O anónimo engenheiro da província, ao começar a ler este artigo "
O dia seguinte" de Vítor Bento no Diário Económico de hoje interrogou-se:
"O ajustamento da economia segue o seu curso e será concluído mais cedo ou mais tarde. É preciso, portanto, começar a pensar no dia seguinte, ou seja, na promoção do crescimento económico sustentado."
O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que nós já estávamos a viver o dia seguinte. Pensava que, quando se deixa de torrar dinheiro dos contribuintes futuros, para manter a funcionar as 16 empresas de construção que estão a a encerrar por dia desde o início do ano, por exemplo, já se estava no dia seguinte a preparar activamente a economia do futuro.
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O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte, que a tal economia sustentada, já estava a ser promovida e estimulada pela ausência do Estado.
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O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte já estava a ser construído activamente ao ver onde é que há meses a fio se está a criar emprego líquido em Portugal.
"Um tal desenvolvimento terá que assentar fundamentalmente na iniciativa privada e, sobretudo, no investimento estrangeiro, dada a escassez de capital nacional."
"Mas não poderá deixar, até pela dimensão e complexidade do desafio, de caber ao Estado um importante papel orientador e facilitador.
O anónimo engenheiro da província recorda sempre aquele dia em 2005 em que um senhor de cabelo grisalho proferiu aquelas famosas palavras:
"Espanha!Espanha!Espanha!"
Basta recordar a montra que são os programas sucessivos "Prós e Contras" na RTP para ter uma ideia do que é a elite pensadora lisboeta... "um importante papel orientador e facilitador"? O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte constrói-se mais depressa quando o Estado sai da frente, não empecilha, não chateia, não atrasa, não privilegia, não orienta... o diletante lisboeta que acabou de saltar da carruagem das PPPs quer apanhar agora a carruagem da Economia do Mar, ou a da ligação ferroviária de mercadorias, ou a da energia das ondas, ou um cluster criado em laboratório (mesas de almoço) de algum banco de algum "puppet maker"?
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O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte se construía quando o senhor João, outro anónimo, empenha alguns bens para poder financiar a ida a uma feira no Rio Grande do Sul apresentar o produto da sua fábrica. O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte se construía quando uma reunião é adiada porque os dois gerentes de uma outra empresa anónima vão visitar clientes à África do Sul. O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte se construía quando outro gerente decidia alargar o seu mercado doméstico e abria um escritório em Espanha. O anónimo engenheiro da província pensava, na sua ignorância e ingenuidade, que o dia seguinte se construía pelos anónimos que construíram o molde do tamanho de um T0 que passou por mim ontem na estrada em cima de um camião.
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E para terminar:
"E também estou convencido de que a ineficiência económica do País - expressa na sua relativamente baixa produtividade média - oferece, paradoxalmente, uma enorme oportunidade. De facto, muito da baixa produtividade da economia resulta de estar demasiado assente em pequenas e médias empresas. Embora habitualmente apresentada com um certo romantismo, esta realidade assenta em processos de produção com escala demasiado baixa para operar num mundo globalizado e em processos de trabalho pouco eficientes.
Fazer o mesmo, muito melhor - concentrando ou criando empresas maiores, para aumentar a escala de produção, e optimizar os processos de trabalho - permitirá, em pouco tempo, um enorme progresso na produtividade média e na satisfação das aspirações de melhoria social."
Eheheh
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O anónimo engenheiro da província sobre isto é muito parcial, e se estivesse a trocar estatísticas com Vítor Bento dava uma kabazada.
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Sim, ok, o anónimo engenheiro de província tem a sua panca lá com a história de Mongo... mas olhem para as estatísticas, todos os sectores de capital nacional que estão a dar cartas na exportação passaram por fugir das grandes escalas de produção... basta olhar para as
lições dos adeptos da concorrência imperfeita.
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Vítor Bento quando pensa em aumento da produtividade pensa, como quase todos os economistas, em produzir mais depressa, em produzir com menos desperdícios, o mesmo tipo de produto. Se ele aprendesse o que é que acontece à produtividade quando se altera a tipologia do que se produz... teria uma surpresa.
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O anónimo e ingénuo engenheiro da província propõe uma outra abordagem, pensar como
David, não como Saul ou como Golias.
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E, para terminar, um artigo que ando para comentar, mas que encaixa muito bem aqui, "
The Commoditization of Scale":
"The competitive advantages of scale are being commoditized. Minimum efficient scale is getting smaller and smaller.
So what's the solution? Accept that everything becomes commoditized. Develop a strategy that doesn't simply rely on being the biggest. Develop a strategy — a difficult to replicate, cogent set of practices in an industry — that assumes everyone will have the advantages of being the biggest. Get to know your customers. Develop a vision of the future. Build things that people want. Realize that everyone will have access to scale.
...
Sustainable differentiation, the key to competitive advantage in Porter's mind, can no longer be achieved through scale."
Num mundo em que assistimos ao início da democratização da produção com as impressoras 3D, num mundo em que a customização triunfa, num mundo em que cada vez mais há mais pessoas weird ("We are all weird") do que pessoas normais... a escala foi chão que deu uvas.
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Mas isto são as reflexões de um optimista inveterado, um anónimo engenheiro de província que tem a sua sanidade mental assegurada com vacinas constantes proporcionadas por tantos e tantos empreendedores anónimos com que contacta durante o seu trabalho missionário, a divulgar o
Evangelho do Valor, que não querem é ter o papá-Estado sempre a querer dizer-lhes o que devem fazer e onde devem investir.