terça-feira, agosto 19, 2025

Curiosidade do dia

Vou no décimo quinto andar e está tudo a correr bem! Não percebo porque disseram que era perigoso.


No JN de 19 de Agosto, o artigo "Famílias pedem crédito ao consumo recorde na primeira metade do ano":

"A cada mês que passa, os bancos concedem, pelo menos, 700 milhões de euros em empréstimos ao consumo

...

Em Junho, foram concedidos 726 milhões de euros em empréstimos ao consumo, culminando seis meses seguidos acima dos 700 milhões"

Vai correr tudo bem!

Obliquidade e lucro


Em 2013 aprendi com John Kay o termo obliquity — obliquidade — que então registei num texto aqui no blogue. A ideia é simples, mas poderosa: certos objectivos não se atingem de forma directa. Lucro, para uma empresa, é como o desemprego para um governo. São metas desejáveis, mas que não podem ser perseguidas de frente. É preciso trabalhar de forma indirecta, sobre as causas que lhes dão origem.

Retomei esse tema em 2021, no texto "Lucro? E para quê e para quem?", onde escrevi que o lucro deve ser entendido como um objectivo oblíquo. Considero absurdo elegê-lo como objectivo directo, tal como seria absurdo ouvir um político declarar que o seu objectivo é apenas reduzir o desemprego. Sempre que isso acontece, dá asneira. O lucro, como a redução do desemprego, é consequência de outras coisas: de clientes conquistados, de clientes satisfeitos, de clientes que continuam a confiar em nós.

Esta semana voltei a encontrar John Kay, agora numa recensão publicada na revista Money Week ao seu mais recente livro "The Corporation in the 21st Century: Why (almost) Everything We Are Told About Business is Wrong". O artigo intitula-se "The goal of business is virtue, not profit" e a tese central é clara: a obsessão com o conceito de shareholder value e a maximização de lucros distorceu a natureza das empresas modernas e acabou por prejudicar não só a sociedade mas também os próprios accionistas.

Kay mostra, com a clareza que lhe é habitual, que a insistência em maximizar lucros não beneficia, em última análise, quem supostamente deveria beneficiar:
“The last people to benefit from the pursuit of ‘shareholder value’ are shareholders.”
Ao focar-se no lucro imediato, desencadeiam-se comportamentos desviantes que acabam por gerar desconfiança pública e queda das empresas:
“Yet a turn to focus on maximising profits at all costs, and the misbehaviour that predictably follows from that, brings a fall, and explains why the public came to mistrust big business.”
Além disso, a própria ideia de que os accionistas controlam efectivamente as empresas é ilusória. As grandes corporações estão envolvidas em teias complexas de relações contratuais, financeiras e regulatórias que tornam o exercício real de propriedade extremamente difícil:
“…figuring out who really ‘owns’ modern corporations… is no easy matter… actually exercising the rights of ownership and control is far easier said than done.”
Os exemplos abundam. Empresas outrora ícones de excelência, como a Boeing, a General Electric ou a Bear Stearns, colapsaram precisamente quando passaram a subordinar a sua cultura e a sua estratégia ao dogma do lucro imediato:
“Boeing was a world-leading engineering firm… until a change in the culture led to a focus on profit. The end result was aeroplanes falling from the sky.”
“General Electric was for much of the 20th century regarded as the best-run company in the US. A ruthless turn to focus on ‘shareholder value’… led in the end to the collapse of the firm.”
Em contrapartida, Kay sublinha que o verdadeiro motor do sucesso empresarial não está apenas no capital acumulado ou nos activos detidos, mas na capacidade de mobilizar talento, inteligência colectiva e relações duradouras. O que distingue as empresas bem-sucedidas é a sua aptidão para transformar competências individuais em capacidades únicas que criam valor e são difíceis de replicar:
“The hallmark of a successful business today is ‘harnessing collective intelligence that isn’t common property’.”
O sucesso empresarial, portanto, não nasce de transacções meramente instrumentais, mas da construção de relações de confiança inseridas num contexto social mais vasto:
“…successful commercial relationships are not simply instrumental and transactional, they are ‘social and embedded in a wider framework of communities and teams’.”
A lógica é simples e, diria eu, profundamente oblíqua: sirvam-se bem os clientes, criem-se relações de confiança e de longo prazo, e o lucro virá como consequência natural. É um erro inverter a ordem:
“Serve your customers well and the profits will follow… It rarely works the other way around.”
Em suma, o pensamento de John Kay sobre obliquidade aplica-se aqui de forma exemplar. O lucro não é um objectivo directo. É um resultado, uma consequência. A obsessão em persegui-lo frontalmente destrói empresas, distorce mercados e mina a confiança social. Já o foco em clientes, em relações e em inteligência colectiva cria as condições para que o lucro surja de forma sustentável e duradoura.

segunda-feira, agosto 18, 2025

Curiosidade do dia


O jornal The Times do passado dia 16 trazia este texto:
"Bolivia - For the first time in 20 years voters will head to the polls tomorrow unsure about the likely winner. The ruling socialist party, in power since 2003, is in as much turmoil as the economy. The Movement for Socialism has been unable to present a viable candidate to be president and no dominant party has emerged. The country has depleted its international reserves and inflation is at 15.5 per cent."

O último número da revista The Economist trazia este trecho sobre a Bolívia:

"An economic crisis, with fuel shortages and inflation likely to hit 30% this year,"

Entretanto o semanário Expresso brinda-nos com:

Eu versus os maus (parte II)

Parte I

Ao minuto 32:44:

"Something I’ve noticed is that many people in the clothing industry right now are struggling with dupes on Amazon. People are often just choosing the lowest-cost option. That may be because of the current economy, or for many other reasons, but it’s happening more and more.

For example, if you go on Amazon looking for a Lululemon shirt, you might find the exact same shirt listed there with the same photo — which really should be illegal — and people are choosing that option instead. So, the question is: is the brand not strong enough to keep people willing to pay the higher price just for the status symbol of the Lululemon logo?

- When you choose your customers, you choose your future. When you choose your competition, you choose your future. And when you choose your marketplace, you choose your future. If you set up shop on a crowded street corner where everyone is selling stolen goods on folding tables, and you say, “No, no, mine is much better — it’s $30,000,” you won’t sell anything. You made the choice to sell on that corner.

- Lululemon, for example, made some brilliant marketing and business decisions — my friend Steph Corker helped build that company. But that doesn’t mean they are entitled to charge their prices to every single person on the planet. It doesn’t last forever. The story they told and the change they sought to make resonated with all the yoga moms. But now, if they want to reach the next circle of customers, they face new challenges.

- As marketers, we can’t feel entitled. We have to be empathetic. We need to acknowledge: “Yes, you’re right. If I were in your position, with your income and the story you tell yourself about your income, there’s no way I would buy Lululemon either. Of course, I would buy the knockoff. That’s the right choice for you.” Everyone does what feels like the right thing for them to do — if they are informed.

- So the real challenge is: how do you inform people in such a way that, based on who they are, what they believe, and what they see, they will make the choice you’re hoping they will make? It won’t happen just because you tell them they’re wrong."

A questão da contrafacção na Amazon mostra bem como a reacção dos clientes não é “maldade”, mas consequência de escolhas estratégicas. Se a proposta de valor não for suficientemente clara ou diferenciada, muitos clientes optarão pela alternativa mais barata. Isso não é injustiça; é simplesmente a lógica do sistema a funcionar, como Roger Martin escreveu: “If your offering is mediocre, customers won’t be loyal, competitors will attack you, and investors will shy away from you… But that is not meanness, it is fairness.”

Da mesma forma, Seth Godin insiste que não podemos ser “entitled” como marketers. É preciso empatia: compreender porque é que, no lugar deles, os clientes escolheriam o artigo fake. O que nos remete para a ideia de que, quando a estratégia é fraca por demasiado tempo, cria-se a ilusão de que os outros são maus. Na realidade, eles apenas reagem com racionalidade às escolhas que a empresa fez.

BTW, enquanto marcas como a Lululemon conseguiram contar uma boa história e servir bem o seu público (as “yoga moms”), colheram lealdade e margens. Quando quiseram aumentar quota de mercado ...

domingo, agosto 17, 2025

Curiosidade do dia



No site do Expresso li "Entre a arrogância e o abandono: um problema da esquerda" do qual retirei este trecho:
"Mas essa esquerda já não está lá. E não se trata apenas de ausência física, trata-se de ausência política, discursiva, simbólica. O que é que a esquerda tem hoje para oferecer a um trabalhador precário, a uma mãe solteira, a um jovem que não consegue pagar uma casa, a um reformado esquecido num bairro periférico? Fala-lhes de carbono. De linguagem inclusiva. De políticas de identidade. De uma Europa verde e digital. Discursos corretos, até nobres, mas destituídos de aderência à vida concreta das pessoas. Desprovidos de sensibilidade para a escala do quotidiano.

É preciso ser frontal: a esquerda, hoje, já não representa os pobres. Representa os formados. Os diplomados. Os que dominam o código simbólico da nova moral pública. Aqueles que sabem o que se pode dizer e o que é preferível calar. Os que se movem confortavelmente nas instituições e universidades, nas redações e fundações, nos fóruns internacionais. E, nesta transformação, a esquerda abandonou, sem cerimónia, os seus antigos aliados: os que não têm fluência na linguagem dos direitos identitários, os que não dominam o vocabulário da interseccionalidade, os que não compreendem, ou rejeitam, a lógica da nova ortodoxia moral."

E admiramos-nos com o sucesso de Trump no eleitorado:


 

Sobre o pensamento sistémico e a sua actualidade

Sou um adepto de longa data daquilo a que se chama "system thinking", ou seja o pensamento sistémico. Julgo que o primeiro postal sobre o tema aqui no blog recua a Junho de 2006.

Alguns exemplos da sua aplicação:
  • Recordo com saudade as interacções com Edward Hugh - 2009 - "Abençoada internet (parte III)"
  • Um exemplo que uso em algumas acções de formação e baseado em 2 empresas com que trabalhei:
  • E por fim um exemplo que me é muito querido:

Esta imagem é complementada por mais 6 como a que se segue:

O pensamento sistémico é a abordagem mais eficaz para lidar com problemas complexos e interligados, antecipando os efeitos secundários e evitando as consequências negativas não intencionais de inovações ou alterações. Costumo chamar de "jogadores de bilhar amador" aqueles que não usam o pensamento sistémico e, por isso, não vêem as consequências distais das suas decisões. Nunca esqueço a frase "Nós não prevemos até ao fim as consequências das nossas decisões."

Se o dia tivesse 48 horas teria tempo para ler mais Thomas Sowell. Ele aborda com frequência o problema da falta de pensamento de segunda ordem — ou seja, a incapacidade de pensar nas consequências não intencionais e nos efeitos de longo prazo das decisões políticas e sociais. Ele critica o que chama de “pensamento de estágio único”, focado apenas nos resultados imediatos de uma acção, sem considerar os seus desdobramentos:
"Thinking beyond stage one is one of the most important skills in economics — and in life."

O número deste mês da HBR inclui o artigo "Why You Need Systems Thinking Now" de Tima Bansal e Julian Birkinshaw (BTW, um dos livros que encomendei na semana passada foi de Julian Birkinshaw, Resurgent: How established organizations can fight back and thrive in an age of digital transformation):

"Systems thinking helps predict and solve problems in dynamic, interconnected environments.

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systems thinkers start by zooming out to understand the system that the innovation will be part of before they zoom in to solve the problem. That approach can lead to non-obvious answers."

Os autores propõem uma abordagem simplificada em 4 passos:

Our streamlined approach to systems thinking has four key steps.

1. Define your desired future state. 

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Systems thinking, by contrast, focuses on the company's role in some desired future state-one that cannot be achieved without changes to the many different parts of the system.

In our workshops we start by helping a company articulate its North Star - what it wants the system to deliver - and what its own role will be in that new system. This helps the company frame discussions with the stakeholders that will also have roles in the future state and whose cooperation is needed for the system - and the company - to progress toward the North Star. It also keeps innovation activities within the system from going awry. Disparate groups of individuals (within the same organization or from different organizations) can build on one another's efforts so that innovation doesn't become a disconnected or conflicting set of activities. 

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Once a company has identified its desired end state, it must then reach out to partners throughout the business system to win their buy - in to its new vision.

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In the course of their outreach, companies should expect resistance or, perhaps more commonly, indifference, as a company's desired end state may seem irrelevant to some stakeholders. That brings us to the next principle.

2. Frame the problem, reframe it, and repeat. Breakthrough thinkers and design thinkers invest time in identifying the right problem and then fixate on it until it is solved. Systems thinkers recognize that there is often no single way to define a complex problem and that they’ll need to reframe the definition iteratively to engage stakeholders who may experience a system’s dysfunctions differently. The trick is to find out how problems that your ecosystem partners are experiencing relate to the problem you are trying to solve.[Moi ici: Não podemos forçar as partes interessadas a fazerem parte do nosso modelo de negócio, mas podemos tentar ver o mundo através dos seus olhos egoístas (aqui sem qualquer carga pejorativa) e perceber como é que podemos criar uma relaçao ganhar-ganhar]

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Consider our experience advising the University of Guelph. Located in Ontario, one of Canada's agricultural heartlands, the university was seeking to attract more grants to carry out research in regenerative agriculture,

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As we embarked on the work, we realized that although farmers cared about climate change, the issue was not top of mind for them. We had difficulty engaging them because they had more urgent day-to-day challenges, such as planting, harvesting, and ensuring strong yields. We decided to reframe the problem from climate change to soil health. The reasoning was that soil health is more central to farmers' daily reality while still being deeply related to climate change. Healthy soil requires rich and diverse populations of microbes. Climate change causes soil to degrade, making it less effective at capturing carbon and at supporting biodiversity, among other harmful effects.

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3. Focus on flows and relationships, not products or services. Most innovators focus their energy on finding a product or service that will solve the problem they've identified.

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However, an innovation need not be a new product, service, or feature to solve a problem. Changes to the flows or relationships among actors can be just as effective, either by reducing friction to speed things up or adding friction to slow down some parts of the system.

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4. Nudge your way forward. A lot of the rhetoric on innovation focuses on immediate solutions: the moon shot, the silver bullet, the killer app. Such solutions, however, usually create knock-on problems. Systems thinking innovators seek to create an "ecology of actions" that steadily addresses problems within a system. [Moi ici: Recordo a conspiração de intervenções cirúrgicas em vez do começar da folha em branco depois de arrasar tudo.]

They look not for leaps but for nudges and experiments that reveal insights into the system and move it forward, until it reaches a tipping point and evolves naturally.

Of course, design thinking shares this emphasis on behavior and experimentation, but it retains nonetheless a focus on a specific solution. Systems-thinking experiments are about exposing interdependencies among partners in the ecosystem as opposed to testing whether a product or service improves the user experience."

Da próxima vez que tiverem de tomar uma decisão importante, façam um exercício simples: parem e perguntem-se ‘e depois? e depois?’. Talvez descubram que a resposta certa não está no que fazer já, mas no que isso desencadeia a seguir. Esse é o primeiro passo para pensar sistemicamente.

sábado, agosto 16, 2025

Curiosidade do dia



"Nations grow old without noticing, says Krzysztof Tyszka-Drozdowski. But European states must now face up to a "fundamental reality" - they have "become gerontocracies". One in four EU citizens is of retirement age. Fewer young people reduces the likelihood of wars and revolutions, but also spells a "retreat from geopolitical ambition and a reconfiguration of the continent's social model". "What defines Europe today is not its dream of positioning itself between the US and China, but the hard fact that the EU makes up just 7% of the world's population and 50% of its social spending." Britain is no exception: "redistribution flows not from rich to poor, but from precarious youth to the asset-rich elderly". It's little surprise so many young people fear for the future, postponing raising a family until they attain economic stability - "a moment that, for too many, may never arrive". "Revolt is brewing." Barely a quarter of young French people say they trust democracy [Moi ici: Os "Je suis Nicolas"]. In the UK, 61% long for a strong leader unconstrained by Parliament that could "fix" the country. Radical reform to shift support from the grey electorate and migrants to the younger generation is needed. But cuts alone won't be enough. The only way out is via economic growth, which will require deep internal reform and deregulation."

Trecho retirado da revista Money Week publicado com o título "The tyranny of gerontocracy" e inicialmente publicado em unherd.com 

 

A senhora gorda e a revisão pela gestão

No passado mês de Maio em dois postais ...
... usei a metáfora da senhora gorda:

Uma empresa toma uma decisão e, mais tarde, avalia a sua qualidade com base no resultado obtido.

Foi então que uma mão amiga me chamou a atenção para uma armadilha mental frequente.

Annie Duke, campeã de póquer e psicóloga cognitiva, autora do livro Thinking in Bets, alerta para o erro a que chama "resulting": a tendência de avaliar a qualidade de uma decisão apenas com base no resultado que ela gerou.

Segundo Annie Duke, a maioria das pessoas confunde resultados com decisões. Se o resultado for bom, presume-se que a decisão foi acertada. Se o resultado for mau, conclui-se que houve erro.

Mas essa forma de pensar é ilusória. Um bom resultado pode decorrer de uma má decisão que teve sorte. E um mau resultado pode surgir de uma boa decisão que enfrentou azar ou factores imprevistos.

O "resulting" é, portanto, um erro de julgamento que confunde sorte com competência e azar com erro. Esta ilusão pode levar as organizações a aprender as lições erradas, validando processos falhados só porque, pontualmente, correram bem.

Este alerta de Annie Duke tem implicações importantes para a forma como realizamos as revisões pela gestão.

Quando uma organização conduz uma revisão pela gestão, de acordo com a cláusula 9.3 da ISO 9001:2015, está a criar um momento estruturado para avaliar o seu sistema de gestão, reflectir sobre o seu desempenho e tomar decisões para o futuro. Mas como devem essas decisões ser tomadas?

A ISO 9001 define um sistema de gestão como um conjunto de elementos interligados ou interdependentes utilizado para estabelecer a política e os objectivos da organização, e para alcançar esses mesmos objectivos. Assim, a revisão pela gestão não deve ser encarada como uma mera reunião formal, com actas e indicadores. É, ou deve ser, uma pausa estratégica — um momento para observar, compreender e decidir.

No entanto, é fácil cair na armadilha de julgar decisões passadas apenas com base nos resultados visíveis. Um indicador a verde pode levar à conclusão precipitada de que tudo foi bem feito. Uma reclamação de cliente pode ser interpretada como sinal inequívoco de falha.

Mas esta forma de pensar ignora a complexidade da gestão. Uma boa decisão pode conduzir a maus resultados por motivos fora do controlo da organização — como mudanças súbitas no mercado, falhas de fornecedores ou eventos inesperados. Inversamente, uma má decisão pode não ter consequências visíveis, por mero acaso.

O que importa, então, não é apenas o resultado. É a qualidade do processo de decisão. A pergunta fundamental a colocar é: com a informação de que dispúnhamos na altura, tomámos a melhor decisão possível? Esta mudança de foco — do julgamento para o entendimento — permite uma leitura mais lúcida dos factos, reconhecendo a incerteza inerente à gestão e promovendo a aprendizagem organizacional.

Durante a revisão pela gestão, não se deve avaliar apenas se os objectivos foram ou não atingidos, mas também como foram definidos, que pressupostos estiveram na sua origem, e se esses pressupostos ainda são válidos. É igualmente importante distinguir entre aquilo que a organização podia controlar e o que estava fora do seu alcance. Um sistema bem desenhado pode falhar se o contexto mudar radicalmente — e isso não significa que o sistema seja inadequado, mas que poderá necessitar de ajustes.

A norma ISO 9001 não exige certezas absolutas, mas sim decisões baseadas em evidência. Isso requer um exercício de análise ponderada, capaz de lidar com ambiguidade e risco. A revisão pela gestão deve servir não apenas para confirmar conformidade, mas para antecipar mudanças, realinhar prioridades e reforçar a coerência do sistema com os objectivos estratégicos.

Mais do que a obsessão de estar sempre certo, o verdadeiro valor está em desenvolver a capacidade de tomar, sistematicamente, decisões melhores — com os dados disponíveis, os recursos existentes e os riscos compreendidos. Esta é uma das marcas distintivas de um sistema de gestão maduro.

sexta-feira, agosto 15, 2025

Curiosidade do dia



Recordar a série:
Agora no The Times de hoje, "Brain chip that translates thoughts into speech":
"Technology with the ability to decode a person's inner thoughts and translate them into speech in real time has moved a step closer after the testing of a new brain implant, scientists have claimed.
Researchers at Stanford University in California said that their device was able, with 74 per cent accuracy, to detect a person's "inner speech" — where they imagined saying a specified set of words in their mind without any effort to physically utter them - and decipher which words they were thinking about."

Lembrei-me logo que as cenas de arranque de unhas com o Liam Neeson vão ficar obsoletas:

"This could prompt fears of systems being able to read a person’s thoughts against their wishes, so researchers also tested whether the users could activate the system by imagining a password and found that it worked with 98 per cent accuracy."

Também poderão ser usadas por televisões-tablóides enquanto entrevistam políticos que não pertencem ao clube.