quarta-feira, novembro 17, 2021

Por alguma razão Cortez queimou os barcos...

Ontem de manhã, enquanto conduzia a caminho de Guimarães, ouvia nas rádios falar-se da produtividade e do salário mínimo. Tantas generalidades... até me arrepiei. Até me lembrei de uma das cenas mais anedóticas deste blogue, a superior produtividade portuguesa no Luxemburgo, segundo um embaixador do Luxemburgo em Portugal é motivada pela saudade. A sério, não estou a brincar.

Uma das perguntas que não obteve resposta foi: porque é que o salário mínimo e o salário médio estão a convergir?

Primeiro, um exemplo do calçado. O preço médio do calçado exportado em 2020 foi de 27,80 USD. Conheço algumas empresas com um preço médio do calçado que produzem e exportam na casa dos 52 USD. As empresas que vendem a 52 USD pagam salários mais ou menos iguais às que exportam a 27,80 USD. As empresas pagam o que o mercado está a pedir e o que o mercado pede é o que a média das empresas do sector consegue pagar. É uma espécie de lei inversa da que se passa quando um nigeriano, motorista de autocarro, emigra para a Noruega para conduzir autocarros. faz exactamente a mesmo coisa, mas por causa do contexto diferente, passa a ganhar cerca de 16 vezes mais do que na Nigéria. Enquanto não se deixarem morrer as empresas menos produtivas não sairemos da cepa torta.

Toda a gente pensa que a diferença de produtividades entre Portugal e a Europa Ocidental tem a ver com eficiência ... come on!!! A diferença resulta de se produzirem coisas diferentes. Recordar "Acerca da produtividade, mais uma vez (parte I)"

Em The "flying geese" model, ou deixem as empresas morrer!!! apresentei a figura:

Reparem como a evolução em cada país se dá quando o grosso do capital e dos trabalhadores avança para outro sector, capaz de suportar margens superiores. Reparem como a evolução não é de vestuário low-cost para vestuário high-price. Ela existe, mas é marginal (recordar a não-bruxaria de ontem). Eu, como consultor, a trabalhar com uma empresa individual que não tem de salvar o país, que tem de fazer pela sua vida, posso apoiar o processo de descoberta e construção que permite que uma empresa tradicional continue num sector tradicional, como o denim japonês, o mais caro do mundo, com margens superiores. No entanto, isso não é escalável para todo um sector. 

Verdade, algumas empresas conseguem fazê-lo, a fabricante de botas de borracha acabou a fazer telemóveis da marca Nokia, ou a Wartsila que começou como uma serração, mas são as excepções à regra. Pela enésima vez vou colocar aqui o que aprendi com Maliranta talvez em 2007, é a primeira citação na coluna de citações à direita do blogue:
""It is widely believed that restructuring has boosted productivity by displacing low-skilled workers and creating jobs for the high skilled."Mas, e como isto é profundo: "In essence, creative destruction means that low productivity plants are displaced by high productivity plants." Por favor voltar a trás e reler esta última afirmação."
Moisés disse ao faraó: Deixa o meu povo partir!
Eu prego no deserto: Deixem as empresas morrer!

Ontem, neste artigo "To Understand The Future Of Diversification, Compare Microsoft And IBM" sublinhei o seguinte trecho:
"IBM is shedding IT services, once a cornerstone of its 1990s recovery.
...
IBM’s IT service business is labor intensive. It has 90,000 employees generating sales of $19 billion, which translates into just over $200,000 per employee. On average even Wal-Mart staff bring in more money. Once the spin-off is completed, IBM can concentrate on higher margin cloud software and solutions.
...
The value creation lens makes it obvious that the IBM spin-off—similar to the other headline grabbing announcements—is fundamentally a decision to move out of an unattractive position. In 2016 Microsoft actually did the same when shutting down the phone hardware business it previously bought from Nokia."
O mesmo artigo refere que a Johnson & Johnson também pretende avançar com um spin-off. Interessante, este blogue tem registado uma década nada abonatória nessa empresa. Recordo "Dá que pensar..." como o exemplo das empresas que abandonam a inovação e se concentram na eficiência operacional, o tal fenómeno do hollowing.

Quando não se tem tempo, nem massa cinzenta para pensar o futuro, e o quotidiano manda ... não se fazem spin-offs, não se fazem escolhas mais ou menos dolorosas ... Ah! Recuar 20 anos e ouvir este, hoje "angolano", director técnico perguntar: "Qual é o truque, qual é o segredo?"



Recordar Terry Hill e o Verão de 2008:
"the most important orders are the ones to which a company says 'no'."

 Como é que está lá em cima?

"Once the spin-off is completed, IBM can concentrate on higher margin cloud software and solutions."

Quando não se corta com os produtos do passado, não há foco suficiente no futuro. Por alguma razão Cortez queimou os barcos... 

Querer aumentar a produtividade, ao mesmo tempo que se apoiam as empresas com baixa produtividade... não vai dar em nada.

Agora imaginem a empresa que estando bem, resolve fazer o que a IBM vai fazer, concentrar-se em produtos de margens mais elevadas. Como não existe mercado para comprar a parte "clássica" da empresa, a empresa teria de encolher. Imaginem as manifestações contra uma malvada empresa que estando bem, resolve cortar postos de trabalho e abandonar bons clientes para poder aumentar a produtividade...

terça-feira, novembro 16, 2021

Bruxaria? Não!

Ler Reinert, percebo-o agora como um promotor da concorrência imperfeita, é encontrar em cada página ligações para o que aqui fui escrevendo ao longo dos anos. Por exemplo, acerca da Fase IV no calçado, ou no têxtil, ou no mobiliário, escrevi:

"Vamos entrar numa Fase 4

O número de empresas vai voltar a diminuir

A quantidade de pares produzidos vai voltar a diminuir

O número de trabalhadores vai voltar a diminuir

O preço médio por par vai novamente dar um salto importante."

Bruxaria? Não, é a única hipótese do sector sobreviver no médio prazo. Entretanto, Reinert em "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" escreve:

"Innovations, rather than savings and capital per se, drive welfare forwards. From both sides of the political spectrum, Karl Marx and Joseph Schumpeter agree on the sterility of capital alone as a source of wealth. The world economy functions a bit like Alice in Wonderland, where one of the strange characters tells Alice: `This is how fast you have to run here in order to stand still.' In the global economy only constant innovations sustain welfare. Resting on their laurels as the world's leading constructors of sailing ships could only last until the steamship took over, when wages and employment would inevitably collapse. Schumpeter's metaphor is that capitalism is like a hotel where there is always someone living on the luxury floors, but these occupants are always changing. [Moi ici: Num país de zombies esta rotação é pequena e tem consequências em termos de produtividade] The world's best producer of kerosene lamps soon became poor with the advent of electricity. The status quo leads inevitably to poverty. This is precisely what makes the capitalist system so dynamic, but this mechanism also contributes to creating huge differences between rich and poor countries. The more one understands these dynamics, however, the more one can do to help developing nations out of their poverty.”

Agora esta série de gráficos:


segunda-feira, novembro 15, 2021

The "flying geese" model, ou deixem as empresas morrer!!!

No início deste ano ao ler "Windows of Opportunity: How Nations Make Wealth" vi este esquema que reproduzi neste postal:

Há dias, ao continuar a leitura de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert voltei a encontrar a mesma imagem.

Tudo começa com:

"Figure 8 shows productivity development for a standard pair of men's shoes in the United States between 1850 and 1936. In 1850 15.5 work hours were required to produce a pair of standard men's shoes. Then a productivity explosion took place in shoe production, and rapid mechanization made it possible to employ only 1.7 labour hours to produce an identical pair of shoes fifty years later, in 1900. St Louis, Missouri, in this period became one of the wealthiest cities in the USA, based on production of shoes and beer: `First in shoes and beer, last in baseball' was the saying about the city that showed the world its wealth when hosting both the Olympic Games and a world fair in 1904. After 1900 the learning curve for shoes flattened out. In 1923 1.1 working hours were needed to produce the same pair of men's shoes. In 1936 0.9 hours were needed. As the learning curves flattened out, pressure on wages increased, and gradually shoe production was moved to poorer regions. The USA was an exporter of shoes for a long time, now the country imports practically all its shoes. This phenomenon - that rich countries export where there is great technological development, and import where there is little technological development - is related to what in the 1970s was dubbed the product life cycle in international trade by two Harvard business school professors who described the phenomenon, Raymond Vernon (1913-99) and Louis T. Wells.

...

When a poor country gradually takes over shoe production, it will be close to impossible to increase the standard of living. This production is left to the poor countries, essentially because there is no more learning to be squeezed from the production process.

...

Only when the learning curves and the experience curves flatten out and knowledge gets into the public domain can poor countries compete, and then competition is based on their low wages and relative poverty.

...

Situations exist, however, where the dynamics described in the learning curves can be used for making poor countries rich, by upgrading them technologically in sequence. This model was named flying geese by the Japanese economist Kaname Akamatsu in the 1930s (see Figure 9) [Moi ici: A figura lá de cima]. Another Japanese economist and later Minister of Foreign Affairs in the 1980s, Saburo Okita, followed the `flying geese' model and theorized that a poor country is able to upgrade its technology by jumping from one product to another with increasing knowledge content. The first flying goose, in this case Japan, breaks the air resistance for the next ones, so gradually all of them can sequentially benefit from the same technological change. For example, many years ago Japan produced inexpensive garments, [Moi ici: Recordo sempre um filme de 1944, "A pricesa e o pirata" com Bob Hope. O filme passa-se no século XVIII, Bob Hope era um pirata a lutar contra outros piratas. Defendia-se com um gancho. Um pirata com um simples toque da espada deu cabo do gancho. A cena como que pára, Bob Hope olha para o gancho e lê "Made in Japan". Então exclama algo como, "não se pode confiar nestes produtos"] achieving productivity increases which boosted the standard of living ('collusive mode') so much that a relatively unsophisticated product like a garment could no longer be produced profitably there. [Mo ici: Percebem o significado deste último sublinhado? E volto ao Maliranta, a Taleb e ao exemplo do Jorge Marrão e à entrevista de Paulo Rangel referida aqui. Acham que um político de direita ou de esquerda tem a coragem de enunciar o meu conselho de Dezembro de 2018, "Deixem as empresas morrer!". Acreditar que a empresa média consegue dar o salto na escala de produtividade... só uma minoria o faz, a maioria aproveita os apoios para prolongar o modelo de negócio actual. Como não recordar Spender] Production was taken over by South Korea, while Japan gradually upgraded its manufacturing to something more sophisticated, like TV production. When South Korea upgraded, garments were then for a while produced in Taiwan, until the same thing happened there; production costs grew too high. Production then moved to Thailand and Malaysia, and history repeated itself. Finally, production of garments was moved to Vietnam. In the meantime, however, a whole row of countries had used garment production to raise their standard of living; they had all surfed sequentially down the same learning curve, and all had become richer. Of course, this game requires that the head goose continuously gets involved in new technologies."

É o velho tema do primeiro princípio de Deming, "Constância de propósito" e volto a 2009 e a Maio passado. Hoje, no JdN Francisco Assis discorre naturalmente sobre a necessidade de aumentar o salário mínimo e de ... apoiar as empresas que não o possam pagar. Acham isto normal?

domingo, novembro 14, 2021

Iludir com retórica

Trechos de entrevista de Paulo Rangel no semanário Expresso deste Sábado.

"P - O salário mínimo deve subir? Faz-lhe sentido o que está previsto por António Costa de subida até €850 em 2025?

R - Eu sou favorável a uma subida sensível do salário mínimo.

P - Sensível é quanto?

R - Uma subida significativa. Não por uma razão puramente social. O modelo de crescimento e desenvolvimento das empress portuguesas não pode assentar nos salários baixos. Já experimentámos isso e fomos ultrapassados por cinco países que tinham economias muito abaixo das nossas há 15 anos e agora deram saltos enormes. Isso pode implicar, aqui ou ali, acertos em alguns sectores onde isto pode ser mais problemático. Claro que não pode ser uma subida abrupta, sob pena de se criarem ruturas na economia. Sabemos que o nosso grande problema não será o salário mínimo, será depois a proximidade cada vez maior entre salário médio e salário mínimo, [Moi ici: sensível = significativa = não abrupta. Conversa de gente de Direito. Iludir com retórica. Fugir da transparência e clareza. Tem de perceber a mensagem de Maliranta e de Jorge Marrão. Só que isso tem um custo doloroso. Mais desemprego. Só uma fracção das empresas consegue subir na escala de valor, a maioria desaparece ou segue a via de Odemira, cá ou como em Itália]

P - Como é que se aumenta o salário médio?

R - Só se aumenta o salário com aumento da produtividade, e só se aumenta a produtividade com a mudança das condições da economia. E isso significa, em primeiro lugar, um alívio fiscal. [Moi ici: Alívio fiscal para quem? Para todos ou para o investimento estrangeiro, ao estilo do governo actual com inferno fiscal para os portugueses e paraíso fiscal para quem vem de fora? Sim, eu concordo com qualquer alívio fiscal, igual para todos, mas para captar investimento estrangeiro. Mais alivio fiscal para quem já cá está significa mais rendimento, e mais rendimento significa a validação do modelo actual e um sinal para a não necessidade de mudar. Again, nature evolves from constraints, not towards goals]

P - Reduzir impostos?

R - Significa reduzir impostos. Mas claro que sabemos que, com a dívida que temos, não pode haver um choque fiscal como seria talvez necessário para dar um grande impulso à economia. Mas pode ser uma política sustentada de redução fiscal. Vou dar o exemplo do IRC: foi António Costa quem, ainda na oposição, acabou com o acordo que existia para baixar o IRC até aos 17%. E hoje até temos uma ajuda, há um acordo internacional para que o IRC fique em termos globais num patamar mínimo de 15%. Podemos ser bastante competitivos para atrairmos investimento." [Moi ici: O meu lado optimista interpreta isto como - tornar o país atractivo para o investimento estrangeiro]

 

sábado, novembro 13, 2021

O cínico

Um daqueles postais que custam clientes...

Não consigo segurar-me, o cinismo toma conta de mim e não consigo pará-lo.

Inovação, Indústria 4.0, fábrica do futuro, plataformas colaborativas, workflow, soluções inteligentes, ...

Cut the chase, vamos ao essencial:

Quando me vierem falar de inovação e Indústria 4.0, por favor, foquem-se numa coisa apenas: a margem cresce, sim ou não? E se cresce, como ou porque cresce? E claro, quanto cresce?

A margem cresce quando:
  • o cliente está disposto a pagar mais pelo produto, aumento do preço de venda (Marn e Rosiello mostraram o quão poderoso é este aumento)
  • o custo final baixa, a inovação permite reduzir os custos de fabrico, sem pôr em causa a qualidade, sem prejudicar o desempenho do produto final (Marn e Rosiello mostraram a limitação deste tipo de poupança, embora seja benvinda)
O que li:
"Sempre na linha da frente da produção de calçado, a XXXX com a força do digital e da tecnologia desenvolveu um projecto onde casou a manufactura tradicional com o conhecimento tornando-se exemplo de aplicação do conceito de indústria 4.0.
...
YYYY revelou que sentia “uma certa vaidade” por mostrar soluções que eram o resultado prático dos problemas do dia-a-dia que uma empresa industrial e de manufactura encontram.

Uma dessa soluções foi encontrada, em plena pandemia, em que o processo de consultar e mudar fichas, em papel, de instruções de fabrico, foi substituída por um tablet, eliminando um potencial foco de contaminação e infecção pela utilização do dedo e da saliva, dos trabalhadores envolvidos. 
...
Todas estas novidades, foram reformas assumidas no sector o que aumentou a produtividade das empresas
...
No que toca ao digital, o ZZZ permitiu uma maior utilização de tecnologias que serviram o processo de fabrico, ajudaram à desburocratização de processos, e ajudaram ao desenvolvimento de plataformas de e-commerce.

Também, uma aplicação – IIOT – que permite ligar sensores a máquinas e a sistemas de informação e o armazenamento de dados na nuvem, fez com que se construísse um sistema ciber-físico com vantagens em todo o processo de fabrico do calçado."

Já chega...

Há aqui alguma coisa que ajude a aumentar preços?

"o que aumentou a produtividade das empresas" em quanto, fizeram contas? Apresentaram números? Por que é que o jornal não os publicou?

Como não recordar a minha última conversa oxigenadora...

Seria interessante daqui a seis meses uma visita para confirmar que este tipo de "inovações" continuam a ser utilizadas.

"uma aplicação – IIOT – que permite ligar sensores a máquinas e a sistemas de informação e o armazenamento de dados na nuvem" e depois, quem analisa e trabalha esses dados? 

Ainda esta semana comentava numa empresa de calçado que há 30 anos, quando comecei a trabalhar como consultor, as empresas contratavam alguém para a função da qualidade quando decidiam avançar para a implementação de um sistema da qualidade. Agora, quase nenhuma o faz. Resposta: temos de ter estruturas leves porque sofremos muito na primeira década deste século e não queremos voltar a cometer o mesmo erro. Sorri, lembrei-me do engenheiro H. perdido numa linha de montagem, porque quem não trabalhava na linha era malandro.

Para terminar com um tom mais optimista. Quando me vierem falar em inovação no calçado, falem-me em "é meter código nisso".



sexta-feira, novembro 12, 2021

The empty hospital - Yes Minister - BBC comedy

Mea culpa (parte II)

Escrevo regularmente neste blogue há mais de 15 anos. Às vezes sinto algum orgulho por causa das previsões em que acerto (por exemplo RaporalÓrbita ou Gráfica Mirandela), e por raramente ter escrito algo do qual me tenha de retratar.

No entanto, hoje gostaria de pôr preto no branco algo que quase soa a retratação. Embora seja mais o resultado de eu próprio ter cometido o pecado do jogador de bilhar amador que tantas vezes refiro aqui.

Herman Simon costuma escrever sobre a falsa percepção que o público tem acerca do lucro das empresas:
"What does the average citizen think about profit? 
...
We’ll start with what people think in the United States, where a survey posed the following question to a representative sample: “Just a rough guess, what percent profit on each dollar of sales do you think the average company makes after taxes?” The average response was 36%! This is very consistent with research that advertising guru David Ogilvy cites in his book Ogilvy on Advertising: “the average shopper thought Sears Roebuck made a profit of 37% on sales.” Sears’ true profit at that time was less than 5%.
Responses to similar questions in nine different polls between 1971 and 1987 ranged from 28 to 37% and averaged 31.6%. What is the truth? The actual average after-tax profit margins of US companies over the long term is around 5%. In other words, the respondents overestimated the level of corporate profits by a factor of six. We found very similar perceptions in a study conducted in Italy in 2019. Respondents there estimated net profit margins to be 38%.
People in Germany have also responded to surveys with similar questions. The answers varied between 15.75 and 24.15% with 20% on average. In Austria, a comparable number was 17%.7 In other countries we could not find similar surveys."(fonte 1)
As empresas ganham menos dinheiro do que as pessoas suspeitam. Então em Portugal, país de zombies e de apoio à manutenção de postos de trabalho com um sistema Ponzi encavalitado em empréstimos bancários, é comum justificar os baixos salários com a avareza dos patrões. Contudo, o problema é outro, a falta de concorrência imperfeita, a falta de inovação, a falta de diferenciação real, que leva a demasiada concorrência perfeita.

Ao longo dos anos o meu erro de raciocínio tem sido o de me ficar pelo pensamento de primeira ordem. Ainda ontem publiquei esta figura:
Enquanto outros falam de produtividade como condição para se ser competitivo, há muito que descobri que produtividade e competitividade são duas realidades distintas. 

Como trabalho com empresas concretas o meu foco é na sua competitividade e a coisa até funciona. Recordo os protestos contra os "ateliês" quando lembro a necessidade de preparar a Fase IV.

O que confesso nunca me passou pela cabeça foram as consequências de um mundo de empresas competitivas, mas não produtivas. Um mundo com salários cada vez mais estagnados não porque os patrões não queiram pagar mais, mas porque o negócio não dá mais. 
Um empresário, um patrão, não tem como responsabilidade mudar o mundo, tem como responsabilidade liderar a sua empresa. Por outro lado, o desafio de a manter à tona é tão grande que raramente encontra tempo para pensar no depois de amanhã, simplesmente reage, o quotidiano é que assume o comando. É cada vez mais difícil encontrar pessoas para trabalhar a receber os salários que pode pagar? Em vez da subida na escala de valor, temos a race to the bottom: Arranjar quem o faça no Brasil, ou na Moldávia ... ou uma prestação de serviços à la Odemira.

Por isso, os portugueses emigram

O que leio em "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.
“Once a considerable gap in real wages has been created, the world market will automatically assign economic activities that are technological dead-ends - and therefore only require unqualified labour, for example, to produce baseballs - to low wage countries. [Moi ici: Daí as "vitórias de Pirro" sobre a Lituânia e a Polónia]
...
The competitiveness of a country is, according to OECD definition, to raise real wages while still remaining competitive on the world markets. In most of the Third World today this situation is turned upside down: wages are lowered in order to be internationally competitive. [Moi ici: Como não recordar a reportagem dos empresários do turismo algarvio que querem ir buscar filipinos e cabo verdianos porque supostamente os portugueses não querem trabalhar]) 
[Moi ici: BTW! Recordam-se da caridadezinha?]
Education is increasingly regarded as the key to expanding wealth in the Third World. In countries like Haiti, which specialize in non-mechanized production - in technological dead-ends - raising the level of education of the population will not help to increase the level of wealth in the population. In such countries the demand for educated personnel is minimal. Education is more likely to increase the propensity to emigrate. A strategy based on education succeeds only when combined with an industrial policy that also provides work for educated people, as happened in East Asia.
...
By emphasizing the importance of education without simultaneously allowing for an industrial policy that creates demand for educated people - as Europe has over the last 500 years - the Washington institutions are just adding to the financial burdens of poor countries by letting them finance the education of people who will eventually find employment only in the wealthy countries. An education policy must be matched by an industrial policy that creates demand for the graduates.[Moi ici: Entram aqui os dinheiros da Europa. Como appetizers recordo estas duas breves reflexões acerca da entrada massiça de dinheiro para investir, aqui e aqui]
...
Theory development led to what Schumpeter calls `the pedestrian view that capital per se propels the capitalist engine'. The West started thinking that by sending capital to a poor country with no entrepreneurship, no governmental policy and no industrial system, they could produce capitalism. The consequence is that today we virtually stuff money down the throat of countries with no productive structure - where this money could be profitably invested - because they are not allowed to follow the industrial strategy all the presently rich countries followed. Developing countries are given loans they cannot profitably utilize, and the whole process of development financing becomes akin to that of chain letters and pyramid games. Sooner or later the system breaks down, and the ones who designed it, standing close enough to the door when everybody rushes out, are able to make good financial profits, while the poor countries themselves are the losers. This is part of the mechanism that often creates larger flows of funds from the poor to the rich countries than the other way around, one of Gunnar Myrdal's `perverse backwashes' of poverty."[Moi ici: Reinert propõe o proteccionismo, mas o proteccionismo para um país na UE não é possível. Como resolver a situação sem sair da UE? Seguir a receita irlandesa, não confiar em irlandeses e atrair investimento estrangeiro apostado na concorrência imperfeita, não na extracção venenosa na agricultura e recursos naturais]
Saúdo Rui Tavares com o artigo "Portugal está preso numa armadilha de salários baixos" por lhe dar a importância que deve merecer. Muito certamente não concordarei com a receita de Rui Tavares para o solucionar, mas decididamente é o tema de fundo.

O mesmo tema, tratado por Eugénio Rosa, desvia-se para os salários da função pública. Como é que a função pública não pode deixar de ter salários estagnados se a riqueza criada está estagnada e há cada vez mais gente na função pública ou a depender do orçamento do Estado? Reinert escreve sobre isto quando refere que um barbeiro na Suécia é tão produtivo, em quantidade de trabalho, quanto um barbeiro em Portugal, mas o salário do barbeiro sueco é muito superior ao do barbeiro português, por causa da riqueza criada pelo resto da sociedade. Tal como um motorista de autocarro português que emigra e começa a trabalhar na Suiça como motorista de autocarro...

Fonte 1 - Trechos retirados de “No Company Ever Went Broke Turning a Profit” de Hermann Simon.

quinta-feira, novembro 11, 2021

Exportações 2021 versus 2020 (primeiros 9 meses)

2020 e 2021 são anos anormais influenciados pelo cometa Covid.

Tenho trabalhado com PMEs que estão tão cheias de trabalho, será que isso se reflecte nas estatísticas? Enchi-me de curiosidade e fui ver o que dizem os números das exportações, segundo o INE. 

Não adianta enganar-me comparando 2021 com 2020, comparei 2021 com 2019 (primeiros nove meses de cada ano).

No total, as exportações de 2021 estão 913 milhões de euros abaixo do nível de 2019. No entanto, se excluirmos os automóveis e as aeronaves, as exportações de 2021 estão acima das de 2019.

Primeiro, considerei apenas os sectores em que as exportações cresceram mais de 20% face ao período homólogo de 2019:

Agricultura e metalurgia a crescer muito.
Agricultura, e maquinaria mecânica a crescer bem.

Depois, seleccionei sectores que embora cresçam menos de 20%, representam crescimentos superiores a 100 milhões de euros.
Aqui já aparece a indústria. Interessante como o vestuário de malha recupera, ao contrário do outro vestuário e do calçado, em 2021 só Janeiro fo abaixo de 2019.

Depois, seleccionei os sectores onde as exportações caem mais de 40 milhões de euros:

Interessante, o Janeiro e Fevereiro de 2021 no calçado foi tão mau que afecta o acumulado YTD.

Coerência e ambiente (parte II)

Em Maio passado em "Coerência e ambiente" recordei a Inditex e a sua conversa sobre o ambiente com base em postais do Verão de 2019.

Há muito que penso que os políticos começaram a falar cada vez mais do ambiente porque era algo que não lhes vinha cobrar. Por exemplo, um político pode propor políticas para reduzir défice, para reduzir filas de espera na Saúde, para aumentar salários, ... e todas essas políticas têm o inconveniente de, mais tarde ou mais cedo, virem cobrar através da comparação entre os resultados propostos versus os resultados obtidos. Já com o ambiente era diferente. Os políticos podiam falar do ambiente à boca cheia sem recear que ainda durante a mesma legislatura alguém lhes viesse pedir contas.

Julgo que a situação pode vir a alterar-se.

Num dos textos que escrevi em 2019 brincava com o oxímoro de uma Inditex, rainha do fast-fashion, querer ter uma aura de amiga e preocupada com o ambiente. 

Se lerem isto:

Agora imaginem um político português encher a boca com o ambiente. Depois, lembrem-se deste trecho:
"Em 2020, 50% das vendas de moda e vestuário na Europa foram feitas com desconto de preço e a indústria têxtil portuguesa surge como um dos suportes destas campanhas agressivas, uma vez que pratica os preços mais baixos do continente, segundo um estudo da Fashion Value intitulado ‘Pricing Report’. Do outro lado da tabela está a Itália."

Quais as implicações de atacar de frente o fast-fashion sem dizer a verdade das consequências desse ataque nos postos de trabalho de tanto têxtil português? Os políticos falam e ninguém lhes pede contas, talvez ninguém os oiça. Há dias, numa missa, ouvi o padre atacar o consumismo... então, comecei a pensar em quantas das pessoas ali presentes a assistir, tinham uma vida dependente do consumismo:

  • quem desenha os artigos;
  • quem produz os artigos;
  • quem publicita os artigos;
  • quem transporta os artigos;
  • quem vende os artigos;
  • quem compra os artigos;
  • quem usa os artigos. 
Vivemos num mundo carregado de gente em lugares de decisão e poder que joga bilhar amador, só pratica first-order thinking.


quarta-feira, novembro 10, 2021

"dynamic imperfect competition"

"will always be possible for a nation to specialize in economic activities where all the capital in the world will not be able to create innovation and productivity growth. This mechanism also makes it possible for a nation to specialize in being poor.

An important element in the huge `social problem' (as it was called) that dominated nineteenth-century European discourse was the existence of so-called home-workers (Heimarbeiter). They produced the articles that industry had not yet managed to mechanize, as part of a production process bereft of any increasing returns and any potential for innovation.

...

New technology and innovations demand and create new knowledge, producing economic activities characterized by high levels of knowledge and high levels of income. These industries are dominated by Schumpeterian and dynamic imperfect competition, high barriers to entry, high risks and high rewards. This contrasts with the perfect competition or commodity competition under which markets for raw materials operate. As innovations, products and processes mature and age, products fall like natural gravity in the index shown"


Trechos retirados de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.

terça-feira, novembro 09, 2021

"las empresas están actuando como dique de contención"

 

"“Pricing power”, the ability to pass costs to customers without harming sales, has long been prized by investors. Warren Buffett has described it as “the single most important decision in evaluating a business”. It is easy to see why. When hit with an unexpected expense, firms without pricing power are forced to cut costs, boost productivity or simply absorb the costs through lower profit margins. Those with pricing power can push costs onto customers, keeping margins steady."(fonte) [Moi ici: McDonald’s , PepsiCO, Procter and Gamble, ... tudo a subir preços nesta altura]

Entretanto, as empresas industriais portuguesas e espanholas:

"Los productos industriales se están encareciendo a ritmos de casi el 25%, un nivel no visto desde la Transición. El precio del petróleo se ha disparado un 101% en el último año; el del aluminio, un 62% y el del cobre se ha encarecido un 45%. Esta es la situación generalizada de las materias primas y los bienes intermedios, pero no es la realidad de la cesta de la compra de los españoles. El motivo es que las empresas están actuando como dique de contención de esta subida de los precios y trasladan a los consumidores finales solo una parte de la inflación real de los mercados mayoristas. Están absorbiendo la inflación en sus márgenes, lo que evita que los datos del IPC sean mucho peores y que se generen más efectos de segunda ronda.

...

Se está produciendo un escenario que es excepcional y, además, insostenible en el tiempo, ya que las empresas salen de la crisis del coronavirus en una situación financiera complicada y difícilmente podrán soportar en sus márgenes el encarecimiento de los costes sin trasladarlos a los precios finales."

Parece que estou em Punxsutawney a viver o mesmo dia repetido, dia após dia.

Entretanto, uma cana sacudida pelo vento:

segunda-feira, novembro 08, 2021

A boa árvore conhece-se pelos frutos...

Vamos admitir como válidos estes números coligidos por Eugénio Rosa:

"A remuneração média nacional aumentará 10,1% entre 2015 e 2022

Agora comparem com a Lituânia:

"The monthly average gross wage rose 12.7 percent in the fourth quarter of 2020 from a year before to 1,467 euros, and the average net pay rose 13.3 percent to 935 euros, SoDra said on Tuesday." (fonte)

 A boa árvore conhece-se pelos frutos... Lucas 6, 44 ou Mateus 7, 17

Quando o quotidiano assume o comando ...

Ontem, neste postal, "Percebem porque vão faltar cada vez mais trabalhadores?", referi a interpretação de Jordan Petersson acerca de Mateus 6, 24-34. 

Deste trecho do youtube recolhi esta transição:

"If you orient yourself properly and then pay attention to what you do every day that works, and I actually think that that's in accordance with what we have come to understand about human perception because what happens is that the world shifts itself around your aim because you're a creature that has a name, you have to have a name in order to do something you're an aiming creature you look at a point and you move towards it it's built right into you and so you have a name 

Well, let's say your aim is the highest possible aim. Well, then so that sets up the world around you it organizes all your perceptions it organizes what you see, and you don't see, it organizes your emotions and your motivations. So, you organize yourself around that aim, and then, what happens is the day manifests itself as a set of challenges and problems, and if you solve them properly, then, you stay on the pathway towards that aim and you can concentrate on the day and so that way you get to have your cake and eat it too because you can, you can point into the distance the far distance and you can live in the day and it seems to me that that's that makes every moment of the day supercharged with meaning that that's how because if everything that you're doing every day is related to the highest possible aim that you can conceptualize well that's the very definition of the meaning that would sustain you in your life well"

Daí também a citação de ontem:
"nature evolves away from constraints, not toward goals"

Se não há uma "highest possible aim" a orientar a actuação, o quotidiano assume o comando e não vamos para onde queremos, mas para onde nos leva o somatório das forças que nos aparecem no caminho.

Quando não se tem estratégia ... não se assumem, não se encaram certas dificuldades como parte do processo de desenvolvimento, foge-se delas aproveitando a primeira coisa que aparece.

domingo, novembro 07, 2021

Percebem porque vão faltar cada vez mais trabalhadores?

Let this sink in:

"Em 2020, 50% das vendas de moda e vestuário na Europa foram feitas com desconto de preço e a indústria têxtil portuguesa surge como um dos suportes destas campanhas agressivas, uma vez que pratica os preços mais baixos do continente, segundo um estudo da Fashion Value intitulado ‘Pricing Report’. Do outro lado da tabela está a Itália.

Independentemente de outos segmentos do mercado, onde a indústria portuguesa também dá cartas, e tomando como ponto de partida o vestuário mais básico – uma t-shirt em algodão e umas calças jeans – o estudo indica que “na Europa Ocidental, Portugal é um dos países mais baratos, com menos de sete euros para uma t-shirt e pouco mais de 19 euros para umas calças jeans”. A Itália encabeça a lista dos mais caros, “com quase 40 euros para umas calças jeans e 15 euros para uma t-shirt básica em algodão”."(fonte)

O título do artigo é "PORTUGAL NO TOPO DA INDÚSTRIA LOW COST EUROPEIA". 

No topo porquê? Temos os salários mais baixos? Nope!


Temos empresas grandes capazes de ganhos de escala? Nope!
Temos empresas automatizadas e muito organizadas? Nope!

Nenhum país enriquece a vender commodities, a menos que seja o campeão da concorrência perfeita. Parece que em vez de treparmos as árvores estamos a descer na escala de valor.

Os apoios e subsídios são usados para isto... isto faz-me lembrar a interpretação de Jordan Petersson acerca de Mateus 6, 24-34. O que casa bem com a tal citação que referi há dias: 
"nature evolves away from constraints, not toward goals"
Quando não se tem uma direcção responde-se a estímulos, foge-se dos obstáculos, não se projecta um futuro, vive-se, mas não se afirma.


Não critico quem o faz. Quem faz, faz o que pode e sabe. Quem faz, faz muito mais que intelectuais que não levantam o rabo do sofá.

Critico quem não percebe a importância de criar condições para que capital estrangeiro venha infectar o país com o spill-over de projectos que apostem na concorrência imperfeita



sábado, novembro 06, 2021

"colonies are nations specializing in bad trade"

Ontem referi isto:

[Moi ici: Escreverei mais tarde sobre como isto se relaciona com a notícia recente das 14 concessões para exploração mineira, e com o objectivo da Galp de ser responsável pela produção de 30% do hidróxido de lítio na Europa]

 Presumo que muitos milhões de euros dos contribuintes entrarão nestas negociatas feitas às escondidas.  Não se fiquem só pela exploração mineira, acrescentem-lhe a ideia de produzir hidrogénio para o vender na Holanda. Esta semana tive a oportunidade de ler:

"The American Civil War is a prototype conflict between free traders and raw materials exporters (the South) on the one hand and the industrializing class (the North) on the other. Today's poor countries are the nations where the South' has won the political conflicts and civil wars. Opening up too early for free trade makes the South' the political winners."

Trecho retirado de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.

Do mesmo livro sublinho:

"It became increasingly clear to me that the mechanisms of wealth and poverty had, during several historical periods, been much better understood than they are today. My 1980 Ph.D. thesis attempted to check the validity of Antonio Serra's seventeenth-century theory of development and underdevelopment. Serra is a very important person in this account because he was the first economist to produce a theory of uneven economic development in 1613, his Breve trattato or `Brief treatise'. Very little is known of Serra's life apart from the fact that he was a jurist who wrote a book when he was in jail in Naples. He sought to explain why his home town of Naples remained so poor in spite of its bountiful natural resources, while Venice, precariously built on a swamp, was at the very centre of the world's economy. The key, he argued, was that Venetians, barred from cultivating the land like the Neapolitans, had been forced to rely on their industry to make a living, harnessing the increasing returns to scale offered by manufacturing activities. In Serra's view the key to economic development was to have a large number of different economic activities, all subject to the falling costs of increasing returns. Paradoxically, being poor in natural resources could be a key to becoming wealthy.

...

In the early 1700s a rule of thumb developed for economic policy in bilateral trade, a rule that rapidly spread throughout Europe. When a country exported raw materials and imported industrial goods, this was considered bad trade. When the same country imported raw materials and exported industrial goods, this was considered good trade

...

colonies are nations specializing in bad trade, in exporting raw materials and importing high technology goods, whether these are industrial goods or from a knowledge-intensive service sector."

Depois não se queixem de não sairmos da cepa torta. 

sexta-feira, novembro 05, 2021

"apenas teremos alternância, não alternativa"

"Ireland had joined the European Community in 1973, and massive EC funds had floated into its agricultural sector. However, this had created over-capacity and highly indebted farmers in a very difficult market. [Moi ici: Escreverei mais tarde sobre como isto se relaciona com a notícia recente das 14 concessões para exploração mineira, e com o objectivo da Galp de ser responsável pela produção de 30% do hidróxido de lítio na Europa]

...

[Moi ici: A 9 de Janeiro de 1980 o primeiro-ministro irlandês, Charles Haughey, proferiu à nação o discurso que se segue ...] I wish to talk to you this evening about the state of the nation's affairs and the picture I have to paint is not, unfortunately, a very cheerful one. The figures which are just now becoming available to us show one thing very clearly. As a community we are living way beyond our means ... we have been living at a rate which is simply not justifiable by the amount of goods and services we are producing. To make up the difference we have been borrowing enormous amounts of money, borrowing at a rate which just cannot continue. A few simple figures will make this very clear ... we will just have to reorganize government spending so that we can only undertake those things we can afford."

Como não recordar Peres Metelo e o seu:

"vivemos abaixo das necessidades da economia"

Conhecem algum político português no activo capaz de fazer um discurso similar a esta nação endividada e estagnada numa rotunda há cerca de 20 anos? Nogueira Leite no JdN de ontem citou:

"a economia portuguesa está hoje 75 por cento abaixo do nível que registaria caso tivesse continuado a crescer desde 2002 de acordo com a tendência prévia a esse momento"

Ganhe esquerda, ou ganhe direita, apenas teremos alternância, não alternativa. Alternativa implica olhar olhos nos olhos e dizer coisas que os eleitores não vão gostar de ouvir.

Trechos retirados de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.

"coisas que me fazem confusão"

Não sou partidário de medidas proteccionistas, mas há coisas que me fazem confusão, "L’armée française choisit des pulls chinois plutôt que des pulls "Made in Tarn", l'Armée dément"

quinta-feira, novembro 04, 2021

"pedir dinheiro emprestado para importar "

À atenção dos que acham que pedir dinheiro emprestado para importar é um modo de vida sustentável:

"Spain as a frightening example of what not to do

From the mid-1500s the theatre of Europe provided further elucidation in economic theory and policy, setting an example of what a country should not do. Spain had long been an important industrial state. `In Europe, to describe the best silk one once said "the quality of Granada". To describe the best textiles one once said "the quality of Segovia",' wrote a Portuguese economist in the 1700s. By then Spanish manufacturing industry was history and the mechanisms that had diminished its manufacturing capacity and its wealth in tandem were eagerly studied across Europe. Their conclusions on what had happened were virtually unanimous.

The discovery of the Americas led to immense quantities of gold and silver flowing into Spain. These huge fortunes were not invested in productive systems but actually led to the de-industrialization of the country. The landowners primarily profited from the `funnel of gold' from the Americas, as they had a monopoly on the export of oil and wine to the growing markets of the New World. The supply of such goods is highly inelastic, and subject to diminishing rather than increasing returns. To increase production, particularly to make new olive trees yield as old ones, takes a long time. This expansion would produce the opposite of increasing returns, that is, diminishing returns which cause the cost of production per unit to rise rather than fall. The result of the increased demand was consequently a sharp increase in the price of agricultural products. At the same time, nobility owning land were exempt from paying most taxes, so the tax burden fell increasingly on the artisans and manufacturers. Their competitiveness was, on the other hand, already being squeezed by the rapid rise of prices of agricultural goods in Spain. This undid the synergies and division of labour in Spanish cities, causing a de-industrialization from which Spain only finally recovered in the nineteenth century. Successful states protected manufacturing industry, unsuccessful Spain protected agriculture to the extent that it killed manufacturing.

...

We find the following observation in Giovanni Botero's work on what causes the wealth of cities: `Such is the power of industry that no mine of silver or gold in New Spain or Peru can compare with it, and the duties from the merchandise of Milan are worth more to the Catholic King than the mines of Potosi and Jalisco." Italy is a country in which ... there is no important gold or silver mine, and so is France: yet both countries are rich in money and treasure thanks to industry.'

In various forms, the statement that manufacturing was the real gold mine is found all over Europe from the late 1500s through the 1700s. After Botero we find this expressed by Tommaso Campanella (1602) and Antonio Genovesi (in the 1750s) in Italy, by Geronimo de Uztariz in Spain (1724/1751) and by Anders Berch (1747), the first economics professor outside Germany, in Sweden: `The real gold mines are the manufacturing industries'."

Trecho retirado de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.

De volta à concorrência imperfeita

De volta à concorrência imperfeita:

"A small city-state devoid of resources but with a huge hinterland, like Hong Kong, may get rich in the same `natural' way as Venice and Holland did. Studying the inner mechanisms of such states, however, makes it clear that the principle of wealth creation - from the cost of a taxi licence in Hong Kong to the city's huge corporations - is not perfect competition, but rent seeking, that is, profiting from imperfect rather than from perfect competition."

Trecho retirado de "How Rich Countries Got Rich and Why Poor Countries Stay Poor" de Erik S. Reinert.

quarta-feira, novembro 03, 2021

Falta de trabalhadores? E salários? Back to Cavaco, Setembro de 1992

No JdN de ontem um artigo de 2 páginas intitulado “Mobiliário desespera à procura de 5 mil trabalhadores”.

Um tema relacionado com alguns postais publicados aqui no blog na última semana:
Sublinhei algumas passagens do artigo e criei o mapa que se segue:




O que é que um cenário destes está a pedir:
  • Aumento dos preços, o aumento da procura por mobiliário nacional é um sintoma de que a relação qualidade/preço está desequilibrada;
  • Aumento dos salários para atrair mais gente para o sector.
Ali ao lado na coluna das citações há uma que gosto muito:

"nature evolves away from constraints, not toward goals"
O meu lado ingénuo e optimista escreveu aqui no blogue:
“Quando a falta de trabalhadores obriga os salários a subirem mais do que a produtividade, as empresas começam a trilhar um caminho perigoso. A minha visão optimista apontou logo a alternativa, subir na escala de valor para que a produtividade aumente mais depressa do que os salários. Ainda recentemente escrevi "Mudar e anichar"”
O título do postal onde escrevi este trecho foi “Uma bofetada que recebo como um aviso”.

Porquê bofetada? Por causa da minha ingenuidade, por causa das raposas trazidas para caçar coelhos australianos. Qual a forma de resolver o cenário lá de cima sem subir na escala de valor e sem aumentar salários? Importar trabalhadores da Ásia.

Assim, abro a porta a outras citações do texto do JdN:



Julgo que estas últimas citações vêm tornar a situação menos linear. E para complicar as coisas acrescento outra que me faz espécie:
Vamos pegar nos dados apresentados no artigo. Por exemplo, Grupo Laskasas, com 435 trabalhadores e a facturar 24 milhões de euros. O que dá cerca de 55 mil euros por trabalhador. Comparemos com a facturação média do sector do calçado em 2018 dividida pelo número de trabalhadores do sector em 2018, cerca de 50 mil euros. Conclusão: custa-me a crer que o sector do mobiliário possa pagar salários elevados.

Pena que o JdN não tenha entrevistado trabalhadores para ter uma visão mais abrangente do contexto.

Custa-me a crer que não haja interessados em entrar numa profissão que pode vir a pagar 2 mil euros por mês limpos. Reparem na resposta à pergunta. O jornalista mostra surpresa por a esse preço não se conseguirem contratar pessoas. E na resposta o presidente da associação do sector explica que não se encontram porque o sector paga bem... há aqui qualquer coisa que não consigo processar. Parece ao nível do antigo presidente da câmara de Guimarães em 2008.

Sinto-me invadido por um pessimismo ao estilo de Cavaco a 25 de Setembro de 1992.