quinta-feira, setembro 18, 2025

Não são elas que precisam de Portugal, é Portugal que precisa delas (Parte VII)



No FT da passada terça-feira, este artigo "N Ireland tech boosted by hard-drive investment."

O artigo descreve o investimento da Seagate em Londonderry, Irlanda do Norte, num projecto de I&D de 5 anos avaliado em £150 milhões, destinado a desenvolver discos rígidos com capacidade até 100 terabytes. Este investimento coloca a região no mapa global da inovação tecnológica, ao mesmo tempo que beneficia da posição única da Irlanda do Norte no pós-Brexit, com acesso tanto ao mercado britânico como ao europeu. O texto destaca ainda o papel do investimento directo estrangeiro (IDE), em particular de empresas norte-americanas, como motor de inovação e crescimento, e a oportunidade de reforçar sectores de alto valor acrescentado.

Não encontrei uma única referência no artigo à palavra "produtividade". No entanto, o texto, todo ele, é sobre o aumento da produtividade. E ainda por cima, da forma mais impactante, através da subida na escala de valor, ou seja, através do numerador da equação da produtividade. 

O investimento em tecnologia de ponta, como discos de 100 terabytes, não se traduz apenas em mais produção, mas em produção com maior intensidade tecnológica e maior valor acrescentado por unidade de trabalho.

A Irlanda do Norte deixa de ser apenas fornecedora de componentes básicos para posicionar-se na fronteira tecnológica mundial (storage de última geração, cibersegurança, defesa, aeroespacial). Isto é precisamente o salto de escala de valor que costumo sublinhar — sair da competição pelo preço para competir pela sofisticação e pela inovação.

O artigo mostra como o IDE é decisivo para criar massa crítica tecnológica, atrair talento e integrar a região em cadeias globais de valor.


quarta-feira, setembro 17, 2025

ISO 9001:2015 vs. ISO DIS 9001:2025 - Main differences

 🚀 Novo artigo publicadoISO 9001:2015 vs. ISO DIS 9001:2025 — Principais Diferenças

Para quem trabalha com Sistemas de Gestão da Qualidade, este artigo pode ser útil. Destaco as diferenças mais relevantes que se esperam na próxima revisão da ISO 9001, comparando a versão de 2015 com a actual Draft International Standard (DIS):

✅ Maior ênfase na liderança, cultura, ética e comportamento organizacional
✅ Gestão de riscos e oportunidades mais robusta — não apenas determinar, mas também avaliar (embora praticamente todas as empresas já fizessem a avaliação)
✅ Requisitos alargados sobre sensibilização, conhecimento organizacional e comunicação com clientes

⚠️ Naturalmente, até à fase FDIS estas diferenças ainda podem evoluir. Não é preciso agir de imediato — mas analisar o que aí vem não fará mal nenhum e só poderá deixar alguém melhor preparado.


Curiosidade do dia

Retirado do FT do passado dia 15 de Setembro:


Conversar sobre os temas, qualquer tema, suportado em números, faz toda a diferença. Tudo o resto é conversa de café.




Portugal e Panasonic - as semelhanças


Ontem no FT um exemplo ao vivo e a cores do que escrevíamos sobre o Red Queen Effect na economia em "Panasonic nears a turning point in its reinvention race"

Por um lado, os rivais transformaram-se mas a Panasonic ficou para trás:
"Rivals Hitachi, Sony and NEC have been rewarded for executing painful transformations, each surging six times in value over a decade, while Toshiba was sold in 2023 for $15bn to Japan Industrial Partners. In contrast, the market value of Panasonic has languished for the past 10 years at about ¥3.75tn ($25bn)."

Falta visão e estratégia clara:

"We’ve talked with them but they don’t make any decisions. They’re siloed,” said a private equity executive in Japan. “We don’t have a clear picture of how that company will transform itself. It’s drifting."

Ontem à hora do almoço fui buscar uns livros entregues num ponto de recolha, enquanto regressava a pé ao escritório, folheei um deles e li um subcapítulo "Your best thinking five years ago is your baggage today." Encaixa bem com:

"Yet the legacy of successes in the 1980s and founder Konosuke Matsushita’s ingrained ‘water tap’ philosophy — to make products as abundant as water to capture a large share of the market — has made it hard for the company to evolve. Ogawa added: ‘Making that mindset shift is extremely difficult.’

...

Atul Goyal, analyst at Jefferies, said Panasonic's "real transformation begins when they decide what businesses they're good at" and prioritise allocating capital to areas of high-tech manufacturing competence.

One big decision shaping Panasonic's future will be the extent to which it offloads or halts the low-margin consumer electronics that made it a household name. Panasonic was attempting a "China cost, China speed and Japanese quality" revival, said Ogawa. [Moi ici: Como cá se faz com a importação de paletes de mão de obra barata e se adia a subida na escala de valor]

Neil Newman, head of strategy at Astris Advisory, has no doubt that Panasonic can push into new areas such as AI but he said the issue was "they always bring their baggage with them". [Moi ici: Vêem a ligação ao subcapítulo do livro. Weird!!! Não há coincidências, todos os acasos são significativos]

"Either they risk everything on a real restructuring and get rid of the consumer electronics," said Newman. "Or they just don't... and never set the world alight but risk gradual decline towards vulnerability and obscurity." [Moi ici: Conseguem a ver a ligação à "DVD leadership team", tão clara que até dói fisicamente]

terça-feira, setembro 16, 2025

Curiosidade do dia



Faz hoje uma semana o jornal Público trazia um texto de opinião que merece reflexão, "Vamos discutir as externalidades do turismo nas autárquicas?", de Pedro Norton.
"É preciso ser muito míope para não perceber que está a crescer na nossa sociedade, nas nossas cidades, um sentimento larvar contra o turismo, os turistas e os agentes (privados, mas também públicos) que o promovem.
E não é preciso ser muito inteligente para perceber que esse sentimento cedo ou tarde, tal como aconteceu noutras paragens, vai acabar por se transformar em ação social e por consequência desta em ação política. Não sei se essa explosão súbita do descontentamento se dará já nestas autárquicas, mas sei que é uma questão de tempo.
...
Infelizmente para os próprios, os agentes do setor parecem caminhar sonâmbulos.
Ou muito me engano ou vão arrepender-se mais cedo do que imaginam de não estarem a liderar esta agenda. O descontentamento existe e está aí para quem queira estar minimamente atento. Em muitos outros temas, as forças políticas extremistas já deram mais do que prova da sua capacidade de cavalgar frustrações, irritações e anseios com soluções ilusórias e contraproducentes. O setor do turismo não ficará imune para sempre a essa tentação.
Como em qualquer outro setor da economia, a autorregulação é quase sempre uma resposta melhor e mais inteligente (porque gerida por quem conhece os problemas a fundo) do que a regulação exógena, sobretudo quando pensada à pressa e para resolver problemas que se acumularam por miopia ou desleixo ao ponto da insustentabilidade.
Talvez esteja na altura de alguém acordar."

Come on, Pedro Norton acha que o o agente típico do setor do turismo é como os espalhadores de bosta de Estarreja. Think again.

Penso que muitos serão como os gafanhotos da Big Agro: quando deixar de dar "deitam abaixo o pau do circo e levam a tenda para outro lado, como gafanhotos."

O aviso de Pedro Norton não deixa de ser um convite à lucidez: ou o sector desperta e lidera o caminho, com medidas próprias e inteligentes, ou arrisca-se a ser surpreendido por uma regulação externa e reactiva, que virá num clima de conflito e ressentimento.

A questão central não é se o debate vai acontecer, mas quem o vai conduzir. E se os agentes do turismo continuarem a “caminhar sonâmbulos”, dificilmente escaparão às consequências.

Um OVNI

No livro "Through the Looking-Glass, and What Alice Found There" Lewis Carroll, no Capítulo 2 - "The Garden of Live Flowers",  Alice encontra a Rainha Vermelha (Red Queen).

  • A Rainha pega na mão de Alice e começam a correr lado a lado.
  • Depois de correrem intensamente, Alice percebe que continuam no mesmo lugar.
  • É aí que a Rainha explica a famosa ideia: "Now, here, you see, it takes all the running you can do, to keep in the same place. If you want to get somewhere else, you must run at least twice as fast as that!"

Na biologia, o biólogo Leigh Van Valen (1973) usou a metáfora para formular a Red Queen Hypothesis:

  • As espécies precisam de evoluir continuamente, não para ganhar vantagem, mas simplesmente para sobreviver num ambiente em que todas as outras também evoluem.
  • Exemplo clássico: a corrida evolutiva entre predadores e presas (a gazela corre mais depressa para escapar, o leão precisa correr mais depressa para caçar).

Na economia a "corrida da Red Queen" tornou-se uma metáfora para situações em que o esforço é constante, mas o ganho líquido é nulo — porque todos estão a mover-se ao mesmo tempo.

  • Concorrência internacional: países investem continuamente em inovação só para não perderem quota de mercado.
  • Empresas em mercados maduros: precisam de melhorar produtividade, reduzir custos e lançar novos produtos só para manter a posição.
  • Trabalhadores: têm de se qualificar continuamente apenas para não ficarem para trás.

É uma descrição viva daquilo a que chamamos "correr para ficar no mesmo sítio".

Estão a ver onde isto nos leva ... podia escrever sobre os produtores de uva no Douro, mas vou fixar-me no sector automóvel e no têxtil e calçado.

Primeiro o sector automóvel, em Março passado citei aqui num postal:

"São diferenças "impossíveis de cobrir por via do aumento da produtividade" [Moi ici: Aqui produtividade como aumento de eficiência, como redução de custos, como redução do denominador da produtividade. O que se segue é um exemplo ao vivo e a cores daquilo a que chamo há muito tempo o jogo do gato e do rato.], assume a administração, depois de comparar o salário bruto médio mensal nas suas fábricas nestes países e a respetiva evolução desde 2019. Em Ovar, o valor passou de €808 para €1303, enquanto a Roménia apresenta valores de €464 em 2019 e de €821 em 2025. Na Bulgária, o salário subiu de €361 para €583, em Marrocos saltou dos €284 para os €362, e na Tunísia aumentou dos €163 para os €284. No Egito, onde só há dados do atual exercício, o valor é de €136.""

No Domingo à noite no LinkedIn mão amiga tinha-me enviado isto:


O que é isto senão outro exemplo ao vivo e a cores da teoria dos Flying Geese:

O país A deixa de ser competitivo (e aqui uso a palavra competitividade com toda propriedade) e o grosso da produção [escrever aqui ou têxtil, ou calçado, ou automóvel, ou ...] passa para o país B porque é mais barato. Mas o país A, ao evoluir na horizontal, da esquerda para a direita, ganha produtividade. E produtividade à custa do numerador e não do denominador, ou seja, ganhos muito superiores que ultrapassam as migalhas da melhoria da eficiência, como aprendi com Marn e Rosiello.

Começou na Alemanha (A), passou para Portugal (B) e está a passar para Marrocos et al (C). Recordar os relatos em primeira mão de Abril passado. Só não acontece mais depressa por causa do, peço desculpa pela palavra que vou usar, mas é para impressionar com a caricatura, suborno que os governos, com benesses fiscais e fundos comunitários, fazem para que a Autoeuropa atrase a decisão de sair. 

Passemos ao calçado e têxtil.

Ontem na capa do JN, "Calçado e têxtil despedem mil trabalhadores numa semana"

BTW, o calçado tem tudo a ganhar em afastar-se da colagem que lhe querem fazer ao têxtil. O têxtil é muito Caím, o problema nunca é dele, é sempre dos outros, dos chineses, dos paquistaneses, dos trabalhadores, dos políticos, em suma dos maus.

BTW, com um título destes "Calçado e têxtil despedem mil trabalhadores numa semana" como conseguem seduzir jovens atentos para o sector? Lembram-se do que escrevi aqui a propósito de:

"A industria é forte, mas precisamos de começar pela educação e formação. E fundamental tornar este setor atrativo para as camadas mais jovens...

"Portugal tem um problema crónico de recursos humanos. A pirâmide etária está invertida e sem jovens a renovação torna-se difícil."

"O grande problema é não conseguir que os funcionários atuais, cada vez mais próximos da reforma, tenham seguidores na empresa, porque os admitidos não estão disponíveis para aprender o ofício."

Também podemos recuar a Novembro de 2016 e a "É verdade, não é impunemente que se diz mal".

Não tenho analisado aqui os números mensais das exportações, mas tive curiosidade em ver como vão as exportações do têxtil e do calçado (primeiros sete meses de 2025 versus primeiros sete meses de 2024) e fiquei admirado. As exportações em 2025 são cerca de 99,8% das de 2024. Ou seja, não foi o mercado externo que colapsou. O problema estará nas margens: os custos sobem (energia, matérias-primas, salários), mas as empresas não conseguem aumentar preços. Resultado: o sistema implode por dentro.

Recordar de Fevereiro passado:

"Portugal exportou 68 milhões de pares de calçado para 170 países em 2024, um crescimento de 3,9% em volume, mas uma quebra de 5,4% em valor face a 2023, para 1.724 milhões de euros, segundo o INE."

Recordar de Abril passado, "Competitivos, mas frágeis: o custo invisível de competir sem diferenciação"

Um OVNI, foi o que chamei a um candidato autárquico que conheço pessoalmente e que vi na RTP com um discurso diferente de todos os outros candidatos.

Conhece mais alguém que fale de produtividade como aqui neste blogue? Pois, outro OVNI... só ganho inimigos.

segunda-feira, setembro 15, 2025

Curiosidade do dia


 Esta manhã junto à estação de caminho de ferro de Valadares. 

Ao longe ainda pensei que eram os cidadãos que estavam a portar-se mal, mas de perto percebi que os contentores já estão cheios.

Esta fotografia, tirada hoje de manhã em Vila Nova de Gaia, mostra um problema que não é apenas estético: ecopontos rodeados de cartão, embalagens e sacos cheios, resíduos com elevado potencial de reciclagem que acabam amontoados no espaço público.

Se a recolha selectiva não funciona - seja por falta de frequência, insuficiência de capacidade ou falha de coordenação entre entidades - a confiança dos cidadãos esgota-se rapidamente. Para quê separar, se depois os resíduos ficam abandonados junto ao contentor?

A gestão de resíduos urbanos não é apenas um serviço de higiene. É um teste à credibilidade das políticas ambientais e ao compromisso com as metas de reciclagem que o país assumiu perante a União Europeia. Cada ecoponto cheio demais, cada recolha em atraso é uma oportunidade perdida de recuperar materiais e de reforçar a confiança pública.

O problema que esta imagem revela não é local, é sistémico: se queremos aumentar as taxas de reciclagem, não basta apelar ao comportamento dos cidadãos. É preciso garantir que a logística da recolha acompanha o esforço de separação. Caso contrário, transformamos uma boa intenção num gesto inútil.

Faz-me lembrar um desenho do Quino.

No primeiro boneco está alguém, em frente a algo semelhante ao que havia na estação dos correios na Praça do Município no Porto há muitos anos, indeciso sobre que ranhura escolher para colocar a carta que tem nas mãos.

No segundo boneco vêmos as traseiras daquela parede com as ranhuras e verificamos que todas elas encaminham as cartas para o mesmo sítio.


Cuidado com esta gente à frente de empresas (parte II)




Mais um podcast com Rory Sunderland a merecer vários sublinhados.


Logo por volta do minuto 11 Rory atira-se ao eficientismo.

Há alguns anos escrevi aqui no blog em "apostar noutro mindset" que os bancos estavam a fugir da interacção com os clientes.

Fechavam balcões, automatizavam processos, transferiam para o cliente tarefas que antes eram feitas pela própria instituição. Tudo em nome da eficiência.

Mas cada visita, cada contacto, é uma oportunidade de interacção e de co-criação. Quando essa oportunidade é eliminada, perde-se valor.

Rory Sutherland, no podcast do IEA, leva esta ideia ainda mais longe ao falar sobre call centers. Para muitas empresas, o call center é apenas um custo a cortar ou automatizar. Mas, como ele sublinha, isso é um erro estratégico.
“It should be possible for someone working in a call center to earn six figures quite easily.”
Porque um bom atendimento não é apenas “resolver chamadas rapidamente”: é prolongar a relação, aumentar a confiança, reduzir a desistência, criar valor vitalício no cliente.

James Dyson dizia-o de forma simples: receber uma chamada de um cliente é uma honra, não um custo.
O paralelo é claro: bancos a fecharem agências, empresas a desvalorizarem os seus call centers. Todas correm atrás do “cheaper” e do “cost”. Mas o valor verdadeiro nasce noutro lado: na experiência humana, no serviço que surpreende, na relação que se reforça a cada interacção.

Apostar noutro mindset é recusar ver a relação com o cliente como um problema de custos — e começar a vê-la como o lugar onde o valor é descoberto e multiplicado.

A lógica do efficiency first leva a decisões míopes que destroem valor. O valor real nasce da experiência, da interação, da confiança criada no contacto humano.

domingo, setembro 14, 2025

Curiosidade do dia


A minha mãe tem o bom costume de fazer uma breve oração para agradecer a refeição que vai ter. No passado mês de Agosto fiz-lhe um reparo. Durante a oração ela foca os "velhinhos" necessitados, e eu disse-lhe que hoje em dia os verdadeiros necessitados são os "jovens"

Recordo isto por causa de um artigo do FT do passado Sábado, "France and Britain are in thrall to pensioners." O artigo começa com este gráfico:

Os pensionistas franceses têm agora rendimentos médios mais elevados do que a população em idade activa.
"What do Theresa May and Andy Burnham have in common with Michel Barnier, François Bayrou and Emmanuel Macron? All five were admirably honest with the public about the trade-offs inherent in financing an ageing society, and all five were duly punished for their candour by the public, the press, opposition politicians or all three.
The past two decades of French and British politics are a graveyard of proposals to slow the upward ratchet of spending on growing elderly populations.
...
Not only do French pensioners get larger cheques from the government than their counterparts anywhere else in the west, they start getting them several years earlier. The result is a situation in which over-65s now have higher average incomes than the working age population - unique both internationally and in France's own history. Even the rumour of threats to this arrangement is met with mass public outrage and opposition from left and right. 
...
In a particularly stunning statistic highlighted by French political analyst François Valentin, pensions play such an outsized role in the country's public finances that they accounted for one-sixth of the ministry of defence budget last year, and without them France would not meet Nato's 2 per cent target for military spending. [Moi ici: Isto tem o seu lado caricato]
...
Voters often accuse politicians of fiscal sleight of hand, but here they are complicit in presuming ever larger pension cheques can be conjured like rabbits from a hat. At some point, both groups must confront mathematical reality."
Têm curiosidade sobre Portugal?
Os reformados e pensionistas entre os 65 e os 75 anos ganham 102,6% do que ganham os trabalhadores activos.

Nesta publicação, "Pensions at a Glance 2023," este outro gráfico com a mesma conclusão:

Conclusão:

Anichar, ao vivo e a cores


Qual o preço médio de um par de sapatos produzidos em Portugal?

Qual o preço médio de um par de sapatos produzidos em Inglaterra? 

Espera! Ainda produzem sapatos em Inglaterra? Sim, assim como na Alemanha. Só que os sapatos produzidos em Inglaterra por ingleses são em pequena quantidade, quando comparados com a produção portuguesa, são para nichos e são vendidos a um preço muito alto.

O FT de ontem publicou um artigo, "Bring back the leather dress shoe" que trazia a foto de um par de sapatos vendidos a £540 o par.

O artigo defende o regresso do sapato clássico de couro com sola Goodyear-welted, em contraposição ao domínio dos ténis/sapatilhas. O autor descreve como marcas britânicas tradicionais continuam a produzir calçado artesanal e duradouro, sublinhando a qualidade, a reparabilidade e o conforto superior destes sapatos face aos ténis/sapatilhas descartáveis. São também apresentados argumentos de sustentabilidade, com destaque para a possibilidade de recauchutar e reutilizar sapatos de couro durante anos, evitando desperdício. O texto sugere que, apesar da moda actual dos ténis/sapatilhas, há sinais de regresso aos sapatos de qualidade, tanto por razões estéticas como ambientais e de saúde.

O meu ponto é a necessidade de subir na escala de valor:
Por exemplo, de acordo com o 2019 World Footwear Yearbook, a produção anual de sapatos de cada país era:
  • Portugal . 80 milhões de pares
  • Reino Unido - 5 milhoes de pares
O modelo inglês de trabalhar para nichos de elevado valor acrescentado tem outra fonte de rendimento, para além da produção:
""We make around 100,000 pairs of Goodyear welted shoes at our factory every year," says James Fox, head of marketing and ecommerce at Crockett & Jones. "Currently, we get between 8,000 and 10,000 pairs of shoes back for repair from our customers annually."
...
"Just under half the people who buy from us send shoes back for refurbishment," says Little. "They do it five or six times. Then we have a range called Back on the Road where we take battered shoes that might be 20 years old, patch them up and add a new sole. When we've got 100 pairs, we have an online sale. They sell out within the hour.""

sábado, setembro 13, 2025

Curiosidade do dia


Este postal também podia ser chamado "Deformação profissional"

O meu sogro, que conheço há mais de 40 anos, pertence a e apoia com trabalho voluntário um grupo da Conferência de São Vicente de Paula (CSVP). Ao longo dos anos ouvi-o, algumas vezes, a referir-se à elevada idade dos membros da conferência a que pertencia.

Ontem estive à conversa com alguns elementos de uma outra conferência. Partilharam comigo a dificuldade que enfrentam: têm muito poucos membros e não conseguem atrair novos voluntários. 
Falámos também sobre como o Estado, as câmaras e as juntas de freguesia hoje oferecem muito mais apoios sociais do que há cinquenta anos. 

Já em casa, fiquei a pensar nisto em termos estratégicos. A CSVP perdeu parte da sua atractividade porque o contexto mudou. E lembrei-me da WeightWatchers: depois do Ozempic, quem precisa de uma WeightWatchers? A diferença é que a WeightWatchers já percebeu essa mudança e está a repensar-se — li recentemente que se vão focar, por exemplo, na menopausa (Weight Watchers Attempts Comeback With Menopause Treatments and Steamy Ads).

A questão de fundo é esta: quando o contexto muda radicalmente, o que faz a diferença é a capacidade de redefinir o problema que se resolve. Quem não o fizer arrisca-se a perder relevância; quem o fizer pode encontrar novos caminhos para continuar a cumprir a sua missão.

A CSVP nasceu num contexto em que o Estado e os municípios tinham pouca capacidade de apoio social. A caridade organizada fazia uma diferença vital.
A WeightWatchers surgiu num mundo em que perder peso dependia sobretudo de dieta e disciplina em grupo. Era uma resposta inovadora e acessível.

Entretanto, o contexto externo muda.
Hoje, o Estado, autarquias e IPSS ocupam muito espaço na ajuda social. A "proposta de valor" da CSVP perdeu centralidade - as necessidades continuam, mas são respondidas por outros.
Com o Ozempic e outros fármacos, a "proposta de valor" da WeightWatchers (acompanhar dietas e controlar calorias) deixou de ser a única solução.

Quando o contexto muda e uma organização insiste no mesmo modelo, a consequência é óbvia: perda de membros, perda de impacte, perda de relevância. O que une os dois casos é o risco de ficar preso a uma definição estreita do problema que resolvem.

Como é que a WeightWatchers reagiu?
Eles perceberam que o seu valor não é "controlar calorias", mas sim acompanhar pessoas em fases de transição de saúde e vida. Daí o reposicionamento: menopausa, bem-estar global, saúde mental. Ou seja, mudaram a definição do problema que resolvem.

E a CSVP? A pergunta estratégica para a CSVP não é como voltar a ter mais membros para fazer o que fazíamos há 50 anos, mas sim:
  • Que problemas sociais existem hoje que o Estado não consegue resolver bem?
  • Que papel único podemos assumir que faça sentido neste novo contexto?
Por exemplo:
  • Acompanhamento de proximidade (solidão, sentido de pertença) - algo que apoios financeiros não resolvem.
  • Resposta rápida e flexível a situações onde a burocracia estatal é lenta.
  • Criação de comunidades de cuidado mútuo, não apenas de prestação de apoios.
Enfim, reflexões de um outsider que não tem certezas, mas gosta no seu trabalho de pôr outros a pensar numa alternativa ... "a shift of mind," daí a palavra metanoia.

Daí o símbolo que acompanha as minhas propostas:
Aquele circulo laranja tem o mesmo tamanho à direita e à esquerda. É preciso fazer um esforço para perceber que há mais do que aquilo que vemos... daí o velho:
What you see is all there is.
[The eyes cannot see what the mind does not know.
We only see what our mind allows us to see.
The eye sees only what the mind is prepared to comprehend.] 
What the mind is prepared to comprehend is all there is.
A mente tem de ser trabalhada, exercitada para podermos ver o futuro, o que ainda não está lá.

Música para os meus ouvidos e os outros

No JdN da passada terça-feira encontrei "Quinta da Alorna olha para a hotelaria para puxar pelo vinho."

Ao longo dos anos tenho aqui criticado, vezes sem conta, a obsessão do sector do vinho pelo crescimento em volume. Chamei-lhe crescimento canceroso (2018), denunciei a ilusão de que a média que engana muito (2018), avisei contra a corrida para o fundo (race to the bottom) quando o orgulho nacional era reduzir tudo a good value for money.

O problema está identificado: Portugal exporta vinhos bons, mas baratos, por isso somos pobres. A tal “boa compra” que nos enche de vaidade, mas que nos condena à irrelevância nos mercados onde o prestígio e o valor acrescentado decidem quem conta e quem não conta. Produzir muito e barato nunca deu reputação a ninguém.

Por isso, é refrescante ver a notícia recente sobre a Quinta da Alorna. Ao contrário de tantos outros, não cedeu à tentação do volume. A meta não é inundar o mercado com mais garrafas. A meta é subir na escala de valor: crescer em qualidade, em diferenciação, em posicionamento. Como disse o diretor-geral Pedro Lufinha, “o volume de vendas deixou de ser uma variável em termos de prémios de gestores”. Eis música para os meus ouvidos.

O resultado já se vê: vendem praticamente o mesmo número de garrafas que em 2021, mas com um peso muito maior de vinhos de categorias superiores. Ou seja, mais receita, mais margem, mais prestígio – sem precisar de despejar milhões de litros adicionais no mercado. Exactamente o caminho que tantas vezes defendi: aumentar preços, subir na escala de valor, deixar de correr atrás de métricas de vaidade que só enganam.

Claro que nem tudo é vinho. O artigo chama a atenção para o milho como incógnita que pode comprometer as contas. E aqui volta o velho problema: o milho é uma commodity sem marca, sem história, sem diferenciação. O seu preço é ditado em bolsas internacionais e o produtor é sempre o elo mais fraco. Não posso deixar de perguntar: por que não substituir esse milho por culturas de maior valor acrescentado, mais alinhadas com a filosofia de diferenciação que já adoptaram no vinho?

No entanto, o essencial é isto: a Quinta da Alorna percebeu que o futuro não está em ser campeã do litro barato, mas em ser reconhecida pela qualidade e pela experiência. Nisso, está a dar um exemplo que merecia ser seguido por muito mais gente no sector. Porque, como escrevi há anos, “um país bag in box, de produtores mal pagos, será sempre um país sem futuro”. Mas um país de produtores que ousam subir na escala de valor pode finalmente aspirar a mais do que sobreviver: pode aspirar a ser respeitado.


"Os 544,65 milhões de euros em vinho de Portugal enviados para o estrangeiro nos primeiros sete meses deste ano ficaram 0,5% abaixo do registo homólogo. Até se compraram mais litros (+2,7%), mas a um valor médio inferior. Caiu de 2,73 para 2,65 euros no espaço de um ano (-3,16%), com a "forte redução do preço médio nos EUA a contribuir decisivamente para a descida do preço médio global das exportações portuguesas de vinho", enquadra Falcão.
Até 2030, a meta fixada pela ViniPortugal passa por alcançar 1,2 mil milhões de euros em exportações e aumentar o preço médio para 3.19 euros por litro. O líder da organização diz ao ECO que mantém esses objetivos, embora "naturalmente [esteja] a rever e a ajustar a estratégia de promoção para dar resposta aos novos desafios e circunstâncias de mercado"."  

sexta-feira, setembro 12, 2025

Curiosidade do dia


No The Times de hoje "More pensioners coming out of retirement to combat loneliness":
"Gone is the era of counting down the days until you turn 65 and can enjoy a quiet retirement in the pub or on the golf course.
A growing cohort of people are instead working well into their seventies and eighties, a report by Bupa has found, driven by a desire to stave off dementia and loneliness in old age.
One in four over-55s believe working past retirement age will help them to live longer and workplaces are being encouraged to do more to retain these older staff.
...
A survey of 8,000 adults found that half of over-55s believed working past retirement age would help to keep their brains active and one in four believed it could help them to live longer.
Some 13 per cent of over-50s have already returned to work after retirement and one in five said they would consider doing so. These people report a stronger sense of purpose and improved mental and physical health. John Shipton, 94, works three mornings a week on the checkouts at Waitrose's Exeter branch. He retired from full-time work as a maintenance controller at 65 but applied for his job at Waitrose at the age of 80.
Shipton told The Times that the "pleasure of working" kept him going, adding: "Interactions with other people are so important in your life. It stops you going completely bananas.""

Eu que nunca pensei em reformar-me e me sinto um marciano ao lado de tanta gente com menos de 60 anos que aspira, que sonha com a reforma, agradeço a solidariedade destes ingleses. 

Não são elas que precisam de Portugal, é Portugal que precisa delas (Parte VI)



O Financial Times de ontem trazia o artigo "Fresh blow to Labour growth drive as Merck pulls plug on Elbn research site":
"US drugmaker Merck has scrapped a £1bn London research centre and will lay off more than 100 scientific staff, as the industry accuses ministers of making the UK uncompetitive and paying too little for medicines.
Merck, known as MSD in Europe, told the Financial Times that it would move the research activity to existing sites, mainly in the US, where the Trump administration is pressuring pharmaceutical companies to invest more.
"Simply put, the UK is not internationally competitive," the group said. The move to scrap the research centre in King's Cross - which was already under construction and set to open in 2027 - and lay off 125 scientists and support staff is a blow to Sir Keir Starmer's government."

Em postais anteriores, por exemplo, na série "Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas" tenho insistido: Portugal não sobe na escala de valor com as empresas que já cá estão (produzimos 22€/hora). Sobe se conseguir atrair aquelas que ainda não estão, as que operam com níveis de produtividade próximos dos 400 €/hora, como aconteceu na Irlanda.

Para que essas empresas escolham Portugal, é preciso criar condições claras: talento, infra-estruturas, estabilidade institucional… e também um enquadramento fiscal atractivo. O IRC não pode ser visto como uma prenda às empresas locais, como discuti em "A descida do IRC é injusta". O IRC é uma alavanca estratégica para que multinacionais com alta produtividade decidam instalar aqui os seus centros de decisão, fábricas, laboratórios ou hubs de desenvolvimento.


 

quinta-feira, setembro 11, 2025

Curiosidade do dia

O FT de hoje inclui um artigo com um lado positivo, "'Super sewer' chief bows out of £5bn project to the sweet smell of success."


O artigo noticia a conclusão do Thames Tideway Tunnel, conhecido como o "super sewer" de Londres, um megaprojecto de 25 km e £5 mil milhões, destinado a modernizar o sistema de esgotos da capital inglesa. Após nove anos de construção, o túnel foi entregue próximo do prazo e do orçamento, algo raro em projectos desta dimensão. Não houve mortes, grandes disputas ou incidentes críticos. O CEO Andy Mitchell vai abandonar o cargo, deixando o projecto concluído com a reputação de um caso de sucesso na execução de grandes infra-estruturas. O financiamento através de sobretaxas nas facturas da água continua a gerar polémica, mas do ponto de vista técnico e de gestão, o projecto é visto como exemplar.

"delivery of one of the largest infrastructure projects roughly on time and close to budget."
"There have been no deaths, serious injuries, major contract disputes or surprises on time or cost." 
"Tideway will be studied for decades as an exemplar case of how to deliver multibillion infrastructure programmes."

Esta última citação, "Tideway will be studied for decades as an exemplar case of how to deliver multibillion infrastructure programmes," fez-me recuar a 2023 e à "The Iron Law of Megaprojects" de Flyvbjerg:

  • 47.9% are delivered on budget.
  • 8.5% are delivered on budget and on time.
  • 0.5% are delivered on budget, on time and with the projected benefits. 

O Tideway contraria, em parte, esta estatística brutal: foi entregue próximo do orçamento, dentro de um prazo aceitável, com benefícios claros já mensuráveis (7,8 milhões de toneladas de efluentes desviados). 
É portanto uma excepção rara à Iron Law, o que reforça a importância de estudar os factores que explicam este sucesso: liderança estável, estrutura de financiamento clara, gestão de riscos competente, e um modelo de contratação que garantiu alinhamento de incentivos.

Flyvbjerg, no seu livro "How Big Things Get Done" mostra também que nem todos os grandes projectos falham. Lembro o exemplo do Estádio Olímpico de Londres 2012 como um caso onde, apesar do risco elevado, a entrega foi bem-sucedida devido a planeamento robusto, gestão transparente e preparação detalhada. 

O Tideway pode ser colocado ao lado desse exemplo: ambos provam que grandes coisas podem ser bem feitas quando os factores de governação, planeamento e liderança estão alinhados.

Uma das cenas a garantir é evitar o "scope creep", esta tarde vou falar dele durante um webinar. O aeroporto de Berlim é um exemplo lapidar desse problema. Quando não se congelam as decisões de design cedo ... os políticos arranjam sempre uns trabalhos a mais...

e coragem para dizer a verdade?


Li no JN da passada terça-feira, "Indústria do calçado aposta na formação de jovens e reforça presença nos EUA."

O artigo sobre a indústria do calçado centra-se no défice de mão de obra jovem, na formação e na atracção de talento, mas quando refere “competitividade” não fala em produtividade. O discurso gira em torno de tornar o sector atractivo e de preservar o saber artesanal, mas não em como produzir mais valor com os mesmos recursos. E sem mais valor ... não há jovens, ponto.

Em Falta a parte dolorosa da transição mostro que, sem aumentos de produtividade, apoiar empresas e sectores para "serem competitivos" apenas prolonga o problema: salários baixos, dependência de mão de obra barata e ausência de investimento em tecnologia.

Em Competitividade, absurdo, lerolero e contranatura denuncio como o termo competitividade foi/é deturpado: 
  • pode significar enriquecer via produtividade, 
  • mas também pode servir para justificar cortes salariais, como no Uganda, onde "competitividade" se tornou sinónimo de empobrecimento
Em Competitiveness compass. Be careful what you wish for explico que países como a Alemanha e o Japão caíram no mesmo erro: usar "competitividade" como dogma, confundindo-a com cortes de custos, em vez de investir no numerador da equação da produtividade

Quando um artigo, ou pior um sector económico, fala de competitividade e ignora a produtividade, está na prática a referir-se apenas ao denominador da equação da produtividade - isto é, reduzir custos, salários ou expectativas. Isto conduz a um ciclo de empobrecimento:
  • salários baixos passam a ser vistos como condição de sobrevivência;
  • como não há ganhos de produtividade, bons salários parecem incompatíveis com a competitividade;
  • o sector deixa de atrair talento jovem, reforçando o círculo vicioso.
O discurso da competitividade no calçado, se fosse só no calçado ..., sem referência explícita à produtividade, repete o erro que não me canso de denunciar no blog:
  • Competitividade sem produtividade = empobrecimento.
  • Para pagar bons salários é preciso atacar o numerador (inovação, tecnologia, novos modelos de negócio, produtos de maior valor acrescentado).
  • Se se insiste no denominador, Portugal arrisca transformar a "força" do calçado (artesanato + tradição) numa armadilha de baixos salários e envelhecimento da força de trabalho.
E volto aos números de Priestley, e volto ao anichar e volto à festa de Natal do filho de 5 anos, aka DVD leadership team. Qual é o governo ou associação com coragem para dizer a verdade?


Enterrar a cabeça na areia não resolve ...

Quando escrevo aqui sobre os Flying Geese:
explico por que é que o Japão deixou de ser uma potência no têxtil... ainda é, mas para nichos, ou porque St. Louis já não tem calçado. Acham mesmo que o calçado ou têxtil português consegue fazer melhor do que o Japão ou os Estados Unidos? Só vão sobreviver as empresas que anicharem. Isso só não acontece mais rapidamente porque os governos, estribados nos fundos da UE, vão atrasando o inevitável.
"A indústria é forte, mas precisamos de começar pela educação e formação. É fundamental tornar este setor atrativo para as camadas mais jovens..."
"Portugal tem um problema crónico de recursos humanos. A pirâmide etária está invertida e sem jovens a renovação torna-se difícil."
"O grande problema é não conseguir que os funcionários atuais, cada vez mais próximos da reforma, tenham seguidores na empresa, porque os admitidos não estão disponíveis para aprender o ofício."
"Alguém convencionou que era duro e mal pago... O ofício é nobre."

Aquele "Alguém convencionou que era duro e mal pago" tira-me do sério... e como é que as pessoas pagam a renda ou o empréstimo da casa? 

quarta-feira, setembro 10, 2025

Curiosidade do dia


Hoje, por volta das 7h00 da manhã, junto à estação de caminho de ferro de Valadares. A Infraestruturas de Portugal gosta de marcar, vedar, delimitar territórios num: "Isto é meu!" 

Já cuidar do espaço... isso é secundário. Toda a gente sabe que o espaço não gera comportamentos ...

Recordo Julho de 2024:

"Hoje, percebi mais um sintoma do que é viver na Suíça. A pintura periódica das paredes dos humildes túneis das passagens para peões nas estações de caminho de ferro."

E, Agosto de 2023 na praia da Madalena:

"Abençoados os que cuidam, criam, restauram." 

"Toda a gente sabe que o espaço não gera comportamentos..."

Pois… foi exatamente essa convicção que durante anos deixou estações, praças e bairros ao abandono.

Mas desde Wilson & Kelling (1982), "Broken Windows: The Police and Neighborhood Safety." The Atlantic Monthly, com a célebre “broken windows theory”, sabemos o contrário: um espaço cuidado gera comportamentos de respeito; um espaço degradado abre caminho ao desleixo, ao vandalismo e à insegurança.

Nova Iorque, nos anos 1990, foi um caso paradigmático. A limpeza sistemática dos graffiti no metro — todos os dias, sem falhar — não foi apenas estética: foi uma mensagem. "Aqui cuida-se, aqui há regras, aqui vale a pena respeitar." O resultado foi uma mudança cultural que ajudou a transformar a percepção de segurança na cidade.

E depois olho para Valadares, às 7h00 da manhã, com ervas a crescer num espaço abandonado pela Infraestruturas de Portugal, e penso:

O espaço não gera comportamentos? Gera, sim.

Gera pressa em passar, gera descuido, gera indiferença.

Tal como, em contraste, a Suíça e a praia da Madalena onde uma simples mão de tinta num bar de praia inspira respeito, pertença, até orgulho.

Ironia das ironias: o espaço não gera comportamentos... mas todos nós nos comportamos de acordo com o espaço que encontramos. 

Vanity metrics é para egos


Ontem, durante a minha caminhada matinal fui atraído por este texto no Facebook:


Por um lado, fez-me recordar a parte da conversa de sexta-feira com o parceiro das "conversas oxigenadoras" sobre "vanity metrics".

Alterando um pouco a frase de Alex Hormozi (daqui) "Getting people to buy is NOT the objective of a business." Posso escrever: "Getting people to know you is NOT the objective of a business."

Que as pessoas nos conheçam pode ser bom para o ego, mas não se traduz em resultados para o negócio. Lembram-se do título do famoso livro de Hermann Simon? 

Eu ajudo, "Hidden Champions of the Twenty-First Century: The Success Strategies of Unknown World Market Leaders." Again, ser conhecido do grande público pode ser bom para o ego, mas irrelevante para o sucesso do negócio. 

Há meses, ao começar a leitura do fabuloso livro de Will Guidara, salientei:
"Até que ponto este tipo de concursos, historicamente, desafiou, desafia, motivou, motiva, empresas e trabalhadores a esmerar-se, a desenvolver, a inovar, a diferenciar-se.

E por cá, temos esta tradição? Podemos promovê-la?"
Há muitos anos aqui no blogue salientei o uso por um suíço deste tipo de concursos para subir na escala de valor com o seu azeite produzido em Portugal:
"Este azeite competiu e ganhou. O Risca Grande Virgem Extra venceu o primeiro prémio do Concurso de Azeites Biológicos da BIOFACH 2009 em Nuremberga, na Alemanha."
Há dias no postal "Ousar olhar para o nicho - o poder dos números" usei os números de Daniel Priestley para chamar a atenção para o poder de compra de 10% do mercado:
"Servir nichos ou segmentos premium exige foco, diferenciação, qualidade e uma proposta de valor clara. Mas é aí que reside a oportunidade: ao subir na escala de valor, uma PME pode transformar um mercado saturado numa arena mais controlada, mais rentável e menos dependente da guerra do preço."
Voltemos agora ao texto do Facebook. Estes resultados, para esta coudelaria e outras na região, porque há sempre um efeito de spillover, real ou imaginado, são uma via para a subida na escala de valor, uma via para o segmento do luxo.

BTW, a Dressage Plus de Vasco Freire já está na elite, mas vivemos no reino da Rainha Vermelha, quem pára acaba como os fidalgos arruinados que sofrem do fenómeno do hollowing.

Para as PME, a pergunta que fica é simples: vão continuar a correr na mesma roda da Rainha Vermelha, sempre a esforçar-se para não ficar para trás, ou vão escolher o caminho mais exigente — o dos nichos, do luxo, da diferenciação e da verdadeira criação de valor?

🚀 O mercado já mostrou: quem ousa subir na escala de valor deixa de ser mais um na multidão e passa a ser insubstituível.


NOTA: Nunca esquecer "Perceber a necessidade de sair do carreiro." Assim, quando de um lado temos produtos comoditizados e concorrência por preços baixos, o “David” deve procurar perceber se "When something is commoditized, an adjacent market becomes valuable." Rory Sunderland anda agora a falar de algo que este blogue, desde o seu início, tem apresentado como solução para as PME, "reverse benchmarking", ou de outra forma: quando todos fazem zig, a PME faz zag (sair do carreiro). O segredo é este: quando todos competem por ser “melhores” no mesmo critério, a PME pode destacar-se por ser “diferente” — e muitas vezes isso é mais valioso do que ser “melhor”. BTW, melhor para quem, melhor segundo que critério, melhor em que circunstâncias? 

terça-feira, setembro 09, 2025

Curiosidade do dia

Faz-me uma espécie ver políticos e militares tão entretidos em investir nas armas para combater a guerra anterior, enquanto a Ucrânia mostra como essas ideias estão obsoletas.



... ou a focar para crescer?


Quando digo que as PME têm de anichar e encolher, muitas vezes cito o exemplo da Apple à beira da falência, "waiting for the next big thing" onde se pode ler:
"By September 1997, Apple was two months from bankruptcy. Steve Jobs, who had cofounded the company in 1976, agreed to return to serve on a reconstructed board of directors and to be interim CEO.
...
What he did was both obvious and, at the same time, unexpected. He shrunk Apple to a scale and scope suitable to the reality of its being a niche producer in the highly competitive personal computer business. He cut Apple back to a core that could survive.
...
Jobs cut all of the desktop models—there were fifteen—back to one. He cut all portable and handheld models back to one laptop. He completely cut out all the printers and other peripherals. He cut development engineers. He cut software development. He cut distributors and cut out five of the company’s six national retailers. He cut out virtually all manufacturing, moving it offshore to Taiwan. With a simpler product line manufactured in Asia, he cut inventory by more than 80 percent. A new Web store sold Apple’s products directly to consumers, cutting out distributors and dealers."

Agora leio "If You Think Downsizing Might Save Your Company, Think Again":

"We found that downsizing firms were twice as likely to declare bankruptcy as firms that did not downsize. While downsizing may be capable of producing positive outcomes, such as saving money in the short term, it puts firms on a negative path that makes bankruptcy more likely. While not always fatal, downsizing does increase the chances that a firm will declare bankruptcy in the future.

Given this finding, we sought to understand why some firms were able to survive the negative effects of downsizing while some were not. We speculated that examining firms’ remaining resources could shed light on this question. Accordingly, we examined intangible resources (captured through Tobin’s q,a measure of the value of the firm not captured by its balance sheets), financial resources, and physical resources."

Gostava que o artigo estudasse as empresas que tiveram sucesso após o encolhimento. Encolher e manter o modelo de negócio é uma coisa. Encolher e mudar de modelo de negócio é uma coisa completamente diferente.

As PME precisam de clareza: cortar custos para sobreviver no mesmo modelo pode ser o caminho para o abismo; encolher para focar, repensar e transformar pode ser o início de um renascimento.

E a sua empresa? Está a cortar para resistir… ou a focar para crescer?

Recordar "Crise no setor têxtil: Polopiqué vai despedir 300 trabalhadores e Stampdyeing com salários em atraso" ou "Dezenas de funcionários de fábrica têxtil em Santo Tirso protestam contra salários em atraso"