Na sequência de "
Bofetadas e locus de controlo - produtividade é que não" um empresário mandou-me um e-mail:
Em anexo ao texto do e-mail vem um ficheiro em pdf com informação detalhada da empresa e cópia do passaporte do Managing Director.
Trata-se, portanto, de um negócio que corre de vento em popa em Portugal.
Quando tinha o meu escritório na Avenida da República em Gaia, um dos meus vizinhos, por causa do sinal de recepção deficiente, vinha para o corredor falar por telefone com trabalhadores da construção civil, para tentar contratá-los para obras na Holanda. Recordo os 12 € por hora com alimentação e casa era o último valor que ouvi. Inicialmente andava pelos 9 €:
Por que recordo isto? Porque o valor era negociado cá e pago cá. O trabalhador estava empregado numa empresa portuguesa, por acaso a realizar trabalho na Holanda. A legislação salarial holandesa não se aplicava ao trabalhador português.
Talvez por isso, isto:
Assim, estes trabalhadores vêm do Bangladesh, as empresas portuguesas não lhes pagam, pagam um serviço a uma empresa bangladeshi que tem trabalhadores bangladeshis que por acaso estão a realizar um serviço para essa empresa em Portugal. Ou seja, a legislação salarial portuguesa não se lhes aplica. Ou seja, a solução para os empresários portugueses, (e espanhóis e italianos, segundo o empresário que me enviou o e-mail) não é subir na escala de valor, nem é deslocalizar para a Ásia... é trazer a Ásia para a Europa.
Ao fim do dia, no Jornal de Notícias apanho "
Falências voltam a crescer no têxtil, calçado e metalurgia":
"Apesar do número total de falências estar a cair desde a crise financeira, há sinais de alerta em várias indústrias.
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O anúncio em letras grandes foi publicado num jornal diário e dá conta da venda, em leilão eletrónico, de máquinas para a indústria do calçado. Em causa a falência da Calçado Bangue, de Romariz, Santa Maria da Feira. É uma das 238 empresas da indústria têxtil e da moda que, desde janeiro, estão em tribunal com processos de insolvência, mais 42% face ao período homólogo.
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A situação não é exclusiva do calçado. As insolvências nos têxteis e na metalurgia somam, nos primeiros nove meses do ano, mais do que no total de 2018. O arrefecimento da economia europeia, a preferência da Inditex por fornecedores marroquinos ou turcos e a concorrência da China, que está a colocar em dificuldades os produtores europeus de torres eólicas, ajudam a explicar. A questão mereceu um alerta do Fórum para a Competitividade que, nas suas perspetivas para o terceiro trimestre de 2019, destacou os "riscos elevados" nos setores têxtil e calçado. Não só as insolvências estão a crescer, como as exportações estão a cair, respetivamente, 1,1% e 7,5%"
Lembram-se de eu escrever aqui sobre os
movimentos subterrâneos na economia portuguesa?
Os incautos olham para os números globais das exportações e comprazem-se com a evolução, eu há anos
que separo as coisas, uma coisa são
as empresas grandes que competem pelo preço, outra coisa é a imensa multidão de PMEs.
Estão a ver o e-mail lá de cima? Estão a recordar
o texto inicial da bofetada? Pensem nisto:
""As empresas que ainda trabalham na lógica do preço baixo estão condenadas a prazo. Sem outros elementos de diferenciação, são simplesmente trocadas mal apareça um concorrente, no Norte de África ou na Ásia, que faça mais barato, nem que seja por um cêntimo", diz o diretor-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP). Paulo Vaz garante, no entanto, que o setor realizou uma "enorme transformação, na última década" e que a generalidade das suas empresas "modernizou-se, qualificou-se, investiu na inovação tecnológica e na diversificação de produtos e mercados"."
Confesso que não sei se haverá demasiado wishful thinking nesta descrição de transformação. Estou um bocado pessimista. Penso que a maior parte da mudança foi por causa da proximidade produção-consumo. Vantagem que agora desaparece com o Norte de África e Turquia.
Acredito que o sector vai voltar a encolher e a ter de se concentrar em nichos.
"Mais difícil de aferir é a situação da metalurgia. A campeã das exportações continua em alta, com as vendas ao exterior a crescerem 7%. A AIMMAP,"
Não sei onde é que vão buscar estes números. Olhando para os dados do INE publicados há um mês o sector da metalurgia, sem o automóvel, caiu 1,9%. Se incorporarmos o automóvel, coisa que a AIMMAP não fazia no passado, e bem, o crescimento é de 4%. O que só mostra a evolução que denuncio
há um ano acerca do
parcial II.
No DN interessante estes números sobre
o mesmo tema da evolução das insolvências:
Esta evolução era de esperar, economias saudáveis não crescem até ao céu. Economias saudáveis de vez em quando têm um ano ou mais menos bom. Por outro lado, temos um contexto em forte evolução com a Turquia e o Norte de África a darem cartas.
Por cá, politicamente a prioridade é a distribuição. Ao menos, podiam facilitar as condições para que capital estrangeiro investisse no país.