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sábado, janeiro 28, 2023

O elefante no meio da sala

 A propósito de "Sustentabilidade made in Brasil para "calçar' os sapatos portugueses" recordei-me desta metáfora:


A nota do final do artigo ajuda a perceber, "A jornalista viajou a convite da Assintecal, com apoio da ApexBrasil."

Ou seja, o artigo é, de certa forma, publicidade. Nada contra, mas é interessante que não se escreva uma palavra sobre o investimento directo português na criação de fábricas de calçado no Brasil, para minorar a falta de pessoas no país, disposta a entrar no sector, e a incapacidade de acompanhar o aumento do custo da mão de obra quando se está habituado a trabalhar o segmento mais barato do mercado. 



quarta-feira, dezembro 14, 2022

Cuidado com os americanos

"Esta semana, um empresário alemão andou no Vale do Ave a fazer contactos para deixar encomendas têxteis que costumava colocar na China e Turquia. "Está disposto a pagar 20% mais para reduzir a exposição numa zona que considera de risco" conta um industrial do sector, animado com a perspetiva do negócio

...

Rafael Campos Pereira, vice-presidente da AIMMAP, a associação do sector metalúrgico, admite que 2022 vai fechar com exportações superiores a €20 mil milhões, 10% acima do recorde de 2021 e pelo menos quarto dos melhores registos mensais de sempre. Para isso, diz, pesam subidas nos principais mercados do sector Espanha, França e Alemanha além dos Estados Unidos, que deu um salto homólogo de 70% em oito meses

...

Na fileira têxtil, as previsões apontam mais uma vez para um recorde nas exportações, depois de o terceiro trimestre fechar 19,2% acima de 2019 (€4,7 mil milhões). Em quantidade, o ganho é de apenas 6%, o que leva Mário Jorge Machado, presidente da associação setorial ATP, a sublinhar que "há valorização de produto, mas também há mão da inflação". Aliás, recorda, o ano obrigou muitas empresas a recorrerem a lay-off pela subida dos custos e por cortes nas encomendas de marcas preocupadas com a redução do consumo.

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muitas marcas americanas querem alternativas à Ásia,

...

No calçado ainda ninguém assume que o recorde de €1,96 mil milhões de 2017 será batido na frente externa, [Moi ici: Mentira o presidente da APICCAPS assumiu-o no último número do Dinheiro Vivo] mas "este é seguramente um dos três melhores anos de sempre", admite Paulo Gonçalves, porta-voz da associação setorial APICCAPS,

...

No caso da indústria do mobiliário, 2022 puxou os EUA do 5° para o 3º lugar no ranking dos maiores mercados, com um crescimento de 30% nas vendas, e Angola, "a beneficiar da alta do petróleo" para crescer 50%, regressou ao top 10."

Qual o perigo do mercado norte-americano? A sua baixa sofisticação, afinal estamos a falar de clientes que estão a sair da Ásia. Recordo o que escrevi em 2018 aqui no blogue, Tanta coisa que me passa pela cabeça...:

"Quem segue este blogue sabe que há muitos anos escrevemos e defendemos aqui que o mercado americano não pode competir com o europeu em preço unitário."

Por exemplo, na última Monografia Estatística publicada pela APICCAPS podemos encontrar:

  • Preço médio de um par de sapatos importado pelos Estados Unidos - 11,37 USD
  • Preço médio de um par de sapatos importado por Portugal - 13,28 USD
  • Preço médio de um par de sapatos importado pela Alemanha - 17,94 USD
  • Preço médio de um par de sapatos importado por França - 18,26 USD

Trechos retirados de "O sonho americano das exportações portuguesas" publicado no caderno de Economia do semanário Expresso do passado Sábado.

terça-feira, dezembro 06, 2022

Os contras!

O livro "Niching Up: The Narrower the Market, the Bigger the Prize" de Chris Dreyer dedica o primeiro capítulo aos contras do anichar:

"CON #1 - Smaller Market
The first con that I think everyone is aware of is that when you niche there is a smaller market and, therefore, fewer buyers. The very definition of niche means it is limited to a specialized audience. Depending on the specific business niche, the ability to target customers or audiences can be constrained, which affects business growth.
Simply put, serving a niche means fewer customers. [Moi ici: O que não quer dizer que se faça menos dinheiro do que a trabalhar para o mainstream, se ele ainda existir]
...
CON #2 - Waste
The second con (which may not be as immediately obvious as the first) is that it can be more difficult and cost you more money to get in front of your target audience when dealing with a niche.
...
Instead, niching requires relationship building, because you can't advertise with direct marketing like you could in broader industries.
...
CON #4 - Lack of Diversity
Once you decide on a niche, there is a lack of diversity in your work. You are basically doing the same thing and talking to the same people all the time. If you don't have a passion for what you're doing, it can get monotonous.
...
Con #6: Product Perfection 
Another potential con of niching is product perfection. Competition in the marketplace requires companies to develop perfect strategies and provide better solutions. Because there are fewer prospects when you niche, there is less room for error. You must be able to provide products (or services) that are exactly in line with what the customer demands.
...
Con #7: Increased Effort and Sacrifice for Buyers
The final con on our list may be the biggest of all: when you niche, you may make things more difficult for your buyers by increasing the amount of effort and sacrifice they have to make."
Qual a relação com Estão todos de acordo?

Sou apologista das PMEs anicharem, mas em vez de contar só o lado solar, também acho relevante apontar para os limites do modelo, como Hoffman refere em "uma árvore má não pode dar bons frutos"

O que estranho mais é que tenho visto sobretudo movimentos de empresas no calçado para aproveitar a saída das marcas da China, algo que implicará maiores quantidades e preços mais baixos, mas será inevitavelmente cortado pela falta de mão-de-obra ... a não ser que se importem bangladeshis. Algo que já esteve mais longe de acontecer. Se já existe em Itália há anos (recordar esta série de postais Curiosidade do dia - comunismo e Chega (parte III)) porque não há-de existir por cá? Costa também não sabia das esquadras chinesas.

BTW, colega do Twitter mandou-me no Domingo à noite esta foto:
Acompanhada do seguinte comentário:
"Par de pantufas compradas há pouco numa loja dos chineses. Material absolutamente commodity, ou pelo menos é o que se espera.. Mas repara bem no "made in". Fiquei passado.."
Voltando ao calçado, será que ainda pensam na Moldávia como o futuro abastecedor de gáspeas?

segunda-feira, dezembro 05, 2022

Estão todos de acordo?

Na passada terça-feira, enquanto viajava de comboio, vi a capa do JdN do dia e li o artigo "Calçado recebe investimento de 600 milhões até 2030". Depois, saquei da aplicação de Notas do computador e escrevi de rajada:

Subir na escala de valor, anichar. São conselhos que dou às PMEs quase desde o início deste blogue. Uma PME não pode competir pelo preço mais baixo. Assim, a subida na escala de valor permite encontrar um nicho onde uma empresa pode viver e prosperar sem precisar de ser gigante. A PME tipo não tem capital e organização, nem mentalidade para a competição séria pelo preço.

Eu, consultor, posso explicar a uma empresa que vai ter de encolher, que vai ter de trabalhar diferentes clientes e vender com base numa vantagem competitiva diferente. Eu não lhes posso mentir e dizer que podem ter o negócio actual e, ao mesmo tempo, criar um negócio à parte para trabalhar o nicho. Não há recursos. Quando discutimos estes tópicos falamos olhos nos olhos e, muitas vezes, o empresário não arrisca. Tem medo! (E quem não tem medo? Só os irresponsáveis não têm medo de uma revolução como esta). O meu ponto neste parágrafo é que lhe é dita qual é a opção e quais as suas consequências para o modelo de negócio actual. Não há nem paninhos quentes nem ilusionismo.

Quando vejo uma associação empresarial a publicar um documento estratégico a dizer que o futuro é o nicho do luxo fico com dúvidas. Será que é correcto uma associação trabalhar e usar os recursos da associação para privilegiar uma estratégia que só é útil para uma parte dos seus associados. Isto sem dizer olhos nos olhos quais as implicações para as empresas quanto à dimensão, mercado, proposta de valor, vantagens competitivas e clientes-alvo.

Guardei isto e não lhe voltei a pegar, mas o texto ficou a remoer na minha mente. Porquê? Por causa das críticas que costumo fazer aos líderes de associações empresariais que exercem o cargo para defenderem o passado, não para levar o sector a abraçar o futuro. Por exemplo, em E não tem mais nada para dizer?

Guardei porque fiquei a pensar que ser líder associativo é ser preso por ter cão ou não ter. 

Ontem, ao procurar uma coisa aqui no blogue dei de caras com este texto de 2018, Tanta coisa que me passa pela cabeça... 

Por que acabei por ir buscar o texto às Notas? Por causa de uns trechos que li no Sábado passado no livro "Step Up, Step Back: How to Really Deliver Strategic Change in Your Organization":

"The first ask of leaders when kicking off a new strategy or change - and the first way in which leaders need to step up and do more is for them to clearly tell the organization what they want.

Starting by explaining what the change should deliver and why it is needed sounds obvious, but too often gets short-changed by leaders too eager to 'just get on with it'

...

Explain why it's necessary and how it fits 

Next, leaders need to create a credible narrative for the change. A narrative understand what the future might look like. When kicking off a strategic is a story that links the past and the present and, in that context, helps us strategy why now. That's critical if people are to understand what's driving the change, leaders need to talk about why this new strategy is needed - and if they are to get a sense of urgency as to why this is now a priority for and - a context that can help them decide how to deliver it the business.

...

When leaders explain a new strategy in the context of the past, it enables managers to understand how this new strategy links with what has gone before. This is important because, other than in a brand-new business, a new strategy will typically be announced a against a backdrop of existing work. By understanding how the new strategy fits with what's gone before, managers can work i.e. the out which of their existing initiatives they will be able to keep and which ones that fit with, and may help deliver, the new strategy the parts they can stop. Knowing the parts of their existing work that can be stopped is critical if bandwidth iS to be freed up, with which to give new strategy the time and focus it needs"

Fiquei a pensar se as consequências deste "choque estratégico" foram percebidas por todos os associados. Estarão todos de acordo? Não houve discordâncias? E começo a recordar um texto de Peter Drucker que li há muitos anos sobre uma reunião numa empresa grande americana. O CEO apresentou uma proposta que ele considerava ser crítica e disruptiva. Apresentou-a e toda a gente votou a favor dela. Ele ficou incomodado e retirou a proposta dizendo. Se estão todos de acordo é porque não a perceberam. Peço que a revejam e voltamos a discuti-la na próxima reunião.

quinta-feira, dezembro 01, 2022

Empobrecer como os tais sapos

Empobrecer mais ou menos lentamente é isto:

  • JdN na passada terça-feira, 29.11.2022 - "Com as exportações do setor [Moi ici: do calçado] a crescerem mais de 10% face aos valores pré-pandemia,"
  • INE no passado dia 17.11.2029 - "O Índice de Preços na Produção Industrial (IPPI) registou uma variação homóloga de 16,2% em outubro (19,7% no mês anterior). Para esta evolução contribuiu, em grande medida, a desaceleração dos preços da Energia. Excluindo este agrupamento, os preços na produção industrial aumentaram 14,6% (15,5% no mês anterior)."
  • ECO na passada terça-feira, 29.11.2022 - "Preço dos sapatos à saída da fábrica subiu 5% no último ano"
Ou seja, para alguém foi um ano de endividamento, foi um ano de pagar para trabalhar, foi um ano de Ponzi. Alguns não o sabem, outros têm vergonha de parar (terras pequenas, toda a gente se conhece), outros fazem batota, outros deslocalizam, outros ...

sábado, novembro 05, 2022

A morte das empresas a dois níveis

O que quero dizer com "deixem as empresas morrer"?

Vejo o tema em dois níveis, ou duas perspectivas diferentes:

  • a perspectiva da empresa individual; e 
  • a perspectiva da sociedade.
Quando afirmo "deixem as empresas morrer" estou a pôr-me na perspectiva da sociedade. Como sociedade, precisamos que empresas menos produtivas deixem de actuar como zombies que consomem recursos que poderiam estar a ser usados noutras áreas da economia, ou noutras empresas, e não os rentabilizam de forma adequada. Sem a morte de empresas não há flying geeses capazes de acompanhar o aumento da produtividade das sociedades mais dinâmicas economicamente. Recordar Maliranta e Taleb, recordar Hausmann e os seus macacos que não voam, apenas trepam árvores. Recordar Portugal não irá crescer se continuar a “exportar ‘mais do mesmo’”

Ainda recentemente usei a pirâmide de Larreché:
A economia portuguesa só alcança a produtividade média europeia através da originação de valor. Recordar o exemplo irlandês - produtividade irlandesa: empresas nacionais versus empresas internacionais.

Vejamos a gora a perspectiva da empresa individual. Cada empresa individualmente deve fazer tudo o que é ética e legalmente possível para sobreviver. Ninguém de fora deve ter autoridade ou poder para dizer que uma empresa deve morrer porque ...

Cada empresa individual, tendo em conta o seu contexto interno e externo, tendo em conta os requisitos e as expectativas das suas partes interessadas, deve trabalhar para capturar mais valor ou para extrair mais valor. Recordar Marn e Rosiello:
Também se aumenta a produtividade vendendo melhor ou sendo mais eficiente, mas nada bate a capacidade de aumentar preços sem perder clientes, algo que só se consegue com a base da pirâmide de Larreché. 

Assim, enquanto como cidadão defendo que a sociedade deve deixar as empresas morrerem, como consultor trabalho para apoiar as empresas individuais a darem a volta quando estão em más circunstâncias. Ou a melhorarem o que já está bem, mas tem de melhorar porque amanhã as partes interessadas (clientes, trabalhadores e o sócio-estado) vão querer mais. Até porque se as empresas de mais baixa produtividade morrerem todas hoje não há empreendedores suficientes para pôrem a render os recursos entretanto libertados. Recordar Não são elas que precisam de Portugal, Portugal é que precisa delas.

E algumas, não todas, das empresas com baixa produtividade, quando encaram de forma sistemática o desafio do aumento da produtividade para sobreviver, descobrem dentro de si recursos adormecidos, desprezados, inúteis, que se tornam preciosos para uma vida 2.0 onde as regras do jogo mudam e a empresa pode começar a viver, mais do que sobreviver. Como, por exemplo, aconteceu com o calçado quando mudou de modelo de negócio e de cliente-alvo e passou a vender sapatos que se vendem na loja a 300€ e não a 30€.

sábado, setembro 03, 2022

Como eu gostava de saber

Há cerca de um mês perguntava Qual o resultado final?

Agora, refino a equação desta maneira:

A guerra e a inflação baixam a procura agregada (mercados tradicionais das exportações portuguesas e restantes mercados).

A saúde da economia chinesa e da sua política Covid zero, a disrupção das cadeias de fornecimento, levam a que potenciais clientes de novos mercados possam estar disponíveis para comprar a empresas portuguesas. A menos que as barreiras à entrada sejam baixas e as empresas chinesas possam ser substituídas facilmente noutros países asiáticos.

Assim, as exportações portuguesas embora sejam prejudicadas pela guerra e pela inflação nos mercados tradicionais, podem ser beneficiadas na substituição das empresas chinesas quando as barreiras à entrada de terceiros for mais alta.

Alguns números:
Como eu gostava de saber ... lembrei-me disto:

"Conhecem a história da empresa de calçado que, nos anos 60 do século passado, enviou dois vendedores para África, um para Angola e outro para Moçambique, para desenvolver negócio? Ao fim de uma semana, o que estava em Angola ligou para a sede desanimado porque ninguém usava sapatos, por isso, ia regressar para não gastar mais dinheiro. No final dessa mesma semana, o que estava em Moçambique também ligou. Estava entusiasmado! Ninguém usava sapatos, havia um mercado potencial tremendo por desenvolver, teria que prolongar a estadia."

E volto a Março de 2013... "Por que é que calçado e têxtil têm tido desempenhos tão diferentes?"  

Pois é: Os modelos mentais agarram-se a nós como lapas... nós somos os modelos mentais que carregamos, e mudar um modelo mental é muito difícil... há que partir o molde que nos enformou... tão difícil que às vezes parece impossível.

terça-feira, maio 10, 2022

O futuro próximo dos sectores tradicionais em Portugal nos próximos meses

"O calçado "não vai escapar às pressões inflacionistas" e deverá registar um "forte aumento" de preços nos próximos seis meses, estimado entre OS 5% e os 20%.
...
“A maioria dos membros do nosso painel acredita que nos próximos seis meses a quantidade de calçado vendido vai crescer moderadamente, juntamente com os preços, que devem aumentar fortemente.
...
Comparativamente a edições anteriores, destaque para o facto de terem desaparecido das preocupações da indústria a falta de encomendas ou as questões relativas à competitividade. Refira-se que 51% dos inquiridos esperam que o nível de emprego no setor cresça nos próximos seis meses, havendo apenas 6% de respostas a apontar para uma quebra.
...
Por fim, e no que aos canais de distribuição diz respeito, cerca de dois terços dos especialistas entrevistados acreditam que o e-commerce vai aumentar o seu peso na venda de calçado nos próximos três anos."

Isto está de acordo com a minha experiência no terreno. 

Trechos retirados de "Preço do calçado deverá aumentar 8,4%, em média, nos próximos meses" no DN de ontem.

sexta-feira, março 25, 2022

Pergunta sincera, pergunta honesta

No último mês já escrevi quatro postais com o mesmo título - O risco de voltar a trabalhar com a China (parte IV).

A China é o banhista gordo. Sair da China provocará/provoca "engarrafamentos" em todo mundo.

Ontem de madrugada, antes de sair de casa, vi este artigo no Financial Times, "BlackRock's Fink says Ukraine war marks end of globalisation":

"Russia's invasion of Ukraine will reshape the world economy and further drive up inflation by prompting companies to pull back from their global supply chains, BlackRock's Larry Fink has warned.

"The Russian invasion of Ukraine has put an end to the globalisation we have experienced over the last three decades," Fink wrote in his annual chairman's letter to shareholders of BlackRock, which oversees $ 10tn as the world's largest asset manager.

...

The letter did not mention any specific country that would be hurt by the shifts, but Fink wrote that "Mexico, Brazil, the United States, or manufacturing hubs in southeast Asia could stand to benefit". Other investors have argued that the last group could substitute for China, where BlackRock last year launched a set of retail investment products."

Entretanto, à hora do almoço vi a capa do JdN e li o artigo "Guerra na Ucrânia trava globalização a fundo"... e só uma vez mencionam a China e indirectamente. Escrever sobre globalização e não falar na China!!! Escrever sobre globalização e reduzi-la a compra de petróleo e matérias-primas à Rússia!!!

Eu tento olhar para a big-picture. Por exemplo, na figura que se segue todos os actores estão no país, excepto os consumidores que podem estar cá ou no estrangeiro:

Qual é, qual deve ser o papel de uma associação empresarial nesta teia de interesses conflituantes?

Com China, com a globalização como a conhecemos nos últimos 30 anos, os fabricantes nacionais ou sobem na escala de valor, ou estão condenados a fecharem portas. Não pela falta de competitividade, mas pelo aperto dos salários promovido pelo governo de turno. As marcas intermediárias entre consumidores mundiais e fabricantes nacionais têm o poder de optar por fabricantes estrangeiros.

Sem China, sem a globalização como a conhecemos nos últimos 30 anos, os fabricantes nacionais não precisam de subir na escala de valor, precisam apenas de serem capazes de aumentar os preços para suportar o aumento de custos. As marcas intermediárias entre consumidores mundiais e fabricantes nacionais perdem poder, a procura passa a ser maior do que a oferta de capacidade produtiva, pelo menos no curto-médio prazo.

Qual é, qual deve ser o papel de uma associação empresarial nesta teia de interesses conflituantes?

Em Novembro último publiquei Mea culpa (parte II) onde escrevi:

"Um empresário, um patrão, não tem como responsabilidade mudar o mundo, tem como responsabilidade liderar a sua empresa. Por outro lado, o desafio de a manter à tona é tão grande que raramente encontra tempo para pensar no depois de amanhã, simplesmente reage, o quotidiano é que assume o comando. É cada vez mais difícil encontrar pessoas para trabalhar a receber os salários que pode pagar? Em vez da subida na escala de valor, temos a race to the bottom: Arranjar quem o faça no Brasil, ou na Moldávia ... ou uma prestação de serviços à la Odemira.

Por isso, os portugueses emigram …"

Quando escrevi Moldávia, sabia de uma associação empresarial estar a trabalhar para transferir parte da produção para a Moldávia.

Pergunta sincera, pergunta honesta: Qual é, qual deve ser o papel de uma associação empresarial nesta teia de interesses conflituantes? Apoiar a race to the bottom, ou trabalhar para que se suba na escala de valor, mesmo sabendo que a maioria das empresas no médio prazo não sobreviverá?

Em Novembro o cenário era um.

E em Março de 2022?

A 16 de Março último o Jornal de Notícias publicou o artigo "Calçado perdeu 158 empresas e 4 mil empregos" onde se pode ler:

"Falta de resposta em Portugal está a levar à subcontratação em países como India e Marrocos.

...

A importação de gáspeas (a parte superior do calçado, antes de lhe ser aplicada a respetiva sola) ou até de produto acabado de outros países, nomeadamente da India e, mais recentemente, de Marrocos, tem sido uma das soluções adotadas. E a APICCAPS vai estudar mercados alternativos de forma séria e aprofundada.

"É algo que terá de ser pensado em termos de futuro. Não digo que esta é a estratégia do setor, porque essa será sempre a de centrar a produção em Portugal, que é onde está o valor competitivo, mas não podemos fechar a porta a nenhum tipo de negócio neste momento", frisa João Maia, em declarações a JN/Dinheiro à Vivo, à margem de mais uma edição da Micam, a maior feira de calçado do Mundo, que terminou ontem em Milão."

Como consultor trabalho para ajudar uma empresa a atingir os seus objectivos.

Pergunta sincera, pergunta honesta: Qual é, qual deve ser o papel de uma associação empresarial nesta teia de interesses conflituantes? E em função dos papéis que assume, qual deve ser o apoio dado por um governo a essa associação?

Quando em "Calçado precisa de dois a três mil trabalhadores" no Jornal de Notícias de 13 de Março último leio as palavras de Luis Onofre, presidente da APICCAPS:

"Os preços do calçado "vão inevitavelmente ter que aumentar", embora não tenha estimativas dessa subida, por depender de cada artigo. O problema é convencer os clientes. "Os aumentos, sobretudo dos custos energéticos, têm sido brutais e influenciam muito o preço final do sapato, mas os clientes não aceitam aumentos. Não conseguem, ainda, perceber a real dimensão da situação"

Fico a pensar ...  Qual é, qual deve ser o papel de uma associação empresarial nesta teia de interesses conflituantes?

quinta-feira, março 24, 2022

Quem feio ama, bonito lhe parece.

 

"A NGPT, com sede em Felgueiras, fez uma parceria alicerçada na certeza de que "não ter fábrica é uma vantagem, até quando falta mão de obra como no momento atual. Como subcontratamos, só temos de estar atentos e mudar rapidamente de fornecedor", diz."

Quem feio ama, bonito lhe parece.

Acredito que nos próximos anos a procura pela produção na Europa vai crescer ainda mais, cada vez mais procura de capacidade de produção para marcas, cada vez mais poder para os fabricantes.

Que subcontratados aceitam trabalhar para um parceiro que os trata como dispensáveis? Estas coisas, mesmo que se pensem não devem ser ditas.

Esta prática pode ser vantajosa ou não. Tudo depende da orientação estratégica da marca, e do preço que estiver disposta a pagar num mercado em que a oferta tem mais força.

Trecho retirado de "Após a corrida ao papel higiénico, há uma lição que o negócio dos sapatos pode tirar"

terça-feira, março 15, 2022

Onde está essa fábrica agora? Pois, não está ...

Um discurso perigoso...

"Do plástico para os saltos às borrachas para as solas, passando pelos fios e pelas peles, a indústria do calçado está a ficar com as margens cada vez mais esmagadas porque “os clientes não estão a aceitar aumentos” de preços. Ao mesmo tempo, começam a chegar as primeiras faturas de eletricidade com valores cinco vezes mais elevados.

...

O grande problema é que os clientes não estão a aceitar aumentos. É muito difícil. Aliás, tenho ouvido respostas – e de grandes grupos – como ‘vocês têm de inventar soluções dentro da vossa empresa para que sejam mais produtivos’. A minha primeira reação, com alguns nervos, é dizer-lhes: ‘então venham para aqui e tentem fazê-lo’. Além disso, estamos com um problema de falta de mão-de-obra e arranjar tecnologia para implementar nas empresas não se consegue fazer de um dia para o outro.

...

Reconheço que o salário mínimo em Portugal continua a ser muito baixo. Estou de acordo que seja aumentado, mas a produtividade também tem de aumentar – e isso não tem acontecido. Devia crescer mais em função da produtividade. E os próprios trabalhadores são a favor disso. Ou seja, quanto melhor fizermos, mais temos de receber no final. O problema com estas subidas dos últimos anos é que todos os escalões que estão acima começam a ficar muito próximos e isso cria uma instabilidade social muito grande [dentro das empresas]. Mas se fossemos aumentar [os restantes] em proporção, tornava-se difícil de manter a indústria."

Recuo a 2011 e a "Não é impunemente que se diz mal". 

Foco-me naquela frase "a indústria do calçado está a ficar com as margens cada vez mais esmagadas porque “os clientes não estão a aceitar aumentos” de preços" e lembro-me de A importância das margens e de:


Se tem de fazer um braço de ferro para aumentar preços ... então, encare-o como uma mensagem do universo a dizer que tem de mudar algo. Portugal não irá crescer se continuar a “exportar ‘mais do mesmo’”

Os trechos iniciais foram retirados de "Luis Onofre: "Preço dos sapatos nas lojas vai aumentar 20% a 30%, para já"". O mesmo Luís Onofre, numa entrevista ao JN de Domingo último, em "Calçado precisa de dois a três mil trabalhadores" refere: 
"O ganho médio dos trabalhadores do setor passou de 623 euros, em 2009, para 871, em 2019, o último ano disponível, o que representa um aumento de 40%."
Entretanto segundo um artigo publicado algures e que li ontem a APICCAPS refere que os preços cresceram 24% na mesma década. Embora as minhas contas apontem para 16%.

Em 2015 escrevi sto sobre uma empresa têxtil: Mais um exemplo do regresso do têxtil
Em 2019, acerca da mesma empresa, escrevi isto: A destruição criativa

As vantagens competitivas não são eternas, o que hoje funciona pode não funcionar no próximo ano. Turn, turn, turn:

Recordo Mea culpa e Mea culpa (parte II). Já este ano encontrei uma foto da saída dos trabalhadores de uma fábrica de calçado em Karlsruhe (?), na Alemanha, ao final do dia. A foto era dos anos 50 do século passado. Onde está essa fábrica agora? 

Pois ... não está.

sábado, fevereiro 12, 2022

Dúvidas...

Quem segue este blogue sabe que costumo trabalhar regularmente com o sector do calçado. Desde o Verão passado que o sector do calçado em Portugal tem andado num reboliço de trabalho, muito trabalho, muitas encomendas, falta de pessoal, falta de subcontratados, disrupção no fornecimento de matérias-primas, aumentos brutais no custo de matérias-primas, componentes e energia.

Literalmente podemos dizer que todas as empresas do sector estão entupidas de trabalho, sem correr grandes erros de simplificação.

Nos meus contactos com os empresários costumo perguntar pelo andamento dos preços... sistematicamente dizem-me que não conseguem aumentar preços. Já nem comento a tristeza que sinto perante essa resposta. Sabem o quanto acredito que o típico empresário português deixa demasiado dinheiro em cima da mesa - Talvez o tema que mais nos separa dos níveis de produtividade do resto da Europa Ocidental

Quinta-feira passada comecei a ouvir notícias e comentários sobre o desempenho do sector em 2021. Já tenho experiência suficiente para não embandeirar em arco ao mínimo sinal de sucesso (wishful thinking?). Por um lado, por causa dos números. Quero ver os números! Por outro lado, sinto que o sector tem uma espada de Damôcles sobre si, depois de ler Eric Reinert, e depois de perceber que o jogo do gato e do rato, acerca da produtividade, seguirá a via de Avelino de Jesus, não há que ter ilusões. O sector em Portugal terá de encolher muito no futuro.

Ontem no Jornal de Negócios olhei para os números do sector em 2021 e comparei-os com os dados de 2019 e 2020:

Quando os empresários me dizem que não conseguem aumentar os preços, muitas vezes recordo o começo do livro "Vinho e Pão" - Qual é a diferença?

Será que o crescimento do preço médio do calçado exportado compensa o aumento dos custos dos factores de produção? Desconfio que não ...

quarta-feira, novembro 03, 2021

Falta de trabalhadores? E salários? Back to Cavaco, Setembro de 1992

No JdN de ontem um artigo de 2 páginas intitulado “Mobiliário desespera à procura de 5 mil trabalhadores”.

Um tema relacionado com alguns postais publicados aqui no blog na última semana:
Sublinhei algumas passagens do artigo e criei o mapa que se segue:




O que é que um cenário destes está a pedir:
  • Aumento dos preços, o aumento da procura por mobiliário nacional é um sintoma de que a relação qualidade/preço está desequilibrada;
  • Aumento dos salários para atrair mais gente para o sector.
Ali ao lado na coluna das citações há uma que gosto muito:

"nature evolves away from constraints, not toward goals"
O meu lado ingénuo e optimista escreveu aqui no blogue:
“Quando a falta de trabalhadores obriga os salários a subirem mais do que a produtividade, as empresas começam a trilhar um caminho perigoso. A minha visão optimista apontou logo a alternativa, subir na escala de valor para que a produtividade aumente mais depressa do que os salários. Ainda recentemente escrevi "Mudar e anichar"”
O título do postal onde escrevi este trecho foi “Uma bofetada que recebo como um aviso”.

Porquê bofetada? Por causa da minha ingenuidade, por causa das raposas trazidas para caçar coelhos australianos. Qual a forma de resolver o cenário lá de cima sem subir na escala de valor e sem aumentar salários? Importar trabalhadores da Ásia.

Assim, abro a porta a outras citações do texto do JdN:



Julgo que estas últimas citações vêm tornar a situação menos linear. E para complicar as coisas acrescento outra que me faz espécie:
Vamos pegar nos dados apresentados no artigo. Por exemplo, Grupo Laskasas, com 435 trabalhadores e a facturar 24 milhões de euros. O que dá cerca de 55 mil euros por trabalhador. Comparemos com a facturação média do sector do calçado em 2018 dividida pelo número de trabalhadores do sector em 2018, cerca de 50 mil euros. Conclusão: custa-me a crer que o sector do mobiliário possa pagar salários elevados.

Pena que o JdN não tenha entrevistado trabalhadores para ter uma visão mais abrangente do contexto.

Custa-me a crer que não haja interessados em entrar numa profissão que pode vir a pagar 2 mil euros por mês limpos. Reparem na resposta à pergunta. O jornalista mostra surpresa por a esse preço não se conseguirem contratar pessoas. E na resposta o presidente da associação do sector explica que não se encontram porque o sector paga bem... há aqui qualquer coisa que não consigo processar. Parece ao nível do antigo presidente da câmara de Guimarães em 2008.

Sinto-me invadido por um pessimismo ao estilo de Cavaco a 25 de Setembro de 1992.

domingo, setembro 26, 2021

Conversas, chapadas, "o problema é do governo" e o problema do locus de controlo

Na sexta-feira passada, a trabalhar com uma empresa de calçado, comentei que apreciei a análise do contexto interno e externo que fizeram (requisito da ISO 9001). Em vez do habitual extenso rosário de banalidades concentraram-se em poucos tópicos, mas bons.

Depois do elogio disse algo como: Conhece aquela frase, no longo prazo estamos todos mortos?

Talvez ainda não seja um problema para a empresa agora, mas de onde virão os trabalhadores que vão operar esta fábrica daqui a 10 anos?

Anuíram com a cabeça, falaram na falta de subcontratados, falaram na remota possibilidade de importação de gáspeas da Índia ou do Brasil.

Este é um tema que vagueia pela minha mente há algum tempo: 

  • Por que é que um jovem no futuro há-de querer ir trabalhar para uma fábrica de sapatos?
  • A pressão do salário mínimo vai ser cada vez maior
  • Qual a rentabilidade que é possível retirar do negócio dos sapatos?
  • Como competir pelos futuros trabalhadores?
Claro que também convém não esquecer as chapadas que se podem apanhar. Se lerem este link pensem no que se esconde de "esquisito" nas Odemiras de Portugal.

Há uma técnica de busca de soluções chamada programação linear, onde diferentes condicionantes são representadas por rectas que vão limitando o campo de escolha (cada recta representa uma limitação diferente):

Uma empresa de calçado para atrair um jovem tem de considerar:
  • o aumento do salário mínimo
  • a falta de gente para trabalhar (por exemplo, na semana passada numa empresa cheia de trabalho contaram-me que quatro, sim quatro trabalhadores tinham-se despedido para ir trabalhar para a Suiça)
  • a falta de atracção por trabalhar numa fábrica para um jovem, ainda para mais agora que é obrigado a estudar até ao 12º ano
  • a crescente competição de concorrentes em países mais baratos e também próximos do centro da Europa (recordar a Turquia e a Albânia, por exemplo) 
Algo que reduz a velocidade a que o problema para as empresas de calçado se manifesta é a incapacidade de Portugal competir com a Europa de Leste na atracção de empresas de produtividade elevada. Se não fosse esse travão, as empresas de calçado portuguesas estariam perante o mesmo problema que as empresas de calçado alemãs nos anos 60 e 70, obrigadas a fechar ou a deslocalizar-se para um Portugal qualquer por ficarem incapazes de pagar os salários que a concorrência de outros sectores mais produtivos conseguia pagar.

Agora vejamos o que é que algumas empresas de calçado pensam sobre o tema, a partir deste artigo "Fábricas de calçado querem contratar e não arranjam mão-de-obra": 
"Há uma série de empresas a precisar de contratar, para dar resposta aos clientes, mas sem sucesso. Luís Onofre, presidente da associação do calçado, pede ao governo que crie apoios à deslocalização, que fomente a transferência de famílias para distritos onde haja falta de mão-de-obra. [Moi ici: Portanto, o problema é para ser minimizado pelos contribuintes]
...
Por exemplo, sugerimos também que pudéssemos ter uma mão solidária com os refugiados, dando-lhes emprego nas nossas fábricas, mediante algum controlo obviamente" [Moi ici: Truque de Odemira ou pagar o salário mínimo? Se for o truque, é uma race to the bottom, se for o salário mínimo, só resulta enquanto o negócio gerar rendimento para o pagar. Também podem trazer a Ásia para a Europa à custas das bofetadas lá de cima, veja o exemplo italiano]
...
[Moi ici: Agora reparem na argumentação que se segue, faz-me recuar aos delírios de argumentação de um presidente da câmara de Guimarães em 2008] "a indústria só consegue ser atrativa através do salário, mas compete com países onde o custo salarial é metade, ou menos". Para o empresário, compete ao governo encontrar uma solução, mas sempre vai dizendo que "tem que haver uma forma de subsidiar os setores tradicionais, que empregam muita gente, já que ajudam a diminuir os níveis de desemprego do país"". [Moi ici: Oh boy!!! Portanto o problema é do governo ... Reparar, o artigo começa com a dinâmica de crescimento, com a dinâmica de encomendas e retoma e, mesmo assim, é preciso subsidiar. O mindset é que o problema não é de cada empresário, ou das associações do sector ... é do governo. E depois o remate final à presidente da câmara de Guimarães em 2008: Por que o desemprego é alto é preciso subsidiar a criação de emprego em empresas que querem empregar. BTW, oficialmente o desemprego está baixo!

Este artigo exemplifica bem o tema que abordei várias vezes esta semana aqui no blogue. Por exemplo em ""Como serão as conversas que decorrem nas empresas?"":

Estamos com conversas de empresas no quadrante de elevada competitividade, mas baixa produtividade.

A cultura portuguesa é uma cultura que evita o choque, que prefere esconder as verdades nuas e cruas, que assume a esperança como a principal estratégia. Trabalhar no quadrante de elevada competitividade, mas baixa produtividade é trabalhar sem autonomia estratégica, as empresas sobrevivem mais ou menos tempo em função da velocidade de aumento do salário mínimo, em função da velocidade da hemorragia demográfica, e da competição de outros sectores.

Se a nossa economia estivesse saudável e fosse capaz de atrair empresas produtivas, o destino das empresas de calçado no quadrante de elevada competitividade, mas baixa produtividade, seria o inevitável encerramento a curto prazo. As conversas dentro destas empresas devia ser sobre o que podem fazer para contrariar o destino normal e saltar para o quadrante da elevada competitividade e elevada produtividade

Ah! O velho problema do locus de controlo... uma doença tuga.

sábado, setembro 25, 2021

Contrarian!


"Tudo está a mudar e nós também precisamos de mudar e é nos períodos de dificuldades que devemos apostar em sermos diferentes"

Nope! 

É nos períodos de facilidades que devemos apostar em sermos diferentes. É nesses períodos que temos mais flexibilidade para falhar. Fazer experiências em períodos de dificuldade é arriscar tudo. A boa lição dos estóicos: aposta só o que podes perder na totalidade sem pôr em causa o teu empreendimento

""Numa feira deste género tem de haver um esforço da comunidade empresarial para garantir uma boa representação que dignifique a indústria. As pessoas têm que se saber reinventar, com stands mais pequenos, mas têm de estar presentes. Senão não dão força ao país nem motivação às outras empresas", defende."

Nope!

As empresas vão a uma feira para tratar da sua vida, não para representar a indústria ou o país. É como a treta dos agricultores terem de alimentar o mundo. Como escrevi aqui:

""A agricultura é a arte de produzir alimentos para a sociedade, [Moi ici: Estou farto de escrever aqui no blogue que a função do agricultor não é alimentar a sociedade, a função do agricultor é ganhar dinheiro através da prática da agricultura. A sociedade não quer saber dos agricultores, quer produtos agrícolas baratos nem que venham da Ucrânia. Por isso, o agricultor não deve ser trouxa e deve trabalhar para quem valoriza o fruto da sua actividade. Adiante]" 

Trechos retirados de "Sinais de retoma dão confiança aos industriais de calçado"

sábado, agosto 14, 2021

"ver certas árvores no meio da floresta"

Em BE 2.0 de Jim Collins e Bill Lazier encontrei uma figura parecida com esta:

Se pesquisarem este gráfico na internet como "industry evolution stages" vão encontrar associado à fase de "Declínio" características como:
"Negative Growth
Excess Capacity
High Competition"

Como uma caracterização deste tipo é fácil perceber qual é o campeonato na fase de "Declínio": Low Cost 

No livro BE 2.0 a caracterização da fase de "Declínio" é mais completa e deu-me para sublinhar algumas características.

"Sophisticated customers

Low/falling prices and margins

Industry over-capacity

Shift back toward specialized channels

Move back toward shorter production runs; higher costs


Fewer competitors

Product stagnation

Can be an ideal time to re-invigorate an industry with a dramatic new innovation"

Quem olha para as estatísticas na fase de "Declínio" vê o primeiro conjunto de caracteríticas e conclui que o negócio é "custo unitário baixo". Quem está dentro do mercado pode ver certas árvores no meio da floresta e perceber que há outras alternativas.

Recordo aqui a Fase IV para o calçado em Portugal:

Em vez de estágios de evolução de uma indústria talvez faça mais sentido pensar em estágios de evolução de um modelo de negócio.

sábado, maio 01, 2021

Uma visão para a Fase IV - calçado

Trabalhar no mundo do calçado é trabalhar num mundo de margens apertadas, quase sempre. Podemos não competir com os chineses, mas competimos com turcos e albaneses. (Recordar as 144h).

Neste postal, "Quantas empresas? (parte VII)", escrevo sobre aquilo a que chamo a Fase IV do calçado português:


Continuarão a existir empresas grandes, mas num país com esta dimensão, e com este nível de vida nunca serão muitas. No entanto, a grande massa que sobreviver ou nascer vai ficar mais pequena e terá de trabalhar para ter muito melhores margens.

Escrevo isto e estou, na minha mente, a ouvir o amigo Pedro a retorquir:
- O Carlos quer que a gente se reduza a um ateliê!!!???

Ontem, numa caminhada matinal em Lousada encontrei via Twitter esta peça de publicidade da Microsoft que serve para ilustrar o que aspiro como visão para a Fase IV. E sublinho COMO VISÃO!

"Successful companies do not wait for opportunity — they create it. Case in point: the French glove and protection manufacturer Racer.

Racer has carved a niche creating high-performance gloves for a discerning worldwide clientele of skiers, cyclists, motorbike riders and equestrians. Its team of 25, based in the southern French town of Salon de Provence, produces premium products that are second to none
...
Today, Racer’s challenge is to maintain its focus on high-end handmade products while also innovating to anticipate the needs of its customers. It has to diversify in a way that stays true to its brand values. In recent years, it has harnessed tech to do so.
...
Racer extended its product line with heating jackets and a sportswear range for urban mobility, with a new generation of very discreet, light and stylish helmets. [Moi ici: Isto é o que acontece quando deixamos de pensar em tubagens e passamos a concentrar-nos no desafio de mover fluidos, e mergulhamos no contexto de quem o faz, para lá daquilo que produzimos]

...

Recent developments include heated rehabilitation gloves and protective clothing for the elderly to prevent injuries caused by falls.

Racer has used an ecosystem of local partners on its latest innovations, from the regional workshops that provide the leather and material for their products to the University of Marseille, with which it works on rehabilitation and healthcare products. There is also a move towards reintroducing production in France and offering a repair option, where possible, instead of expecting customers to buy replacement gloves due to the effects of wear and tear."





segunda-feira, março 08, 2021

Turquia - Portugal em 144 horas

Sábado fez 10 anos que publiquei "Pregarás o Evangelho do Valor", depois fui para Arrifana onde fui trabalhar com os amigos Paulo e Pedro. Julgo que foi ao final dessa manhã que me apresentaram o amigo António.

Sábado ao princípio da noite o amigo Pedro mandou-me esta imagem via WhatsApp:
Portugal -> Turquia e Turquia -> Portugal com entregas em 144h (6 dias).

Como não recordar um texto publicado fez ontem três meses ""Come on! Esta gente não analisa os números?"" onde escrevi:
"O que ressalta é a evolução turca e albanesa. Em 2010 a Turquia exportava cerca de 75 milhões de pares de sapatos, em 2019 exportou 275 milhões de pares a um preço médio de 3.29 USD. A Albânia em 10 anos duplicou as suas exportações. Presumo, pelo preço médio de cada par, que há ali mão de know-how italiano."

E chamei a atenção para a transitoriedade do status quo no sector privado exportador. A base do sucesso do modelo nos últimos 10 anos posta em causa por dois países próximos do centro da Europa com custos de produção muito baixos. Por isso:

"finding a sustainable competitive advantage may not be that important. What is important, however, is that companies have a contingency plan to deal with the upcoming prospects for an expansion of available resources or possible constraints created by other actors in the market." 

E isto joga bem com a mensagem do lucro como uma ilusão, parte significativa dele é para pagar os custos do futuro, como aprendi com Schumpeter. Há que estar sempre focado no amanhã, recordo esta série "Quantas empresas". Recomendo a parte X dessa série.

E já agora, na sequência dessa parte X, voltar ao postal de ontem sobre "The search for a profitable niche market"




quinta-feira, fevereiro 18, 2021

Pensar no futuro

O covid só veio acelerar as mudanças que já estavam em curso.

Interessante o que se lê sobre o Bangladesh: 

"The pandemic is not the only pressure point on fashion’s traditional supply chain. The rise of ultra-fast, online-only fashion companies is playing havoc with manufacturers’ business model, and the changing retail landscape is likely to feel long-lasting and far-reaching consequences.

Where traditional retailers would make large orders of each style, their more nimble, digital competitors have found success in a test-and-repeat model, ordering limited runs and swiftly doubling down on styles that sell. For factories, it’s a costly planning nightmare; the pivot to smaller, quicker inventory restocks could make sourcing from countries like Bangladesh and Pakistan — where lead times are longer and order minimums are relatively high — less attractive to buyers.

Manufacturers are caught shouldering much of the cost of uncertainty, with inventory volumes and associated labour requirements increasingly difficult to predict. “Those components of supply chain which have historically been much more formulated ... are now going to change, [with] speed being the name of the game,”

...

Others see opportunity in adapting to the fast-paced needs of ascendant, digitally native brands. Sean Coxall, a former executive at supply chain solutions giant Li & Fung, launched his company, 707, in January to offer supply chain solutions to direct-to-consumer upstarts. [Moi ici: Ao tempo que penso nisto. As marcas online não vão a feiras conhecer potenciais fabricantes]

We’re changing from supply chain to demand chain,” he said. “If you’re a factory, you need to forget the old way of asking for 100 days’ lead time... you know everything needs to be a lot more flexible and agile right now.”"[Moi ici: Quantas fábricas estão preparadas para dar a volta ao modelo de produção? É mais fácil criar uma de raiz do que dar a volta à cabeça das pessoas

Trechos retirados de "In Fashion’s Global Supply Chain, a Ruthless Race to the Bottom

quinta-feira, janeiro 28, 2021

Do you have the willpower?

 "Two companies, two giants, each dominating its market, each fated to collapse very quickly. Neither lacked insight. What they lacked was willpower. Kodak invented the first digital camera. Encyclopedia Britannica produced one of the first multimedia encyclopedias on a CD-ROM. Both companies became trapped in business models that had previously worked so well. Kodak’s photographic print division resisted any shift to the lower-profit digital cameras, and EB’s sales force refused to put its product on a disk. Each company needed to make changes while its original business model was still profitable before the collapse began, but they were unable to throw away what looked like a winning hand.

...

IBM chose to become smaller but more profitable and successful, transforming itself from a maker of business machines into a global provider of information services. The company made these changes before it had to before it entered a period of crisis. [Moi ici: Como não pensar no calçado e na Fase IV que apresentei na parte I desta série]

...

It is easy to cherry-pick examples, contrasting Kodak with IBM while ignoring companies that did try to transform themselves and got it disastrously wrong.

Mostly, I worry that the doctrine of continual transformation runs counter to the emergence of insights. Advocating for continual or even periodic transformation makes it into a routine to be performed. In contrast, insights are accidental. An organization that rigidly adheres to a doctrine of continual transformation, following the creative desperation path, is different from one that is sensitive to connections, coincidences, curiosities, and contradictions.

Organizations demonstrate willpower when they act on insights, particularly insights about their primary goals. An insight about a goal isn’t about being flexible and adapting plans in order to reach the original goal. It’s about changing the goal itself." [Moi ici: Li este parágrafo várias vezes e em todas elas veio-me à mente a expressão "Hmm! Wrong jungle!"]

A Depressão Económica que se seguirá à pandemia vai matar, está a matar, muitas empresas. Vai obrigar outras a transformarem-se, vai obrigar outras a mudarem de modelo de negócio. Na passada sexta-feira estive numa empresa, a certa altura verbalizei, para que ficasse claro para todos os presentes:

- O vosso modelo de negócio vai ter de mudar da venda de produtos, da conquista de mais clientes, para a venda de serviços aos clientes que têm. Densificação de relações!!!

BTW, hoje durante a caminhada matinal, pela primeira vez percebi que a densificação tem de ocorrer não só com o exterior da organização, mas também no interior das organizações, e isso, é exactamente o contrário do que Taylor propôs.

Trechos retirados de "Seeing What Others Don't" de Gary Klein.