sábado, setembro 25, 2021

Contrarian!


"Tudo está a mudar e nós também precisamos de mudar e é nos períodos de dificuldades que devemos apostar em sermos diferentes"

Nope! 

É nos períodos de facilidades que devemos apostar em sermos diferentes. É nesses períodos que temos mais flexibilidade para falhar. Fazer experiências em períodos de dificuldade é arriscar tudo. A boa lição dos estóicos: aposta só o que podes perder na totalidade sem pôr em causa o teu empreendimento

""Numa feira deste género tem de haver um esforço da comunidade empresarial para garantir uma boa representação que dignifique a indústria. As pessoas têm que se saber reinventar, com stands mais pequenos, mas têm de estar presentes. Senão não dão força ao país nem motivação às outras empresas", defende."

Nope!

As empresas vão a uma feira para tratar da sua vida, não para representar a indústria ou o país. É como a treta dos agricultores terem de alimentar o mundo. Como escrevi aqui:

""A agricultura é a arte de produzir alimentos para a sociedade, [Moi ici: Estou farto de escrever aqui no blogue que a função do agricultor não é alimentar a sociedade, a função do agricultor é ganhar dinheiro através da prática da agricultura. A sociedade não quer saber dos agricultores, quer produtos agrícolas baratos nem que venham da Ucrânia. Por isso, o agricultor não deve ser trouxa e deve trabalhar para quem valoriza o fruto da sua actividade. Adiante]" 

Trechos retirados de "Sinais de retoma dão confiança aos industriais de calçado"

sexta-feira, setembro 24, 2021

"Como serão as conversas que decorrem nas empresas?"

Primeiro comecei por ler:
"The important point in these otherwise commonplace changes is that organizing keeps being reaccomplished. The organization keeps drifting toward disorganization and organizing keeps rebuilding it."
É tão fácil esquecermos isto... somos iludidos a acreditar numa realidade estável quando ... a estabilidade é uma ilusão, mesmo!

Depois recordei o Argus da Grécia Antiga e as empresas que não são, vão sendo! Tal como Ortega Y Gasset escreveu: não somos, vamos sendo. Só somos quando morremos.

Há dias escrevi "Como tornar Portugal mais competitivo?" onde usei esta figura:
Vamos admitir que as empresas não competitivas não têm futuro. Por isso, concentremo-nos nas empresas competitivas e analisemos a questão da produtividade.

Competitividade associada a baixa produtividade significa a sobrevivência das organizações no curto-prazo, mas a incapacidade de subir na escala de valor e, por exemplo, acompanhar o aumento do salário mínimo, ou ser capaz de atraír novos trabalhadores. 

Competitividade associada a alta produtividade significa subida na escala de valor.

Também esta semana escrevi "As organizações são as conversas que decorrem dentro delas". Como serão as conversas que decorrem nas empresas que se revêem nas palavras do presidente da CIP? Parece que a produtividade só pode crescer se o governo actuar. Talvez por isso, aprendi há muitos anos com Maliranta e o exemplo da Finlândia. A produtividade do agregado cresce sobretudo porque as empresas menos produtivas desaparecem, e não porque façam um esforço de melhoria. Recordar o exemplo para Jorge Marrão das 3 empresas e do impacte da que morre no agregado.

Por que é que Maliranta infelizmente tem razão? Por que a maioria das empresas, pelo menos a nível de gestão, tem as conversas alinhadas com a lista do presidente da CIP. E mesmo quando a vida lhes corre bem optam pelo satisficing, têm medo da instabilidade do desassossego, ou têm lacunas que não conseguem colmatar. Vender um produto a 10 com base no preço e nas especificações, não é o mesmo que vender um produto a 20 com base no potencial de valor que pode ajudar o cliente a criar. E esse produto a 20 e os seus clientes não são os mesmos que os que compram a 10, nem compram nas mesmas prateleiras.

Sem mudar as conversas não se começa contrariar Maliranta.

Mas então os impostos são baixos? Não!!! São altos, basta olhar para isto:
No entanto, acredito que não é por causa da incapacidade de acumular capital que a produtividade não cresce, ou que essa seja a principal restrição.

Trecho retirado de "Managing the Unexpected - Resilient Performance in an Age of Uncertainty" de Karl E. Weick e Kathleen M. Sutcliffe.

quinta-feira, setembro 23, 2021

As organizações são as conversas que decorrem dentro delas

"Given the dynamic quality of organizing, it is tough to locate just what “the organization” consists of. To make it easier, think about organizational communication and the conversations that embody much of it. Think of those distributed conversations as the site where organization emerges. And think of the things that people talk about at those sites as the textual surfaces from which the organization’s substance is read. If we set up organizing this way, then organizations are talked into existence (sites), they gain their substance from the content of the discussions that are produced there (surfaces), and they “become” the organization when macro actors summarize and speak on behalf of a sample of these conversations. These conversations create organizational reality; they don’t just represent an entity that is already there."

As organizações são as conversas que decorrem dentro delas ...

Que tipo de conversas decorrem dentro da sua organização? Qual a tendência principal?

Um outro trecho interessante sobre as organizações é este, talvez um pouco irónico:

"An alternative perspective [to that of the rational organization] on organizations holds that information is limited and serves largely to justify decisions or positions already taken; goals, preferences and effectiveness criteria are problematic and conflicting; organizations are loosely linked to their social environments; the rationality of various designs and decisions is inferred after the fact to make sense out of things that have already happened; organizations are coalitions of various interests; organization designs are frequently unplanned and are basically responses to contests among interests for control over the organization; and organization designs are in part ceremonial. This alternative perspective attempts explicitly to recognize the social nature of organizations." 

Primeira citação retirada de "Managing the Unexpected - Sustained Performance in a Complex World" de Karl E. Weick e Kathleen M. Sutcliffe.

Segunda citação retirada de “Who Gets Power—And How They Hold on to It: A Strategic-Contingency Model of Power,” de  Gerald R. Salancik e Jeffrey Pfeffer, publicado em Organizational Dynamics 5, no. 3 (1978): 3–21, 18–19.

quarta-feira, setembro 22, 2021

Como tornar Portugal mais competitivo?

Neste artigo, "Como tornar Portugal mais competitivo?", podem encontrar uma longa lista de propostas de acções, quase todas da responsabilidade do governo de turno, para tornar Portugal mais competitivo.

Atenção eu sou empresário, não tenho rede nem contactos políticos.

Reparem nas propostas do presidente da CIP:

"- Lançar urgentemente soluções, há muito prometidas, que promovam a capitalização das empresas e facilitem o acesso ao financiamento.  [Moi ici: Não me pronuncio porque isto pode ter uma interpretação benéfica, como ser um pedido de mais facilidade no acesso a crédito]

- Inverter a tendência de aumento da carga fiscal e corrigir os aspetos em que o sistema fiscal português se mostra mais desfavorável, tornando-o mais competitivo, mais previsível e simples.  [Moi ici: Lerolero para adormecer boi! A diminuição da carga fiscal é boa para aumentar lucros que podem ser canalizados para investimento. Aproveitar dominuição da carga fiscal para ganhar competitividade à custa de preços mais baixos é ... sem classificação]

- Apostar na qualificação e requalificação da força de trabalho e na sua permanente adequação às necessidades das empresas, com base no reforço e modernização do sistema de formação profissional. [Moi ici: Lerolero para adormecer boi! As empresas podem e devem apostar na qualificação e requalificação da sua força de trabalho, mas isso terá um impacte marginal na competitividade. Recordar a caridadezinha de 2008]

- Travar o contínuo surgimento de novas obrigações legais que implicam mais encargos para as empresas e libertá-las dos custos de contexto que constituem ainda um evidente fator de perda de competitividade. [Moi ici: Existirão obrigações legais absurdas e outras justas. No entanto, travar não significa tornar mais competitivo, apenas significa travar a erosão de competitividade por essa via]

- Promover um enquadramento sócio laboral que contribua para a melhoria da produtividade e competitividade da economia portuguesa, num clima de paz social." [Moi ici: Terá um impacte marginal na competitividade. Ainda me fez lembrar a grande esperança de Ricardo Salgado, à espera de boleias do governo para fazer o trabalho que ele não sabia promover]

Tudo isto são peaners. 

As propostas do presidente da CIP mantêm, quando muito, as empresas no quadrante inferior direito:


É possível ser pouco produtivo e competitivo (quadrante inferior direito), mas temos de evoluir para o quadrante superior direito.

Para tornar Portugal mais competitivo e muito mais produtivo vai ter de haver "sangue" (em sentido figurado). Muitas empresas terão de fechar para que os seus recursos, nomeadamente trabalhadores, sejam canalizados para empresas novas onde eles possam ganhar mais dinheiro porque essas empresas são mais competitivas e mais produtivas. Claro que essas empresas não competirão pelos clientes das empresas portuguesas, simplesmente estarão noutros segmentos de clientes e noutros sectores económicos. Que empresas serão essas? Sublinho do mesmo artigo as palavras de Pedro Braz Teixeira:

"Para aumentar a competitividade do país, é necessário criar condições para atrair Investimento Directo Externo (IDE)"

Recordo:

terça-feira, setembro 21, 2021

Curiosidade do dia

 E um Potemkin no governo. Não faz muito diferente.



"à custa de acumular com o seu uso mais conflitos para a hora seguinte"

Há tempos, a 28 de Agosto último, o jornal Público numa entrevista com José Eduardo Martins escreveu:

"Ao dr. Costa interessa tanto o que se vai passar daqui a três anos, como a mim o que se vai passar daqui a 300. O dr. Costa quer saber da semana que vem. O que é desesperante é que a direita nem a semana que vem percebe. Está a acontecer tanta coisa grave, estamos perante a última oportunidade… [Moi ici: Não concordo. Há sempre uma oportunidade, temos é de esperar pelo timing certo. Como escrevi há dias no Twitter: "este país tem de piorar antes de começar a melhorar. até lá é preciso deixar a situação apodrecer. não vale a pena ter ilusões ou até preocuparmos-nos com isso. quando o povo estiver maduro a mudança acontece, até lá é esperar" numa rotunda onde se simula que se anda, mas não se sai do sítio] Fomos perdendo lugares todos os anos, atrás de nós na União Europeia já só estão a Bulgária e a Roménia."

Hoje de manhã, enquanto caminhava relacionei este trecho com um texto de Ortega Y Gasset que citei aqui em 2006:

"o poder público, o governo, vive o dia-a dia; não se apresenta como um porvir franco, não significa um anúncio claro de futuro, não aparece como começo de algo cujo desenvolvimento ou evolução resulte imaginável. Em suma, vive sem programa de vida, sem projecto. Não sabe aonde vai porque, rigorosamente, não vai, não tem caminho, prefixado, trajectória antecipada. [Moi ici: Como não recordar as rotundas de Joaquim Aguiar?] Quando esse poder público tenta justificar-se, não alude para nada ao futuro, antes pelo contrário, encerra-se no presente e diz com perfeita sinceridade: "Sou um modo anormal de governo que é imposto pelas circunstâncias." Quer dizer, pela urgência do presente, não por cálculos do futuro. Daí que a sua actuação se reduza a esquivar o conflito de cada hora; não a resolvê-lo, mas a escapar dele para já, empregando seja que meios forem, mesmo à custa de acumular com o seu uso mais conflitos para a hora seguinte. O poder público sempre foi assim quando exercido directamente pelas massas: omnipotente e efémero.

O homem-massa é o homem cuja vida carece de projecto e anda à deriva. Por isso não constrói nada, mesmo que as suas possibilidades, os seus poderes, sejam enormes."

Este "à custa de acumular com o seu uso mais conflitos para a hora seguinte" é um tema que encontro recorrentemente em Karl Weick. Ainda ontem li:

"Small events have large consequences. Small discrepancies give off small clues that are hard to spot but easy to treat if they are spotted. When clues become much more visible, they are that much harder to treat. Managing the unexpected often means that people have to make strong responses to weak signals, something that is counterintuitive and not very “heroic.” Normally, we make weak responses to weak signals and strong responses to strong signals." [Moi ici: Há anos escrevi aqui no blogue sobre esta doença nacional. Tratamento sintomático que alimenta o problema de fundo que vai engordando nos bastidores]


segunda-feira, setembro 20, 2021

“When do I know it is time to rethink my strategy?”

Um artigo interessante e com um bom timing, "Strategy in the Face of Discontinuity To Do, Or Not To Do?", de Roger Martin. Recomendo a leitura:

"“When do I know it is time to rethink my strategy?” 

...

In due course, nearly every company will face some sort of discontinuity. It could be a discontinuity in the business environment due to government change as with Peru. But equally, the discontinuity can occur due to the arrival of a new technology — the automobile, the transistor, the digital switch, the Internet. 

...

It is difficult for a company facing one of these discontinuities to know how to respond. It doesn’t want to be in the position of acting as if the sky is falling and totally throwing out its strategy when that isn’t either necessary or productive. But equally, it doesn’t want to be the next Blockbuster and be written up as the ultimate case study in sticking your head in the sand until you die.

To do or not to do? Do you significantly alter your strategy, or do you stick it out with the current strategy? That is the question."

Depois, Roger Martin apresenta a sua proposta de abordagem à pergunta seguindo a sua técnica: "what would have to be true?" 



domingo, setembro 19, 2021

Good riddance!

No primeiro trimestre de 2021, preços da electricidade:

Na semana passada:

Entretanto, os DDT do lado industrial, malta que externaliza custos com a ajuda dos governos de turno, começam a ensaiar o choradinho dos apoios "Navigator admite cortar investimento em Portugal por causa dos preços da energia". Até parece que a energia só fica mais cara para os meninos.

Boa viagem!
 


Para reflexão

De um lado "¿Qué fue de la bomba P, la catástrofe de la superpoblación?",  do outro "La "regla del 85": el inusitado futuro demográfico de la humanidad".

Faz-me recordar Paul Feyerabend em "Against Method":

"Knowledge so conceived is not a series of self-consistent theories that converge towards an ideal view; it is not a gradual approach to the truth. It is rather an ever-increasing ocean of mutually incompatible alternatives, each single theory, each fairy-tale, each myth that is part of the collection forcing others into greater articulation and all of them contributing, via this process of competition, to the development of our consciousness. Nothing is ever settled, no view can ever be omitted from a comprehensive account."

O que por sua vez me faz recordar a Via Negativa que aprendi em Antifragile de Nassim Taleb:

"what is called in Latin via negativa, the negative way, after theological traditions, particularly in the Eastern Orthodox Church. Via negativa does not try to express what God is - leave that to the primitive brand of contemporary thinkers and philosophasters with scientistic tendencies. It just lists what God is not and proceeds by the process of elimination." 

Tanta gente cheia de certezas... parecem-se comigo quando eu tinha 18 anos. Entretanto, vivi mais 40 anos. 



sábado, setembro 18, 2021

É tão fácil e instintivo bater no bombo da festa... (parte III)

Parte I e parte II.


A propósito deste feito (Lisboa-Faro em 100 minutos de carro), deixem-me terminar esta série sobre o "sharp end", o condutor, e o "blunt end", a personalidade em causa na foto. 

Imaginem que havia um acidente, imaginem que matavam ou morria alguém, imaginem que havia um inquérito às causas do acidente.

Facilmente recolhem elementos acerca da velocidade a que o bólide circulava. Facilmente relacionariam o acidente com o excesso de velocidade. Quem conduzia o bólide? A personalidade? Não!!! Quem conduzia o bólide? Quem tinha o pé no acelerador? O condutor!!!

"These are situations in which practitioners have the responsibility for the outcome but lack the authority to take the actions they see as necessary. Regardless of how the practitioners resolve a trade-off, from hindsight they are vulnerable to charges of and penalties for error."

Imaginem artisticamente um diálogo deste tipo:

- Tenho de estar em Faro daqui a hora e meia! (um objectivo)

- Hora e meia para fazer 280 km!!! E as multas? (outro objectivo, evitar multas)

- Tenho de estar em Faro daqui a hora e meia! (um objectivo)

- E a segurança? Circular a tão alta velocidade durante tanto tempo é perigoso! (outro objectivo, segurança)

- Tenho de estar em Faro daqui a hora e meia! (um objectivo) E há mais candidatos na sede do partido para serem condutores (assumo aqui que o condutor é um militante e não um motorista do governo)

Pensamento do condutor: Não posso perder esta oportunidade de servir a personalidade, se fizer um bom serviço consigo uma cunha para aquele lugar na junta de freguesia) (outro objectivo)

Estão a ver o que escrevi na parte I?

"fez-me recordar várias situações onde visualizei os trabalhadores sujeitos a objectivos conflituantes e a constrangimentos impostos pelo "blunt end" mas que nunca são referidos quando há um acidente."

Agora vocês são os investigadores têm de responder a perguntas objectivamente:

  • quem ía ao volante?
  • alguém obrigou o condutor a circular a alta velocidade?

 Agora pensem nas situações que acontecem todos os dias em linhas de produção, em armazéns, em salas de design, em blocos operatórios, nos serviços de limpeza de um centro comercial... tantos bombos da festa ... óptimos para arcar com "culpa", com responsabilidade.

Coitada da personalidade, da chefe, do director, da encarregada, postas em perigo ou em cheque por uns irresponsáveis que não cumprem as regras



sexta-feira, setembro 17, 2021

É tão fácil e instintivo bater no bombo da festa... (parte II)

Parte I.

Ainda acerca do capítulo que ando a ler, após recomendação de Karl Weick, "13 Operating at the Sharp End: The Complexity of  Human Error" de Richard I. Cook e David D. Woods, mais uns trechos acerca dos bombos da festa:

"These are situations in which practitioners have the responsibility for the outcome but lack the authority to take the actions they see as necessary. Regardless of how the practitioners resolve a trade-off, from hindsight they are vulnerable to charges of and penalties for error

...

The results of research on the role of responsibility and authority are limited but consistent-splitting authority and responsibility appears to have bad consequences for the ability of operational systems to handle variability and surprises that go beyond preplanned routines

...

Together the conflicts produce a situation for the practitioner that appears to be a maze of potential pitfalls. This combination of pressures and goals that produce a conflicted environment for work is what we call the n-tuple bind. ' The practitioner is confronted with the need to follow a single course of action from a myriad of possible courses. The choice of how to proceed is constrained by both the technical characteristics of the domain and the need to satisfy the "correct" set of goals at a given moment chosen from the many potentially relevant ones. This is an example of an overconstrained problem, one in which it is impossible to maximize the function or work product on all dimensions simultaneously. Unlike simple laboratory worlds with a "best" choice, real complex systems intrinsically contain conflicts that must be resolved by the practitioners at the sharp end. Retrospective critiques of the choices made in system operation will always be informed by hindsight."

quinta-feira, setembro 16, 2021

É tão fácil e instintivo bater no bombo da festa...

A propósito deste artigo, "Morreu de enfarte após três horas à espera nas urgências de Braga" recordei um capítulo que ando a ler, após recomendação de Karl Weick, "13 Operating at the Sharp End: The Complexity of  Human Error" de Richard I. Cook e David D. Woods.

"Studies of incidents in medicine and other fields attribute most bad outcomes to a category of human performance labeled human error.

...

Generally, the "human" referred to when an incident is ascribed to human error is some individual or team of practitioners who work at what Reason calls the "sharp end" of the system.

...

Those at the "blunt end" of the system, to continue Reason's analogy, affect safety through their effect on the constraints and resources acting on the practitioners at the sharp end. The blunt end includes the managers, system architects, designers, and suppliers of technology. In medicine, the blunt end includes government regulators, hospital administrators, nursing managers, and insurance companies. In order to understand the sources of expertise and error at the sharp end, one must also examine this larger system to see how resources and constraints at the blunt end shape the behavior of sharp end practitioners."

Ao ler esta referência ao ""blunt end" of the system" fez-me recordar várias situações onde visualizei os trabalhadores sujeitos a objectivos conflituantes e a constrangimentos impostos pelo "blunt end" mas que nunca são referidos quando há um acidente. O capítulo uso três casos sobre os quais depois discorre.Um deles, se calhar é aplicável ao caso do hospital de Braga:

"On a weekend in a large tertiary care hospital, the anesthesiology team (consisting of four physicians of whom three are residents in training) was called on to perform anesthetics for an in vitro fertilization, a perforated viscus, reconstruction of an artery of the leg, and an appendectomy, in one building, and one exploratory laparotomy in another building. Each of these cases was an emergency, that is, a case that cannot be delayed for the regular daily operating room schedule. The exact sequence in which the cases were done depended on multiple factors. The situation was complicated by a demanding nurse who insisted that the exploratory laparotomy be done ahead of other cases. The nurse was only responsible for that single case; the operating room nurses and technicians for that case could not leave the hospital until the case had been completed. The surgeons complained that they were being delayed and their cases were increasing in urgency because of the passage of time. There were also some delays in preoperative preparation of some of the patients for surgery. In the primary operating room suites, the staff of nurses and technicians were only able to run two operating rooms simultaneously. The anesthesiologist in charge was under pressure to attempt to overlap portions of procedures by starting one case as another was finishing so as use the available resources maximally. The hospital also served as a major trauma center, which means that the team needed to be able to a start a large emergency case with minimal (less than 10 minutes) notice. In committing all of the residents to doing the waiting cases, the anesthesiologist in charge produced a situation in which there were no anesthetists available to start a major trauma case. There were no trauma cases, and all the surgeries were accomplished. Remarkably, the situation was so common in the institution that it was regarded by many as typical rather than exceptional."

Desta vez correu bem, mas podia ter corrido mal e a culpa era de quem?

"The conflicts and their resolution presented in Incident #3 and the trade-offs between highly unlikely but highly undesirable events and highly likely but less catastrophic ones are examples of strategic factors. People have to make trade-offs between different but interacting or conflicting goals, between values or costs placed on different possible outcomes or courses of action, and between the risks of different errors. People make these trade-offs when acting under uncertainty, risk, and the pressure of limited resources (e.g., time pressure, opportunity costs)."

É tão fácil e instintivo bater no bombo da festa... Não consigo esquecer aquele:

"O executivo regional está a oferecer-lhe uma recompensação de 215 mil euros, afirmando que é impossível “descobrir o culpado”

quarta-feira, setembro 15, 2021

"It is running out of people"

Ontem à noite o WSJ trazia este artigo, "Depopulation Hits Latvia Economy Hard" onde sublinhei:

"This year, with its population at roughly half of what it was in 1990, Dagda County was deemed too small to support a local government and merged with a nearby county.

“The only people still around here are retired,” said Ms. Frolova, 59 years old. Latvia is on the front line of what could become one of the defining challenges for the industrialized world: It is running out of people.

From Portugal to Singapore and across most of the Americas, birthrates are falling, and population growth in the industrialized world has stalled or reversed. That prospect brings with it the specter of a shrinking labor force, an aging population and stagnant economic growth."

Ontem durante o dia estive numa empresa em Felgueiras em que o empresário me contou que durante as férias de Verão 4 trabalhadores despediram-se para ir trabalhar para a Suiça.

BTW, o meu lado cínico leva a melhor e obriga-me a perguntar: então, o encolhimento da população mundial não é bom para o futuro do planeta? Os governos não afirmam estarmos perante uma emergência climática? Se houver menos humanos ... ergo 


Não vamos pôr os desejos egoístas dos futuros reformados à frente do bem-estar do planeta, pois não?

 

Uma sistematização interessante

Um artigo, "Three Ways to Sell Value in B2B Markets" publicado no número de Outono da revista MIT Sloan Management Review:

"we suggest that rather than viewing VBS as a single strategy, vendors should choose from three different approaches. Our findings suggest that vendors can adopt either a product-centric, customer process-centric, or performance-centric VBS approach.

...

VBS is based on demonstrating and documenting the monetary worth of the economic, technical, service, and social benefits a specific customer receives in exchange for the price that customer pays. This is a powerful marketing approach, because ultimately, B2B customers purchase goods and services to reduce their costs or boost their own revenues."

Uma sistematização interessante. 

terça-feira, setembro 14, 2021

Curiosidade do dia

Os sindicatos reivindicam aumentos salariais para a função pública. No entanto, mesmo sem mexer em nada, só pela inércia, o governo prevê um acréscimo de despesa de 580 milhões de euros com salários dos funcionários públicos em 2022.

No entanto, qual o ângulo que os jornais "so-called" económicos resolveram usar para tratar o tema?


Querem que as pessoas comam gelados com a testa a toda a força.




Era uma questão de tempo. Todos vão perder!

Ontem encontrei "Alemães contra agricultura intensiva boicotam fruta de estufas do Alentejo e Algarve"

Era uma questão de tempo

É a generalização do que me aconteceu "E sem intenção, e sem querer, apareceu na minha mente a decisão de pôr de lado o azeite alentejano" (Junho de 2019)

No entanto, havia uma alternativa. Nunca morri de amores por Assunção Cristas. No entanto, nunca me esqueci de um discurso que alguém lhe terá escrito(?) e que ela proferiu enquanto ministra da Agricultura. Na altura, Dezembro de 2014, escrevi este postal, "Ter razão antes do mainstream é tramado" onde escrevi:

"Ontem, li que a ministra da Agricultura disse "Cristas quer colar a Portugal o rótulo de país da "joalharia da agricultura"".

Alto e pára tudo!

Joalharia?!

Segundo a wikipédia: Joalharia é a arte de produção de jóias que envolve todos os aparatos ornamentais, tipicamente feitos com gemas e metais preciosos.

Ou seja, uma metáfora para significar que o que a agricultura produz é algo de precioso, é algo de valioso. Para ser valioso, tem de ser escasso..."

Um país pequeno não pode competir pelo preço mais baixo, não pode seguir a estratégia cancerosa das produções intensivas e super-intensivas.

Algo na linha do que aprendi em Junho de 2014 e registei neste postal "A marca de Portugal", onde citei:

"O cliente era russo. E a distinção que desejava era anti-massificação. "Vendemos hortícolas para a Rússia em que nos exigiram a colocação de uma bandeira portuguesa para não sermos confundidos com os produtos espanhóis que naquele mercado estão muito massificados""

Entretanto, o rumo da agricultura em Portugal foi outro. Avançou-se para um paraíso de culturas intensivas e super-intensivas. A nova "Galinha dos Ovos de Ouro" (Novembro de 2019).

Não é preciso ser bruxo para adivinhar onde esta abordagem nos vai levar. Escrevi sobre ela em "Todos vão perder" (Maio de 2019). 

segunda-feira, setembro 13, 2021

Prisioneiros de justificações

Em "Making Sense of the Organization, Volume 2 - The Impermanent Organization" de Karl E. Weick encontrei este trecho:

"The BRI [Bristol Royal Infirmary] culture is one in which people share the practice “of explaining or justifying . . . mediocre or poor results on the basis of case severity rather than directing attention to producing better results.” The prevailing explanation for bad results at BRI is not “we are doing something wrong and need to improve,” but rather that these are “bad patients . . . and we are doing our best.”
...
Cultural entrapment means the process by which people get locked into lines of action, subsequently justify those lines of action, and search for confirmation that they are doing what they should be doing. When people are caught up in this sequence, they overlook important cues that things are not as they think they are."

 E porque é que as pessoas ficam prisioneiras destas práticas?

"“Commitment binds an individual to his or her behavior. The behavior becomes an undeniable and unchangeable aspect of the person’s world, and when he makes sense of the environment, behavior is the point on which constructions or interpretations are based. This process can be described as a rationalizing process, in which behavior is rationalized by referring to features of the environment which support it. Such sensemaking also occurs in a social context in which norms and expectations affect the rationalizations developed for behavior, and this can be described as a process of legitimating behavior. People develop acceptable justifications for their behavior as a way of making such behavior meaningful and explainable.”"

domingo, setembro 12, 2021

A memória é um guia

Ainda há dias escrevi:

"Joaquim Aguiar costuma escrever que não se pode seguir em frente sem primeiro reconhecer os erros do passado. Por isso, ele usa a metáfora das rotundas. O país está numa rotunda há mais de 20 anos, focado na distribuição de riqueza que é gerada por outros povos e que se transforma em dívida para as gerações de escravos no futuro."

Fez ontem um mês que escrevi:

"Joaquim Aguiar costuma falar e escrever acerca da necessidade imperiosa de reconhecer e falar a verdade acerca do que nos levou a um desastre, para podermos ultrapassar esse desastre. Quando se mascara e maquilha a realidade, para evitar falar do que nos levou ao desastre, não conseguimos seguir em frente, ficamos condenados a dar voltas a uma rotunda que nos traz empobrecimento, apesar dos amanhãs que cantam segundo os chefes e seus acólitos."

 O postal de ontem levou-me a rever os meus sublinhados de "12 Rules for Life: An Antidote to Chaos" de Jordan Peterson.

"Who are you? What did you do? What happened?” What was the objective truth? There was no way of knowing the objective truth. And there never would be. There was no objective observer, and there never would be. There was no complete and accurate story. Such a thing did not and could not exist. There were, and are, only partial accounts and fragmentary viewpoints. But some are still better than others. Memory is not a description of the objective past. Memory is a tool. Memory is the past’s guide to the future. If you remember that something bad happened, and you can figure out why, then you can try to avoid that bad thing happening again. That’s the purpose of memory. It’s not “to remember the past.” It’s to stop the same damn thing from happening over and over."

Imagem daqui


sábado, setembro 11, 2021

Hierarquias

"Systems contain people and roles with differing amounts of power, which is significant for requisite variety because ‘ power makes people stupid’. In situations with large power differentials, people with more power have the freedom to define reality, which means they need to spend less time trying to understand how reality is constructed. Mind, intellect, and alertness tend to be marginalized by powerful people. The result is a loss of variety. Fewer justifications may be formulated for interventions, which leaves associates in the dark as to what is being attempted and why. Less documentation may be prepared which makes for less continuity of care. Modifications in the direction of power equalization have the opposite effects and increase variety. While the language of ‘empowerment’ has come to sound contrived and manipulative, the move toward self-management and a more equal distribution of power, however one chooses to label it, is a change toward enacting more variety into teams that now face sicker patients."

Ontem de manhã, li isto na margem do Douro antes de seguir para Felgueiras. Em Felgueiras o meu interlocutor mandou-me um texto por e-mail que acabei a ler à noite, "Zappos: o trágico fim do criador da 'empresa mais feliz do mundo'":

"Mas, à medida que a empresa crescia, ela lutava com o problema interno de hierarquia. Como grandes grupos de seres humanos poderiam fazer coisas sem grandes chefes os dirigindo? E uma vez que você começasse a dar poder a esses chefes, o que aconteceria com a felicidade e a criatividade daqueles que são forçados a seguir ordens?

...

Hsieh achava que uma maneira de salvar a felicidade era estrangulando hierarquias.

"Tony foi a uma conferência e voltou muito animado com a ideia da holocracia", disse Gonzales-Black.

...

Holocracia é uma forma profundamente descentralizada de administrar uma empresa. Não há patrões e nem mesmo cargos.

A hierarquia tradicional é completamente abandonada. Em vez disso, existem círculos, equipes autogeridas que desenvolvem projetos. Os funcionários escolhem em quais círculos trabalhar e, muitas vezes, trabalham em vários.

...

No início, parecia um grande sucesso. Mas o tempo mostrou que as pessoas gostam de hierarquias.

Em empresas como a Zappos, a ausência de regras formais ocultava uma estrutura de poder nociva. Não havia freios e contrapesos. Os mais poderosos podiam satisfazer seus caprichos com poucos limites.[Mo ici: Como isto me faz lembrar as descrições que familiar, funcionário público, me faz sobre o seu local de trabalho. Chefias que ocupam o lugar porque ... ninguém sabe. Não exercem poder, funcionários marcam férias todos ao mesmo tempo, funcionários saem às horas que querem e não têm falta, funcionários marcam consultas médicas sucessivas sem nunca descontarem as horas, funcionários fazem as tarefas que mais gostam e deixam para os novatos as outras]

"Muitas pessoas se sentiram presas e intimidadas por aqueles que entendiam o sistema. O que Tony fez não foi criar uma estrutura plana, uma administração plana, mas um sistema no qual ele era o chefe e todo o resto ficava abaixo dele. Não era democrático. Ele era essencialmente um rei", acrescenta Bradley Carr.

A ironia é que, ao buscar igualdade perfeita, ele inadvertidamente criou o oposto.

Em 2018, a Zappos começou silenciosamente a abandonar a holocracia.

Em 2020, um Hsieh cada vez mais errático deixou a empresa. Seu sonho havia morrido."

E o que vou escrever a seguir é mesmo verdade. Depois de chegar a casa, enquanto fazia exercício, assisti a este vídeo. Onde mais uma vez Jordan Peterson foi confrontado com as lagostas e a hierarquia.

Trecho inicial retirado de "Making Sense of the Organization, Volume 2 - The Impermanent Organization" de Karl E. Weick. 

sexta-feira, setembro 10, 2021

Continua a treta do erro humano

Ontem, duas estórias:

Na TSF, "Ministra rejeita acusações de "berros" e "bullying" contra funcionários de Loja do Cidadão":

"Alexandra Leitão, ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, é acusada pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e Notariado de ter "destratado" os trabalhadores de uma Loja do Cidadão, dados os tempos de espera registados no serviço. 

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"A senhora ministra, tanto quanto sabemos, começou aos berros contra os funcionários, porque havia filas, porque um senhor estava à espera há 11 horas para ser atendido..."

No Jornal de Notícias, "Jovem trocada à nascença em 2002 pede indemnização de três milhões de euros":

"Em 2002, no antigo hospital de São Millán, em Logroño, duas bebés, nascidas no mesmo dia, com apenas cinco horas de diferença, foram trocadas depois de terem passado pela incubadora porque nasceram abaixo do peso. Nesse momento, devido a um erro humano, as recém-nascidas ainda a ganhar forças nos berços 6 e 7 foram trocadas. 

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Uma das duas meninas, agora jovem, descobriu o escândalo graças a um teste de ADN que confirmou não ser filha dos supostos pais. A mulher de 19 anos decidiu denunciar a situação ao departamento de saúde de La Rioja, a quem pede uma indemnização de três milhões de euros por danos morais. O executivo regional está a oferecer-lhe uma recompensação de 215 mil euros, afirmando que é impossível “descobrir o culpado”.

Recordar o que já escrevi aqui sobre a treta do erro humano (alguns dos postais):´

Chamo a especial a atenção para o postal de 2006:
"As instituições que, analisando um qualquer acidente, se ficam pelo modelo de “culpa individual” perdem a possibilidade de alterar o “sistema” e melhorar a segurança pela introdução de novas políticas que tornem novos erros menos prováveis. Ao punir, simplesmente, um indivíduo a organização nega de forma subliminar a sua responsabilidade no evento negativo, mas não o corrige verdadeiramente. É o princípio da negação dos acidentes, que caracteriza as organizações demasiado burocratizadas e sem abertura a qualquer processo de inovação regenerativa. Face a um acidente que ocorre, a tendência é isolá-lo, punir o responsável mais directo, impedir a divulgação do facto e, seguir em frente, após ter tomado medidas limitadas a nível local."

Já agora, convido a ouvir este vídeo, referido aqui:

37:32 - Kathy I'm wondering what Sanae Charro's general take on after somebody or an organization has screwed up in punishment well I mean they try not to punish the individual I mean the the whole thinking and somebody talked about the Swiss cheese model the idea that generally there's not one single single cause of accidents so in many organizations they try to not punish the individual at the sharp end of the stick of course that doesn't always happen but for example hospitals the hospitals that I know about say emergency departments and and intensive care units they're trying to understand the systemic components that contribute to errors rather than punishing a single individual now you know there are political consequences and and other consequences to that so it's sometimes difficult to implement but I think I think organizations are really trying to get away from punishing individuals that's not to say that there aren't times when there is malfeasance or is or there is some actual bad behavior and I think some people have written about that in those cases then you of course you have to punish people if that is the case but just for for events that occur that were unexpected and they don't necessarily one person wasn't the cause they're generally trying not to punish people"