Parte I.
A empresa A do exemplo anterior, apesar de preguiçosa, apesar de ter um desempenho de zombie vai sobrevivendo à custa de artimanhas legais e desinteresse dos outros concorrentes em servir os seus clientes.
Entretanto, a China entra em jogo e começam a aparecer os produtos superbaratos com os quais as empresas A não podem competir:
E assim, em t4 as empresas tipo A morrem às mãos da concorrência amarela (chinesa).
Em t5, as empresas A já não existem, e agora a perseguição é às empresas C.
A velocidade de subida na escala de valor das empresas chinesas, e a constante entrada em campo de players com custos baixos (Turquia et al) dizima empresas em Portugal a uma velocidade superior aquela a que as empresas, ou os sectores se podem regenerar naturalmente.
A incapacidade de calçar os sapatos do outro impede ver que o que chineses e turcos nos fazem, é o que nós fizemos aos alemães e franceses que trabalhavam nas indústrias tradicionais, quando o país aderiu à EFTA. Por isso, falam em dumping social, ou em batota, ou associam o sucesso a negócios como o contrabando de droga.
Também existem os Peter Pan. Os Peter Pan são as empresas que operam em mercados em que os chineses ainda não entraram, mas que também sentem a concorrência de quem oferece o mesmo produto ou serviço por um preço extremamente mais baixo. Os Peter Pan não conhecem, ou não ouviram falar do
modelo de Kano:
Sentem-se injustiçados, então até dão boas condições aos seus trabalhadores e aparecem uns maus que praticam preços de arrasar a estragar tudo.
Como o ginásio de topo com que trabalhei em 2011 e que se zangava com os velhos clientes que o trocavam por opções mais baratas em pleno descalabro do mercado interno. Não, não são os clientes os maus, os maus são os que não evoluem e não arranjam mais truques, mais novidades para continuar a seduzir os clientes.
E assim chegamos aos truques, e ao
truque alemão. A necessidade imperiosa de estar sempre a trabalhar para subir na escala de valor, para aumentar o peso do numerador na equação da produtividade. A velocidade a que a empresa portuguesa-tipo faz isto é muito baixa. Maliranta e Nassim Taleb explicam (ver parte I).
E aqui entra o exemplo irlandês. O exemplo irlandês não tem a ver com os empresários irlandeses, tem a ver com o capital estrangeiro injectado como investimento directo:
Recordar Irlanda e João Duque:
Em 1990 a trabalhar com uma empresa japonesa levei-os a visitar uma fábrica de grades de cerveja na Figueira da Foz. Apesar da desarrumação, da sujidade, das máquinas da empresa, o japonês gostou da empresa, confidenciou-me que a super-ocupação do espaço com máquinas o faziam lembrar as fábricas japonesas (BTW, outro japonês com que trabalhei, chegava a uma empresa e via-a super arrumada e com muito espaço e não conseguia compreender o desperdício de dinheiro, o valor do m2 no Japão era exorbitante, ficava logo de pé atrás). Imaginem, uma fábrica de grades de cerveja arrastada por uma empresa estrangeira para uma subida na escala de valor... qual o valor líquido co-criado por grama de polímero, ou por minuto de injecção, a fabricar grades de cerveja ou componentes para automóveis. Hoje, essa empresa é um player no negócio de componentes para automóveis.
A rapidez e a dimensão da subida na escala de valor requer este know-how estrangeiro como semente para puxar pelas empresas portuguesas. A seguir ao 25 de Abril o que interessava era produzir, mas num mundo com excesso de produção quem manda é quem compra (B2B). E quem compra tem de dominar as cadeias de fornecimento, tem de mandar nas prateleiras. Um país sem marcas não pode ter essa veleidade, mas pode trabalhar e subir na escala de valor ao servir essas empresas.