sexta-feira, junho 27, 2025

Recomeços e sucesso, ou não


"She learned that rather than perceiving time as a continuum, we tend to think about our lives in “episodes,” creating story arcs from the notable incidents, or chapters, in our lives.

...

This research helped us develop the idea that the start of a new life chapter, no matter how small, might be able to give people the impression of a clean slate. These new chapters are moments when the labels we use to describe ourselves, who we are, and what we're living through shift, compelling us to shift with them."

...

These statistics suggest that when we’re seeking to change, the disruptions to our lives triggered by physical transitions can be just as powerful as the fresh starts spurred by new beginnings on our calendars.

...

Instead of getting a performance boost from a trade as struggling players had, top performers suffered from resets, which made their recent successes feel farther in the rearview mirror and forced them to rebuild their record from scratch.

...

Not everyone benefits from a fresh start. When you’re on a roll, any disruption can be a setback. We see this at home and at work, and though the disruption itself might seem like no big deal, even trivial, the consequences can weigh you down

...

that while fresh starts are helpful for kick-starting change, they can also be unwelcome disruptors of well-functioning routines. Anyone seeking to maintain good habits should beware."

Interessante... talvez explique porque poucos jogadores mantém o alto nível após uma transferência.

Trechos retirados de "The Science of Getting from Where You Are to Where You Want to Be" de Katy Milkman.

quinta-feira, junho 26, 2025

Curiosidade do dia

Há cerca de mês e meio escrevi aqui "Não espere por uma crise para acelerar" sobre o arquétipo da "escalada" entre os drones ucranianos e russos.

Hoje no FT notícias de mais um avanço, agora russo, em "Russia's unjammable drones pose novel threat".

A Rússia está a utilizar drones de ataque controlados por fibra óptica, que não podem ser neutralizados por interferência electrónica (jamming), para apoiar os seus avanços na Ucrânia. Estes têm sido particularmente eficazes na frente de batalha em Donetsk, permitindo ataques mais precisos e dificultando a defesa ucraniana.



Foco disciplinado, o mais difícil


O capítulo 17, "Being Bad in the Service of Good", do livro "Better, simpler strategy: a value-based guide to exceptional performance" de Felix Oberholzer-Gee, é muito bom!

Traz alguma coisa de novo para mim? Não, mas reforça a mensagem deste blogue acerca da importância dos clientes-alvo.

"Why would a company that genuinely cares about customer WTP adopt a shortcut? Why not do it properly? Why not do it all? The notion that a focus on WTP (or WTS) implies doing it all, getting better by every conceivable measure, is perhaps the single biggest risk of adopting a strategy that is centered entirely on value creation. Invariably, companies that attempt to do it all fail to create significant value, because every value proposition reflects a set of trade-offs, a mixture of dos and don'ts, a blend of promises and letdowns.

...

my colleague Professor Youngme Moon, [Moi ici: Recordo, por exemplo "There’s nine times more to gain by elevating positive customers than by eliminating negative ones"] in her elegant book on differentiation, calls a reverse-positioned brand. These brands choose to be bare-bones in many respects, only to surprise us With extravagance in others.

...

Resource constraints are the main reason firms assume reverse positions."

Este capítulo defende uma ideia simples, mas poderosa: uma empresa não consegue ser excelente em tudo. Os recursos são escassos - tempo, dinheiro, atenção, energia. Por isso, quem tenta agradar a todos, acaba por não se distinguir de ninguém porque tem de distribuí-los por n "features".

Em vez disso, as empresas mais bem-sucedidas fazem escolhas difíceis. Escolhem um tipo de cliente, percebem profundamente o que esses clientes valorizam mais — e concentram os seus esforços nisso. Para isso, às vezes têm de ignorar regras tradicionais de gestão ou dizer "não" a expectativas do mercado. A isso, o autor chama "being bad in the service of good".

O capítulo sublinha que não se trata de ser rebelde por vaidade, mas de ter coragem para ignorar o que não interessa aos clientes-alvo e investir apenas no que realmente é percepcionado como tendo valor.

Ser "estrategicamente mau" significa fazer escolhas claras: não tentar agradar a todos, mas sim aos clientes certos. Isto implica ignorar pedidos que não interessam aos clientes-alvo — mesmo que o mercado os veja como "obrigatórios". Muitas vezes, os gestores têm medo de fazer menos — mas é justamente isso que permite o foco e a diferenciação. As empresas bem sucedidas não tentam ser tudo para todos. Assumem uma missão, escolhem o seu público e ignoram os manuais tradicionais de gestão.

O verdadeiro acto de liderança está em dizer “não” — não ao ruído, às modas e às exigências genéricas. Só assim é possível usar os recursos escassos para se construir uma proposta de valor distinta e coerente.

A diferenciação não vem de tentar acompanhar tudo o que os concorrentes fazem, mas de foco disciplinado nos factores que realmente interessam ao público-alvo.

quarta-feira, junho 25, 2025

Curiosidade do dia

Já no ano passado Stephen Bush tinha aflorado o tema do fim da TV e das suas consequências sociais em "This will be the UK's first post-TV election" que comentei nesta Curiosidade do dia de 28 de Junho de 2024. Agora, no passado dia 17 ele volta ao tema com "Without TV in common, can we still live together?":

"If television producers travelled from the UK in 1977 to 2025, looking at the chart positions of the two programmes, they would conclude that Coronation Street and Doctor Who were as strong as ever. But there are now many more programmes, much more choice and very few of us are held to the schedulers' whims. We watch what we want, when we want to: and as a result even a chart-topper rarely gets above 10mn viewers.

What we are seeing is fragmentation - of where we get both our entertainment and our news. This is a trend that our time-travelling producers would begin to understand as they looked at the viewing figures for ...

...

More importantly, it is bad news for modern states, which are held together to some extent by the sense that we are all part of a collective endeavour. Those of us who are prime working age, who receive and need vanishingly little in the way of state largesse, cross-subsidise the expensive things we will (hopefully) do at the start and end of our lives: get educated, get sick, grow old, and die.

...

When we no longer have a shared reality, this sense of a collective endeavour is harder to cultivate. It is then that our societies no longer have the required level of shared sympathy to make the young willing to subsidise the old, adults happy to pay for other people's children and an agreed upon framework of facts - not least 'was this election fair?' - which representative democracies require to function."

Stephen Bush reflecte a ideia de que a televisão partilhada criava uma base emocional e cultural para a solidariedade intergeracional (pagar impostos para serviços de outros) e isso terminou. Relaciona o declínio da audiência partilhada com a dificuldade crescente de aceitar verdades comuns (“was this election fair?”), o autor sugere que a televisão teve um papel estruturante na manutenção da confiança mútua e no funcionamento das democracias representativas. A ausência de experiências mediáticas comuns pode corroer o apoio ao estado social.

Reduzir a organização ao que é mensurável é perigoso

"AI doesn't need a sci-fi upgrade to upend the economy - current models, and the cheaper, more capable versions already in the pipeline, are set to disrupt nearly every corner of the labor market.

...

To navigate this new landscape, leaders need to understand - and plan for - how automation will affect their businesses. 

...

Environments that are extensively measured or codified— whether through laws, tax codes, compliance protocols, or streams of sensor data - face the greatest near-term risk of being handed over to machines.

...

Tasks that demand human judgment today - choosing a medical treatment, reviewing a legal contract, scripting a film that nails the zeitgeist - could soon pass to AI as models tap richer data and greater compute. [Moi ici: Isto coloca um desafio estratégico urgente para as PME: compreender que não é apenas o trabalho manual ou repetitivo que está em risco, mas também tarefas criativas, analíticas e administrativas que, por serem passíveis de codificação em dados, podem ser rapidamente assumidas por modelos de IA]

...

If you can shoehorn a phenomenon into numbers, AI will learn it and reproduce it back at scale - and the tech keeps slashing the cost of that conversion, so measurement gets cheaper, faster, and quietly woven into everything we touch. More things become countable, the circle resets, and the model comes back for seconds. That means that any job that can be measured can, in theory, be automated. [Moi ici: As PME que se limitarem a medir e optimizar aquilo que já é quantificável correm o risco de serem ultrapassadas por concorrentes que apostem em áreas onde a AI ainda não chega: o julgamento humano em contextos de incerteza, a visão estratégica em territórios desconhecidos, a criação de experiências diferenciadoras e o cultivo de relações de confiança.]

...

Humans are evolutionary generalists, selected to navigate half-drawn maps. We don't merely survive unknown unknowns —we thrive on them, and that resilience is our defining edge.

...

But the cornerstone of our advantage is our highly plastic, densely wired prefrontal cortex. This neural command center lets us spin endless "what-ifs," rehearse counterfactual futures, and pivot strategy the instant conditions shift. Short of a true singularity, even quantum machines will struggle to match our talent for open-ended, cross-domain counterfactual planning.

...

The list is fluid-tasks drop off the moment they become measurable, and new ones surface just as quickly. Each shift forces painful economic and social adjustments, squeezing more work into a superstar economy that concentrates outsized rewards at the peaks of creativity, talent, and capital. Yet Al offers a paradoxical gift: by democratizing education and serving as everyone's personal copilot, it hands more people than ever the tools to reach those peaks. Jobs themselves will keep evolving, and any breakthrough that turns the unknown into the countable will scale and be imitated at meme speed.

...

Only leaders who pay attention to what is measurable and, more crucially, to what stubbornly isn't— will be ready when the next shift arrives."

Um tema clássico neste blogue, a gestão centrada exclusivamente no que cabe numa folha de cálculo - eficiência operacional, indicadores de desempenho, métricas de produtividade - deve dar lugar a uma liderança que valoriza também o que ainda não é mensurável: a intuição, o propósito, a adaptabilidade e a capacidade de imaginar futuros alternativos.

Automatizar o que é repetitivo é prudente. Reduzir a organização ao que é mensurável é perigoso. A vantagem competitiva residirá, cada vez mais, na capacidade de integrar inteligência artificial com inteligência humana - e saber onde termina uma e começa a outra. 


Trechos retirados de "What Gets Measured, Al Will Automate" publicado pela HBR. 


terça-feira, junho 24, 2025

Curiosidade do dia


No passado dia 16 de Junho o WSJ publicou um artigo, "Javier Milei's Gift for Pope Leo".

"On June 7, Pope Leo XIV met with Argentine President Javier Milei at the Vatican. Mr. Milei reportedly gave the new pope a historical document from 1642, a handwoven vicuña poncho, and Austrian economist Friedrich Hayek's 1988 book, "The Fatal Conceit: The Errors of Socialism." Even though the book costs only $18.83 on Amazon, it was the most valuable gift.

Hayek's fatal conceit is that "man is able to shape the world around him according to his wishes." It's a hearty defense of free markets-of classical liberalism."

Achei delicioso o facto de Milei ter oferecido o livro ao papa.

Recentemente li o primeiro volume da obra que Bento XVI escreveu sobre Jesus de Nazaré. A certa altura Bento XVI explica a sua interpretação sobre a primeira tentação que o demónio faz a Jesus. O demónio convida Jesus a usar o seu poder divino para satisfazer as necessidades físicas — transformar pedras em pão. Bento XVI explica que esta proposta não é meramente sobre a fome, mas um convite a reduzir o sentido e a missão de Jesus às necessidades imediatas e materiais, negligenciando o propósito superior do Reino de Deus.

Não posso deixar de relacionar as duas coisas, o livro de Hayek e a primeira tentação (Transforma estas pedras em pão). 

A primeira tentação é, no fundo, a tentação da solução fácil e visível, do bem material garantido por um poder superior — seja esse poder o Messias ou o Estado. Tanto Jesus como Hayek recusam essa tentação, apelando à humildade diante do mistério da liberdade humana e da ordem que emerge sem ser imposta.

Jesus confia no Pai. Hayek confia no processo. Ambos recusam substituir o que é vivo, imprevisível e livre por uma segurança ilusória.

No entanto, tantas e tantas vezes, nos últimos anos, senti na Igreja Católica uma deriva para uma postura socialista.

Porque empobrecemos

Li de Seth Godin Ecosystems come and go:

"Your project doesn't exist in a vacuum. Your company wouldn't exist if it weren't for the customers, competitors, marketplaces, systems and tech that make it all work.

...

The ecosystem for board games was large, steady and profitable. The combination of toy stores and TV ads made it sustainable. And then, for most providers, it wasn't.

The telegraph employed tens of thousands of people... and then it didn't.

...

We can lament the end of an ecosystem. After all, we worked hard to get here and we counted on it. We're comfortable with it and we understand it.

Or, we can accept that ecosystems come and go, and focus our energy on how the next ecosystem gives us a chance to do our work, new work, different work, but work that matters, for people who care."

E recordo Phil Mullan em "Em vez de abraçar a destruição criativa ...". Os governos, mesmo quando falam de crescimento, agem em função da estabilidade. Evitam qualquer política que implique disrupção — mesmo sabendo que é a única forma de restaurar o dinamismo económico. O resultado é uma economia gerida como um sistema de manutenção, não de renovação. A “Longa Depressão” que vivemos actualmente de que fala Mullan não é só económica — é intelectual. Perdeu-se a fé na capacidade humana de liderar mudanças significativas. O progresso tornou-se suspeito, e o risco passou a ser tratado como um erro, não como uma condição da inovação

E recordo Reinert em "The "flying geese" model, ou deixem as empresas morrer!!!". Reinert fornece um exemplo histórico que ilustra a tese de Godin: St. Louis, outrora rica pela produção de sapatos e cerveja, entrou em declínio quando a curva de aprendizagem da produção de calçado se esgotou. O know-how deixou de evoluir, os salários estagnaram, a produção mudou-se para zonas mais pobres. A lição? Quando já não há mais nada a aprender, a vantagem desaparece. O ecossistema morre — e se uma cidade, uma indústria ou um país não mudar a tempo, morre com ele.

Seth Godin aponta-nos o dedo quando diz que a questão é: como reagimos? Ou nos queixamos da erosão do ecossistema antigo, fazendo uma "perrice de adulto" ou reconhecemos que cada fim é também uma abertura — para criar algo novo, diferente, mas que importa.

Quando recusamos a mudança e optamos pela ilusão da estabilidade recebemos o que queremos e não o que precisamos (isto é Coldplay). O resultado é uma economia gerida como um sistema de manutenção, não de renovação. 

O que vejo nas PME: o medo de reconhecer que o mundo mudou. As empresas resistem a uma mudança imposta pelo mercado ou por um cliente — tentam adaptá-la à sua lógica interna, em vez de reconhecer que está perante um novo ecossistema.

Eu costumo perguntar-lhes: "Esta mudança é pontual ou é sinal de MUDANÇA a sério?"

Se for passageira, há que acomodá-la. Mas se for estrutural, então tem de ser integrada o quanto antes. Só assim se transforma um incómodo em vantagem competitiva. O problema, como expõe Mullan, é que as nossas sociedades perderam a coragem para dar esse salto. A cultura dominante prefere conservar o velho a criar o novo. E isso é exactamente o oposto do que o capitalismo precisa para viver: destruição criativa.

Quando vemos uma empresa a contorcer-se para adaptar uma mudança a um modelo que já não serve, estamos a ver um ecossistema em negação da sua própria morte.

Seth Godin diz que os ecossistemas vêm e vão. Reinert mostra como eles morrem. Mullan explica porque não os deixamos morrer — e o que isso nos custa: o empobrecimento.

Mas há sempre uma escolha: ou ficamos presos à estabilidade do que conhecemos, ou corremos atrás da aprendizagem que ainda não fizemos. O que morre é a curva antiga. O que vive é a vontade de saltar para a nova. 


segunda-feira, junho 23, 2025

Curiosidade do dia



Através deste podcast cheguei a este vídeo:


E a primeira coisa que me veio à cabeça foi o fenómeno de aculturação que ocorre quando imigrantes em pequeno número chegam a uma sociedade e são levados por essa sociedade a "aprender" como viver nessa sociedade. Por exemplo, respeitar o sinal vermelho ao conduzir, não insultar mulheres que andam de mini-saia, não cagar no chão à entrada dos prédios, não insultar gente que bebe cerveja calmamente na esplanada, ou assa secretos de porco numa assadeira comunitária.

Outra coisa, é quando esse número é muito elevado, e vive em guetos, sem necessidade de grande interacção com a tal sociedade. Como será a tal aculturação?

Relacionado com a propriedade da emergência, uma das propriedades dos sistemas, traduzida normalmente em: o todo é diferente da soma das partes.

Escolhas e consequências

No Sábado escrevi sobre a curiosidade de um vinho inglês vencer um concurso contra champanhes franceses. Uma pequena vitória simbólica? Talvez. Mas o verdadeiro choque veio depois, com a notícia do The Times de sexta-feira: “Champagne grape pickers treated 'worse than slaves'”.

"At least 14 champagne houses used grapes picked by illegal immigrants deprived of food, housed in filthy conditions and treated like slaves, a court heard.

One of the pickers said animals enjoyed better conditions.

...

Behind the glamorous image of champagne lies widespread exploitation and misery, unions said, as they held a protest outside the criminal court in Châlons-en-Champagne."

A ironia é dolorosa. Enquanto a marca “Champagne” brilha nos mercados internacionais, o modelo que sustenta esse prestígio parece assentar em práticas que, longe de criar valor, o sugam dos elos mais frágeis da cadeia. Aqui entra Felix Oberholzer-Gee, que em "Better, simpler strategy: a value-based guide to exceptional performance" distingue com clareza duas formas de procurar produtividade: aumentar o numerador (melhorar a experiência do cliente, a qualidade do produto, o valor percebido) ou reduzir o denominador (cortar custos, salários, condições de trabalho). 

"When companies seek to capture value without increasing it, the consequences for customers and employees are very different. Customers have an easy remedy. They simply do not purchase the product. But for employees, the situation is more challenging. Most of us need our jobs, and walking away from work is financially costly and often difficult emotionally, even if the job provides little satisfaction [Moi ici: É fácil associar o empobrecimento, consequência da aposta na competitividade em vez de na produtividade e da impostagem com que os políticos nos brindam, aos níveis de emigração que sofremos há quase duas décadas].
...
[Moi ici: O trecho que se segue é fundamental. Alinhado com Porter e a sua ideia de que é tão ou mais importante escolher o que não fazer do que o fazer. Alinhado com Terry Hill e as bolas azuis e vermelhas]  In their view, company resources and capabilities normally lend themselves to improving customer delight or supplier surplus, but not both. The mindset of organizations that discover ever new ways of pleasing their customers, the argument goes, is very different from a mindset that is ruthless at slashing cost and raising productivity. [Moi ici: "improving customer delight" corresponde a trabalhar para aumentar a produtividade à custa do aumento do numerador, "slashing costs" corresponde a trabalhar para aumentar a produtividdae à custa da redução do denominador] In the view of these executives, trying to achieve a dual advantage risks achieving none, being "stuck in the middle." As Professor Michael Porter explains, "Becoming stuck in the middle is often a manifestation of a firm's unwillingness to make choices about how to compete. It tries for competitive advantage through every means and achieves none, because achieving different types of competitive advantage usually requires inconsistent actions.""

Repito: “The mindset of organizations that discover ever new ways of pleasing their customers […] is very different from a mindset that is ruthless at slashing cost and raising productivity.” Não é só uma escolha técnica. É uma escolha moral, estratégica e identitária. O artigo do The Times mostra o que acontece quando se tenta capturar valor sem o criar: a reputação afunda-se, os trabalhadores fogem (ou revoltam-se), e o sector perde o direito de se gabar do seu glamour. Os ingleses, pelo contrário, estão a criar valor — com inovação, diferenciação e provavelmente maior respeito pelas pessoas.

Se Champagne quer competir com vinho inglês, talvez precise de mais do que terroir e tradição. Precisa de uma mudança de mindset: menos extração, mais criação. E talvez — quem sabe — menos cinismo, mais carácter.

domingo, junho 22, 2025

Curiosidade do dia

"In a society with seemingly little appetite for work, human resources managers have long struggled to motivate staff. Now the full extent of their difficulties has been revealed by a study showing widespread reluctance to assume managerial roles in French companies.

More than half (56 per cent) of human resources directors in the country said some staff had refused promotions to middle-management roles. The average elsewhere was 36 per cent. The research was published by Cegos, the professional training group, which interviewed 4,271 people in their first management jobs and 427 HR directors in France, the UK, Germany, Italy, Spain, Portugal, Brazil, Mexico, Chile and Singapore.

Laurence Ballereaud, of Cegos, said the reluctance to become a manager was a "French specificity".

... A poll commissioned by BFM, the news organisation, asked people whether they would be prepared to work harder to earn more money. Fifty-one per cent said the idea sounded good, while 49 per cent disagreed. The poll also found that most French employees thought they worked hard enough."

Trecho retirado de "French snub promotions to avoid the extra work"  publicado no FT de 19.06.2025. 

A viagem até aqui e a que continua

[Lista de nomes] este fim de semana celebram um marco muito especial: a Profissão Solene da Fé, no dia 22 de Junho de 2025, na Paróquia de Santa Maria Madalena, em Vila Nova de Gaia.

Foram três anos de caminho juntos — de perguntas e descobertas, de momentos sérios e gargalhadas, de oração e partilha. Cresceram. E foi um privilégio e um gosto caminhar convosco. Vamos ter saudades vossas.

Mas esta etapa não é uma chegada. É uma nova partida. A vossa viagem na fé continua, agora com outro formato. Lembrem-se sempre das sábias palavras de S. Paulo:

 “Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança e pensava como criança. Depois tornei-me adulto e deixei o modo de ser de criança.”
Lembrem-se da nossa lição:




Nunca é tarde para aprender, mas ás vezes é demasiado cedo. A vida vai-nos fornecendo “andaimes mentais” para olhar para a Palavra de Deus e mergulhar de forma cada vez mais profunda no seu significado. 

Deus não se afasta. O Seu amor é sempre presente, mesmo quando nós nos afastamos.

Lembrem-se sempre da Parábola do Filho Pródigo. Ela fala de um Deus que nunca fecha a porta. Que espera, acolhe e perdoa, porque o mal não é fazer uma asneira — é cortar a relação com o Bem supremo que é Deus. Mas mesmo aí, Ele corre ao nosso encontro.

E lembrem-se da Parábola dos Talentos. Jesus confia em cada um de nós e desafia-nos a não enterrar o que somos, mas a arriscar, a crescer, a fazer render o bem. A fé não é para ficar parada. Como a água, se estagna, perde a vida. Se se move, renova tudo à sua volta.

Por isso, ide e esticai bem as vossas asas.

Stobachoff e os clientes-alvo



"Recall that willingness-to-pay (WTP) and customer delight reflect opinions and impressions, not facts and figures.

...

Of course, not every customer who is not in the market represents an attractive target. Think of a continuum of individuals ranging from those who would never buy your product to the most loyal group (figure 5-3).

Near-customers are the ones whose WTP is fairly close to the level that is required to make a purchase. Understanding the determinants of this group's WTP can reveal substantial business opportunities. It is useful to ask, Why are your near-customers not in the market for your product? Do they misperceive its value? How might you tweak your offering to boost their WTP and turn them into buyers?"

Estes trechos sublinham uma verdade frequentemente ignorada: a willingness-to-pay (WTP) não é um dado objectivo, mas sim uma percepção moldada por impressões, contexto e comunicação. Por isso, é ilusório tentar agradar a todos - e perigoso do ponto de vista estratégico.

É aqui que entra a importância de seleccionar cuidadosamente os clientes-alvo. Não se pode (nem se deve) tentar servir todos os perfis do mercado. A curva de Stobachoff ilustra bem este ponto: uma pequena parte dos clientes gera a maior parte do valor, enquanto outros podem até destruir valor, absorvendo recursos sem retorno.

Focar nos "near-customers" - aqueles cuja vontade de pagar está quase no limiar de compra - pode ser uma estratégia inteligente. Mas só faz sentido se isso implicar um pequeno ajustamento da proposta de valor, e não uma diluição estratégica para tentar abarcar quem nunca fará sentido servir. O segredo está em descobrir quem são os clientes certos para o nosso negócio, não em correr atrás de todos. 

Trechos retirados de "Better, simpler strategy: a value-based guide to exceptional performance" de Felix Oberholzer-Gee.

sábado, junho 21, 2025

Curiosidade do dia


Se ontem demos um exemplo negativo alemão, hoje aqui vai um exemplo positivo ... inglês:
"A boutique producer in West Sussex who has officially joined the big beasts of fizz spills his secrets to Seren Hughes
Champagne has long been the choice to mark life's greatest moments, but connoisseurs believe English sparkling wine is in prime position to compete, and it has now beaten the French fizz to a prestigious international award.
The Trouble with Dreams 2009 by the winemaker Sugrue South Downs has become the first sparkling wine magnum to be crowned one of the top 50 wines in the world at the Decanter awards. The sparkling white from West Sussex took home a best in show medal, an award never given to a magnum of champagne (twice the size of the standard 750ml bottle). Among the other sparkling magnums in the running was a £598 champagne, Henriot's Cuve 38 Edition 6 blanc de blancs brut, which received a platinum medal. The top 50 are chosen from platinum winners.
The judges said: "Our competition has been open to champagne magnums for the last three years, while this year we opened the competition to sparkling wine magnums from all origins. And guess what. It's an English sparkling wine that's the first to find its way in magnum to our best in show selection, not a champagne.' Dermot Sugrue, who founded and runs the winery, said: "It's no longer what has become a slightly outdated narrative of England versus champagne when it comes to sparkling wine. Now it's England and champagne, because we really are on the world stage beside champagne and the other best sparkling wines in the world."
His wine is made from a blend of chardonnay, pinot noir and pinot meunier grapes. The 600 bottles of the 2009 vintage are sold out. They originally cost £185, with a limit of one magnum per customer."
É assim que se faz.
Enquanto uns pedem “preços justos”, outros trabalham para merecer preços premium. Um produtor inglês cria um espumante capaz de ombrear com os melhores champanhes... mostra o caminho: aperfeiçoamento técnico, diferenciação, construção de marca e ambição internacional.

Não se limitou a reclamar do mercado — transformou-se para se destacar nele. O resultado? 
Notoriedade, prestígio… e £185 por garrafa.

A lição é clara: valor não se exige, constrói-se.

Trecho retirado de "English sparkling wine magnum beats champagne to world's top 50" publicado pelo The Times no passado dia 18 de Junho.

Acerca do combate ao caos





"The starting point for thinking about your process should always be the bottom row rather than the top row of Figure 5. No matter how carefully you may try to control your process, assignable causes will tend to cause it to shift around. Until you use a process behavior chart to identify these assignable causes and then control them, your process will inhabit the bottom row of Figure 5. It's only as you identify and control assignable causes that your process will begin to behave like the pictures in the top row of Figure 5.
...
The cycle of despair
Since everybody knows that they're in trouble when their processes are in the State of Chaos, they inevitably appoint chaos managers whose job is to drag the process up from the State of Chaos. With luck, these chaos managers can get the process back to the Brink of Chaos—a state which is erroneously considered to be "out of trouble."
Once the process is brought back to the Brink of Chaos, the chaos manager is sent off to work on another problem. But as soon as his or her back is turned, the process begins to move down the entropy slide toward the State of Chaos.
...
The only way out
There's only one way out of this cycle of despair. There's only one way to move a process up to the Threshold State or the Ideal State, and that is the effective use of process behavior charts.
Every manufacturer is confronted with a dual problem-to identify both the effects of entropy and the presence of assignable causes. Entropy places a process in the cycle of despair. Assignable causes doom it to stay there.
The only way a manufacturer can ever meet the dual objectives of overcoming the barrier created by the assignable causes and counteracting the effects of entropy is by using process behavior charts. No other approach will consistently and reliably provide the necessary information in a clear and understandable form."

Uma crítica certeira à forma como muitas organizações gerem os seus processos — com foco na reacção e não na compreensão profunda do comportamento do processo ao longo do tempo.

A metáfora do “cycle of despair” é particularmente poderosa: descreve a realidade de muitas empresas que vivem constantemente entre o caos e o limiar do caos, sempre a apagar fogos, nomeando “gestores de caos” que trazem soluções provisórias, mas sem nunca resolverem as causas profundas. Quando o gestor se afasta, tudo volta a descambar — porque o sistema não foi efectivamente estabilizado.

A chave está no uso consistente de process behavior charts (cartas de controlo estatístico do processo). Estes gráficos permitem distinguir o que é ruído natural (common cause variation) do que são causas atribuíveis/assinaláveis (assignable causes), abrindo a porta a uma verdadeira melhoria contínua e sustentável.

Sem compreender o comportamento dos processos, não há controlo — e sem controlo, não há progresso. O combate ao caos não se faz com reacções, faz-se com método. 


Figura e trechos retirados de "If It Ain't Broke..." publicado na revista Quality Digest

Donald Wheeler é só a pessoa com quem mais aprendi acerca de cartas de controlo (Ainda me lembro de fazer o Shinkansen Kyoto-Tokyo em 1992 a ler "Understanding Variation: The Key to Managing Chaos") a outra foi o professor Sarsfield Cabral


sexta-feira, junho 20, 2025

Curiosidade do dia



Ao longo dos anos tenho escrito aqui no blogue sobre o choradinho dos produtores de uvas no Douro, ou dos produtores de leite em Portugal, entre outros.

Agora é a vez de ilustrar o tema com um exemplo ... alemão:
"Towards the end of the last century the reputation of German wine could scarcely have sunk much lower.
In Britain and other markets it had become synonymous with cloyingly sweet, mass-produced brands such as Blue Nun — Alan Partridge's plonk of choice.
Today, though, its good name has recovered to the point where it sells at average prices comparable to those from France and Italy.
...
Yet the industry is facing a "looming catastrophe" and more than half of Germany's wine producers fear bankruptcy in the coming months, according to an organisation founded by vintners to rescue their sector.
"If we don't act now, we will lose more than just the vines. We will lose our cultural landscape, our history, our identity," said Thomas Schaurer, the head of the Initiative for the Future of German Winegrowing (ZDW).
This might seem like a paradox. The total area of its vineyards has actually grown by more than 8 per cent since 1990. But the group, which represents more than 80 winemakers, is frustrated by a minimum wage that has risen by 40 per cent over the past five years and rival wines that cost €3 a bottle or less. "What we need in order to survive is simply fair prices," it said."

A frase final - "What we need in order to survive is simply fair prices" — traduz uma postura que, do ponto de vista económico, contém várias incoerências, ilusões ou confusões fundamentais. 

Confundem "preço justo" com "preço suficiente para a minha sobrevivência". Temos pena! A ideia de preço justo neste contexto é usada de forma subjectiva e auto-referencial: os produtores querem um preço que cubra os seus custos actuais e garanta a sua continuidade. No entanto, o preço de mercado é determinado pela oferta, procura e valor percebido pelo consumidor, não pelas necessidades de quem produz. Do ponto de vista económico, não há garantia de que qualquer actividade deva ser lucrativa só porque existe ou tem tradição.

Ignorar a concorrência e o comportamento do consumidor. O facto de existirem vinhos rivais a €3 a garrafa mostra que há alternativas no mercado com que os produtores alemães têm de competir. Se os consumidores não estiverem dispostos a pagar mais pelos vinhos alemães, a culpa não é do mercado, mas de um posicionamento ineficaz (em qualidade, diferenciação, marketing, canal de distribuição...). Exigir preços mais altos sem justificar mais valor percebido é ignorar a lógica da concorrência. Em Mioa passado, durante o fim de semana de caves abertas em Satigny (Genebra) não encontrei garrafas a menos de 12 francos suíços.

Foco nos custos em vez de foco no valor. Queixar-se do aumento do salário mínimo é um argumento comum, mas fraco: se a estrutura de custos não permite competir num mercado aberto, o problema é de modelo de negócio, não de política salarial. Em vez de pressionar para baixar custos externos (salários, concorrência), deveriam estar a procurar criar mais valor, subir na escala de valor, inovar no produto ou diferenciar-se.

O apelo emotivo à identidade e à cultura como justificação económica. A frase "We will lose our cultural landscape, our history, our identity," é retoricamente poderosa, mas economicamente irrelevante — a menos que esses elementos sejam convertidos em valor económico real (ex.: enoturismo, DOP, storytelling eficaz). O mercado não financia heranças culturais apenas por existirem — é preciso torná-las desejáveis, visitáveis, compráveis.

Negação do papel da destruição criativa. Se certos produtores não conseguem adaptar-se, é normal — ainda que doloroso — que saiam do mercado. A destruição criativa (Schumpeter) faz parte do dinamismo económico. Subsidiar a permanência de modelos ineficientes perpetua o problema, não o resolve.

A solução não é pedir preços — é criar valor e rever estratégia. Em vez de apelar a uma noção vaga de justiça, os produtores deveriam:

  • Repensar o seu modelo de negócio;
  • Reposicionar os seus produtos com base na diferenciação;
  • Reforçar redes de exportação;
  • Investir em inovação e parcerias;
  • Ou mesmo fundir ou abandonar explorações ineficientes. 
Por fim, afinal esta postura não é geneticamente tuga.


Trechos retirados de "Germany's vintners may wither on the vine" publicados no The Times de 18.06.2025.

ISO 9001: ainda faz sentido para as PME? (parte II)

Ainda antes de ter publicado aqui no blogue "ISO 9001: ainda faz sentido para as PME?" já tinha publicado uma versão mais curta no LinkedIn "Does ISO 9001 still make sense for SMEs?" na manhã de 16 de Junho.

Termino os meus textos com uma referência aos trabalhos de Nicholas Bloom et al sobre a dificuldade no spillover das boas práticas de gestão entre empresas do mesmo sector de actividade económica num mesmo país. Como se existisse uma fricção que diminui a velocidade de propagação.

Entretanto, durante a tarde de 16 de Junho Roger Martin publicou "Influenceability, Society & Strategy - Don't Choose the Path of an Intellectual Hermit":

"the problem with uninfluenceable people

...

Society is what we construct when individual people in it interact with one another. When they interact, they influence one another and that pattern of interaction and influence shapes society.

...

People who are completely uninfluenceable can’t participate in that societal building and shaping process. By definition, uninfluenceable people can’t learn, can’t get better, and get completely stuck

...

If you are influenceable, you would want help from others in coming up with the most useful interpretation of the law or Bible or anything else. If you are uninfluenceable, that is simply not an option.

Why it Matters for Strategy

Influenceability is important to contemplate in strategy because strict constructionism dominates in the modern practice of strategy. The mantra is to do the analysis and then do what the analysis says. Anything else is considered to be negligent and abhorrent. The analysis is viewed as providing ‘the right answer.’ If you don’t concur, you are an anti-analysis business floozy. And that reinforces the dominant culture.

My experience of executives is that under this strict constructionist regime, they tend to become more uninfluenceable as their careers progress. They get more inclined to say: I know this business, this is the way it is always done, the analysis agrees with me, so it is what we are going to do."

Talvez exista, afinal, uma ligação entre a fraca difusão das boas práticas de gestão e a incapacidade de muitos dirigentes para se deixarem influenciar por perspectivas externas. Bloom et al mostram-nos que, mesmo dentro do mesmo sector e país, as diferenças de desempenho entre empresas podem ser abissais — não por falta de acesso à informação, mas por falta de absorção. Roger Martin, por sua vez, sugere que a influência mútua — e a abertura à influência — é condição essencial para o progresso individual e colectivo. Quando a cultura organizacional cristaliza em torno de certezas analíticas e de "modelos de sempre", deixa de haver espaço para o verdadeiro diálogo, para a escuta, para a aprendizagem.

Talvez por isso a ISO 9001, apesar da sua natureza genérica e da sua longa história, continue a fazer sentido: porque obriga a escutar, a medir, a rever e a melhorar. E, como lembra Martin, só melhora quem se deixa influenciar.

quinta-feira, junho 19, 2025

Curiosidade do dia



Mão amiga fez-me chegar esta peça:
"Climeworks' Direct Air Capture (DAC) plant in Iceland captures so little CO2 from the atmosphere it doesn't even cover its own emissions.
This represents a complete failure. The technology is tasked with reducing atmospheric CO2, and instead it is increasing it.
Climeworks DAC began operations in Iceland in 2021. The large machines are claimed to be able to capture 4,000 tons of CO2 each year. This goal has never been achieved. Since commencing capture operations, they have captured no more than 1,000 tonnes in a single year.
Yet Climeworks' own emissions amounted to 1,700 tons of CO2 in 2023."

"differences in value creation"

 


"all ability to capture value depends on differences in value creation. In their quest for exceptional performance, many executives ask themselves what they might do to increase their firm's returns. This is the wrong question to set out from. To begin your journey toward increased financial performance, create differentiated value and profits will follow. Fail to do so, and no amount of business acumen will generate exceptional results. [Moi ici: Resultados financeiros saudáveis são consequências, tal como os números do desemprego, não se trabalha directamente para eles, mas eles são uma consequencia do que se faz]
...
copying reduces the ability to capture value, because greater similarity across firms leads to downward pressure on prices."

Trechos retirados de "Better, simpler strategy: a value-based guide to exceptional performance" de Felix Oberholzer-Gee.  

quarta-feira, junho 18, 2025

Curiosidade do dia



Temos de perguntar: Por que não ladram os mastins dos Baskerville

"they go on expensive crusades to announce their goodness"


No passado dia 13 de Junho, Janan Ganesh escreveu um dos artigos mais desmoralizantes que tenho lido nos últimos tempos, "Only a crisis will wean the west off debt", algo em linha com o que escrevi em Agosto passado: as sociedades ocidentais precisam de situações de emergência para mudar.

Ganesh, argumenta que os investidores internacionais em dívida soberana devem ter em conta uma realidade muitas vezes ignorada: os governos de democracias ricas têm uma capacidade política limitada para impor austeridade e consolidar as finanças públicas, mesmo quando racionalmente necessário. 

Usando o exemplo do Reino Unido, Ganesh descreve como governos de diferentes espectros partidários têm falhado em controlar a despesa pública por medo da impopularidade e protestos sociais. O texto sugere que, sem uma crise ou um estado de emergência, reformas estruturais significativas são praticamente impossíveis — e isto deve preocupar quem investe em dívida pública.

"The Labour government has a tremendous majority in parliament. It does not have to call a general election until 2029. Its opponents are split, perhaps terminally. When it cut pensioner perks to save the indebted kingdom some cash, public anger was, while fierce, unexceptional. And still Labour capitulated to the pensioner vote. As it did to public sector wage demands last summer. As it soon might to some child benefit recipients. If this of all governments cannot withstand some run-of-the-mill moral pressure, which UK government ever can?"

Lá, como cá:

"It is odd that so little of Britain's political discourse is about the fiscal trajectory."

Ganesh lamenta o facto da trajectória orçamental do Reino Unido quase não ser debatida, enquanto os políticos se concentram em medidas simbólicas e promessas irrealistas. Lembrei-me logo de Alexandra Leitão a prometer transportes públicos gratuitos.

"I nurse a theory that low-charisma politicians are the biggest financial liabilities. Unable to win the affection of the public on their own terms, they go on expensive crusades to announce their goodness."

Ganesh nota que Margaret Thatcher teve como trampolim uma crise económica grave, tal como os países do Sul da Europa após 2010. Sem um choque externo, o autor não vê hipótese de reformas sérias. 

"If the illusion breaks, and a debt crisis happens, it might at least force a reassessment of the state from first principles. The only way that painful but necessary change happens in highincome democracies is through a sense of emergency."

E o remate final:

"Reeves' spending review this week smelled like an era coming to an end: the references to spending as "investment", [Moi ici: Por cá chegámos a esta fase há muito tempo] the hailing of the provinces over London and its productive satellites. This is a model of government that is almost asking to be put out of its misery. What the likes of Musk couldn't do, the bond traders might." [Moi ici: BTW, relacionar com "As the sun sets on the old world of debt economics, pain lies ahead"

terça-feira, junho 17, 2025

Curiosidade do dia

O último número da revista The Economist traz um artigo muito interessante, "China's "low-altitude economy" is taking off":

"Delivery drones and flying cars are mainly science fiction in the rest of the world, although in some places they have advanced to the realm of prototypes and trials. Walmart, a pioneer, has made 150,000 deliveries by drone in America since 2021. In China, however, these technologies are becoming an everyday reality. The government is vigorously promoting them as part of its ambition to develop a "low altitude economy". By that it means a proliferation of airborne devices whizzing around at less than 1,000 metres (far lower than ordinary commercial planes), offering a dizzying array of services. The intention is to foster a futuristic industry for China to dominate by refining the approach that has already turned the country into an electric-vehicle (EV) juggernaut."

O artigo descreve o rápido desenvolvimento da chamada low-altitude economy na China, um sector emergente que inclui drones de entrega e carros voadores (eVTOLs), com apoio explícito do governo chinês. Esta economia opera abaixo dos 1.000 metros de altitude e está a crescer exponencialmente graças a políticas públicas, regulação flexível e sinergias com as indústrias de baterias e veículos eléctricos.

O governo chinês já criou estruturas para fomentar o sector, incluindo autorizações locais para abrir o espaço aéreo abaixo dos 600 metros, investimentos em infraestruturas (terminais, rotas, 5G), cursos universitários especializados e fundos públicos. Empresas como a Meituan e a EHang estão na vanguarda, já operando drones para entregas de refeições e oferecendo passeios turísticos em eVTOLs.

Apesar do entusiasmo, surgem dúvidas sobre a viabilidade económica de algumas aplicações, especialmente os carros voadores, e sobre o risco de excesso de investimento impulsionado mais pela política do que pelo mercado.

Interessante as sinergias entre diferentes indústrias e a postura das autoridades:

"First, flying cars and drones play to existing industrial strengths. China is the world's biggest manufacturer of both the batteries such aircraft need, and of electric vehicles, which involve lots of the same technology. "Why can our low altitude economy quickly generate strong explosive power? One very important reason is that we have accumulated a lot in the new energy industry, especially in cars, in the past few years," Qiao Dong of Yunhe Capital, an investment firm, argued at the conference in Beijing. Shenzhen, for instance, is home to both the D world's largest drone-maker, DJI, and the world's largest EV firm, BYD, along with lots of their suppliers.

What is more, despite the controlling nature of the Chinese state, regulators are nimble and accommodating. [Moi ici: Impressionante!!!] Bureaucrats from different cities now come to Meituan to suggest that it initiate a new delivery route, rather than the other way round, an employee notes. Rather than spending a long time drafting a systematic policy, officials have been drawing up rules as the industry develops. "You have to have a policy that can match whatever technical progress that is being made on the ground," Mr Mao says. Although this might involve less exacting safety standards than may be imposed in Western countries, Chinese consumers, at any rate, do not seem too worried.

...

As a result, Chinese firms can develop products faster than their counterparts elsewhere. EHang was founded five years after Joby, one of America's leading eVTOL companies. "We can iterate faster by leveraging the strengths of the manufacturing industry, and we can also accumulate relevant experience faster through actual flights in China," says Mr Hu. Robin Riedel of McKinsey notes that, whereas Western firms in the industry consider their products superior in quality, Chinese firms view themselves as faster to commercialise: "There's a little bit more willingness to experiment in China versus in North America and in Europe.""

ISO 9001: ainda faz sentido para as PME?


A norma não está ultrapassada. Mas a forma como muitas empresas a aplicam, sim.

Comecei a trabalhar com a ISO 9001 entre 1989 e 1990. Na altura, Portugal era visto como um país de mão-de-obra barata dentro da recém-alargada Comunidade Económica Europeia, e eu acreditava que a ISO 9001 traria organização e disciplina às PME portuguesas, ajudando-as a competir num mercado cada vez mais exigente.

Era o tempo em que se exaltava a “Normalização” com cartazes em salas de formação — e a crença ingénua de que bastava seguir normas para atingir a excelência. Hoje, sei que isso não basta.

O colapso das PME protegidas

A semana passada assinalaram-se os 40 anos da entrada de Portugal na CEE. Esse momento histórico abriu fronteiras e eliminou barreiras alfandegárias que protegiam milhares de empresas. A consequência foi brutal: uma parte significativa da nata das PME desapareceu, incapaz de competir com as marcas europeias. As que apostavam apenas no preço ainda tiveram algum fôlego — até que a China lhes retirou até esse último trunfo.

Entretanto, muita coisa mudou. Como explica Eric Beinhocker em The Origin of Wealth, o mundo empresarial tornou-se uma paisagem competitiva enrugada, em constante mutação. Quando a vantagem do baixo custo desapareceu, as PME mais ágeis descobriram o valor da flexibilidade, da rapidez, da capacidade de adaptação. Foi esse impulso que permitiu ao peso das exportações no PIB nacional saltar de 27% para cerca de 50% num espaço de poucos anos.

Nesse mesmo período, encerrei um capítulo da minha vida profissional — a marca Redsigma, que havia fundado nos anos 90. Foi o fim de um ciclo. Mas não do meu envolvimento com a qualidade.

A ISO 9001 ainda é útil? Depende.

Hoje, continuo a acreditar que a ISO 9001 pode ser uma ferramenta valiosa para PME que não competem apenas pelo preço. Mas é fundamental que a norma seja aplicada com inteligência e intenção estratégica. O sistema de gestão da qualidade não pode existir por si só. Tem de estar ao serviço da execução da estratégia da empresa.

Infelizmente, vejo com frequência o oposto: empresas onde a ISO 9001 serve apenas para “manter o certificado”. Perdeu-se o sentido original — e, com ele, a oportunidade de transformação.

Felizmente, também tenho participado em projectos onde a ISO 9001 é muito mais do que um exercício burocrático. Nestes casos, torna-se um catalisador para melhorar processos, alinhar equipas e reforçar a competitividade.

A grande lição de Bloom e Oberholzer-Gee

Recentemente, revisitei uma ideia poderosa no livro "Better, Simpler Strategy" de Felix Oberholzer-Gee: há mais variação de desempenho entre empresas do mesmo sector do que entre sectores diferentes. Ou seja, empresas a operar no mesmo país, no mesmo sector de actividade, sob as mesmas leis, impostos e mão-de-obra, apresentam resultados muito diferentes. Porquê? Pela estratégia que escolhem e pelas práticas de gestão que adoptam.

Muitos acreditam que as boas práticas de gestão estão amplamente difundidas. Mas Nicholas Bloom e John Van Reenen demonstraram o contrário em estudos amplamente citados. A sua investigação, publicada no Quarterly Journal of Economics, mostra que as diferenças na qualidade da gestão são profundas — mesmo entre empresas semelhantes.

O que estes dados nos dizem é claro: há milhares de empresas que continuam a não fazer o básico bem feito. A ISO 9001, aplicada com seriedade, pode ser esse “básico” — mas tem de ser usada como instrumento de melhoria do desempenho, e não como um selo decorativo de conformidade.

Se é empresário e sente que o seu sistema de gestão da qualidade já não serve os propósitos actuais da sua empresa — ou se precisa de criar um sistema de raiz que realmente apoie o crescimento sustentável do seu negócio — contacte-me para uma conversa inicial, sem compromisso: metanoia at metanoia.pt

Não basta certificar. É preciso transformar. E isso começa com uma decisão.

segunda-feira, junho 16, 2025

Curiosidade do dia

Há minutos, no noticiário das 16h da rádio Observador ouvi o presidente do Chega, André Ventura, a perguntar como é que alguém na Índia e que nunca pôs os pés em Portugal pode ter nacionalidade portuguesa.

 

Há duas respostas possíveis. Ilegalmente e legalmente.

O WSJ de hoje publica a via legal (já agora, eu ainda sou do tempo de aprender na escola primária que Goa, Damão e Diu eram parte de Portugal, apesar de tomadas pela União Indiana em 1961): 

"DIU ISLAND, India - The only survivor of Air India Flight 171 was born on this tropical island dotted with palm trees and fishing boats. So were 14 passengers who died in the crash, most of them Portuguese or British nationals of Indian origin.
They straddled two continents, their lives consisting of long-haul flights between work and family. Like many of the 241 people who perished on the London-bound Boeing 787, they were part of the large Indian diaspora that has spread across the world.
Yet Diu is unique. Unlike much of India, the island off the country's west coast was a Portuguese colony until 1961, a history that gives its residents a leg up if they want to go abroad. Those born under Portuguese rule and their descendants for two generations are entitled to citizenship of the country."

Trechos retirados de "Island With Ties To Europe Tallies Its Crash Dead" publicado no WSJ do passado dia 16 de Junho. 

Luxo e sinais exteriores

"This research introduces "brand prominence," a construct reflecting the conspicuousness of a brand's mark or logo on a product. The authors propose a taxonomy that assigns consumers to one of four groups according to their wealth and need for status, and they demonstrate how each group's preference for conspicuously or inconspicuously branded luxury goods corresponds predictably with their desire to associate or dissociate with members of their own and other groups. Wealthy consumers low in need for status want to associate with their own kind and pay a premium for quiet goods only they can recognize. Wealthy consumers high in need for status use loud luxury goods to signal to the less affluent that they are not one of them. Those who are high in need for status but cannot afford true luxury use loud counterfeits to emulate those they recognize to be wealthy.
...
For mnemonic reasons, we label the four groups as the four Ps of luxury: patricians, parvenus, poseurs, and proletarians. We label the first category "patricians," after the elites in ancient Roman times. Patricians possess significant wealth and pay a premium for inconspicuously branded products that serve as a horizontal signal to other patricians. 
...
We label the second category "parvenus" (from the Latin pervenio, meaning "arrive" or "reach"). Parvenus possess significant wealth but not the connoisseurship necessary to interpret subtle signals, an element of which Bourdieu (1984) refers to as the "cultural capital" typically associated with their station. To parvenus, Louis Vuitton's distinctive "LV" monogram or the popular Damier canvas pattern is synonymous with luxury because these markings make it transparent that the handbag is beyond the reach of those below them. However, they are unlikely to recognize the subtle details of a Hermès bag or Vacheron Constantin watch or know their respective prices. Parvenus are affluent—it is not that they cannot afford quieter goods - but they crave status. They are concerned first and foremost with separating or dissociating themselves from the have-nots while associating themselves with other haves, both patricians and other parvenus.
...
We call the third class of consumers "poseurs," from the French word for a "person who pretends to be what he or she is not." Like the parvenus, they are highly motivated to consume for the sake of status. However, poseurs do not possess the financial means to readily afford authentic luxury goods. Yet they want to associate themselves with those they observe and recognize as having the financial means (the parvenus) and dissociate themselves from other less affluent people. Thus, they are especially prone to buying counterfeit luxury goods. If brand status is important to a person, as it is with poseurs, but is unattainable, a person is likely to turn to counterfeit products as cheap substitutes for the originals."

O artigo refere um estudo feito com o símbolo da marca Mercedes. O estudo conclui que, nos modelos Mercedes-Benz vendidos nos EUA, quanto maior o tamanho do símbolo (estrela da marca), menor tende a ser o preço do automóvel. Especificamente:
  • Um aumento de 1 cm no diâmetro do símbolo está associado, em média, a uma redução de mais de 5.000 dólares no preço do veículo
  • Os modelos mais baratos exibem símbolos maiores, enquanto os modelos mais caros têm o emblema mais discreto.
Interpretação: Os consumidores com maior poder económico e menor necessidade de exibição de status (os chamados patricians) preferem sinais discretos. Já os consumidores mais preocupados em afirmar status (parvenus) preferem símbolos mais visíveis — como uma estrela grande no capô do carro.

Um outro estudo analisa mais de 400 malas da Louis Vuitton e Gucci, e conclui que:
  • Malas com marcações visíveis e logótipos grandes tendem a ser mais baratas.
  • As malas mais caras exibem a marca de forma discreta ou quase invisível, às vezes só no interior (como a Bottega Veneta).
  • Consumidores com elevado poder de compra e cultura de luxo preferem malas discretas, como forma de sinalizar o seu estatuto apenas aos que sabem reconhecer os detalhes subtis (materiais, acabamentos, fechos, costuras).
  • Já consumidores que querem ser reconhecidos como tendo estatuto social, mas não têm necessariamente conhecimento profundo de marcas ou cultura de luxo, tendem a preferir malas grandes, com logótipos evidentes, ou até mesmo contrafacções dessas.
No mundo do luxo, quanto mais alto o preço, mais pequena (ou subtil) a marca. A discrição tornou-se, ironicamente, o sinal mais forte de estatuto - mas só entre os que sabem ler esses sinais.


Trechos retirados de "Signaling Status with Luxury Goods: The Role of Brand Prominence" publicado no Journal of Marketing (Julho de 2010).


domingo, junho 15, 2025

Curiosidade do dia

"Empresários acusados de branquear 124 milhões no Casino da Póvoa"


Hummm! Estranho. Que negócios geram necessidade de branquear dinheiro? Que negócios libertam tais margens? Que empresários têm tais problemas?

"Em causa um esquema, que durou entre 2012 e 2017, que envolve donos de estabelecimentos de venda de vestuário ou calçado, oriundos da República Popular da China, vendidos nos armazéns da chamada "Chinatown do Norte", situada na Varziela, Vila do Conde.
...
De acordo com o Ministério Público, um grupo de empresários da Varziela usou o Casino da Póvoa como uma máquina de lavar dinheiro, proveniente da fraude fiscal, revela o Jornal de Notícias na sua edição deste sábado."


A grande ilusão

A revista The Economist dedica a sua capa ao tema "The Manufacturing Delusion" traduzida num artigo intitulado "The world must escape the manufacturing delusion".

Devo dizer que concordo com praticamente todo o artigo. O texto critica a obsessão actual dos governos pelo regresso à produção industrial nacional, argumentando que essa abordagem é ultrapassada, ineficaz e potencialmente prejudicial. A crença de que o fomento da indústria resolverá problemas como criação de emprego, crescimento económico e resiliência nacional assenta em mitos desactualizados. A automação reduziu drasticamente os empregos industriais e a produtividade do sector não garante salários elevados. A conclusão do artigo é clara: esta "mania" pela industrialização é contraproducente.

Ao longo dos últimos meses tenho coleccionado alguns artigos que vão no mesmo sentido, embora não os tenha referido aqui. Por exemplo, "Want to destroy American business? Protect it, writes Carl Benedikt Frey" publicado na revista The Economist do passado dia 29 de Maio, ou “Semiconductor Subsidies? Tried and Failed”, escrito por T.J. Rodgers no Wall Street Journal de 4 de Junho último.

Recordo ainda a alegria do jornalista por termos roubado uma fábrica de meias à Lituânia.

Voltando ao artigo da revista The Economist:

"Manufacturing no longer pays those without a degree more than other comparable jobs in industries such as construction. As productivity growth is lower in manufacturing than it is in service work, wage growth is likely to be disappointing, too. 

...

The manufacturing delusion is drawing countries into protecting domestic industry and competing for jobs that no longer exist. That will only lower wages, worsen productivity and blunt the incentive to innovate."

Por que concordo com o artigo? Julgo que expliquei em Abril passado em "Trump's Protectionist Bunker". Tudo o que contraria a evolução natural da Teoria dos Flying Geese é de evitar. No fim, o que é produzido tem de pagar salários cada vez mais elevados e isso só se consegue como valor acrescentado. Recordar a imagem associada à Herdmar.

Tudo o que se traduza fábricas com maior valor acrescentado, óptimo, é a direcção correcta. Recordo a Coloplast ou a Avincis. BTW, Camilo Lourenço na passado quinta-feira, no seu programa matinal referiu o que Marrocos está a fazer relativamente à indústria automóvel.