terça-feira, novembro 12, 2024

"We don't need fashion"

Volto a Junho de 2023 e a "Are you prepared to walk the talk? (parte Il)" após ler "'We don't need fashion: Sewing Bee judge tears a strip off Burberry" publicado no The Guardian.

Patrick Grant (um designer de roupa e apresentador do "The Great British Sewing Bee", um reality show britânico de competição onde participantes, geralmente costureiros amadores, enfrentam desafios semanais de costura) critica duramente a baixa qualidade dos produtos de moda e utensílios domésticos modernos, exemplificando com a marca Burberry e produtos de baixo custo como os da Tesco. 

"“Most people who sell you clothes do not give a stuff about the quality.”

...

“Fifty years ago most people trying to sell you clothes would describe their purpose and quality in their advertising,” he said. 

...

Almost all the [fashion] businesses only exist if we continue to buy more stuff,” he said. “We don’t need fashion – if they all disappeared tomorrow we’d be just fine and we’d save 10% of the world’s carbon emissions.”"

Ele destaca como as empresas de moda priorizam o consumo excessivo em detrimento da qualidade e da longevidade, contrastando com práticas antigas onde o foco era produzir peças duráveis e de alta qualidade. Ainda ao princípio da tarde de Sábado passado a minha mulher me apontou vários exemplos de falta de qualidade nos acabamentos de peças de roupa em três lojas.

Grant também enfatiza a importância de ensinar artesanato nas escolas para que as pessoas entendam a qualidade, a habilidade e a alegria de criar coisas. Ele critica a ironia dos hobbies da classe média que imitam trabalhos antigos de forma amadora, sugerindo que a sociedade deveria valorizar e incorporar essas atividades como parte da vida cotidiana para promover um senso de comunidade e respeito pelas tradições manuais.

segunda-feira, novembro 11, 2024

Curiosidade do dia

Os jornais ingleses estão cheios de notícias sobre a revolta dos agricultores que está a fermentar, o encerramento de fábricas com o aumento do salário mínimo e da contribuição para a segurança social, o encerramento de escolas por causa da aplicação do IVA e do aumento da contribuição para a segurança social. O estado inglês está sem dinheiro e precisa de aumentar impostos para se sustentar. 

Entretanto:

"Labour's decision to clear the way for a four-day week in the public sector without corresponding reductions in pay or improvements in productivity speaks volumes as to the party's priorities.
Angela Rayner, the Local Government Secretary, has withdrawn opposition to South Cambridgeshire council's plan to switch to a four-day week. Sadiq Khan, meanwhile, has offered Tube drivers an identical reduction in working days alongside a 3.8 per cent pay rise.
These moves follow on from the decision to award above-inflation pay rises to workers in the NHS without accompanying reforms to improve the woeful performance of the health service. Indeed, across the public sector, productivity today is lower than it was in 1997. Forget benefiting from AI; the workers of the British state have yet to catch up to the advent of broadband internet.
It is a potent illustration that, left to its own devices, the public sector will do what is best for itself: deliver minimal performance and minimal effort for maximal pay, insulated from the consequences of failure and cost pressures by its ability to simply extort more money from the taxpayer. The role of elected politicians should be to constrain this self-serving behaviour. With Labour in thrall to its public sector voters, however, any desire to reduce the burden of taxes is of little concern relative to the need to reward its core constituency. The contrast with events unfolding in the United States could not be more marked."

Trecho retirado do Daily Telegraph no dia 10 de Novembro. 

"Kaput: The End of the German Miracle"

No FT de Sábado 9 de Novembro passado li o artigo "The giant humbled" sobre o livro que já tinha encomendado durante a semana, "Kaput: The End of the German Miracle" de Wolfgang Münchau.

A indústria automóvel alemã, particularmente a Volkswagen, é utilizada como metáfora para os desafios económicos e políticos mais vastos do país. Os sucessos históricos e os fracassos recentes realçam questões sistémicas. A Volkswagen, outrora um símbolo da eficiência alemã e das proezas de engenharia, esteve envolvida em escândalos significativos (por exemplo, emissões de diesel) e mostrou fraquezas estratégicas na transição para veículos eléctricos.

Wolfgang Münchau critica as estruturas políticas, económicas e sociais da Alemanha, retratando-as como disfuncionais e resistentes à mudança.

A Alemanha enfrenta desafios como modelos industriais ultrapassados, subinvestimento em tecnologia, um preconceito anti-técnico na educação e ineficiência burocrática. Embora o chanceler Olaf Scholz tenha anunciado um Zeitenwende (um importante ponto de viragem) em resposta às mudanças geopolíticas, Münchau está céptico quanto ao seu impacte.

A influência da Alemanha nas políticas da UE pode ser restritiva, sufocando potencialmente o crescimento e a inovação nos estados membros. Verifica-se um dinamismo crescente noutras partes da Europa, como a Dinamarca e a Polónia, apresentando novos modelos de crescimento económico. Os desafios que a Alemanha enfrenta reflectem-se noutros países que se têm centrado em modelos orientados para a exportação, como o Japão e a China.

E Portugal no meio disto?

Será que pode capitalizar o seu crescente ecossistema tecnológico e atrair investimento em novas tecnologias, aprendendo com as oportunidades perdidas pela Alemanha em áreas como os veículos eléctricos e semicondutores. Será que pode concentrar-se em indústrias especializadas de menor escala que oferecem produtos de elevado valor, evitando as armadilhas da dependência excessiva de um único sector.

Se a Alemanha, enquanto maior economia da Europa, enfrentar uma recessão prolongada, toda a UE poderá registar um crescimento lento, afectando potencialmente as exportações portuguesas e a estabilidade económica. A saúde económica de Portugal está parcialmente ligada ao quadro mais vasto da UE. Um declínio da influência económica alemã poderá reduzir o financiamento ou o apoio a determinadas iniciativas a nível da UE.

Qual a relevância para as PME?

As PME podem capitalizar o fracasso das grandes empresas na adaptação rápida, posicionando-se em nichos de mercado, especialmente em sectores emergentes como as tecnologias verdes e as soluções digitais. As PME podem construir parcerias com instituições académicas e de investigação para promover a inovação, aprendendo com as oportunidades perdidas pela Alemanha na integração dos avanços tecnológicos.

Uma base industrial alemã enfraquecida poderá levar a perturbações nas cadeias de abastecimento europeias, afetando as PME portuguesas que dependem de importações ou componentes alemães.

A instabilidade económica num grande parceiro europeu como a Alemanha pode levar a uma incerteza mais ampla, afectando a procura, o investimento e a estabilidade financeira, que são fundamentais para as PME.

domingo, novembro 10, 2024

Curiosidade do dia

Confesso a minha surpresa:

""Tem-se falado muito de levar a água do norte para o sul, de transvases. Julgo que isso é uma matéria muito delicada, porque estamos a falar de investimentos que ninguém sabe exatamente de que números é que estamos a falar, e às vezes falamos destas coisas com alguma ligeireza e sem a profundidade que um assunto desta dimensão merece", afirmou."

É tão raro ouvir um membro do governo falar assim. É muito mais fácil gastar milhões e depois, perante o preço exorbitante da água, em vez de cobrar o preço justo aos criadores de amêndoas e abacates, pôr o contribuinte a pagar. 

Trecho retirado de "Seca: Governo diz que transvases são solução "pouco prudente e excessiva"

Fugir da comoditização

No DN do passado dia 8 li "Crescimento das marcas "brancas" retirou dois mil milhões às de fabricante"

O texto destaca que, em cinco anos, as marcas próprias da distribuição passaram de uma quota de 32% para mais de 45% do mercado. Esse crescimento significativo mostra como os consumidores têm optado cada vez mais por produtos de marca branca, em parte devido ao preço mais baixo.

Esse crescimento das marcas brancas resultou numa perda de cerca de dois mil milhões de euros para as marcas de fabricantes, refletindo o impacte directo que as escolhas dos consumidores têm na rentabilidade das marcas tradicionais.

O artigo aponta que, com a inflação a subir, os consumidores começaram a mudar as suas escolhas, favorecendo produtos mais económicos, como as marcas brancas.

Os fabricantes tentam estratégias para reconquistar a preferência dos consumidores, mas enfrentam dificuldades significativas devido ao poder de mercado e à competitividade das marcas brancas.

E as PMEs como devem actuar?

  • Devem destacar a qualidade, exclusividade e benefícios adicionais dos seus produtos em vez de competir apenas pelo preço. Investir em produtos que proporcionem experiências superiores ou que se diferenciem de marcas brancas pode ajudar a justificar um preço mais alto e criar lealdade à marca.
  • Têm de inovar e diferenciar os produtos para que os consumidores vejam valor em escolher a marca, mesmo que o preço seja mais elevado. O texto indica que as marcas brancas ganharam terreno, em parte, devido a uma busca por alternativas mais baratas; assim, oferecer algo que estas marcas não consigam replicar facilmente pode ser uma vantagem. Por exemplo, ainda ontem naveguei por uma prateleira com umas dez opções de diferentes marcas de maionese. Desisti, estava interessado numa com azeite e não no que me era oferecido com óleo de girassol ou óleo de colza.
  • Devem investir em estratégias de branding que reforcem a imagem da marca como uma opção premium ou com características únicas e desviar a atenção da comparação de preços e criar uma percepção de valor superior.

Evitar a competição pelo preço mais baixo e criar um nicho próprio que se baseia em qualidade e características únicas, afastando-se da dependência do mercado dominado pelas marcas brancas é fundamental.

sábado, novembro 09, 2024

Curiosidade do dia

Li uma entrevisa ao vice-presidente da CAP (Confederação dos Agricultores Portugueses) onde a propósito do azeite disse:

"É sempre bom aprendermos com os bons exemplos de outras fileiras e/ ou outros países que desenvolvem a sua atividade em prol do desenvolvimento integrado de um produto. Em Espanha, a Interprofissional do Azeite foi constituída em 2002, tendo sido aprovada em 2008 a extensão da norma, o que lhe permitiu desenvolver atividades de inovação e, sobretudo, de promoção dos azeites de Espanha nos mercados internacionais. Em Itália a situação é análoga."

Entretanto, uma pesquisa na internet permite concluir:

  • Entre 2015 e 2021, Portugal apresentou um preço médio de exportação de 3,42 euros por quilograma, enquanto Espanha registou 3,22 euros por quilograma.
Pena que o senhor vice-presidente, apesar de presidente da APPITAD – Associação dos Produtores em Proteção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro, não aposte na joalharia e se deixe cativar pelo Mar del Plástico.

Lucro, investimento e produtividade

Acabei a leitura do capítulo 5, "The problem of profitability" do livro "Creative Destruction", de Phil Mullan, mais uma boa leitura.

O autor discute o declínio persistente da taxa de rentabilidade como uma questão crítica que afecta as economias modernas. Este problema é visto como intrínseco ao processo capitalista, ligado à necessidade de aumentar o investimento de capital para aumentar a produtividade. A taxa de rentabilidade diminui geralmente à medida que se aplica mais capital, o que coloca desafios ao crescimento sustentado e ao investimento. Interessante como o autor cita Marx longamente.

A diminuição da rentabilidade prejudica o investimento empresarial, que é um motor fundamental da expansão económica. Quando os lucros descem em relação ao capital investido, as empresas estão menos inclinadas a investir noutras actividades produtivas. Esta situação leva à estagnação económica ou a uma depressão prolongada, como se verifica nas análises históricas.

O capítulo identifica um declínio secular e de longo prazo da rentabilidade desde o boom pós-Segunda Guerra Mundial. As taxas de lucro atingiram o pico na década de 1950, mas diminuíram nas décadas seguintes, com algumas estabilizações e pequenas recuperações após recessões. A tendência tem sido uma trajetória descendente da taxa de lucro ao longo do tempo nas principais economias industriais.

O paradoxo destacado neste capítulo é que os períodos de expansão económica podem acelerar o declínio da rentabilidade. Este declínio ocorre porque a rápida expansão económica requer um investimento de capital substancial, o que aumenta a produtividade mas reduz a taxa de lucro global à medida que se investe mais capital em comparação com os retornos. Esta relação leva à redução da rentabilidade durante períodos de crescimento.

Estão a ver para onde isto nos leva?



A diminuição da rentabilidade desencoraja o investimento empresarial. Esta relutância em investir perpetua a estagnação económica, uma vez que o investimento é crucial para o crescimento e o avanço tecnológico. Por sua vez, o investimento é o motor essencial da produtividade. Contudo, à medida que a rentabilidade cai, o incentivo para investir diminui, o que prejudica o crescimento da produtividade. Isto cria um ciclo de feedback em que a baixa rentabilidade limita o investimento, resultando num crescimento estagnado ou baixo da produtividade. 

Aquele sinal mais quer dizer que o feedback loop é positivo, ou seja, é auto-catalítico, auto-reforça-se a cada volta que dá. Por isso, amplifica os seus próprios efeitos, transformando pequenos problemas em grandes crises. Sem intervenção, cada ciclo piora o resultado, criando uma espiral descendente da qual é difícil escapar.

sexta-feira, novembro 08, 2024

Curiosidade do dia

 

"O nosso modelo de distribuição não é entre os mais ricos e os mais pobres. É entre os mais jovens e os mais velhos. A AD tentou uma solução absurda, tecnicamente inviável com a proposta de IRS jovem, mas tinha um diagnóstico claro: os mais novos não podem pagar mais. Mesmo que não gostemos da solução há uma pergunta que temos de responder: quanto mais podemos exigir aos mais jovens?

Ao longo da vida cada geração recupera na velhice, através da reforma, aquilo que descontou. Porém, esta geração de jovens vai receber relativamente menos do que os seus pais e avós descontaram e pagar mais por benefícios que não gozará."

Trecho retirado de "Até onde vai o egoísmo?"

Sem investimento a produtividade não cresce

Acabei a leitura do capítulo 4, "Why investment matters" do livro "Creative Destruction", de Phil Mullan. 

O capítulo começa com:

"The prolonged weakness of capital investment is the main explanation for the perpetuation of the Long Depression. Without the transforming investments that embody technological advances, innovation will remain deficient, sustained productivity growth will not occur and stagnation will continue. The research and science that come up with new ideas are insufficient to bring about progress on their own. They only acquire social value through the investment that realises them in innovating ways that add to human pleasure or prosperity."

Tal como no capítulo 3 o autor dedica parte importante do capítulo a ilustrar como um mundo de fantasia é criado com a manipulação dos indicadores, alargando o âmbito daquilo a que se chama de investimento.

No entanto, gostava de focar a atenção em dois tópicos:

"The more relevant economic proportionality for assessing investment needs is not between manufacturing and services, but between low value adding and high value adding sectors. Generally it is the low value activities, whether making goods or providing services, that are of low capital intensity. This applies to simple manufacturing assembly operations, as it does to serving food and drink, cleaning, personal care, or shelf stacking.

High value industries, in contrast, whether manufacturing, extractive or services, are more likely to require capital investment to increase their capacity to produce at high levels of productivity. This applies as much to a modern transport system or a communications network as it does to advanced manufacturing. Even agricultural activities like dairy production - traditionally regarded as low-tech and labour intensive - are becoming much more automated and capital intensive: robots now milk cows. A return to durable economic growth will require continuing levels of investment in higher value sectors - services or goods based - to expand, maintain and upgrade capital assets."

Algo que permeia este blogue frequentemente: a importância de subir na escala de valor para aumentar a produtividade à custa da eficácia e não da eficiência. Recordar o que significam as imagens e a sua sequência na figura que ilustra os Fliyng Geese.

"Calling spending on workers' skills 'intangible investment' while downplaying the role of capital investment again mystifies the production process. Production brings workers and tangible capital together; neither is effective on their own. A machine is just an inert piece of kit until humans activate it. A person can work just with their hands without any tangible capital but their activities will remain primitive: crop picking by hand, or a home-visiting masseur. Not much else is possible for humans without some tools, or premises, or raw materials to work with.

Prioritising the role of human capital can divert from the requirement for much more tangible, innovation-carrying, capital investment. Too little of the latter has been undermining effective production, thereby holding back the productivity of the workers who make up the human capital. People who do not have the opportunity of working with modern technology are not that productive, and most do not have fulfilling work experiences either.

...

Increasing workforce skills are of no value economically in the absence of the capital investment, technology and jobs to use them. Devoting extra resources to training will not produce economic benefits if there are insufficient high-skill, high productivity jobs for the workforce. A supply of skilled people does not create a demand for them, and skills that are not used are rapidly lost. To be effective, skills need to combine with other factors in production, especially those deriving from adequate amounts of capital investment in innovation."

O velho tema da "caridadezinha" aqui no blogue. Recordo:

Mas há muito mais.

quinta-feira, novembro 07, 2024

Curiosidade do dia

A propósito de "Não se deixem surpreender" sobre a situação da economia alemã, convém perceber que a coisa não fica por aí.

Ontem no WSJ, "Outlook Is Gloomier For French Factories":

"French manufacturers produced less in September, threatening a bleak end to the year for a European manufacturing sector suffering from high energy bills and tougher competition from China.

...

As the European auto sector shifts to electric vehicles, it suffers from increased competition from abroad, notably China. On Tuesday, French tiremaker Michelin said it would close two plants and German auto supplier Schaeffler said it would reduce operations at some factories, jointly putting more than 5,000 workers in line for layoffs. 

...

Survey data this week suggests France's manufacturing sector is primed for its weakest month since the beginning of the year in October. That is contributing to a continued decline in the wider eurozone, similar surveys show.

Sliding exports remain a major problem for French manufacturers, and October's international sales marked the fastest drop on record, according to survey compiler S&P Global."

Também "French industry stuck in recession and outlook stays bleak, survey finds "

Uns vão olhar para isto e pensar:
  • À medida que as empresas francesas e alemãs procuram deslocalizar ou diversificar as operações devido aos elevados custos energéticos e à concorrência, Portugal pode posicionar-se como um destino atractivo. 
Outros vão olhar para isto e pensar:
  • O declínio da indústria transformadora francesa e alemã poderá levar a uma concorrência mais intensa entre os países europeus para atrair empresas, sobrecarregando potencialmente os recursos e os incentivos de Portugal.

Inovação versus produtividade

Um mundo de fantasia criado pela manipulação de indicadores ao estilo de "wag the dog".

Acabei a leitura do capítulo 3, "Innovation Puzzles" do livro "Creative Destruction", de Phil Mullan, que explora as complexidades e os desafios que rodeiam o conceito de inovação, particularmente nas economias ocidentais, e avalia criticamente pressupostos e medições comuns a ele associados. Algumas das ideias:

Mullan defende que a inovação foi elevada a um estatuto quase sagrado, muitas vezes aplicada de forma ampla a conceitos muito distantes dos avanços tecnológicos reais na produção. Isto levou ao que ele chama de “exagero da inovação”, onde até mesmo pequenas atualizações, como atualizações de software, são celebradas como inovações significativas​.

O capítulo diferencia entre inovação de processo (melhorar os métodos de produção para aumentar a produtividade física) e inovação de produto (criação de novos produtos). Mullan sublinha que, embora ambas sejam essenciais, a inovação de processos desempenha um papel fundamental na condução do crescimento económico, aumentando a produtividade e reduzindo custos. A inovação ocidental recente inclinou-se fortemente para os produtos de consumo em vez dos avanços produtivos​. Talvez este possa ser o ponto de vista de quem está a comentar a partir de uma economia avançada. Eu, a comentar a partir de Portugal, penso que precisamos de mais inovação concentrada na subida na escala de valor (eficácia), que permite preços mais altos, do que focada na melhoria de processos (eficiência), que permite ou melhoria ou manutenção de margens. Recordar Marn e Rosiello e o que significa aumentar preços versus reduzir custos.

Métricas como as despesas em I&D, a contagem de patentes e a frequência das citações são frequentemente utilizadas para avaliar a inovação, mas são indicadores defeituosos. Por exemplo, as despesas em I&D não garantem resultados bem-sucedidos e a contagem de patentes pode refletir estratégias jurídicas ou financeiras, em vez de inovação genuína. Estas métricas centram-se mais nos inputs da inovação do que nos seus impactes qualitativos na produtividade e no crescimento económico​.

Existem evidências de que a inovação não tem tido os efeitos transformadores esperados na produtividade, especialmente desde a década de 1970. Apesar dos avanços nas tecnologias de informação e comunicação, o crescimento da produtividade nas economias ocidentais abrandou. Esta estagnação é atribuída a investimentos insuficientes em capital transformador e a inovações de processos que melhorem genuinamente as capacidades de produção​.

Mullan sublinha que a difusão da inovação – através da qual os avanços tecnológicos se espalham pela economia – é crucial para o crescimento global da produtividade. No entanto, muitas economias ocidentais sofrem de baixo dinamismo económico, com recursos retidos em áreas de baixa produtividade, limitando os benefícios generalizados da inovação. Esta quebra da “máquina de difusão” exacerbou a estagnação da produtividade​.

quarta-feira, novembro 06, 2024

Curiosidade do dia

A propósito da vitimização: 

Recordar o termo "priming" (ou pré-activação):

Daí o tweet:



Não se deixem surpreender

Não se deixem surpreender:


No FT de ontem um artigo interessante na coluna "FT BIG READ" intitulado "A broken business model?" acerca da situação da economia alemã:

  • Dependência energética: O sucesso industrial da Alemanha tem dependido fortemente do gás russo barato. As tensões geopolíticas e a subsequente redução do fornecimento de gás levaram ao aumento dos custos energéticos, impactando a produção industrial.
  • Declínio industrial: Sectores como o automóvel, o químico e o da engenharia estão a atravessar crises. A produção industrial tem vindo a diminuir desde 2017 e a Alemanha regista um crescimento mínimo do PIB desde finais de 2021.
  • Desafios do sector automóvel: A mudança para veículos eléctricos e a concorrência dos fabricantes chineses afectaram negativamente a indústria automóvel da Alemanha, tradicionalmente uma pedra angular da sua economia.
  • Alterações geopolíticas: As alterações na dinâmica do comércio global, especialmente no que diz respeito à China, perturbaram o modelo orientado para as exportações da Alemanha, necessitando de uma reavaliação das relações comerciais.
  • Instabilidade política: O governo de coligação liderado pelo Chanceler Olaf Scholz enfrenta dificuldades em lidar eficazmente com estes desafios económicos, conduzindo à instabilidade política. Isto resultou num crescente apoio aos partidos da oposição que defendem reformas económicas.
Fico a pensar nas consequências do pântano alemão na economia portuguesa ...

  • Redução dos fundos europeus, e toda a gente sabe o quanto este país vive da poupança dos frugais com a Alemanha à cabeça.
  • A queda da procura alemã pode afectar as exportações portuguesas, especialmente industriais, impactando a produção e o emprego.
  • Menor consumo alemão pode reduzir o turismo em Portugal, prejudicando o sector turístico.
  • Empresas alemãs podem suspender ou reduzir investimentos em Portugal, afetando o crescimento e o emprego local.
  • A crise pode levar o BCE a ajustar as taxas de juro, elevando o custo da dívida para Portugal e limitando o orçamento do governo.
  • A UE pode exigir reformas em Portugal para aumentar sua resiliência económica e reduzir a dependência de subsídios.
  • A crise alemã pode abalar a confiança na zona euro, afectando empresas portuguesas que dependem de mercados externos e financiamento estrangeiro.
Mas, por outro lado, a crise também pode levar empresas alemãs a procurar parcerias em energias renováveis, onde Portugal, com o seu potencial em energia solar e eólica, pode atrair novos investimentos.

BTW, o artigo começa asim:
"I an 30-plus-year career in corporate restructuring, consultant Andreas Rüter has seen it all: the dotcom bust, September 11, the global financial meltdown, the euro crisis, Covid-19. But what's happening right now in corporate Germany is "unprecedented" and "of a completely different order of magnitude", says Rüter, the country head of AlixPartners.
The federal republic's all-important automotive sector, chemical industry and engineering sector are all in a slump at the same time. Rüter's firm is so overwhelmed by demand for restructuring that it's turning potential clients away." 

terça-feira, novembro 05, 2024

Curiosidade do dia

Há quase um ano escrevi isto "Menos dor na transição" acerca da Coloplast. 

Agora, mão amiga manda-me "Nova empresa a 10 minutos de Vizela quer contratar 1000 pessoas e vai esclarecer interessados":

"Inicialmente, a dinamarquesa está à procura de operadores de produção, técnicos de manutenção e outros qualificados técnicos, todos com formação ao integrarem a empresa. A experiência não é, por isso, um requisito obrigatório."

BTW, a primeira vez que escrevi sobre a Coloplast foi em 2014.

Anichar

Faz hoje uma semana que li no WSJ em "Hectic Is Normal for Whirlpool Factory Boss" este trecho:

"CLYDE, Ohio - Ryan DeLand arrives at Whirlpool's washing-machine factory at 6:53 a.m., not long after dayshift workers have settled into their stations.

He steps into his office and is greeted by a whiteboard that bears the motto "stable and predictable."

He will spend the day chasing that goal despite a never-ending stream of complications in a plant that 1s as big as 30 football fields put together.

A lot can go wrong. The plant has more than 25 miles of conveyors and uses more than 2,000 parts. Robotic and human-piloted vehicles zip through its aisles, while an overhead crane carries huge coils of steel.

Going full blast, the factory can pump out 22,000 washing machines in a day, but even a brief mishap can stop production cold."

22 mil máquinas de lavar roupa por dia ... fiquei a pensar no que o número representa em termos de filosofia de produção e de comercialização.

Entretanto, ontem no FT li "Niche bike makers bank on quality to ride out dip":

"They work for Moulton Bicycle Company, a maker of small-wheeled bikes with distinctive steel-lattice frames that is one of several specialist UK manufacturers betting on quality, design and customer service to help withstand brutal conditions in the global market.

...

Carlton Reid, an author on cycling issues and close observer of the sector, said the "cottage industry" of niche operators was less focused on meeting sales and revenue targets than the dominant bike brands Trek and Specialized of the US and Taiwan's Giant.

Manufacturers such as Moulton differentiate themselves by offering unique designs. Others offer products made with unusual materials such as titanium or that are personalised to individual customers' requirements.

...

Dan Farrell, Moulton's technical director, said it was relying on selling its bikes in small volumes but at high prices. It sells about 700 units a year, ranging from a £2,100 entry-level machine to a £21,950 "double-pylon" model made of stainless steel.

...

The approach of Atherton Bikes, based in Machynlleth, west Wales, is still more personalised, with each of the company's premium mountain bikes built to order. For its top-end "A" range, it uses 3D printers to produce titanium and carbon-fibre frame parts tailored to users' needs.

...

Reid said such an approach had proved successful for many high-value

UK bike brands. "They all have a certain price point where they're immune from the bottom-feeding," he said. "They have good margins and some of them have been going for a while."

Farrell agreed. There was enough demand for highly specialised bikes to keep operations like Moulton's going, he said. "Providing you're not thinking that you're going to sell millions of these things, you can charge a premium for it," he added. "So you can manufacture in what is a relatively expensive area.""

PMEs que se concentram em qualidade, personalização e design, com preços elevados para mercados de nicho, têm um caminho promissor, especialmente em países onde o custo de vida é alto e quase impossibilita a produção. Este modelo permite que as PMEs diferenciem os seus produtos e serviços, escapando da pressão dos preços baixos e das estratégias de volume que predominam entre os fabricantes grandes. Enquanto gigantes como Whirlpool apostam em alta produção e eficiência para manter competitividade, as empresas mais pequenas, como a Moulton Bicycle Company, vêem o nicho como uma oportunidade para se posicionarem com produtos de qualidade e exclusividade.

O foco em nichos de mercado significa investir em algo que o consumidor médio não está nem à procura nem disposto a pagar, mas que um público específico e exigente valoriza profundamente. Para esses clientes, o valor do produto está não apenas na sua função, mas também em aspectos como o design, a durabilidade, a personalização e até a experiência de compra. Isso permite que este tipo de PMEs trabalhem com margens mais altas e construam uma reputação de exclusividade e inovação.

Contudo, existem erros comuns que muitas PMEs cometem ao tentar trabalhar para nichos e que podem comprometer o sucesso da estratégia. Um dos principais é subestimar o custo e a complexidade de manter uma produção de alta qualidade e personalizada. Produtos de nicho exigem atenção ao detalhe e flexibilidade na cadeia de fornecimento, o que requer investimentos robustos e processos bem estruturados. Sem uma infraestrutura adequada, a empresa corre o risco de comprometer prazos e qualidade, frustrando os clientes.

Outro erro recorrente é a falta de compreensão do cliente-alvo. As PMEs de sucesso em nichos conhecem profundamente o seu público, mas muitas acabam por adoptar uma abordagem mais genérica, acreditando que qualidade é suficiente para atrair clientes. Esse desconhecimento leva a falhas em marketing, preço e distribuição. Para que um produto de nicho seja realmente valorizado, ele tem de estar alinhado com as necessidades e desejos específicos do cliente-alvo.

Além disso, algumas PMEs tentam crescer rapidamente para maximizar vendas, mas expandir sem uma base de clientes sólida e leal pode ser arriscado. Para essas empresas, aumentar a produção pode significar abrir mão da exclusividade e da personalização, pontos-chave para sua proposta de valor. Em vez de procurar volumes maiores, PMEs de nicho devem focar-se na construção de um relacionamento de longo prazo com os clientes, apostando na inovação e lealdade. Recordo sempre o exemplo da Frank Perdue Chicken Farms que recusou vender através da distribuição grande para poder criar a sua marca e manter margens. O contrário da Raporal.

segunda-feira, novembro 04, 2024

Curiosidade do dia

 



Atolados no presente

"Why We Get Stuck in the Present 

If Newton's first law is the law of inertia, it is also, alas, the first law of incumbent organizations. When they are at rest, they tend to stay at rest. And when they are moving in a certain direction, it requires a great deal of energy and effort to alter their courses. Most incumbent organizations are led by people who are much less future-facing than their founders.
...
In brief, if you want to understand a company's strategy, don't listen to what it says; look at where it spends its money. Disruption tends to start at the low end of the market and only gradually work itself upward; compared to what the core regularly delivers, disruptive products can seem less relevant at first, and hence more dispensable. That said, prioritizing the tried and true over the not-yet-known is not foolish or irrational; it's sound management until it's not, when disruptive developments are reaching full boil."

Dar prioridade ao que é “seguro” só é uma boa prática enquanto o mercado não muda de forma significativa. Para as PMEs, a “gestão prudente” deve ser equilibrada com uma abertura para a experimentação controlada. Isso pode significar realizar pilotos em áreas de inovação com um impacto mais modesto ou que ofereçam um ganho incremental, (pensamento estóico) possibilitando ao mesmo tempo o teste de novas abordagens que podem, mais tarde, levar a ganhos maiores em produtividade. 

No estoicismo, uma das práticas fundamentais é o preparatio malorum (preparação para dificuldades futuras), que incentiva a antecipação de possíveis cenários adversos. Esse pensamento lembra a necessidade de não confiar cegamente na "gestão prudente" que ignora o potencial de mudanças disruptivas. Assim como os estoicos incentivam a preparar a mente para o que pode acontecer de inesperado, as PMEs também devem estar prontas para responder a transformações no mercado que podem inicialmente parecer distantes, mas que se revelam inevitáveis.

Outro conceito estóico relevante é a flexibilidade mental e a capacidade de não se agarrar ao status quo. Para os estoicos, aceitar que o mundo e as circunstâncias estão em constante mudança permite que as pessoas ajam com serenidade, sem se paralisarem com o apego ao que é confortável.  


Trecho retirado de "Lead from the Future" de Josh Suskewicz.

domingo, novembro 03, 2024

Para reflexão

 

Imagem retirada do Twitter.

Curiosidade do dia

"Before the general election, Rachel Reeves told The Times:

"If I become chancellor, the next Labour government is going to be the most probusiness government this country has ever seen." Last Wednesday, she confirmed:

"Economic growth will be our mission for the duration of this parliament.""

Entretanto o orçamento inglês é apresentado e ...

Os Goa'uld nunca falham...



Acerca da importância da destruição criativa (parte III)


Parte I e parte II.

Ainda no segundo capítulo de "Creative destruction" de Phil Mullan, intitulado "Productivity in Decline", o autor aborda o tema da divergência entre os Estados Unidos e a Europa relativamente à evolução da produtividade, encontrando uma explicação diferente da avançada por Drahgi:

Em Creative Destruction, o autor atribui a falta de aumento da produtividade na Europa, em comparação com os Estados Unidos, a vários factores-chave:
  • Apesar da adopção generalizada das tecnologias de informação e comunicação (TIC) em ambos os lados do Atlântico, o crescimento da produtividade europeia continuou a abrandar. Robert Gordon defendeu que o aumento da produtividade nos EUA resultou de mais do que apenas as TIC, uma vez que as empresas europeias também utilizavam tecnologias semelhantes, como os PCs e os telefones móveis. De facto, a Europa estava à frente dos EUA em algumas áreas de adopção das TIC, como as redes de telefones móveis
  • Os EUA tinham uma maior dependência do consumo, particularmente impulsionada pelos gastos das famílias suportados em dívida. Esta economia centrada no consumo, especialmente no sector do retalho, contribuiu para uma parte substancial do diferencial de produtividade entre os EUA e a Europa.
  • O crescimento da produtividade nos EUA esteve fortemente concentrado em sectores específicos como o comércio grossista, retalhista e financeiro, onde as TIC foram amplamente utilizadas. No entanto, estes sectores tiveram um alcance limitado na economia em geral, indicando que o aumento da produtividade não foi tão generalizado ou transformador em todas as indústrias. 
Estas observações sugerem que as diferenças de produtividade têm menos a ver com as disparidades tecnológicas e mais com as diferenças estruturais e económicas entre os EUA e a Europa.