Esta semana, durante a minha habitual conversa com o meu parceiro das chamadas "conversas oxigenadoras", falámos sobre os perigos da dependência excessiva. Começámos por discutir uma empresa que vive à sombra de um único cliente grande. Imaginem uma pequena ou média empresa (PME) que, de repente, é escolhida por uma gigante para ser fornecedora regular. Cresce rapidamente, adapta-se às exigências desse cliente, mas acaba prisioneira da relação. Não é o Euromilhões que parece à primeira vista.
Os riscos são claros. Se o cliente reduzir pedidos, atrasar pagamentos ou romper o contrato, a empresa enfrenta uma crise financeira imediata. O poder de negociação fica desigual: a gigante impõe preços baixos, prazos longos ou condições difíceis — como se viu recentemente num e-mail da Simoldes aos seus fornecedores mais pequenos. Sem alternativas, aumentar lucros torna-se quase impossível. Pior, o foco num só cliente trava a inovação e a busca por novos mercados. A empresa especializa-se tanto que, se o cliente desaparecer, adaptar-se a outros torna-se um desafio. A longo prazo, o crescimento estagna e atrair investidores fica mais difícil. Um colapso é um risco real. Uma vida sem autonomia estratégica.
Enquanto reflectia sobre isto ao almoço na sexta-feira, ocorreu-me uma ideia: e se aplicarmos esta lógica a uma escala maior? O que acontece a um país cuja economia depende de poucas empresas dominantes? Pensei num Portugal com cinco ou seis Autoeuropas, onde um punhado de gigantes controla sectores estratégicos e sustenta grande parte do PIB. As fragilidades saltam à vista.
Se uma dessas empresas/sectores tropeçar — por dificuldades financeiras, perda de competitividade ou deslocalização —, o impacto no país pode ser devastador. Economias concentradas em sectores como o turismo, a indústria automóvel ou o petróleo ficam mais expostas a crises globais. Essas gigantes influenciam políticas públicas, limitam a concorrência e dificultam o surgimento de novos negócios. Despedimentos em massa afectam o emprego nacional, e trabalhadores especializados podem ficar sem opções. As PME, por sua vez, lutam por crédito e apoios, já que os recursos se concentram nos grandes. Se os lucros dessas empresas caem, as receitas fiscais também, forçando o governo a oferecer incentivos para as manter, mesmo que sejam insustentáveis.
A analogia entre uma PME dependente e um país refém de poucas empresas é reveladora. Veja-se a Alemanha: outrora um modelo de sucesso, hoje enfrenta um declínio económico, como noticiou o Wall Street Journal a 21 de fevereiro, "Germany Goes From Model to Broken Economy". A sua indústria encolheu, os custos subiram, as exportações caíram. Faltou diversificação e coragem para mudar, dizem os analistas. Será um exemplo perfeito desta dependência?
"A decade ago, Germany was the model nation. Its economy hadn't just withstood the ascendance of China; it was thriving in its wake. Its balanced public finances stood out in a world of huge government debt. And while British and U.S. lawmakers were caught up in the culture wars, German politicians continued to practice the art of compromise.
Today, Germany has gone from paragon to pariah. Its economic model is broken, its self-confidence shattered and its political landscape fractured. Europe's former growth engine has shrunk for two years in a row, erasing any recovery made since the Covid-19 pandemic. Its manufacturing output is down about 10% over the same period and its companies, squeezed between rising costs and falling exports, are shedding thousands of jobs a month.
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There are external causes for this malaise, from the war in Ukraine to U.S. protectionism and China's economic slowdown.
Yet some analysts, economists and historians think Berlin mismanaged its response. The reason: the preference for the status quo over change, for reaction over action and for caution over risk.
This is partly the wage of success. As long as Germany's economy was growing, brushing aside the financial crisis and the eurozone debt crisis, there was no pressure to course-correct, said historian Timothy Garton Ash, author of "Homelands," a history of Europe in the past 50 years."
Recordo o meu último trabalho por conta de outrem. Em apenas um ano, a empresa passou a produzir num dia o que antes fazia em duas semanas. Cresceu, sim, mas ficou quase totalmente dependente de um cliente. Os outros tornaram-se um estorvo. É uma lição simples, mas poderosa: depender de poucos, seja numa empresa ou numa nação, é jogar com o equilíbrio na ponta de uma faca. Será que Portugal — ou mesmo a Alemanha — pode diversificar antes que o fio se parta?