segunda-feira, outubro 28, 2024

Perpetuar a estagnação

Recordo o efeito de Baumol de Junho passado, "Quando a produtividade estagna ou baixa... (parte II)".

Agora, encontro "Should everyone earn their pay rise?" de Tim Harford.

O efeito de Baumol ocorre quando a produtividade avança em alguns sectores da economia, enquanto outros permanecem estagnados. Este fenómeno explica porque certos serviços intensivos em mão-de-obra, como os cuidados de saúde, a educação e as artes performativas, se tornam relativamente mais caros ao longo do tempo. Nesses sectores, melhorar a produtividade é difícil sem sacrificar a qualidade ou a autenticidade.

Vejo uma ligação clara entre o efeito de Baumol e a vaga de trabalhadores imigrantes. Muitos empresários optam por uma solução mais fácil, aquilo a que chamei aqui de bofetada: os trabalhadores imigrantes ocupam frequentemente funções em sectores intensivos em mão-de-obra, onde a produtividade não aumentou significativamente, mas o custo de vida sim, ou os salários de outros sectores são mais atractivos. Estes são precisamente os sectores afectados pelo efeito de Baumol, onde os salários têm de ser competitivos apesar das poucas melhorias na produtividade.

O aumento da mão-de-obra imigrante pode, temporariamente, aliviar a pressão sobre os custos causados pelo efeito de Baumol, oferecendo uma força de trabalho mais barata. Esta abordagem permite manter os níveis de serviço em sectores críticos, sem um aumento proporcional dos custos, mas acaba por perpetuar a estagnação, ao invés de encorajar a inovação e a melhoria da produtividade.

No Dinheiro Vivo do passado Sábado, no âmbito do artigo "Dois terços das empresas tiveram lucros em 2023. Resultados líquidos totais cresceram 12,2%", pode ler-se o seguinte gráfico:

Uma excelente ilustração de uma matriz que criei há alguns anos:

Recordem o choradinho constante do sector do "Alojamento e Restauração", depois olhem para a variação do volume de negócios desse sector de actividade.

As vendas crescem mas o sector não faz dinheiro. Em vez de fecharem as empresas pouco produtivas, em vez das empresas com mais potencial subirem na escala de valor, temos o refúgio da competitividade à custa de salários baixos. Um imigrante que vive com mais duas famílias numa casa alugada pode sobreviver com um salário que um local não pode ter se quiser ter uma vida normal. Ou seja, perpetuamos a estagnação.

domingo, outubro 27, 2024

Curiosidade do dia

Primeiro, a evolução de fundo do mercado do chocolate, de 2017 E porque não somos plankton (parte VIII).

Segundo, a minha experiência de contacto com o mundo do chocolate em 1987:

"A Nestlé gosta de vender aquele chocolate com 10% de cacau (na minha primeira entrevista de emprego, o director de produção de uma fábrica de chocolate dizia-me que o chocolate era um excelente veículo para o que interessava, vender açúcar. Foi na segunda-feira a seguir à primeira maioria absoluta de Cavaco) mas em Mongo a tendência é outra."

Terceiro, as voltas que o mundo dá: em "Tate & Lyles journey from sugar producer to sugar reducer" no FT da passada sexta-feira:

"If you ask why Tate & Lyle is helping to take sugar out of biscuits rather than putting it in, you have clearly not been concentrating.

...

Tate & Lyle's journey from sugar producer to sugar reducer has been a long haul. It moved into sucralose, sold its corn-based sweeteners and starches division in the Americas, and this year paid $1.8bn for CP Kelco, a US producer of pectin and speciality gums. It once refined cane sugar, but now calls itself"a global leader in sweetening, mouthfeel and fortification"."

Outro mindset - cada vez mais uma necessidade



No WSJ em "What Went So Wrong With Boeing?" vemos espelhadas as consequências da doença anglo-saxónica, do tal hollowing baseado no eficientismo. No mesmo WSJ de ontem encontrei "Chinese Rivals Dent Mercedes Profit" onde se pode ler:

"... Chief Financial Officer Harald Wilhelm said. Speaking on a call with reporters, Wilhelm said the company seeks to reduce the cost base. This includes the materials that go into its cars and those it uses in factories, as well as labor costs.

...

Wilhelm noted that the company has been able to bring costs down significantly over the last five years without launching a big program, as each division within the business has steadily worked toward achieving individual cost targets.

"I think that was successful, but we need to go a step beyond, so it's going to be tighter, it's going to be tougher for sure," Wilhelm said."

A mesma doença. É claro que é preciso controlar custos mas o risco de isso se tornar o mantra à custa da inovação e do design é bem real.

Querem recuar a Julho de 2023 e ao que intuí acerca do futuro da Mercedes em Uma pena? Recordo, mas de Janeiro deste ano: Não é impunemente. Quem acredita em modelos homogéneos e simplificados da realidade comete o erro de acreditar naquilo a que Schumpeter chamava o "Ricardian vice". Partir de premissas muito simplificadas e, a partir delas, deduzir conclusões aparentemente rigorosas e lógicas, mas sem aplicação adequada às situações reais e dinâmicas da economia.

Há tempos mandaram-me este vídeo de uma outra era:

Outro mindset.

Voltemos à Boeing. O foco mudou da excelência em engenharia para os indicadores financeiros, levando a uma decadência do mindset e da cultura da empresa. 

sábado, outubro 26, 2024

Curiosidade do dia

 
"Adopting the economic mode of thinking reduces the cognitive demands placed on our ruling classes by telling them that there are lots of things they don't have to bother thinking about.
...
Economics could make a model suggesting that a given outcome was optimal, before gathering data about it and estimating how far reality was from the theoretical optimum. Depending on political preferences and ideological commitments, they could then either go back and make a new model, or declare that the distance represented a failure on the part of reality and suggest a policy to bring the world into line. It's not hard to see why these people became influential advisors."

Trecho retirado de "The Unaccountability Machine" de Dan Davies.

"Decerebrate Cats"



Pelos vistos, segundo Dan Davies em "The Unaccountability Machine", Stafford Beer usava algumas metáforas surpreendentes nas suas palestras ou livros para captar a atenção. Para ilustrar a importância dos sistemas 4 e 5, ele comparava uma organização a um animal vítima de experiências neurológicas antigas. 

Se cortarem a conexão entre o cerebelo e o resto do cérebro de um gato, ele continua a parecer vivo. Pode andar, equilibrar-se quando cai, e comer ou beber se lhe colocarem comida e água à frente. Talvez até consiga limpar-se, mas já não é capaz de agir com um propósito. O gato, sem essa parte do cérebro, só sobrevive se o ambiente for compatível, pois não consegue responder a mudanças, precisa de protecção externa. Beer argumentava que, como o gato, muitas vezes encontramos uma "organização sem cérebro". (O seu exemplo típico era uma universidade.) Uma organização nesta situação deixou de prestar atenção a certos tipos de informação. Está ciente apenas do que a rodeia de imediato - como os lucros deste trimestre ou o número actual de funcionários - e perdeu a capacidade de planear. Tal como o gato, pode continuar a sobreviver enquanto não houver grandes mudanças, mas, ao enfrentar um choque, entrará em crise. Se não encontrar recursos para restabelecer as funções perdidas, colapsará.

sexta-feira, outubro 25, 2024

Curiosidade do dia


Na curiosidade do dia de Terça-feira passada registámos aqui notícias sobre falências no têxtil e no calçado.

O JdN de Quarta-feira registava uma série de notícias do mesmo calibre mas na área tecnológica:
  • Reditus volta a falhar prazo para divulgação de contas.
  • Era uma vez um unicórnio que levou o novo dono a prejuízos.
  • Pioneira Regra colapsou aos 54 anos sem nada e atolada em dívidas.
  • Compta faliu dois anos após ter sido vendida pelo atual líder da CIP.
Gostava de ver a evolução do Índice de Turbulência deste sector de actividade.

Sem nada de pessoal contra ninguém, é preciso deixar as empresas morrerem de morte natural.

A falta que faz um sistema 4 e um sistema 5

Encontrei este artigo no FT, "Australian bootmaker RM Williams targets UK's richer regions".

Um fabricante australiano de botas, a RM Williams ... só que não é só um fabricante, um fabricante com marca própria.

Botas produzidas num país do primeiro mundo: Têm de ter um preço elevado e as prateleiras têm de estar nas zonas com elevado poder de compra.

Portugal tem poucas marcas de calçado, anda sempre a saltar de mercado em mercado em vez de se focar onde pode fazer a diferença.
Sem marca, os graus de liberdade são menores e maior a tentação de focar a atenção no fabrico e não no mercado.

Criar uma marca ...

Na semana passada devorei "The Unaccountability Machine" de Dan Davies. A certa altura o autor descreve de forma resumida os 5 sistemas preconizados por Stafford Beer para um sistema viável. Algo sobre o qual não lia há mais de 20 anos.

Os 5 sistemas do Modelo de Sistema Viável de Stafford Beer representam as funções necessárias para que uma organização seja considerada viável, ou seja, capaz de sobreviver e se adaptar num ambiente dinâmico. Aqui está um resumo de cada sistema:
  • Sistema 1 - Operações: Representa as funções operacionais da organização, responsáveis pela execução das actividades principais. É o núcleo da organização, onde os produtos ou serviços são produzidos.
  • Sistema 2 - Coordenação: Cuida da coordenação entre as diferentes unidades operacionais (Sistema 1), garantindo que as interações entre elas sejam harmoniosas e que conflitos operacionais sejam evitados.
  • Sistema 3 - Controlo: Garante a supervisão e o controlo interno, assegurando que as operações estão alinhadas com os objectivos da organização. Também se refere ao uso eficiente de recursos e ao cumprimento de normas internas.
  • Sistema 4 - Inteligência: Lida com a percepção externa, analisando o ambiente e antecipando mudanças no mercado, tecnologia ou outras influências externas. É responsável por adaptar a organização às mudanças do ambiente.
  • Sistema 5 - Política/Direcção/Filosofia: Define a identidade, os valores e os objectivos da organização, mantendo o equilíbrio entre o presente (Sistema 3) e o futuro (Sistema 4). Ele dá a direcção estratégica e garante que a organização mantém sua coesão interna.
Criar uma marca exige um Sistema 5 e um Sistema 4 a funcionar. Registei em Preocupante que muitas PME não têm um Sistema 4 a funcionar quanto mais um Sistema 5.

Quem não desenvolve Sistemas 4 e 5 fica-se pelos "operand resources".

Operand resources são recursos sobre os quais se age para gerar valor. Esses recursos, por si só, não criam valor directamente, mas precisam ser manipulados ou transformados para produzir um resultado desejado. Geralmente, são recursos tangíveis, como matéria-primas, equipamentos, energia ou dinheiro.

Operant resources são recursos que agem sobre outros recursos (geralmente operand) para criar valor. Esses são os recursos intangíveis que, ao serem aplicados, geram um impacte significativo. São capacidades, competências, conhecimento, habilidades, ou criatividade que podem transformar operand em valor. 

Quem não desenvolve Sistemas 4 e 5 não densifica, não "incorpora" a intangibilidade associada a uma marca e que resulta naquilo a que chamamos subir na escala de valor.

Agora, mais de 20 anos de pois recordo as palavras do Engº Matsumoto. É preciso ter cuidado com as surpresas que sucedem, num mundo em mudança acelerada, a quem adopta o "present-forward mindset".

Nota: Marca não é necessariamente de produto, pode ser do serviço, ainda que se fabriquem produtos.
 

quinta-feira, outubro 24, 2024

Curiosidade do dia




Benvindos ao tema:
Já agora para os marxistas:
"the first person to realise this was Karl Marx, who wrote about the ‘reserve army of the unemployed’, and their role in managing wage costs by reducing the bargaining power of workers."

Trecho retirado de "The Unaccountability Machine" de Dan Davies.

"things can’t be rushed"


Já por várias vezes referi aqui no blogue o relato de Ackoff sobre a forma como diferentes pessoas olham para o futuro.

Receio que a maioria olha para o futuro como uma continuação do presente, a seta branca:
Num mundo estável o exercício pode funcionar com alguma eficácia. Contudo, num mundo em ebulição o mais provável é que esta abordagem nos traga surpresas negativas que desaguam em problemas. Problemas que requerem uma abordagem diferente.

Há dias encontrei num jornal a notícia de que uma empresa onde fiz um trabalho de índole operacional há cerca de 11 anos tinha fechado. Curioso, fui à procura do que tinha relatado no diagnóstico inicial. Isto aplica-se:
"The first trap is what we call the "present-forward mindset," the unchecked assumption that the company's existing business can simply be extended into the future. 
...
The current state of the business dominates the discussion. The time horizon is restricted to two or three years ahead. Inevitably, the plans that emerge focus largely on incrementally improving the core business. Resources are allocated within the existing structures of the business and the organization is caught in the straightjacket of the present.
...
A Future-Back Approach
...
You start with destination in mind and then work backwards to determine the right highways, roads, and signposts.
Although you know roughly where you want to end up, you don't have to know all the details of the route when you start.
...
  • Anticipating the need for change and thoughtfully managing it. That creates far more value than just reacting to events as they unfold.
  • Starting by discovering the unmet needs of customers. The jobs-to-be-done lens of finding strategic opportunities from the "outside-in," from the customer point of view, is a truer form of innovation than "inside-out," from a product point of view.
  • Planning from the destination - or at least the vicinity of the destination - makes the journey more likely to get the desired outcome." (Trechos retirados de "A Future-Back Approach to Creating Your Growth Strategy" de Mark Johnson e Roy Davis.)
Ontem, ao ler o segundo capítulo de "Lead from the Future" de Mark Johnson e Josh Suskewicz ontem um tema relacionado com o que citei até agora, mas numa perspectiva diferente. Vamos primeiro ao que li:
"Future-back leaders are oriented to the big picture but attentive to its individual pixels. They are decisive when they need to be, but patient to find the best solutions —and willing to iterate for as long as necessary to do so. Importantly, they are also skilled communicators and storytellers, which is how they convince their own people and other constituents to embrace their envisioned future. Above all, they are flexible and adaptable, willing to continually adjust and reshape their visions in light of what they learn as they work with their teams to translate them into reality.
...
The discussion is guided by the future-back tenets we have described thus far, meaning that the focus is on what could be as opposed to what is. The purpose of the dialogues is as much to explore, imagine, and learn as to prove, confirm, or solidly decide. That means things can’t be rushed; these dialogues are very different than the typical two-hour strategy review, which frequently devolves into a race to get through a sixty-page PowerPoint deck."

Este "That means things can’t be rushed; these dialogues are very different than the typical two-hour strategy review" ficou a ressoar na minha mente.

Pensem nas empresas em sectores cada vez menos estáveis e que têm hora marcada para, uma vez por ano, pensar estratégia. A única coisa que pode resultar é "a armadilha da seta branca, o present-forward mindset".

É preciso paciência, são precisas iterações, é preciso explorar, imaginar, aprender. Isso não se compadece com o "the typical two-hour strategy review."

Dá para sentir arrepios...

quarta-feira, outubro 23, 2024

Curiosidade do dia

No JN de ontem:

No JN de Sábado passado:

É também por isto que precisamos de baixar o IRC.
O movimento na vertical está a acontecer, mas temos de acelerar o movimento na horizontal. Recordo de Novembro passado: Menos dor na transição.

Duas dúvidas acerca de estratégia e SPC


Há muitos anos que uso e abuso do SPC. Por exemplo:
O SPC é muito bom para evitar a esquizofrenia analítica. Por exemplo:
Na passada segunda-feira Roger Martin publicou "Statistical Process Control & Strategy". Como grande apreciador dos contéudos de Roger Martin assim que pude mergulhei a sua leitura.

Apreciei os insights fornecidos no artigo, particularmente a analogia da aplicação do Controlo Estatístico de Processo (CEP = SPC) à estratégia. No entanto, tenho algumas observações que gostaria de partilhar.
"The WWHTBT can be utilized to set control limits for your strategy.
...
Setting control limits in advance is critically important because human beings have an infinite capacity for ex post rationalization.
...
The only protection against your own ex-post rationalization is to set control limits ex ante."
Primeira, no SPC tradicional, os limites de controlo não são algo que definimos arbitrariamente ou com base em expectativas futuras. Em vez disso, emergem de dados históricos do processo, reflectindo a variação natural inerente a um processo estável. Os limites de controlo revelam o que é típico de um processo ao longo do tempo, ajudando-nos a detectar quando ocorre uma variação invulgar (causa especial). Neste contexto, a definição de limites de controlo com base nas expectativas de resultados futuros parece inconsistente com os princípios fundamentais do SPC.
"É extremamente importante não confundir os limites de controlo com as especificações ou com as metas para o processo. As especificações são a voz do cliente ou do mercado, as metas são a voz ou o desejo da gestão, os limites de controlo são a voz do processo, aquilo que o processo é capaz de fornecer." (Fonte - Dezembro de 2008)
Volto ao texto de Roger Martin:
"If outcomes stay within your preset control limits, then keep your hands off the dials — with confidence."
A carta de controlo permite descortinar entre variação aleatória ou variação causada por causas específicas. O que nós fazemos ao executar uma estratégia é perturbar uma realidade. Vamos então à segunda observação.
O próprio acto de executar uma estratégia envolve frequentemente a introdução de mudanças ou “causas especiais” de variação, porque o objectivo é mudar a organização do seu estado actual para um futuro novo e desejado. No SPC, a variação das causas especiais indica normalmente uma necessidade de correcção, mas na estratégia, a introdução de causas especiais (novas iniciativas, mudanças estruturais, etc.) é intencional. Este contraste entre manter a estabilidade do processo (foco do SPC) e impulsionar a mudança estratégica pode ter de ser mais explorado para evitar confusão. Não percebo como Roger Martin conclui que um processo sob controlo estatístico é um processo em que a estratégia está a resultar.

terça-feira, outubro 22, 2024

Palhaçada do dia

Curiosidade do dia

Vemos, ouvimos e lemos acerca das confusões, lutas, resistências, prepotências, e irrealismos relacionados com as ideias sobre a descarbonização da economia.

Esta manhã, durante a caminhada matinal li:

"Thomas Edison's approach to electric lighting was similarly systemic. Contrary to popular myth, he didn't invent the incandescent light bulb. The great English chemist Humphry Davy laid the groundwork for it in 1809, with other inventors to follow. Edison didn't start by asking how he could solve the technical problem of making a better lightbulb; that came later. Instead, he asked how he could get consumers to switch from kerosene to electricity. He understood that despite the many advantages of electric light, it would replace kerosene only if it had its own economically competitive network." 

Trecho retirado de "Lead from the Future" de Josh Suskewicz.

"Businesses ought to be like artists, not paperclip maximisers"


Na conversa da passada sexta-feira, o meu parceiro das conversas oxigenadoras falou-me de uma aplicação de inteligência artificial que o tem fascinado. Falou-me de vários postos de trabalho que rapidamente terão os dias contados e perguntou-me como será a competição no futuro quando todo o know-how estiver disponível na ponta dos dedos.

Eu não tenho a veleidade de saber o futuro ...
"Vaidade das vaidades, tudo é vaidade!"

Mas respondi com uma ideia que há muito partilho aqui no blogue: a arte!!!

Recordo:

 Entretanto, ontem cheguei ao fim do último capítulo de "The Unaccountability Machine" de Dan Davies e encontro este trecho:

"they don't work by defining an objective function and seeking to maximise it. This is the paradigm shift that might be required - that organisations and systems can be like people, having purposes without a single goal. An artist doesn't have a successful career by maximising their art; they do it by repeatedly producing work that they are proud of.

That's what the world could look like if we got rid of the blind spots. Businesses ought to be like artists, not paperclip maximisers. The economic concept of optimisation, and the institutions of management and government which enforce its use, effectively act as a brutal information-reducing filter. By taking away the pressure to maximise a single metric (and therefore to throw away information that doesn't relate to it), organisations could apply their decision making capabilities much more effectively. They could innovate more, design more sustainable solutions and build less adversarial, longer-term relationships with their people."

Já nas últimas páginas leio:

"Any system which is set up to maximise a single objective has the potential to go bonkers.

It follows from the mathematics of constrained optimisation, combined with the basic laws of cybernetics. Setting up a maximising system involves defining an objective function, and throwing away all the other information. Sooner or later, the environment is going to change, and something which isn't in the information set any more is going to lead the system into destruction.

Consequently:

Every decision-making system set up as a maximiser needs to have a higher-level system watching over it.

...

You can't have the economists in charge, not in the way they currently are.

If every maximising system has to have a higherlevel system governing it (to make sure it doesn't go bonkers), then that logically implies that the top level of any decision-making system that's meant to operate autonomously can't be a maximiser. And so, the governing philosophy of the overall economic system can't be based on the constrained optimisation methodology that's currently dominant in the subject of economics. Otherwise there's a risk that the system will go bonkers, and that it will start pursuing maximising objectives, oblivious to the danger that it's on course for making human life impossible. Like it actually has done."

Recordo de Janeiro deste ano Não é impunemente ... 

segunda-feira, outubro 21, 2024

Curiosidade do dia


Hoje o jornal espanhol "El Economista" publica o artigo "El dato que desmonta el milagro económico de España: producir más no siempre genera prosperidad". Um texto que deve alimentar reflexão.

A economia espanhola está a crescer rapidamente, com um ritmo que quase triplica o da zona euro, o que gera emprego e ajuda a controlar a inflação. No entanto, este crescimento não se traduz em melhorias significativas na riqueza per capita dos cidadãos.

Apesar do forte crescimento do PIB agregado, o PIB per capita espanhol quase não avançou desde 2019 (apenas 0,1%), em contraste com a Itália, cujo PIB per capita cresceu 4,7% no mesmo período. Isso mostra que o crescimento não está a contribuir para melhorar o bem-estar das pessoas.

O crescimento do PIB em Espanha tem sido impulsionado pela incorporação de um grande número de trabalhadores, especialmente imigrantes. Embora isto aumente a produção total, também dilui o PIB entre uma população maior, o que explica a estagnação do PIB per capita. O modelo económico de Espanha depende fortemente de sectores de baixo valor acrescentado, como o turismo, e não está a aumentar suficientemente a produtividade. Além disso, a falta de investimento está a prejudicar o crescimento a longo prazo, e o governo não está a adoptar políticas que incentivem a inovação e a produtividade. Ainda hoje Camilo Lourenço contava a estória de um investimento na área da energia que foi para Sines tal a voracidade fiscal em Espanha.

A Itália, ao contrário de Espanha, tem-se focado mais na exportação de bens e no investimento, o que contribui para um crescimento mais sustentável da sua produtividade e do seu PIB per capita.

O problema de Espanha (e de Portugal) é a baixa produtividade, resultante de um modelo económico focado em sectores de baixo valor acrescentado (como o turismo) e de um crescimento sustentado na expansão da força laboral em vez de no aumento da eficiência ou inovação. Embora o PIB esteja a crescer fortemente, esse crescimento não se reflecte em melhorias significativas na riqueza por habitante. 

Curto-prazismo e futuro (parte II)

Quando ontem de manhã publiquei aqui a parte I não fazia ideia de, horas depois, no jornal Público encontrar o artigo "O "samurai" dos custos caminha no fio da navalha - Carlos Tavares":

"Carlos Tavares chegou ao Salão Automóvel de Paris preparado para tudo.

Setembro tinha sido um mês difícil para o gestor português, pressionado por analistas, accionistas, sindicatos e parceiros comerciais.

Em Itália, a falta de interesse no Fiat 500e levou o grupo Stellantis, dono de 14 marcas e presidido por Tavares, a suspender a produção, deixando Turim e a icónica fábrica de Mirafiori à beira de um ataque de nervos.

Nos EUA, os retalhistas das marcas norte-americanas da Stellantis criticaram a "gestão de vistas curtas" do presidente, quando foram cortados postos de trabalho e reduzida a produção nas fábricas norteamericanas, apostando antes na venda de unidades mais antigas que se acumulavam nos armazéns, por causa de uma estratégia que levou o grupo a subir preços na pandemia sem apostar na renovação. Tavares estaria a contribuir para a "rápida degradação" das marcas, acusam. Tal aposta ajudou a engordar os lucros da Stellantis em 2023 e o prémio de desempenho de Carlos Tavares (que embolsou 36,5 milhões de euros), como sugeriram os críticos, mas levou marcas como Jeep (-9%), Dodge, Ram (-19%) e Chrysler a perder vendas (em cinco meses consecutivos) e quota de mercado. Além disso, havia sinais preocupantes de problemas operacionais. Mais de 700 mil unidades da marca Jeep poderiam estar em risco por um problema de motor. O embaraço era evidente."

Monta-se uma vila Potemkine e ... engana-se meio-mundo. 

domingo, outubro 20, 2024

Curiosidade do dia


Daqui.


Curto-prazismo e futuro


Nunca tinha visto isto escrito desta maneira tão enxuta acerca do curto-prazismo:
"One consequence of focusing on quarterly numbers and short-term delivery is that costs become more important than revenues. To increase its revenue, an industrial company like GE would have to find a customer, win the order, make the product and get paid – hard to do in twelve months, let alone three. An employee can be fired more quickly than that; a business can be shut down or sold. The management has greater control over costs than revenue – they depend less on decisions taken outside the organisation’s perimeter."

Trecho retirado de "The Unaccountability Machine" de Dan Davies.

sábado, outubro 19, 2024

Curiosidade do dia

Mão amiga tem-me feito chegar notícias da economia alemã. Eis uma amostra:

  • Metal and electrical misery - Hundreds of thousands of jobs are eliminate
  • Job losses again - Brose wants to cut almost 1,000 jobs
  • Next downfall! The Titanic shipyard is insolvent

  • Entretanto na última página do FT de ontem "Bargain prices lure buyers to corporate Germany":
    "Foreign takeovers of groups listed in London have given rise to much hand-wringing in the City. The situation is spreading to the continent.
    "Deutschland im Ausverkauf" is the phrase used to describe this by worried observers in Berlin.
    Germany, it would appear, is on sale. Deal volumes are inherently lumpy. But the numbers show a trend. So far this year, international companies have been on a $47.2bn German shopping spree, according to Tim Winkel of 7Square. That's nearly 70 per cent higher than the value of inbound M&A in the whole of 2020. It includes high-profile megadeals such as Adnoc's bid for chemicals company Covestro and Danish group DVS's swoop on Deutsche Bahn's logistics business - together worth about $32bn. Concerns will not have been assuaged by would-be suitors stepping into more sensitive sectors such as banking. UnCredit's frenemy hug on Commerzbank, which has raised politicians' hackles, is not counted in the numbers.
    Adding to worries, German groups are not out doing some shopping of their own."

    Já hoje escrevi no Twitter:

    "Lê-se o FT e está polvilhado de sinais negativos da evolução económica na rua comercial e na indústria, a França entra em austeridade, o tecido industrial alemão está a esfarelar.

    Por cá está tudo bem pq 1 orçamento socialista vai ser aprovado."

    Unreasonable hospitality - parte VIII

    "But when you're going for four stars, you're aiming for perfection, so we did everything in our power to make his experience perfect - even when he wasn't there. Because every night that Bruni [Moi ici: O crítico do NYT que atribuía as estrelas] wasn't in the restaurant, which was most of them that year, we designated one random table as the Critic of the Night and used those tables as a dress rehearsal.
    ...
    Most nights, the critic in our restaurant wasn't real, just as the rivalry Michael Jordan created in his head wasn't real, but it doesn't have to be real to work. The ruse was successful.
    ...
    Because the Critic of the Night was for us. It allowed us to role-play so that every single move was rehearsed and polished to a gleam. It also meant that when Bruni did come in, we'd be so practiced, not only would there not be any panic, but we would be ready for him regardless of what table he sat at and what team ended up serving him. The host would make eye contact and nod, and the cascade would begin: He's here, and here we go."

    Ao designar um "Critic of the Night", a equipa estava constantemente a treinar e aperfeiçoar os seus processos, mesmo na ausência de um verdadeiro crítico. Nas PME's, isto pode ser adaptado criando situações de simulação de clientes exigentes ou cenários desafiadores. Esse treino constante prepararia a equipa para situações reais, aumentando a capacidade de resposta, melhorando a consistência e contribuindo para um serviço de excelência, independentemente das circunstâncias. Esse treino constante criaria o terreno perfeito para a habituação na procura da melhoria continua, para a inovação, para a subida na escala de valor.

    E volto à primeira citação do livro de Guidara aqui no blogue: E por cá, temos esta tradição?

    A importância de constantemente esticar a corda para aprender, para melhorar. Por isso, quando li "Conserveira portuguesa mantém métodos de confeção iniciados em 1920", também vi um lado negativo para além da tradição.

    Trechos retirados do livro "Unreasonable hospitality: the remarkable power of giving people more than they expect" de Will Guidara.