Na semana passada várias vezes e ontem mais uma vez, várias conversas centraram-se sobre a falta de trabalhadores. Várias empresas de vários sectores de actividade desesperam para encontrar trabalhadores.
Na passada sexta-feira neste espaço de diálogo alguém referia a ganância dos empresários pelo lucro como motivo para os baixos salários. Não concordo!
Comecemos por considerar o valor acrescentado bruto:
(Vendas - Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas - Fornecimentos e serviços externos). O VAB representa a riqueza criada.
Depois, olhemos para números sobre o valor acrescentado por trabalhador em vários sectores de actividade:
Por mais mãos largas que um empresário do mobiliário ou têxtil queira ser, o valor acrescentado bruto limita a possibilidade de praticar salários altos. O valor acrescentado bruto não o permite!
E esta é a razão para a imagem da teoria dos flying geese:
A seguir à II Guerra Mundial o Japão aposta no têxtil e vestuário, depois o sucesso do sector metalomecânico começa a "roubar" trabalhadores ao têxtil e vestuário porque pode pagar melhor, porque tem valor acrescentado por trabalhador superior e assim por diante. Como continua a haver procura por artigos têxteis a solução é deslocalizar a produção para países com salários mais baixos, como Hong Kong, e assim se desencadeia a evolução ...
Como Portugal está estagnado há cerca de vinte anos ou mais não há progressão na horizontal da esquerda para a direita. Por isso, os salários estagnam, porque o valor acrescentado sobe pouco. Só depende do crescimento intrasectorial, é pouco influenciado pela progressão para sectores intrinsecamente mais produtivos. O que fazem as pessoas? Emigram ou migram para outros sectores de actividade. Por exemplo, recentemente ouvi o caso concreto de um motorista numa empresa de prestação de serviços na área da electricidade que se despediu e passou a ganhar mais do dobro ao optar por emprego numa empresa de transportes internacionais.
O problema não é a empresa-tipo. O problema é a distribuição das empresas-tipo por sector.
Agora a isto acrescentem:
- fronteiras abertas - atracção de melhores salários no estrangeiro
- demografia - país a envelhecer (além do progressivo aumento dos que vão para a reforma, chegam menos pessoas à idade de trabalhar)
- má gestão - lembram-se da vacinação covid quando era "gerida" por um militante do partido do governo? Lembram-se da vacinação covid depois que começou a ser "gerida" pela equipa do militar? O militar, esse, como me recordou o parceiro das conversas oxigenadoras, andava no terreno a ver, a recolher informação em primeira-mão. A má gestão nas empresas gera desorientação, gera "jobs that lack autonomy, variety, or opportunities to grow; jobs that pay poorly and don't reward performance fairly; jobs that aren't clearly defined and structured; jobs that lack guardrails that prevent chronic overload and frustration." (daqui)
- impostagem elevada para pagar um estado que não funciona.
Qual o caminho para as empresas existentes?
Qual o caminho para o país?
Para o país, seguir a receita irlandesa (interessante ver o peso do
sector quimico e farmacêutico na Irlanda e comparar com o ranking de valor acrescentado lá em cima no postal).
Para as empresas existentes, dentro de um mesmo sector de actividade, há uma receita para subir na escala de valor acrescentado:
anichar!
Anichar permite praticar melhores preços enquanto se precisa de menos gente, mas mais competente e mais polivalente. Qual a grande resistência a anichar? Ainda ontem citámos uns trechos sobre isso: o medo de anichar.
Os preguiçosos olham para os resultados, não olham para o "processo" que leva aos resultados. Por isso, optam pela "magia", pela fezada:
- "Se trabalharmos menos horas, vamos ser mais produtivos"
- "Se aumentarmos administrativamente os salários vamos dar uma lição a esses empresários gananciosos"
- "Se ...
Continuemos a festa ...
Nada do que acontece ao país é obra do acaso. É um produto perfeitamente normal das nossas decisões como povo. E estando este povo envelhecido e dependente:
"It is difficult to get a man to understand something, when his salary depends upon his not understanding it"
E estando este povo envelhecido e dependente quer continuar a ser enganado. Avós que vivem à custa dos netos, e dos bisnetos que nunca nascerão, pelo menos por cá.