segunda-feira, julho 31, 2023

As "inocentes" distracções e interrupções.

Há algum tempo, durante uma conversa informal antes de um jantar, o responsável pela qualidade de uma empresa farmacêutica mencionou-me números absurdamente altos de mortes causadas por distrações em organizações de saúde nos Estados Unidos.

Na altura não lhe pedi a referência do estudo, mas o tema não me tem largado porque reconheço a quantidade de distracções a que eu e outros somos sujeitos diariamente no trabalho. Basta recordar o tema do "multitasking", por exemplo.

Há dias, pedi ajuda à inteligência artificial para me elucidar sobre o tema e foi-me recomendado este artigo, "Identifying and reducing distractions and interruptions in a pharmacy department".

Segundo o artigo as distracções e interrupções na área da saúde (mas não fiquemos por ela, pensemos no nosso próprio trabalho) podem ter várias consequências negativas, incluindo:

  1. Aumento do risco de erros de medicação, que podem levar a danos nos pacientes.
  2. Aumento do tempo necessário para concluir tarefas, o que pode levar a atrasos e redução da eficiência. 
  3. Aumento do stress, desconforto e insatisfação dos trabalhadores. 
  4. Redução da qualidade e segurança dos serviços farmacêuticos.

O ponto 2 fez-me recuar ao meu tempo de responsável da qualidade numa empresa da indústria química e ao impacte da conversa na necessidade de repetir ensaios.

Quais os principais motivos de distracção e interrupção?

  1. Chamadas telefónicas e mensagens.
  2. Colegas que páram para conversar.
  3. Doentes que fazem perguntas ou fazem pedidos.
  4. Pacientes fazendo perguntas ou fazendo pedidos.
  5. Alarmes de equipamentos e outros estímulos auditivos.
  6. Factores ambientais, como ruído e temperatura.
  7. Distracções pessoais, como telemóveis e redes sociais. (esta faz-me lembrar conversa recente com o Aranha, que me contou sobre...
  8. Tarefas administrativas, como preencher papéis e respondera  e-mails.
  9. Outras tarefas relacionadas com o trabalho, como reabastecer prateleiras e limpar equipamentos.
O que propõe o artigo para minimizar a frequência de distracções e interrupções?
Coisas práticas como:
  • Usar dicas visuais, por exemplo fazer com que as pessoas que executam tarefas que exigem atenção total usem uma bata colorida.
  • Usar barreiras para identificar uma zona "livre de interrupções".
  • Usar listas de verificação para ajudar a garantir que os funcionários se lembrem do que estavam a fazer antes de serem interrompidos.
  • Proibir o uso de telefones pessoais por funcionários que desempenhem funções relacionadas com a prescrição, distribuição e administração de medicamentos.
  • Dar formação contínua sobre a importância de tarefas complexas e como reduzir as interrupções.
  • Determinar quais são as interrupções inaceitáveis no contexto das operações em curso.
Outro artigo, com uma perspectiva muito mais interessante sobre o motivo das distracções e interrupções é "Driven to distraction: The nature and apparent purpose of interruptions in critical care and implications for HIT"

O que me impressionou neste tema é o impacte das "inocentes" distracções e interrupções no número de  vidas humanas perdidas ou prejudicadas

domingo, julho 30, 2023

Obrigá-los a falar

Mais um artigo interessante, "3 Questions Sales Teams Should Ask After Losing (or Winning) a Deal":
"When salespeople lose a deal, most prefer to move on rather than linger over the specifics of the loss. Similarly, when they win a deal, most are quick to celebrate. But very few take the time to assess why they won the business.
In our experience leading and coaching sales teams, we see evidence that a brief, well-pointed sales retrospective, where you unpack the reasons behind a win or a loss, can significantly improve a team's future win rate. Beyond the obvious benefits for the sales team - for whom the process can help identify the best messaging and behaviors to use going forward - unpacking wins and losses also provides valuable insights for product, marketing, and finance teams."

Algo que algumas empresas não fazem.

As empresas deviam "torturar os dados" e obrigá-los a falar.

Recordo um caso, recolher os dados de uma tabela e trabalhá-los com os dados de outra tabela, para reparar em 3 pistas:

  • por que é que um cliente tem um preço muito mais alto do que a média?
  • por que é que um cliente nacional tem um preço inferior ao período homólogo em mais de 10%?
  • por que é que a Espanha saltou do limbo para o top 5 de vendas?
Como é que estas análises não se fazem com mais frequência? Recordo de um postal recente:
"too many small company leaders work "in" their businesses, rather than "on" their business"

sábado, julho 29, 2023

Estratégia versus planeamento

Um extenso artigo, "How to Thwart Strategy Masquerades" a merecer uma leitura. Sublinho alguns trechos:

"Strategy always involves giving up something to get something else better. If we decide to offer only a single class of service, the consequence is that first class passengers will fly elsewhere. If we choose to offer only index funds, the consequence is that investors desirous of managed funds will invest elsewhere. If the opposite of your choice is stupid on its face, it causes no consequences and it is likely to be planning. Planning involves being non-stupid. Strategy involves consequences.

...

Strategy is centrally about compelling the thing you don't control - your customers - to take actions you wish they would take. No matter what you do, you will never be in control of your customers. If you start assuming that just because you want them to buy a certain volume of your offering, they will comply, then you are planning - and you will be sorely disappointed. Control is a planning illusion.

...

Strategy creates a future that does not now exist. That can't be accomplished by using inductive or deductive logic to extrapolate the past into the future. If your discussion focuses on 'what the data tell us we should do that is a planning discussion, not a strategy discussion. Planning doesn't create. Planning organizes."

sexta-feira, julho 28, 2023

Quando acaba o dinheiro barato

Muitas vezes ao longo dos anos tenho referido aqui no blog esta figura que criei em 2008:


Por exemplo:
Quando o preço do dinheiro desce, a rentabilidade necessária para um projecto sobreviver baixa, e vice versa. Vivemos mais de uma década de dinheiro barato... quais as implicações para os negócios habituados a baixo rentabilidade?

O NYT de ontem chama a atenção para o tema em "Corporate Debt Was Cheap, But Economy May Pay Price":
"Companies loaded up on cheap debt during an era of superlow borrowing costs to help finance their operations. The Fed has since lifted interest rates to a range of 5.25 to 5.5 percent from near zero, where they were as recently as March 2022.

The fear is that as debt comes due and businesses still in need of cash are forced to renew their financing at much higher interest rates, bankruptcies and defaults could accelerate. That risk is especially pronounced if the Fed keeps borrowing costs higher for longer - a possibility that investors have slowly come to expect.
...
The bankruptcies that have happened this year haven't seriously dented the economy so far. But analysts have warned they are symptomatic of the excesses that developed during a decade of historically low interest rates. And financial stress is unpredictable, so it poses a wild-card risk for the Fed as it tries to tame inflation. It hopes to do that without causing a recession.
...

As higher rates last, “more and more corporations will need to refinance into a higher-rate environment,”
...

But in a sign of the uncertainty over the severity of debt distress on the horizon, the Moody’s forecast also suggested that in a “severely pessimistic” scenario defaults on risky debt could jump to 13.7 percent in a year, higher than the 13.4 peak reached during the 2008 financial crisis."

quinta-feira, julho 27, 2023

Acerca da produtividade no Reino Unido

Li no FT, "Why productivity is so weak at UK companies" com o subtítulo "Longstanding problems of low investment and skills gaps exacerbated by overconfidence and lack of management time".

"But he is still in the vanguard of a collective UK effort to solve the puzzle of why British workers turn out less for every hour they work than their counterparts [Moi ici: Não gosto desta formulação. Como se os trabalhadores fossem os culpados ou a solução] in other advanced economies such as the US, Germany and France.

...

Productivity may be an abstract concept for many, but its consequences are real. Higher output  [Moi ici: Outra linguagem arcaica que não gosto de ver usada qunado se fala de produtividade porque me recorda a mentalidade dos engenheiros - foco no denominador] leads to better wages and a more prosperous economy. But UK productivity has grown by just 0.4 per cent annually in the years since the financial crisis, less than half the rate of the 25 richest OECD countries, according to think-tank the Resolution Foundation. UK household income, which used to be ahead of competitors such as France and Germany, now lags behind.

...

suggests British companies are long on confidence but short on commitment when it comes to action and investment in becoming more productive.

...

"Confidence can be a good thing - self-belief is powerful," says the report. "However, an alternative way of putting it is that we [the UK] are good at complacency." [Moi ici: Bom ponto!]

...

Another potential drag on improving output per worker is a relative lack of business investment. "If UK business investment had matched the average of France, Germany and the US since 2008. ... our GDP would be nearly 4 per cent higher today, enough to raise average wages by around £1,250 a year," the Resolution Foundation said in its recent report "Beyond Boosterism", part of its Economy 2030 research on the UK's economic prospects.

...

The proportion of UK businesses that have taken steps to improve or try regularly to measure and improve productivity is slightly down or unchanged since 2020. Some 37 per cent of businesses have discussed or planned improvements - up 8 percentage points between 2020 and 2022 - but not yet taken action.

...

That in turn feeds into concerns about the wider calibre of British managers, memorably voiced in 2017 by Andy Haldane, then Bank of England chief economist, who suggested "a (lack of management quality" was one reason for the UK's long tail of lagging businesses.

In fact, "our long tail doesn't seem to be much worse than others" , says Greg Thwaites, research director at the Resolution Foundation, and most businesses in the long tail are either too small or simply too unproductive for remedial measures to have a big macroeconomic impact. 

Be the Business chief executive Anthony Impey, who has first hand experience of starting and running technology businesses, also defends British managers. Although he acknowledges the cliche that too many small company leaders work "in" their businesses, rather than "on" their business, he points out that the obsession with day to day operations often reflects the ownership structures of such firms.

Many founders mortgaged their homes to launch or sustain their businesses and for those owners "there's a scale of jeopardy which is very often overlooked, because economists and those in big businesses don't have these sorts of stakes in their jobs", he says.

"If you have that kind of pressure, you're going to work in your business 12 hours a day", leaving little time or energy to plan investment or pause operations to implement improvements.

...

Nor do UK managers, accidental or otherwise, seem especially keen on asking for outside advice. The government's long-running survey of small businesses tracks how many leaders have sought "external advice or information" on their business (excluding "casual conversation"). That proportion dropped from almost a third to less than a quarter between 2018 and 2020 and was almost unchanged in 2021, according to the latest report available.

That is worrying because managers who do not take advice tend towards overconfidence, according to the Productive Business Index, which Be the Business has been compiling since 2021. Its latest edition found that business leaders who took no external advice were actually more confident about their leadership and management skills than those that did seek outside support. But managers without external advisers or non-executive directors were less likely to have a two- to five-year strategic plan or to feel they were prepared for unforeseen events.

...

If there were a single catch-all prescription for self-improvement, businesses would probably have applied it by now. Instead, recent analysis suggests companies need to apply a range of measures.

One would be developing and improving management skills and practices. US smaller companies top the ranking of G7 countries on management and leadership and operating efficiency, and are consistently higher than their UK equivalents in their plans to improve capabilities over the next 12 months."

Para reflexão ...

 Risco ou oportunidade não são atribuições intrínsecas... dependem da estratégia, do contexto e do apetite de risco 

quarta-feira, julho 26, 2023

Luxo, ambiente, massas, caça, salários e calçado

(X) Por que é que os portugueses, genericamente falando, não compram sapatos Made in Portugal?

(Je) - Por que são demasiado caros para a bolsa-tipo portuguesa.

(X) Por que é que as fábricas portuguesas não produzem calçado mais barato que possa ser comprado por portugueses?

(Je) - E depois, como se pagavam os salários e as matérias-primas?

Para que os salários possam subir há que aumentar o valor acrescentado. Para aumentar o valor acrescentado  há que aumentar o preço médio de cada par de sapatos. Para aumentar o preço médio de cada par de sapatos há que procurar clientes que os possam pagar.

Claro que há outra forma de aumentar o valor acrescentado: reduzir o custo unitário, praticar preços mais baixos e aumentar a quantidade produzida e vendida. Só que isso implica ter vantagem competitiva no custo e isso é incompatível num produto com muita mão de obra incorporada e situado na Europa Ocidental.

Escrevo isto a propósito de um texto publicado no semanário Expresso no Sábado passado: "Especulação Já não há hotéis na terra da fraternidade e uma noite num dos empreendimentos de luxo pode chegar a €1650 - Zeca Afonso teria de "montar uma tenda para dormir" " em Grândola""

Estou a lembrar-me dos anos a seguir à revolução de 74 e dos milhares de caçadores anónimos que íam caçar para o Alentejo em regime de caça livre (não havia outro e era um direito de Abril).

Eu nunca ocuparei esses empreendimentos turísticos em Grândola, porque não tenho dinheiro para isso e porque não fui educado nesse estilo de gasto e de vida, mas não consigo deixar de pensar que talvez esse nível de preços proteja a região do turismo de massas e permita pagar melhores salários.

terça-feira, julho 25, 2023

"That's the part I have to start lying about."

"I would like, in this book, to show that the crisis of the world around us, and also the "crises of religion" ... are enormous windows of opportunity opened to us by God.
...
I regard the awakening of just such an attitude to life - not avoiding crises but taking up one's cross - to be one of Christianity's most valuable contributions. Christianity is not primarily "a system of dogmatic texts," but instead a method, a way, a route." (1)

Precisamente a opção contrária ao modelo português-tipo. No entanto, cada vez mais não estamos sozinhos.

"If I'm doing something that's growth-based and if I suffused all of these institutions with certain growth obligations The portion of that institution like its pension fund that had to grow at a level that it cannot grow at becomes psychopathic. Right?

...

So we started to get into a place where we couldn't sustain the science, the science couldn't sustain the technology, the technology couldn't sustain the markets, and everything had been built with an obligation. So the whole point of this theory of egos or embedded growth obligations is how do we have a theory why all? Institutions would sort of get into trouble at once and it's the common thing is a growth that can't be met.

Right, so that's that's why everything went funny, now.

That's not to say that we're not analytic. If we didn't want to lie to keep this game going. We could fix a lot of things. So things that do get fixed are things like airplane checklists to make sure that we don't take off with something broken. The checklist is also operative in a hospital, so you don't amputate the wrong leg. So the explosion in iatrogenics, which is the harm done by physicians to their own patients, and the epidemic of crashes, that ended, both in part result from a common understanding and management that a checklist is a life-saving thing.

We could do that with integrity to the growth based parts the pension I could say to you actually, you know these commitments we made to get to your pension can't be met. Here's what's realistic and here's what's safe. What do you guys how do you guys feel about 2% or you know, or 1.5% growth? 

You say well, can I retire? Not really very well? You might paid my whole life into helping other people. Yeah, you're the loser in a pyramid scheme.

How do you feel? Well, you don't feel good. That's the part I have to start lying about."(2)

De ontem:

"Future generations of retirees will be impoverished, as will the country as a whole."(3) 

Conseguem ouvir o governo de turno dizer com uma lata só semelhante à cobardia dos media que a ouvem:

- A Segurança Social foi salva! 

1 - Trechos retirados de "Night of the Confessor: Christian Faith in an Age of Uncertainty" de Tomas Halík.

2 - Trechos retirados de "Eric Weinstein - All Hell Is About to Break Loose"

3 - Trecho retirado de "The government needs to be far bolder on pension reform"

segunda-feira, julho 24, 2023

Diferenciação para fugir à comoditização

"The Swiss are proud of their cheese, and most of the cheese they eat are local varieties like Gruyère, Emmental and other hard cheeses from milk from happy cows that are famous all over the world.
...
In fact, the Swiss cheese trade balance has been shrinking for decades, and especially since the market was liberalized in 2007, which allowed the country to trade with the European Union without tariffs or quotas in either direction. Switzerland now exports about 40 percent of the cheese it produces, per industry estimates.
But in each of the first five months of this year, Switzerland imported more cheese by weight than it sold abroad, according to customs data
...
[Moi ici: Os números que se seguem são muito interessantes, ilustram como as marcas, como a diferenciação, permite fugir da guerra do preço. Em Maio passado estive em várias cidades suíças e é impressionante encontrar no dia-a-dia o festival de marcas suíças que trazem um valor acrescentado tremendo à simples soma dos custos] The number of dairy farmers in Switzerland has fallen in recent decades, with a drop of more than half over the past 25 years, Mr. Koller said. On top of that, farming operations in Switzerland are small: The average size of a herd is about 27 cows, Mr. Koller said, and dairy farms with more than 100 cows are rare. [Moi ici: Isto quer dizer que se o negócio fosse preço puro e duro os suíços não tinham hipótese. Até as explorações portuguesas já devem ser maiores. Recordo que sem marca, "Milk is the ultimate low-involvement category"]
...
[Moi ici: Segue-se agora um trecho difícil de encontrar em Portugal, basta recordar a malta das conservas ou do leite, "economists say there is no need to panic"] Although an influx of foreign cheese may challenge notions of Swiss national identity, economists say there is no need to panic. Swiss producers have become more specialized in recent years, and the cheeses they export tend to be the higher-value varieties, like Gruyère. Imports are cheaper and softer and largely come from France. (What's called "Swiss cheese" in the United States is an American reproduction of Swiss hard cheeses, known of course for its signature holes.)
Not all the cheese that is imported into Switzerland is consumed there, either. A large chunk of the cheese and curd brought into the country gets refined in Switzerland and then exported.
"The trade diference in cheese itself is not a major thing to worry about," said Martin Mosler, an economist at IWP, an economic policy institute at the University of Lucerne. "We are better than most of the world at the high quality stuff," he said. Switzerland continues to run a healthy trade surplus in cheese by financial value: On average, Swiss cheese exports fetch roughly 10 Swiss Francs per kilo (about $11.60), compared with about six Swiss Francs per kilo paid for imports."

domingo, julho 23, 2023

Tic-Tac-Tic-Tac

Recentemente ouvi este podcast, "The Depopulation Bomb: Stephen J. Shaw". Um dos indicadores interessante que o autor refere passa por comparar o número de pessoas na "gaveta" dos 50-54 anos com o número de pessoas na "gaveta" dos 0-4 anos. 

Olhando para a pirâmide demográfica de Portugal em 2023 as contas levam a concluir que daqui a 50 anos existirão menos 45% de pessoas na "gaveta" dos 50-54. Qual o impacte da redução em 45% da quantidade  de gente em idade produtiva? 

Quais as consequências desta evolução:
  • a nível dos impostos?
  • a nível do ensino?
  • a nível da saúde?
  • a nível do trabalho?
  • a nível das dinâmicas sociais?
  • a nível de segurança social?
Depois, encontrei este tweet e os comentários que se seguiram:

E lembrei-me de ter lido algo na semana passada sobre:

Como diz o autor no podcast e eu traduzi na minha mente de ex-modelador de reactores químicos, a população é como um químico num reactor pistão, num dado momento parece que a quantidade total está a aumentar, e está, mas a não entrada de mais químico vai ditar que no futuro ela vai cair inexoravelmente. Cidades vazias, velhos sozinhos, impostos altíssimos (ainda ontem o embaixador do betão regozijava-se com a redução da dívida em % do PIB, mas a dívida bruta continua a crescer e vai ter de ser paga pelos 8,7 milhões em 2060, mas a maioria serão reformados). Ver abaixo ("By 2050, people age 65 and older will make up nearly 40 percent of the population in some parts of East Asia and Europe")

O que me aborrece é que ninguém no poder quer enfrentar de frente o futuro. Não faz sentido estarmos a caminho de 6,8 milhões de habitantes lá para 2100 e continuar a achar que nada precisa de mudar. 

Não é o que nos acontece que interessa, mas o que fazemos com o que nos acontece.

Já depois de escrever o texto até aqui li o NYT de ontem e encontrei o artigo, "Vast Demographic Shifts Are Reshaping the Globe":
"Japan had the first major shift: By 2013, a quarter of the population was 65 and older, making Japan the oldest large country ever. Much of Western Europe will follow, with record old-age populations, and South Korea, Britain and Eastern Europe will be next, along with China.
At the same time, many low-income countries today will have huge prime-age labor forces for the first time. Can they take advantage of the opportunity?
...
The projections are reliable and stark: By 2050, people age 65 and older will make up nearly 40 percent of the population in some parts of East Asia and Europe. That's almost twice the share of older adults in Florida, America's retirement capital. Extraordinary numbers of retirees will be dependent on a shrinking number of working-age people to support them.
As a result, experts predict, things many wealthier countries take for granted - like pensions, retirement ages and strict immigration policies - will need overhauls to be sustainable. And today's wealthier countries will almost inevitably make up a smaller share of global G.D.P., economists say."

sábado, julho 22, 2023

Uma pena ...

O FT de ontem trazia uma pequena peça, "BASF China boss leads race for top job after rival quits"com algo lateral que me deixou a pensar:

"Markus Kamieth, the board member overseeing BASF's operations in China, is backed by Brudermüller, who is to step down in May to join Mercedes-Benz, two people familiar with the matter said. He is the clear favourite after Saori Dubourg, who headed BASF's European business, suddenly left the company in February. Dubourg had advocated a more cautious approach to China, the people said."

Pesquisei e encontrei, "BASF CEO named to become head of Mercedes-Benz supervisory board, carmaker says".

Há muito que cito aqui uma frase atribuída a Napoleão:

Pergunta sincera:

O que quer dizer, acerca do futuro da Mercedes-Benz, que o próximo CEO seja alguém educado no mundo das commodities químicas?

Esse alguém aprendeu uma série de truques, de mnemónicas, de respostas instintivas numa indústria de bolas azuis.


Quer dizer que o futuro estratégico da Mercedes-Benz passa por um mundo de bolas azuis?
Quer dizer que o board da Mercedes-Benz acredita que a empresa tem de operar num mundo de bolas azuis?

Uma pena...

BTW, no meu primeiro emprego, trabalhava no apoio ao desenvolvimento de couro artificial (napa) para a indústria automóvel (painéis de porta e bancos). Na minha memória ficaram dois clientes: o mais inteligente, a VW; e o mais burro, com especificações absurdas, a Mercedes-Benz.






sexta-feira, julho 21, 2023

Há que fuçar e reinventar-se ponto

Lê-se o FT e percebe-se a decadência do Reino Unido pós-Brexit.

Lê-se "Rust belt on the Rhine - the deindustrialization of Germany" e percebe-se o momento crucial por que passa a economia alemã. E fico a pensar no potencial de repercussão em toda a UE que depende da "caridade" alemã.

E recordo um vídeo recente de Peter Zeihan sobre a Califórnia onde ele refere:

"But now, all of the factors that have propped up California are flipping. Immigration is stalling. The capital situation is upside down. The cost of living is through the roof, so the labor force is moving to places like Texas. Rising tensions with Asia are causing reshoring and nearshoring. The only thing California can do now is reinvent itself."

Gosto do locus de controlo no interior. O mundo muda... não adianta chorar pelo queijo desaparecido, há que fuçar e reinventar-se ponto. 

Esta postura implica enfrentar o mundo de frente e ir ao fundo das questões, não passa por tapar o sol com uma peneira. Nunca mais vou esquecer a cena do regicídio.

BTW, o que passou com o Expresso e a médica Diana Pereira no Algarve é outra ilustração da cultura que leva ao evitar ir ao fundo das questões.

quinta-feira, julho 20, 2023

"Como aumentamos os salários?"

O jornal Público de ontem trazia um interessante artigo com o título "A pergunta é: como aumentamos os salários?"".

Claro que uma tentativa de resposta há anos que é esboçada neste blogue. Mergulhemos primeiro no artigo:

"A região norte é a mais exportadora do país. Mas medir o pulso ao estado da nação a partir desse retrato é esquecer que o Norte também é a região mais pobre do pais. O que está a falhar? [Moi ici: Já abordei o tema em Por que é então uma das [regiões] mais pobres de toda a UE?]

Paula, 47 anos, gaspeadeira, Santa Maria da Feira. Trabalha há 32 anos na indústria do calçado, mas há um mês ficou no desemprego, "A meu ver, o que falha é que as empresas tiram o lucro todo para elas. Estávamos a fazer sapatos que chegam a ser vendidos por 800 euros. Isso é o que cada um de nós ganhava de salário num mês." [Moi ici: Recordo as contas deste postal Quantas empresas? (parte III) ]

O preço do sapato na loja não reflecte necessariamente a receita da empresa que o produz, contrapomos. "Mas a empresa ganha mais do que aquilo que nos paga", responde Paula, certa de que a riqueza gerada pelos trabalhadores "é mal distribuída". [Moi ici: A distribuição é a possível, o problema é o que o valor criado é muito limitado. A situação só melhorará quando as empresas existentes forem substituídas por empresas com outros modelos de negócio] Paula ganhava 914 euros iliquidos. Feitos os descontos, levava para casa "800 e pouco". 

...

O que dirão os empresários perante a mesma questão. Por que razão a região mais exportadora e industrializada é também a mais pobre, senhor Albano Miguel Fernandes, da AMF Shoes, em

Guimarães?

"Está a faltar valor acrescentado às exportações. A maioria das empresas de calcado) trabalha em regime de private label, 'vendendo' minutos do seu tempo ou das suas máquinas", responde. [Moi ici: O que o engº Albano está a falar é ... do modelo de negócio. Só que no mesmo sector de actividade, nem todas as empresas conseguem dar esse salto, nem existe mercado para todas elas se derem esse salto]

...

"Vender minutos também é o modelo de muitas empresas noutras indústrias, como no téxtil. "A competição é feroz e por isso dá origem a uma baixa remuneração para as empresas, o que tem por consequência um poder muito limitado para remunerar os seus colaboradores. Estamos também dependentes de grandes multinacionais, que direccionam os seus centro de custos [para] países com sistemas mais competitivos do que o português", [Moi ici: Aqui há que ter cuidado com o uso da palavra competitividade, recordar o Uganda e os quadrantes do primeiro artigo citado lá em cima


...

"A pergunta é: como aumentamos os salários dos portugueses?" José Teixeira, presidente do grupo DST, de Braga, está a falar há cerca três minutos. Até chegar à questão que elegeu como crucial, o gestor invocou "o novo iluminismo de que a Europa precisa" e que "tem de ser agarrado", porque pressupõe "outro modo industrial, social, de relações dos trabalhadores com os accionistas, de usar recursos".[Moi ici: O que ele não diz é que são precisas outras empresas... percebem a enormidade disto? As empresas podem ser mais eficientes, podem ser melhor comercialmente e extrair mais valor, mas originar mais valor... isso só a produzir outras coisas com outro modelo de negócio. Volto a Larreché e aos Flying Geese e o exemplo do calçado em St. Louis, tão rico que pagou uns Jogos Olímpicos de Verão em ... 1904]

...

A empresa [Moi ici: Riopele] continua relevante, apesar de mais pequena. Exporta directamente 98% da sua produção, emprega 1102 pessoas e em 2022 fixou o salário de entrada em 780 euros, 20 euros acima do salário mínimo que, entrou em vigor no inicio de 2023. As despesas de inovação e desenvolvimento equivalem a 20% da receita anual, afiança. Quem conheça a indústria sabe que é uma percentagem que mete respeito. [Moi ici; Eu se dirigisse a empresa até teria vergonha de divulgar estes números. Torrar 20% da receita anual e não conseguir gerar valor acrescentado é um sinal claro de falhanço. O que interessa são os resultados, não o que se gasta. Fizeram-me lembrar a Raporal] Se tivesse voz no debate do estado da nação, a sua mensagem seria: aliviem o IRS dos trabalhadores, isentando os salários até 1200/1300 euros."

Agora voltando atrás no artigo sublinho:

"Quando me chamarem, vão-me propor o salário mínimo. Para quem ganhava 914 euros, não é nada motivador. Vão querer pagar-me o que se paga a um aprendiz. Não é este o futuro que eu desejo para as minhas filhas."

Recordo que em Maio passado escrevi aqui:

"No ECO o meu lado cínico foi despertado em "Calçado entra em 86 escolas para atrair jovens para as fábricas". Como é que o marketing abalroará a experiência que os jovens têm com os familiares que trabalham ou trabalharam no sector do calçado?" 

Sublinho: Como é que o marketing abalroará a experiência que os jovens têm com os familiares que trabalham ou trabalharam no sector do calçado? 

Como se aumentam os salários? A minha resposta amedronta os incumbentes, sobretudo as associações patronais:


Eu sei que as pessoas têm compromissos, têm amigos, têm custos afundados…
Eu sei que promover a mudança a sério tem um custo social no curto prazo que os políticos não estão dispostos a assumir.

Por isso, não vão encontrar respostas mais directas noutro lugar. Por isso, vão encontrar muita conversa da treta.

quarta-feira, julho 19, 2023

Volume is Vanity Profit is Sanity

""Why is a strong brand important?" one might say that it creates customer preference, lifts sales, or even makes the sales force's job easier. But the most important answer to this question is that a brand commands a higher price. And the stronger the brand, the higher the price.
...
Now consider the seemingly naive question, "What's the value of a higher price?" The answer is higher profits for the company that markets the brand.
Profit is the reason companies are in business - not sales, not revenues, not growth, but profit. And one thing trumps all others in the business mix when it comes to profitability: the pricing integrity of the brand.
...
Nothing can improve a company's bottom line better than protecting and enhancing its ability to command a higher price. This means that revenues are not the key metric of your firm's success; profits are. Profit is driven mostly by price. Price is driven mostly by brand perception. This makes brand building an activity central to the success of every professional firm.
...
Sadly, growth for the sake of growth has become enshrined as the goal of business. Wall Street wants its growth projections, and any company that is not consistently increasing market share is seen as an investment risk."

Isto não é unânime, alguns empresários torcem o nariz a esta argumentação. 

Trechos retirados de "Positioning for Professionals - How Professional Knowledge Firms Can Differentiate Their Way to Success" de Tim Williams.


terça-feira, julho 18, 2023

Investir para entrar na mente dos clientes-alvo

"Each area within the circles is strategically important, but A, B, and C are critical to building competitive advantage. The team should ask questions about each. For A: How big and sustainable are our advantages? Are they based on distinctive capabilities? For B: Are we delivering effectively in the area of parity? For C: How can we counter our competitors’ advantages?

The team should form hypotheses about the company’s competitive advantages and test them by asking customers. The process can yield surprising insights, such as how much opportunity for growth exists in the white space (E). Another insight might be what value the company or its competitors create that customers don’t need (D, F, or G).
...
But the biggest surprise is often that area A, envisioned as huge by the company, turns out to be minuscule in the eyes of the customer."

Acredito que muitas empresas apostam em propostas de valor que caem sobretudo na área B porque se focam nos outputs e não nos inputs. Assim, não investem tempo para entrar na mente dos clientes-alvo e perceber como é que o output é usado como input no processo de criação de valor do cliente.

Trechos retirados de "Strategic Insight in Three Circles".  

segunda-feira, julho 17, 2023

Desmascarar clichés

Há dias, no FT apanhei este artigo, "Scaling up or selling out: a German take on a corporate dilemma" sobre duas empresas alemãs a Bayer e a Viessmann. A Bayer e a decisão de comprar a Monsanto, e a Viessman e a decisão de vender parte do negócio à Carrier.

Este anónimo engenheiro da província pronunciou-se sobre o negócio na altura:
 

No artigo lê-se:
"Shareholders were unimpressed by the high price as well as debt burden taken on. Moreover, the transaction exposed Bayer to Monsanto’s litigation risk. Bayer was forced to pay $10bn in settlements over Monsanto’s weedkiller glyphosate allegedly causing cancer. Disgruntled investors earlier this year pushed out chief executive Werner Baumann, one of the deal’s masterminds."
Mas o mais importante do artigo para mim é:
"What seems particularly remarkable about the Bayer and Viessmann cases is that they appear to turn clichés about corporate decision-making upside down. Normally, listed groups that are accountable to cold-blooded shareholders are expected to take sober, hardnosed decisions which, if necessary, ditch decades of corporate legacy in a blink. By contrast, tradition-rich family outfits are thought to dither when it becomes necessary to prune a company.
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But regardless of the ultimate outcome, the political opprobrium and Max Viessmann's tears already show that dismantling a successful company is a difficult decision. That does not mean, however, that it should be dodged."

domingo, julho 16, 2023

Inversão de ciclo


No final de Fevereiro o calçado estava a crescer 9% nas exportações homólogas, no final de Maio esse valor já estava em terreno negativo.

As exportações de têxteis e vestuário há 8 meses que apresentam variações homólogas negativas em quantidade.

O número de insolvências registou um crescimento homólogo de 28%, em junho, com 384 empresas insolventes. No entanto, no acumulado do ano ainda se mantém baixo dos valores do ano passado (-2,7%), com um total de 2055 insolvências, de acordo com a Crédito y Caución. Já as constituições de empresas caíram 13%, mas manteve-se um acumulado positivo.

Estamos perante uma inversão. Algo de muito interessante é a heterogeneidade intersectorial. No mesmo sector empresas cheias de trabalho coexistem com empresas sem encomendas.

No final do ano passado reflectia sobre: "Tudo vai depender do tal jogo de forças", qual a resultante das forças da recessão, da quebra do consumo versus o aumento da procura com o fim da globalização. A tendência parece evoluir no agregado para o lado da diminuição.

\Outro tema que me tem acompanhado no último mês é o da evolução da metalomecânica. Será que a metalomecânica é o novo têxtil dos anos 70? 

sábado, julho 15, 2023

... devia haver proactividade

Jorge Marrão no Think Tank desta semana recordava que quando mataram o rei D. Carlos, o rei Eduardo VII mandou chamar o embaixador português em Londres e perguntou: mas que raio de país é este em que matam o rei e a primeira decisão é demitir um ministério. Jorge Marrão remata usando este episódio como um exemplo da actuação prtuguesa tipo: evitar ir ao fundo da questão.

Lembrei-me disto ontem durante a caminhada matinal ao ler uma série de artigos sobre a evolução do contexto: Estados Unidos e China/Alemanha.

O FT de quinta e sexta trazia uma página inteira dedicada ao que está a acontecer nos Estados Unidos na sequência da I.R.S..

O FT de ontem trazia na capa e em mais duas páginas o grito de alerta do governo alemão acerca da necessidade da economia fazer o de-risking da China. Mesmo tema no NYT.

O mundo a mudar, o contexto a mudar e ... por cá, comportamos-nos como um protectorado, como dependentes a viver na casa de adultos. Os adultos lidam com o mundo, os dependentes lidam com a sua vida sob os ditames ditados por outros.

Com estas mudanças profundas em curso devia haver foco nas oportunidades e ameaças, devia haver proactividade. 


sexta-feira, julho 14, 2023

Trabalhar a relação

Um artigo com ideias interessantes e que ajuda a trabalhar o tema do desenvolvimento da relação com os clientes. 

"Many companies have embraced the importance of creating closer, more valuable relationships with customers.

But most do little to actively manage their portfolios of weaker and stronger relationships, other than keeping them diversified. They're missing significant opportunities.

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  • How central is developing customer relationship strength to our strategy and competitive advantage? More specifically, when and how much should we invest in converting weaker relationships to stronger relationships?
  • How do we leverage these investments once relationships are created?
  • How do we protect the relationships we have created to minimize customer churn?
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we have identified three explicit goals for an effective CPM [customer portfolio management] growth strategy: relationship conversion, relationship leverage, and relationship defense.

Relationship Conversion 
Customer relationship conversion is the process of turning strangers into acquaintances, acquaintances into friends, and friends into partners. It accomplishes two important goals. First, customer loyalty and profit per customer improve, thanks to an increase in strong relationships. And second, the addition of weaker relationships to a portfolio provides both a source of future loyal customers and economies of scale."
Trechos retirados de "Manage Your Customer Portfolio for Maximum Lifetime Value"

quinta-feira, julho 13, 2023

Não há risco?

O JdN do passado dia 5 de Julho traz uma entrevista de várias páginas ao presidente da AEP, fiz alguns sublinhados:

"Entre o balanço do primeiro semestre e a perspetiva para o segundo "há questões constantes, nomeadamente a dificuldade de contratação de mão de obra a inflação e as taxas de juro, agora agravadas com a redução da procura interna cexterna que já se começa a fazer sentir", diz Luis Miguel Ribeiro, presidente da AEP ao Negócios.

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O aumento dos custos de financiamento terá um efeito "significativo" ou "muito significativo" em dois terços das empresas, mais gravoso do que os 60% que garantem ter sofrido consequências da subida das taxas de juro.

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Aevolução da procura interna um dos fatores com mais crescimento nas preocupações para a evolução da atividade, com 58% dos gestores a atribuirem-lhe um peso "significativo" ou "muito significativo"

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Os inquiridos enunciam também o peso dos impostos como um dos fatores que vai ter impacto negativo na atividade até ao final do ano."

Até aqui o discurso do costume, o foco nas dificuldades, o foco nos problemas. Depois, apanho esta pérola:

"Que o Banco de Fomento permita, de uma vez por todas, que as empresas acedam a financiamento em melhores condições, à semelhança de muitos países da Europa com os quais competimos."

Como conciliar o comboio de queixas e dificuldades da primeira parte com o desejo de facilidades na sugunda parte? À luz da primeira parte não há risco acrescido em emprestar dinheiro às empresas?