Ontem, durante uma breve passagem pelo Facebook fui interpelado por esta imagem:
Sublinhei logo:
"Ramalho, destaca a importância de reforçar a atratividade do setor, promover a renovação geracional e ... "O agricultor não pode continuar a ser o elo mais fraco da cadeia de valor do agroalimentar""
Recordei logo a diferença entre as associações têxteis e do calçado, e sobre o qual escrevi aqui em 2011: "Não é impunemente que se diz mal".
Resolvi ler o artigo. Reparem como começa e depois, como continua até ao final:
"Enquanto entidade gestora dos programas comunitários e de outros instrumentos de financiamento de desenvolvimento regional, como pode a CCDR-N ajudar os agentes locais a tirarem o melhor partido dos apoios existentes?
O nosso papel é garantir que os fundos comunitários são bem aplicados, capazes de acrescentar valor ao território e de aportar desenvolvimento e sustentabilidade, ...
...
Recentemente foi aumentado para o dobro o apoio à instalação de jovens agricultores, em regime de exclusividade, para os 50.000 euros. Também o limite máximo de apoio ao investimento do jovem agricultor passou de 206.000 euros para os 400.000 euros. E importante ainda implementar um sistema de acompanhamento do jovem agricultor para que possa beneficiar de apoio técnico durante a execução do projeto.
...
O programa VITIS teve uma forte dinâmica na última década, mas, nos anos mais recentes, tem tido menor adesão. Porquê?
É verdade, mas este ano a procura ultrapassou, em valor, o dobro face ao montante disponibilizado, o que se deveu, em grande parte, ao ajustamento dos custos unitários do VITIS, que estavam manifestamente baixos. No ano passado, foram apresentadas, em todo o território nacional,1418 candidaturas para uma área global de reestruturação de vinha de 2264 hectares. Este ano, foram submetidas 2121 candidaturas para reestruturar 4604 hectares. Só a Norte, foram apresentadas 1318 candidaturas tendo em vista uma área de reestruturação de vinha de 1983 hectares.
As alterações climáticas, e em especial os fenómenos meteorológicos extremos, têm gerado novos desafios. Os apoios existentes, designadamente a empresas afetadas por incêndios rurais, são os necessários e adequados?
Os apoios aos danos provocados pelos incêndios de ..."
Transpira uma dependência excessiva de subsídios e fundos comunitários. A entrevista está carregada de referências a fundos, subsídios, programas e apoios (VITIS, PEPAC, PAC, etc.). Isto transmite a ideia de um sector que sobrevive mais pela “captura de apoios” do que pela sua capacidade de criar valor autónomo através de inovação, diferenciação ou produtividade. Sugere uma mentalidade de sobrevivência dependente, não de diferenciação.
E comecei a pensar num trecho da revista The Economist que citei aqui no passado Sábado:
"In the 20th century Argentina, plagued by inflation, went from being one of the world's richest young countries to a middle-income economy that lurched from one crisis to the next. The competition that raged in Buenos Aires was not over who could innovate or be the most productive, but over who could capture the state and exploit its power to help them avoid inflation's confiscatory effects."
Este foco cria uma mentalidade de dependência crónica — em vez de reforçar o agricultor, fragiliza-o, porque a sobrevivência deixa de depender do desempenho competitivo e passa a depender da capacidade de preencher formulários e alinhar-se com programas de Bruxelas.
Temos de ser equilibrados e reconhecer uma parte positiva na entrevista. Também sobressai uma visão de futuro positiva, assente na sustentabilidade e na inovação. Reconhece-se que os consumidores estão cada vez mais dispostos a pagar mais por alimentos sustentáveis, o que abre espaço para estratégias de diferenciação e criação de valor, em vez de cair na armadilha da competição apenas pelo preço. O vinho é associado a experiências únicas – enoturismo, gastronomia, cultura e identidade territorial – revelando a ambição de reposicionar o setor em cadeias de maior valor.
Só que também temos o lado do mau marketing ou das mensagens ambíguas.
“O agricultor não pode continuar a ser o elo mais fraco da cadeia de valor” vs. “Precisamos de atrair jovens para a agricultura”.
Ao reconhecer o agricultor como elo frágil, reforça-se a imagem de precariedade. É contraditório querer simultaneamente convencer novas gerações de que o sector é atractivo e moderno.
Apoios crescentes para jovens agricultores vs. desinteresse contínuo e abandono das vinhas. Mostra que os incentivos financeiros, por si só, não estão a resolver o problema da atractividade e sustentabilidade da viticultura.
Fala-se em inovação e diferenciação, mas a maior parte do discurso continua focada em instrumentos financeiros e fundos comunitários — enfraquecendo a narrativa da autonomia estratégica.
O discurso está excessivamente centrado em fundos comunitários (VITIS, PEPAC, PAC) e menos em estratégias de mercado ou inovação organizacional.
O sucesso do sector é medido pelo número de candidaturas e pelo montante de apoios atribuídos, e não por indicadores de valor acrescentado, produtividade ou diferenciação competitiva.
Há um trecho que é lerolero, conversa para boi dormir:
"construção de estratégias de desenvolvimento regional, em articulação e parceria com as demais áreas das políticas públicas, de forma bem mais alargada. O que se traduz numa maior capacidade de resposta aos novos desafios que a agricultura e as pescas enfrentam, mas também em benefício e valorização dos próprios territórios rurais e dos seus ativos. Não podemos esquecer que a agricultura é também coesão territorial e, em muitos dos nossos territórios, é mesmo a principal atividade económica. E não tenho dúvidas, que uma política regional adaptada às especificidades locais é fundamental para gerar competitividade, que também nasce da proximidade, da agilidade na resposta e da valorização da identidade e do que é único em cada território."
%2009.11.jpeg)

%2012.29.jpeg)
%2014.02.jpeg)
%2011.29.jpeg)
%2013.55.jpeg)

%2010.36.jpeg)
%2018.36.jpeg)
