quinta-feira, maio 14, 2020

O low-cost como um aliado

Ontem em "Good Entrepreneurs Don’t Set Out to Disrupt" sublinhei:
"Our path of disruption has not been one of destruction. This surprised me, and so I looked back on some of the great entrepreneurs of history to see if their paths had been destructive ones, or expansive ones. I learned that the vast majority of entrepreneurial ventures did not steal their customers from any established business, but rather brought new people into a market, as we did.
...
When Southwest Airlines was beginning, the prevailing “wisdom” was that only the well-off wanted to fly places.
...
“When we went into the Dallas–Houston market in ’71 it was the thirty-fourth largest market in the United States. We were there one year and it grew to be the fifth largest. So in other words, we were just taking all of these people that had never flown and putting them on airplanes for the first time. But the remarkable thing is that all the other carriers increased their traffic on that route as well. We weren’t taking business from anyone, we were growing the market.”"
Sorri e recordei o que aprendi em 2015:

"acerca do papel dos modelos de negócio low-cost para atraírem novos clientes, novos utilizadores, para o sector. Clientes que depois podem evoluir nas suas necessidades e serem atraídos por outras empresas com outras propostas de valor mais elaboradas
...
Portanto, os modelos low-cost podem ser seus aliados, se não os quiser copiar. Podem ser seus aliados se surgir como uma extensão natural para os que entraram pelo low-cost mas descobriram que querem experiências mais elaboradas"
E que depois refinei introduzindo o conceito de mineração:

"o seu negócio não é low-cost? Então, agradeça aos membros low-cost o trabalho de "mineração" que fazem, eles criam os seus potenciais futuros clientes. Eles "ensinam-lhes" o bê-à-bá da actividade. Depois, alguns ficarão sempre por aí, mas outros ganharão uma paixão e sentirão uma necessidade genuína de subir para outros desafios. É aí que entra a sua empresa, dedicada a servir um grupo que quer mais do que o básico. Para isso, precisa de ter uma estratégia clara e estar alinhado com ela."


Um parêntesis (IId)

Parte IParte IIaParte IIb e Parte IIc.


Por que é que escrevi que esta versão do BSC 3.0 não é a minha versão?

Vejamos a lógica do encadeamento das perspectivas do BSC:
Nota: Logo desde a primeira vez que usei o BSC num projecto que abandonei a designação de Perspectiva de Aprendizagem e Crescimento para adoptar a designação Perspectiva de Recursos e infra-estruturas.

Atentemos primeiro na perspectiva dos Processos internos:
O que esta perspectiva nos diz é que há um conjunto de processos onde devemos trabalhar para ser excelentes. A excelência nesse conjunto de processos é preciosa para a execução da estratégia, mas atenção: Não devemos trabalhar para que todos os processos sejam excelentes. Procurar ser excelente em processos que não cativam os clientes-alvo é um desperdício de recursos. Há muitos anos que divido o conjunto de processos que compõe o modelo de funcionamento de uma organização em dois grupos:

  • Os processos de contexto - processos que têm de existir, mas onde basta ser eficiente. Ou seja, basta cumprir sem asneiras;
  • Os processos críticos - processos fundamentais para a execução de uma estratégia. Ser excelente nestes processos é muito importante.

Os processos internos no BSC são os processos críticos, e a perspectiva dos processos críticos, inclui os objectivos estratégicos que devem ser atingidos trabalhando em um ou mais desses processos críticos.

Quando trabalhamos com processos e equacionamos a sua caracterização costumamos usar a figura da tartaruga:
Que pode ser pormenorizada assim:
Esta versão da tartaruga permite explicar a relação entre a perspectiva de recursos e infraestruturas e a  perspectiva de processos:
Assim temos:
Daí, ao olhar para a perspectiva de recursos e infraestruturas dizer: onde vamos, onde temos de investir, para poder aspirar a processos internos críticos excelentes.

O que é que acontece se os processos críticos tiverem um desempenho excelente?

Podemos aspirar a, como consequência, ter bons resultados a nível de clientes. Bons resultados a nível de clientes-alvo, permitem-nos, como consequência, aspirar a bons resultados a nível financeiro. Ou seja, como vejo as coisas, as iniciativas estratégicas, projectos para transformar a realidade da organização, ou actuam sobre os recursos e infraestruturas, ou actuam sobre os processos internos, não modificam as perspectivas clientes ou financeira.

Assim, o meu BSC é melhor descrito por esta imagem:

E se repararem, podemos ter iniciativas a actuar sobre mais do que uma perspectiva em simultâneo.

Aproveito o parêntesis para comentar um exemplo que se pode encontrar numa tese de mestrado na internet, a mesma do BSC 1.0 na parte IIa. Apresento só um exemplo, mas infelizmente podia apresentar mais, o que só ilustra a falta de cuidado e investimento nestes temas. Por exemplo:
O que é que se entende por "Aumento da qualidade dos produtos"?

Será ter produtos com mais atributos, produtos mais caros, produtos mais inovadores?

Ou será ter produtos com menos custos, produtos com menos defeitos durante a produção?

Os indicadores estratégicos não ajudam a decifrar o desafio e a iniciativa também não:
Meter os dois tipos de indicadores e de desafios na iniciativa transmitem, de certa forma, uma imagem de esquizofrenia, apelam a que a organização trabalhe em duas vertentes opostas.

Vamos admitir que a orientação estratégica é mais qualidade através de mais inovação. Então o controlo dos defeitos não é importante? É, mas não é estratégico. Os defeitos devem ser monitorizados a nível operacional, mas não ocupar largura de banda da atenção da gestão de topo. Podemos ter um desempenho excepcional a nível dos defeitos e falhar a execução estratégica ao desenvolver produtos da treta.
Apostar na inovação e ter um desempenho trágico ao nível dos defeitos talvez seja sintoma de que a orientação estratégica seguida é incompatível com a cultura da organização.

A verdade é que ter os dois tipos de mensagens num BSC contribuí para diluir o foco no que é essencial.

Continua com mais duas hibridizações a nível da monitorização, mais algo que diz respeito à minha evolução.

quarta-feira, maio 13, 2020

Em vez de comando e controlo

Em Covid-19 - Direcção e iteração colaborativa escrevi sobre a diferença entre emergências de rotina e emergências de crise, e sobre a ineficácia do comando e controlo em emergências de crise.

Ontem encontrei:
"Glen Walter, president, North America, for Mondelez, the snack-maker, said the group started by allowing existing teams to take on the extra responsibility of tackling the crisis.
...
Mondelez created a “framework that allowed a smaller central group to identify strategically a much smaller set of priorities . . . so leaders down in the organisation could move with speed and agility”.
...
Existing management teams have vastly increased the frequency of interactions, with the
help of online tools.
...
he is “very hands-on, but only from an insight and guidance point of view, not a ‘doing’ point of view”.
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The balance is hard to strike. If leaders try and retain too much control, or avoid decisionmaking, they cause bottlenecks and delay response,
...
“Leaders benefit from loosening control during crises, enabling staff to creatively and intuitively respond to an uncertain and unknown situation,”"
Trechos retirados de "How to carry your business through the pandemic"

Acreditar nas pessoas

Ao ver esta proposta de cartaz:


Pensei em mais uma oportunidade para a venezuelização entrar na nossa sociedade, com a introdução de regras absurdas numa lógica de top down, dos papás para as crianças.

E recuei a Agosto de 2010, sentado no pátio da minha casa em Estarreja, a ver este vídeo pela primeira vez:


Como se escreve na introdução:
"A fun game that shows how chaos dynamics and complexity theory works.  It shows how self-organisation can get better results than leader directed organisation within a complex task." 
Em vez de detalhar todas as regras e micro-regras, estabelecer princípios gerais e deixar o bottom-up funcionar.

Acreditar nas pessoas em vez de as tratar e considerar como crianças.

BTW, para um libertário em construção como eu, a introdução de regras absurdas tem a vantagem de converter mais algumas pessoas à liberdade, e o inconveniente de criar mais pides, gente mais interessada em aconselhar Salomão a matar o bebé do que a salvá-lo.

terça-feira, maio 12, 2020

E a zombificação?

O que será melhor para uma economia, um choque violento onde um grande número de empresas morre, o capital é desviado para opções mais rentáveis, e as pessoas ficam livres para desafios mais recompensadores?

Ou um grande número de empresas-zombies, que vivem de apoios e subsídios, mantêm o capital preso a projectos que talvez tenham expirado o seu prazo de validade, e mantêm as pessoas presas por lealdade com salários de miséria, que hesitam em sair da zona de conforto do conhecido?

Ontem no WSJ li:
"Factory furloughs are becoming permanent closings, a sign of the heavy damage the coronavirus pandemic and shutdowns are exerting on the industrial economy.
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Makers of dishware in North Carolina, furniture foam in Oregon and cutting boards in Michigan are among the companies closing factories in recent weeks. Caterpillar Inc. said it is considering closing plants in Germany, boat-and-motorcyclemaker Polaris Inc. plans to close a plant in Syracuse, Ind., and tire maker Goodyear Tire & Rubber Co. plans to close a plant in Gadsden, Ala.
...
It isn’t just manufacturing. While aerospace suppliers General Electric Co. and Raytheon Technologies Corp. have announced job cuts or said they planned to reduce head count, so have Uber Technologies Inc. and Airbnb Inc. MGM Resorts International warned that some of the 63,000 employees it has furloughed may be let go permanently starting in August. Joblistings site Glassdoor and United Airlines Holdings Inc. also said they had reduced jobs or planned to do so.
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The burst of job-cut announcements indicates many companies are bearing down for a sustained slowdown. Some are also using the moment to accelerate strategic shifts. In April, payrolls fell by a record 20.5 million, erasing a decade of job gains.

The factory closures suggest a growing share of the record job losses in recent weeks won’t be temporary, said Gabriel Ehrlich, an economic forecaster at the University of Michigan. The more that job losses turn from temporary to permanent, he said, the harder the hit to consumer spending and every company that relies on it—including manufacturers.
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“The higher the proportion of permanent layoffs, the worse the chances of a strong recovery start to look,” Mr. Ehrlich said."

Como evoluiu o BSC? (IIc)

Parte IParte IIa e Parte IIb.

Nestas partes IIb) e IIc) relato não tanto a evolução do BSC mas a minha utilização do BSC.

Cá vai mais uma hibridização que introduzi: a abordagem por processos.

Num BSC 3.0 típico temos:
Na próxima parte desta série explico porque esta não é a minha versão, mas digamos que é a versão do mainstream.

Na extrema direita temos as iniciativas estratégicas.

As iniciativas são projectos, conjuntos de actividades a desenvolver por alguém num certo espaço de tempo. Cada uma dessas actividades faz parte de um cronograma e é possível acompanhar e controlar a sua execução.
O que desde cedo me fez impressão foi a diferença entre o antes e o depois da implementação de uma iniciativa.

Enquanto uma iniciativa é implementada temos o cuidado de a controlar. Uma vez declarada a sua implementação, apagam-se as luzes
e acredita-se que tudo vai correr bem.

Acredita-se que não vão ocorrer reversões, acredita-se que as velhas práticas não voltarão para reclamar o que era seu.

O que é uma iniciativa?

Uma iniciativa inclui um conjunto de actividades:

  • algumas dessas actividades traduzem-se em alterações não comportamentais. Por exemplo, investir numa nova máquina mais produtiva, investir num sistema anti-erro, fazer uma pequena obra de construção;
  • algumas dessas actividades traduzem-se em alterações comportamentais. Por exemplo, a alteração de um método de trabalho.

Uma vez fechada uma inicativa estratégica não costuma haver problemas com as alterações não comportamentais . E com as comportamentais? Quem nos garante que a entropia, que a tradição não volta à superfície e reverte o que foi alterado?

Associo sempre esta situação a um caminho rural:

As velhas práticas são estes trilhos. É mais fácil seguir o trilho feito do que o trilho novo.

As iniciativas são transientes por natureza. O que é que é permanente num organização? Os seus processos!

O que cedo descobri é que devemos relacionar e ancorar as iniciativas estratégicas naquilo que é permanente numa organização e que, por isso, continuará a ser objecto de monitorização e acompanhamento para lá do tempo de vida da iniciativa.

O que uso é a abordagem por processos. Modelar o funcionamento de uma organização com sendo o resultado de um conjunto de processos que interagem entre si.

Considerando um modelo genérico de funcionamento de uma organização com base na abordagem por processos podemos ter:
A ISO 9000:2015 define projecto como:
Processo único que consiste num conjunto de atividades coordenadas e controladas, com datas de início e de fim, realizadas para atingir um objetivo em conformidade com requisitos específicos, incluindo restrições de tempo, custos e recursos.
A mesma ISO 9000:2015 define processo como:
Conjunto de atividades inter-relacionadas ou interatuantes que utiliza entradas para disponibilizar um resultado pretendido.
O processo é repetitivo, está periodicamente a ser executado. É algo permanente numa organização. Por isso:

  • são auditados
  • têm indicadores de desempenho 
  • são descritos em documentação
  • são transmitidos a novos trabalhadores
  • são objecto de melhoria contínua, não são estáticos.

Assim, podemos relacionar objectivos do mapa da estratégia com processos e com iniciativas estratégicas:
A iniciativa estratégica I1 vai permitir cumprir o objectivo estratégico P1, para que isso seja permanente, as actividades do cronograma da iniciativa vão alterar os processos 2.1; 4.1 e 6.1.

Começamos por desenhar o modelo do funcionamento da organização com base na abordagem por processos. Descrevemos esses processos: é assim que funcionamos.
Depois, tendo em conta o conteúdo das iniciativas estratégicas conjugamos a sua implementação no terreno com a alteração dos processos. Por vezes, concluímos que a estratégia que uma empresa pretende seguir tem de dar origem a alguns processos novos porque a organização nunca desenvolveu  algumas actividades de forma  sistemática. Por exemplo, quando uma organização deixa de vender um  produto e passa a vender um serviço.

Continua com um parêntesis. Antes de apresentar mais duas hibridizações que adicionei ao uso do BSC, vou na próxima parte explicar porque é que aquela versão lá em cima não é a minha versão do BSC 3.0.

segunda-feira, maio 11, 2020

Curiosidade do dia

Todos os dias exemplos de como a necessidade aguça o engenho e nascem novos negócios.

"Last month, when Jill Frechtman lost her grandmother, she wanted to mark her passing with a memorial service—an effort complicated by a lockdown that prohibited gatherings of family and friends.
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With some cajoling, she convinced her parents to try GatheringUs, an online service that hosts memorials on Zoom, starting at $1,400. Without leaving her Manhattan apartment, Ms. Frechtman put together an online service for 89-year-old Blanche Frechtman, the head of their family and a beloved community figure, in just two hours.
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During the proceedings, GatheringUs technical issues and logistics, like auto-muting participants during the livestream of the burial on Long Island. Following the burial, the nearly 30 attendees stayed on the video chat for hours, sharing memories of Blanche—from her tendency to make friends of strangers to her phone calls with Ms. Frechtman following the nightly news.
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“I thought we were going to have to bury her alone,” Ms. Frechtman recalls her mother saying, “but I felt like you were all there.”"
Trecho retirado de "Online Funeral Services Take Off"


A empresa especialista

Uma das abordagens possíveis para subir na escala de valor.
"Whatever you’re going to do, do it well. Sounds obvious. But deciding precisely what to do — or whether to keep doing it — is often hard for leaders as they look to distinguish their companies, stay competitive, and adapt to changing market forces.
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Numerous distractions — envy of a rival’s success, the blind pursuit of growth, underestimating the capabilities and investment needed to enter a new market space — cause companies to stray from their competitive sweet spots.
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the specialist: the company that chooses to do one thing and do it uniquely well. For these niche players, the problem of focus is, literally, a question of identity itself.
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Specialists come in two basic types. The first finds its niche in a particular product or service.
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The second type of specialist focuses on a particular group of customers.
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Whether it specializes by product/service or customer or an intersection of the two, a niche company isn’t necessarily small.
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All specialist companies exist to solve a specific type of problem, or do a specific type of job, for customers that have a specific set of needs. To win by being narrow, specialists do six things:
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1. They own, maintain, and demonstrate specialized knowledge. A specialist must have something in which to specialize. That knowledge can be technical or scientific, such as a medical specialty; or it can be deep knowledge of a market, such as a hotel concierge would have; or both.
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Specialist knowledge must be valuable and hard to copy, but needn’t be arcane.
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“If you can’t differentiate the product, you have to be the best at serving the customer.”
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2. They demonstrate their knowledge. When customers recognize specialists’ expertise, they feel that they’ve put themselves in not just good hands but the right hands. Thought leadership marketing — white papers, presentations at industry conferences, and the like — is therefore a powerful tool, serving as a complementary proof point to execution. Testimonials, references, awards, and certifications are other forms of tangible evidence of superior knowledge.
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3. They select the right customers and set appropriate expectations. A dermatologist can give you a flu shot, but why would she, and why would you go to her for one? Specialists don’t squander time, talent, and attention on customers who don’t need their specialized capabilities.
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4. They compete on value, not price. Specialists’ sales processes are almost invariably consultative — partly to display their skill to a prospective customer, but also to vet the customer’s suitability for them. Says Sepire’s Steinberg, “You can identify a specialist when on the very first sales call with a prospective client they don’t try to sell anything.” She says those first contacts should be about listening: “Find out what their pain points are, what they are really looking for.” If you try to make price your differentiator, you’ve surrendered your credentials as a specialist.
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5. They seek and leverage the strategic value of partners and collaborators. Focused they may be; lone wolves they are not. All companies participate in business ecosystems — networks of suppliers, distributors, competitors, “frenemies,” and others. Winning specialist companies are particularly adept at creating and keeping mutually beneficial relationships in their ecosystem. Just as physicians refer patients to other doctors they know and trust, focused businesses cultivate relationships with generalists and companies that have complementary skills or occupy complementary markets.
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6. They know the difference between expansion and distraction. The pursuit of complementary products and adjacent markets might be the biggest temptation for specialists — especially because their own customers might be urging them to blur their focus."
Trechos retirados de "Niche work if you can get it" de Thomas A. Stewart e Patricia O’Connell, publicado na revista Strategy+Business de Fevereiro de 2020

Como evoluiu o BSC? (IIb)

Parte I e Parte IIa.

Formulamos uma estratégia e, traduzimo-la num mapa da estratégia onde objectivos estratégicos interagem através de relações de causa-efeito plausíveis. Definimos um ou mais indicadores associados a cada objectivos estratégico.


Por exemplo:
Recordo-me deste exemplo. Era de uma empresa que competia pelo preço, num negócio em que cerca de 55% dos custos eram matéria-prima e recorria muito a subcontratação. Daí a quantidade de indicadores para um único objectivo estratégico. 

Agora olhemos para o que acontece a quem monta o balanced scorecard:
Para cada um dos indicadores regista o desempenho actual e estabelece uma meta, um desafio, um desempenho futuro desejado, associado a uma data.
Por que vamos precisar de 13 ou 14 meses para chegar aos resultados futuros desejados? Por que não os podemos atingir já amanhã?

Porque os resultados de hoje não são fruto do acaso, são um produto perfeitamente natural da forma como a organização trabalha, decide, vive. A organização de hoje gera os resultados de hoje, os resultados do futuro desejado terão de ser fruto de uma organização diferente, a organização do futuro desejado.
Ou seja, vamos precisar de 13 ou 14 meses para transformar a organização de hoje na organização do futuro desejado. Como vamos promover essa transformação? Através de um conjunto de projectos a que vamos chamar de iniciativas estratégicas:
Assim, chegamos aquilo a que se chama o BSC 3.0, mas que ainda não é a minha versão do BSC 3.0:
O mapa da estratégia, os indicadores estratégicos e as iniciativas estratégicas.

E como é que se definem estas iniciativas estratégicas?
Kaplan e Norton propunham que através de um brainstorming bem-intencionado se desenvolvessem as iniciativas estratégicas a executar.

O brainstorming é uma ferramenta que nos últimos anos tem caído em desuso e tem sido criticada porque, dizem, não é eficaz. O problema não é da ferramenta, o problema é de quem a usa indevidamente. Houve um dia em que estava a reflectir sobre este tema e veio-me à mente uma analogia que nunca mais abandonei:

Quando estudei Filosofia no liceu, gostei muito de Descartes e daquela sua afirmação "Penso, logo existo" era tão poderosa... tudo o resto podia ser uma ilusão, mas eu existia porque pensava, porque tinha consciência de mim...

Depois, aprendemos a justificação de Descartes para a existência de Deus. Deus é uma ideia perfeita. O Homem é um ser imperfeito. Um ser imperfeito não pode gerar uma ideia perfeita. Logo, Deus tem de existir à priori, não pode ser uma criação humana.

Não gostei nada desta justificação... um homem que tinha criado um alicerce tão poderoso para a sua visão do mundo... ficava-se por isto?!

E usar um brainstorming para determinar que iniciativas estratégicas desenvolver parecia-me muito pobre. Depois de todo o rigor intelectual para construir o mapa da estratégia e os indicadores, construir um conjunto de iniciativas estratégicas com base num brainstorming bem-intencionado. Que desilusão.

Durante anos vivi com este desassossego de achar que o brainstorming não era a melhor ferramenta para determinar o conjunto de iniciativas estratégicas a desenvolver.

Aprendi com a corrente do pensamento sistémico a ver os resultados de um sistema como um produto perfeitamente normal do funcionamento desse sistema. Aprendi mesmo a ver os resultados indesejados ou insuficientes não como um acidente, não como obra do acaso, mas como o resultado expectável da conspiração da realidade. 

Não há acasos!

Ou seja, os resultados de uma empresa não são como meteoritos caídos do céu, nem são obra de um jogo de roleta, nem uma consequência de artimanhas de “terroristas”, intervenientes maldosos, que fazem mal de propósito.

Aprendi a usar o iceberg de Senge. 

Normalmente as organizações vêem o mundo assim: 
Um lugar cheio de resultados inesperados que conspiram contra sua existência e o seu sucesso.

Mas se cavarmos um pouco, se mergulharmos mais fundo vemos:
Encontramos sempre um sistema invisível com sua agenda própria. Pior, encontramos grupos de ciclos invisíveis conspirando contra a agenda oficial.

E o que é interessante é ... como nos filmes do Alien: O mal (o xenomorfo), afinal estava dentro da Ripley desde sempre.
Este iceberg é uma boa forma de perceber a realidade e os resultados, e uma boa ferramenta para diferenciar remendos de actuações estruturais.

A minha primeira hibridização do BSC surge quando descobri a teoria das restrições e percebi o como a podia usar para desenvolver as tais iniciativas estratégicas, o como a podia usar para construir aqueles ciclos sistémicos conspirativos. A partir do trabalho de uma equipa heterogénea pode-se tirar uma fotografia ao vivo e a cores de como funciona a conspiração da realidade actual, podemos vislumbrá-la como uma sequência de dominós a caírem, e a contribuírem de uma forma normal para o tal desempenho negativo.

As iniciativas estratégicas emergem de uma forma cirúrgica das abordagens para quebrar os ciclos conspirativos.

Por exemplo, se temos esta realidade:
As actividades a desenvolver para transformar a organização passam por:

A cinza, o que há a implementar. 
A amarelo, as consequências do que vai ser implementado.
A verde, objectivos estratégicos incluídos no mapa da estratégia.

Em vez de iniciativas de terraplanagem, em que um iluminado vindo de fora, propõe arrasar tudo para construir uma organização nova, uma actuação cirúrgica que emana da contribuição de uma equipa heterogénea que no seu todo conhece a organização.

Continua com a parte (IIc) - Uma nova hibridização pessoal para chegar ao meu BSC 3.0

domingo, maio 10, 2020

Not jumping to ill-informed solutions

Parte I.
"You’ll never get past the tendency to leap to solutions. But there are ways to fight the tendency, to promote deep analytical thinking instead of Jumping. Here’s a four-step process to help you activate your inner Analyst and keep you from jumping to ill-informed solutions.
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1. Go and SeeIt’s easy to jump to conclusions — and lousy solutions — when you don’t have a clear picture of what’s actually happening. And you can’t have a clear picture if you don’t leave your desk, your office, or your conference room. [Moi ici: Isto pôs-me a pensar seriamente... sobre as auditorias remotas ou e-audits] Unfortunately, that’s where most leaders live.
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Taiichi Ohno was the father of the Toyota Production System, or what is now known as ‘lean’. As described in The Birth of Lean,
[Ohno] never rendered judgment simply on the basis of hearing about something. He always insisted on going to the place in question and having a look.
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Ohno said, “Data is of course important in manufacturing, but I place the greatest emphasis on facts.” Gathering facts comes from close observation of people, of objects, of spaces. By contrast, spreadsheets, reports, and anecdotal accounts are not facts. They’re data. They’re two-dimensional representations of reality, which makes it easy to jump to conclusions.
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Data tells you how often a machine breaks down on an assembly line. Facts — direct observation—show you that the machine is dirty, covered in oil, and hasn’t been cleaned and maintained in a long time."
This is how organizations, normally, see the world:
A place full of unexpected results conspiring against its existence and success.

But, if we digg a little deeper...
We always find an invisble system with its own agenda. Worst, we find nests of invisible cycles conspiring against the oficial agenda.

And what is interesting is ... like in that Alien movies: The evil (the xenomorph) was inside Ripley all the time.

As a rule of thumb always think on this:
Always look for short-term gains that deliver long-term costs.

Results are a natural outcome of how organizations work and manage. Some times it is just a rule, just a small practice, that derails the entire system.

Can you imagem the power of that bonus?
Delivering above target savings is something desirable and very tangible. Seeing that the management behind that delivers:

  • Raw materials that arrive to late and have to bypass quality control;
  • Raw materials that don't pass quality control;
  • Raw materials that don't arrive.
Takes a deeper and analytic look. Takes not Jumping into the simple, obvious and wrong.

"...
2. Frame It ProperlyFraming the problem properly is the first step on the road towards finding the right solution. Problem statements are deceptively difficult to get right. For one thing, it’s easy to mistake the symptoms for the underlying problem. The Jumper inside you gravitates towards symptoms. They’re easy to see and comparatively easy to address. It’s the Analyst inside you that has the cognitive power to find the root cause of those symptoms, and to really fix the problem. [Moi ici: Recordo estar em Abril de 2019 a olhar para as reclamações recebidas por uma empresa e, constatar que em apenas 3 meses já tinham tido 8 reclamações com o mesmo motivo. Olhando para o tratamento de cada reclamação, percebi que cada uma tinha dado origem a uma acção correctiva. No entanto, já iam em 8 reclamações em três meses. Quando pesquisei o conteúdo de cada acção correctiva descobri que a acção era sempre a mesma, porque a causa identificada era sempre a mesma: erro humano. Erro humano não é causa nenhuma. As causas-raiz costumam estar bem escondidas. Daí que uma investigação para as encontrar não seja fácil. Daí que eu não proponha que se desenvolvam acções correctivas por tudo e por nada, para que quando faça sentido se use a artilharia como deve ser.]
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How many times have you heard something like this (or said it yourself)? ‘The problem is that we don’t have enough time to do….’ Or, ‘The problem is that we need more money so that we can….’ Or, ‘The problem is that we don’t have enough people for….’
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These sound like legitimate problems, right? Not really. The truth is you never have enough time. You never have enough money. And you never have enough people.
...
A well-framed problem statement opens up avenues of discussion and options. A bad problem statement closes down alternatives and quickly sends you into a cul-de-sac of facile thinking. [Moi ici: Erro humano...]  Consider these two problem statements:
  1. Our sales team needs more administrative support.
  2. Our sales team spends six hours per week on low-value administrative tasks.
Although you hear this kind of framing often, notice that the first statement isn’t really a problem at all. It’s a solution.
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The only possible response to needing more administrative support is to hire more administrative support. What’s the solution to the second problem statement? It’s unclear — which is good! The second problem statement pushes us to think analytically. The observable fact (six hours) rather than the implicit judgment (we need more admins) raises other questions that help us develop better solutions: why do they have six hours of administrative tasks in the first place? How can we make the tasks faster? Can we use a computer? Can we use checklists and templates to reduce the burden? Are they actually necessary? Can we eliminate some of them entirely? If you see that your problem statement has only one solution, rethink it. Reframing the problem can help you avoid conclusion-jumping."
Trechos retirados de "Four Tools for Better Decisions" publicado na revista Rotman Management Spring 2020:

Pivoting

Mais um exemplo de "We are all startups now"
"Audrey McLoghlin was preparing her largest wholesale shipments of the year for her two labels, Frank & Eileen and Grayson, when cancellations started to come in a month-and-a-half ago. Now, spring and summer merchandise originally destined for over 350 retailers across the US, including Nordstrom and Anthropologie, sits in storage.
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Before the pandemic, wholesale accounted for over 60 percent of McLoghlin’s business. But with stores closed, she’s pivoting to her own e-commerce as fast as she can. She’s redesigned both of her brands’ websites to make shopping easier and taught herself to use Instagram Live. She’s also bought ads on Google and social media – prior to the virus, her digital marketing budget was nonexistent.
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This just forced us to test it out and try new things,” McLoghlin said.
...
I would rather be smaller and more direct than go back to how things were before,”
...
“This is a game changer. It’s never going to be business as usual again.”"
Trechos retirados de "How to Go From Wholesale to Direct-To-Consumer"

E outro:
"Companies that have seen their business models blown up by the pandemic are making dramatic changes in real time, from the products they sell to where and how they are sold.
...
“Things are so up in the air that you need to move quickly and adapt,” ... “If you can tap into what people want and need right now, it’s the strongest way to survive.”
...
“I’m in reinvention mode right now, and trying to give myself and my business a new way to position clients in this current climate,” Tuke said. “You have to be scrappy.”
...
“Business owners need to think about how they can shift to play in the world we live in,” Gardner said. “Can they leverage existing resources and pivot to clothes people actually need?”
...
A pivot doesn’t need to involve new products. Some brands are using the pandemic to reduce their reliance on wholesale. The wholesale model has been challenged for years, and more brands are leaning into the direct-to-consumer approach."
Trechos retirados de "The Art of the Crisis Pivot — and the Brands Getting it Right"

sábado, maio 09, 2020

Recomendação


Vejo este título e penso: Esta é a mentalidade que os empresários não podem ter neste momento.

Os empresários não podem estar à espera de uma boleia, têm de fazer pela vida. Os empresários não podem estar à espera de uma maré.

Esta é uma das mensagens mais antigas deste blogue:

"Quando a maré sobe, ou seja, quando o PIB cresce, todos os barcos sobem, ou seja, todas as empresas crescem, todas as empresas aproveitam.
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Cuidado! Se vamos estar à espera que uma locomotiva externa faça o trabalho que tem de ser feito por quem trabalha, por quem gere uma empresa... não vamos lá, nunca iremos lá!" (Novembro de 2006)
"os políticos falam da retoma como uma força motriz, em vez de falarem dela como um resultado, como uma consequência.
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Pensam que a retoma, como uma maré, é a solução para as empresas.
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Apetece repetir a frase "Fia-te na Virgem e não corras, não." (Janeiro de 2007)
Recordar a mesma mensagem nesta tira:

"A micro-economia não se pode fiar em marés que subam. Tem de seleccionar clientes-alvo concretos, não abstracções estatísticas e procurar satisfazê-los, oferecendo-lhes uma proposta de valor superior." (Abril de 2009)
"Quem pensa na retoma como uma força motriz está à espera que a maré suba, porque quando a maré sobre todos os barcos sobem.
.
Pelo contrário, quem pensa na retoma como uma consequência não espera, põe os pés ao caminho para sair do buraco e construir o futuro.
.
A importância da actuação individual" (Abril de 2011)




"uma retoma não é uma maré pronta para dar boleia a passageiros clandestinos que não fazem a sua parte, o seu trabalho de casa, que não têm uma estratégia, que não apostam na diferenciação."(Abril de 2015)
Portanto, se é um empresário, não se fie na Virgem, faça a sua parte.

"Quando tem um problema, saca da carteira e compra uma máquina!"

O meu amigo Aranha tem várias frases que caricaturam o comportamento de um certo tipo de empresário português. Recordo daqui uma delas:
"Quando o empresário português tem um problema, saca da carteira e compra uma máquina!"
Ontem lembrei-me desta frase ao ler " Four Tools for Better Decisions" publicado na revista Rotman Management Spring 2020:
"AS A MANAGEMENT CONSULTANT, I’ve seen more than my fair share of ludicrous corporate decisions resulting from hasty leaps to poorly designed solutions. Before becoming a consultant, I was an employee at several companies over the course of 15 years, and I’ve lived through the ramifications of these poor decisions. I’ve seen the sales declines, the layoffs, and the damaged lives.
.
Frankly, I’m tired. Tired of seeing leaders jump to conclusions and taking action without really understanding their problem. Tired of seeing leaders arrive at a ‘solution’ that doesn’t solve the real problem at all. Tired of seeing the staggering waste of money and opportunity caused by this knee-jerk approach to problem solving.
.
When leadership teams don’t understand the real problem and simply jump to a conclusion, they tend to reach for one of three solutions:
  1. Shiny new technology
  2. Reorganization
  3. Money
If one of these is your answer to a problem — stop. Think again. You may actually be right. You might really need to develop new tech, or create a new organizational structure, or spend more money. But more often than not, you’re about to go down the wrong road. You’ll have a shinier, more expensive, differently organized version of the same problem
that you had before." 

sexta-feira, maio 08, 2020

Como evoluiu o BSC? (IIa)

Parte I.

Como evoluiu o BSC?

Aqui temos um exemplo simples do que é um BSC construído de acordo com o artigo inicial de Kaplan e Norton:
Por favor, peço a Vossa condescendência, retirei este exemplo de uma tese de mestrado. Mais à frente faremos a nossa crítica às escolhas.

Eu lembro-me do entusiasmo com que li o artigo inicial em Janeiro de 1992. Por isso, não me custa nada perceber o sucesso imediato que o BSC granjeou no mundo dos negócios. Por exemplo, no artigo “Does the BSC work: An empirical investigation” de Andy Neely, Mike Kennerley & Veronica Martinez (2004) podem-se encontrar os seguintes números:
"Commentators suggest that between 30 and 60% of large US firms have adopted the Balanced Scorecard, first described by Bob Kaplan and David Norton in their seminal paper of 1992.
...
increasing numbers of firms appeared to be "re-engineering" their measurement systems, with data suggesting that between 1995 and 2000, 30 to 60% of companies transformed their performance measurement systems...
Evidence suggests, for example, that by 2001 the balanced scorecard had been adopted by 44% of organisations worldwide (57% in the UK, 46% in the US and 26% in Germany and Austria). And more recent data suggests that 85% of organisations will have performance measurement system initiatives underway by the end of 2004"
É claro que não há nenhum dicionário oficial que estabeleça a norma para o que é e para o que pode ser classificado de um BSC.

Com esta popularidade seria de esperar, como consequência, uma melhoria do desempenho das organizações. Afinal, o BSC tinha aparecido para isso mesmo.

A verdade, estudo após estudo, era que o BSC não contribuía para a melhoria do desempenho da maioria das empresas onde era aplicado. Recordo particularmente um artigo de 2003 onde se concluía que apenas 23% das empresas com um BSC tinham melhoria de desempenho estatisticamente significativa. Em "Coming Up Short on Nonfinancial Performance Measurement" de Christopher D. Ittner e David F. Larcker, publicado na revista HBR em Novembro de 2003 podia ler-se:
"By filling in gaps left by financial accounting, nonfinancial measures (such as customer loyalty and employee satisfaction) promise to complete the picture of your company’s performance. This fuller picture, the theory goes, gives you and your employees the information you need to achieve your company’s strategic objectives.
But few companies realize these benefits. Why? They don’t identify, analyze, or act on the right nonfinancial measures—those that will advance their strategies. And they don’t demonstrate clear connections between improvements in nonfinancial activities and financial outcomes, such as profit or stock price. Results? Misdirected investments and unfulfilled strategies.
How to realize the promise of nonfinancial performance measures? Identify the major nonfinancial drivers of long-term economic performance for your firm. Then measure — and act on — the drivers behind those drivers."
A adopção do BSC convidava as organizações a escolher um número limitado de indicadores em quatro perspectivas (financeira, clientes, interna e aprendizagem e crescimento) para melhorar a gestão e o desempenho. Como é que as empresas escolhiam os indicadores não financeiros? Vou caricaturar: juntavam a equipa de gestão e faziam um brainstorming, ou uma votação em que os indicadores eram elegidos. Parecia que bastava ter outros indicadores além dos financeiros.

Acham que a minha caricatura é exagerada? Recordo este artigo “Linking the Balanced Scorecard to Strategy”, de Alan Butler, Steve R. Letza e Bill Neale, publicado no número 2, do volume 30, da revista “Long Range Planning”, em 1997:
"The next stage in the process was the determination of key performance measures.
Senior managers … were circulated with an information pack about the balanced scorecard, and then each was interviewed individually.
Each interview was structured around a standard set of questions to gather information about the areas for which each senior manager was directly responsible and the key performance measures they used. Information was also gathered on any additional measures which senior managers would like to see and use in the future. From the results of these interviews, a first proposal for the scorecard was devised using Kaplan and Norton's 'four business perspectives' model."
Gosto sempre de recordar a mensagem inicial deste artigo "System Dynamics as the Link Betwwen Corporate Vision and key Performance Indicators” de K. Linard, C. Fleming e L. Dvorsky:
“Any fool can develop performance indicators”
Por isso, costumo usar a imagem de um fóssil para ilustrar o fim daquilo a que chamo o BSC 1.0


Uma boa ideia, uma ideia interessante, uma ideia atraente, mas ineficaz.

O que é que se aprendeu com as tais 23% de organizações que tinham sucesso com a adopção do BSC?

Percebeu-se que tinha de haver critério na escolha dos indicadores não financeiros. Esses indicadores tinham de estar alinhados com a estratégia da organização. Foi dessa percepção que surgiu a segunda geração do BSC, o BSC 2.0

Há uma forma rápida de perceber se estamos perante um BSC 1.0 ou 2.0, basta olhar e verificar se os indicadores estão associados a um mapa da estratégia.


Veremos mais tarde como desenvolver um mapa da estratégia. Aproveito para salientar aqui que escrevo mapa da estratégia e não mapa estratégico. Não é o mapa que é estratégico, o mapa apenas procura traduzir numa imagem, num conjunto de relações de causa-efeito plausíveis, a lógica de uma estratégia ao longo das várias perspectivas.

A introdução do mapa da estratégia veio de certa forma mudar a forma como o BSC era visto e usado. O BSC passou a ser visto como uma ferramenta não tanto para monitorização e gestão de uma organização, mas para ajudar a comandar a execução da sua estratégia.

Eram inúmeros os artigos e as discussões sobre a dificuldade em executar uma estratégia neste período. Por exemplo, lembro-me de Tom Peters ao ler:
“Só 10% das estratégias formuladas são implementadas com sucesso”
Em “Corporate Strategists under Fire” de Walter Kiechel, Fortune, 27.12.1982, exclamar:

- 10%?! O número está claramente inflacionado.
Anos depois os números continuavam a retratar esta dificuldade:
“na maior parte dos casos – estimamos que em cerca de 70% - o verdadeiro problema não é (uma má estratégia) … é uma má execução”
R. Charan & G. Colvin, em “Why CEOs Fail” (Fortune, 21.06.1999)

A capacidade de executar uma estratégia foi considerado como o mais importante indicador não financeiro em “Measures that matter” Ernst & Young (Londres, 2000)

Recordo sempre a minha tradução:
"Formular uma estratégia é uma das actividades mais sexy da gestão. Implementar a estratégia… isso, isso é com os grunhos"
Lawrence Hrebiniak in “Making Strategy Work”

Kaplan e Norton no seu segundo livro sobre o BSC publicaram esta figura:


Atenção, o BSC não é uma ferramenta para formular uma estratégia. É sim uma boa ferramenta para monitorizar quer a sua execução, quer os seus resultados.

Recordo que por esta altura estávamos a viver o que referimos na parte I, o aumento da variedade de estratégias e não mais a ditadura da competição pelo preço.

Contudo, a evolução do BSC não ficou por aqui.

Continua com "Como evoluiu o BSC? (IIb)"

"in many cases the best solutions happen because of constraints "

"You have said that creativity and innovation are often the result of constraints. Please elaborate..It’s great to have a blank slate, but in many cases the best solutions happen because of constraints — whether they be physical or resource-related. For example, we have had to reinvent our shows for smaller big-tops to tour new countries or move traditional big-top shows into arenas. All of a sudden, the physical space becomes a constraint and you have to reinvent how you think about things. At first, certain things seem impossible and it forces you to use that other part of your brain to rethink how you do things."
Trecho retirado de "QUESTIONS FOR Pierre-Luc Bisaillon" publicado na revista Rotman Management - Spring 2020

quinta-feira, maio 07, 2020

Por que apareceu o BSC? (I)

Por que apareceu o Balanced Scorecard?

Julgo que para responder a esta pergunta temos primeiro de perceber o século XX.

Há quem diga que o século XX em termos económicos começou em Outubro de 1913 com a abertura da primeira linha de montagem da Ford.
"A 7 de Outubro de 1913, a produção do modelo que se viria a tornar o clássico dos clássicos mudou para Highland Park."
O fundador da Ford dizia que o cliente podia escolher a cor do carro desde que fosse preta, mas mais, não era qualquer preto, tinha de ser Japan Black, porque era a cor que secava mais depressa.
"it was the ability of japan black to dry quickly that made it a favorite of early mass-produced automobiles such as Henry Ford's Model T. The Ford company's reliance on japan black led Henry Ford to quip "Any customer can have a car painted any colour that he wants so long as it is black".
While other colors were available for automotive finishes, early colored variants of automotive lacquers could take up to 14 days to cure, whereas japan black would cure in 48 hours or less."
O século XX, em termos económicos, foi um tempo em que a procura era superior à oferta.


E quando a procura é superior à oferta quem manda é quem produz. Quem produz é que estabelece o que se produz, o que se coloca no mercado e com que especificações. Neste tipo de universo competitivo o factor crítico de sucesso é o preço. Por isso, faz-se tudo para ser eficiente, para aumentar a cadência de produção, para reduzir os custos unitários.
  • "economics of scale;
  • large, physically and temporally concentrated production facilities;
  • long production runs;
  • mass markets; 
  • task specialisation; and
  • standardisation."

Um dos maiores inimigos da eficiência é a variedade, porque se querem "long production runs".  O século XX não queria variedade, queria blockbusters, queria big sellers, queria quota de mercado. E os clientes?

Os clientes aceitavam trocar variedade por uniformidade porque assim conseguiam ter acesso a bens a um preço mais baixo. Seth Godin usa metáfora admirável para retratar este mundo. O mundo em que os produtores tratam os consumidores como plancton, uma massa indistinta e homogénea, sem quereres individuais.

Quando o negócio é preço, quando o negócio é ditado pela eficiência, quando tudo o que se produz tem saída, então chega olhar para dentro, chega medir o desempenho com base em resultados financeiros. Por isso, chamo ao modelo económico do século XX de Magnitogorsk ou de Levittown.

A cidade de Magnitogorsk na URSS foi reconstruída durante o estalinismo:
"In Magnitogorsk, there were two types of apartment, named ‘A’ and ‘B’. They were the city’s sole concession to variety." 
Li algures que a diferença entre o tipo A e o tipo B residia na cor dos candeeiros, branca ou laranja. Não se pense que as Magnitogorsk eram um apanágio do mundo comunista. Não, eram uma consequência de um modelo industrialista baseado na produção em massa e com pouco ou nenhum cuidado com o que os utilizadores pretendiam ou valorizavam. Os Estados Unidos também tinham a sua versão, as Levittown:
"In July 1947, on potato fields 20 miles from Manhattan, William Levitt pioneered the mass production of affordable homes. Variations in the 17,477 houses were minor; each had two bedrooms, a bath, living room and kitchen on a 750-square-foot concrete slab. By standardizing the units, Levitt eventually was able to put up more than two dozen a day, helping fill the enormous postwar demand. Over the years, innumerable changes to the homes have transformed the community. But even now, Levittown remains a kind of shorthand for the sameness of mass production that’s starting to give way to mass customization."
À medida que o século XX foi avançando, o desequilíbrio entre a oferta e a procura foi-se reduzindo até que se passou para o outro lado: a oferta passou a ser superior à procura.


Quando isto acontece ocorre um verdadeiro choque epistemológico. Não basta produzir, o poder passa para quem compra não para quem produz. E isso muda tudo. De que serve ser muito eficiente se o produto não sai do armazém?

Quanto mais o desequilíbrio se acentuava, mais poder passava para o comprador, mais o produtor tinha de descer do pedestal e procurar seduzir o comprador. Assim, começou a vir à superfície a insuficiência dos indicadores financeiros como indicadores únicos para gerir uma organização.

Sejamos claros, eles continuavam a ser cruciais, mas já não chegavam. Além disso, indicadores financeiros são indicadores de resultados, são indicadores de consequências, em boa verdade já não permitem agir em tempo útil. O juiz já deu o veredicto. Gerir exclusivamente com base em indicadores financeiros é como conduzir uma viatura para a frente mas olhando exclusivamente para o espelho retrovisor.

Numa economia com pouca incerteza, lenta e em que a eficiência é o fundamental não há grande problema, mas quando a supremacia da eficiência é posta em causa vêm ao de cima as falhas do modelo de monitorização e decisão baseado na vertente financeira.

Recordo o impacte económico dos produtos japoneses na economia americana, algo que acelerou o poder dos compradores face aos produtores/fabricantes:


Era algo que estava em curso, mas que a "invasão japonesa" acelerou de forma brutal.

Assim, quem pesquisar as revistas de gestão dos anos 80 do século passado encontrará vários artigos e discussões sobre a "falência" dos indicadores financeiros como meios de gestão de uma organização.

 Por exemplo, o artigo “Managing Our Way to Economic Decline”, HBR (Jul-Ago. 1980) de William Abernathy e Robert Hayes, pode ser resumido em "American companies live by the numbers, are dying by the numbers"

Por exemplo:

  • R. Kaplan “Yesterday’s accounting undermines production”, (HBR, Jul.-Ago. 1984)
  • R. Kaplan “One Cost System is not Enough”, (HBR, Jan.-Fev. 1988)  
  • T. Johnson, e R. Kaplan. “Relevance Lost: The Rise and Fall of Management Accounting”, (Management Accounting; Jan 1987)

Neste último artigo pode ler-se:
"As bases racionais dos sistemas de contabilidade de gestão, na maioria das organizações actuais ficaram ultrapassadas com as tendências contemporâneas de competição global, a revolução na organização e tecnologia de fabrico e a desregulamentação"
É por esta altura que começam a ganhar popularidade as ideias em torno da medição da satisfação dos clientes e mesmo da medição da satisfação dos trabalhadores. 

E é neste contexto de aumento da concorrência, de aumento da variedade, do crescente poder de escolha dos clientes e consumidores que surge o BSC, uma ferramenta que apareceu como uma resposta natural a um problema: a crescente complexidade e variedade do mundo económico, tinha tornado os indicadores financeiros insuficientes para lidar com um mundo mais incerto, mais rápido, e com muitas variantes, com muitas mais estratégias.

Gosto de usar a imagem de uma paisagem que se vai enrugando ao longo do tempo para ilustrar o que acontece no mundo económico à medida que abandonamos o paradigma do século XX:
Enquanto o século XX podia ser representado por uma paisagem com um único pico, e quanto mais se subia no pico mais retorno tinham as organizações. E todas procuravam o mesmo, subir o mais alto possível e o mais rápidamente possíverl ao topo do mesmo pico. Quem subir mais rápido vai tendo vantagem competitiva sobre os restantes, dado o mecanismo virtuoso do efeito da escala num cenário regido pela eficiência. Já a economia do século XXI, vai-se enrugando progressivamente e gerando cada vez mais picos. Cada vez mais empresas, apesar de parecerem estar a operar num mesmo sector económico, não concorrem entre si, porque especializaram-se a servir diferentes tipos de clientes em diferentes circunstâncias. Uma das frases que repito com frequência é a de que a economia é uma continuação da biologia. E a biologia dá-nos grandes lições que podem ser transpostas para a economia. Uma das estórias que mais gosto de contar é a do estudante de doutoramento Robert MacArthur que descobriu que cinco espécies diferentes de toutinegra conseguiam alimentar-se numa mesma árvore sem competirem entre si, cada espécie alimentava-se numa zona diferente:

Um exemplo do que o biólogo russo G. Gause, publicou em 1934 no livro “A luta pela existência”, onde relatava as conclusões de um conjunto de experiências que realizou com paramécias e de onde cito o principio da competição exclusiva:
“Duas espécies não podem coexistir indefinidamente se se alimentarem do mesmo tipo de nutriente escasso."
Fazendo o paralelismo para as organizações; num mundo em explosão de variedade, as empresas não podem ser geridas da mesmo forma. Diferentes "espécies" servem diferentes tipos de clientes. Por isso, precisam de ser geridas de forma diferente. Por isso, olhar apenas para os indicadores de consequências, os indicadores financeiros, é insuficiente.

A seguir, "Como evoluiu o BSC? (II)".