Portanto, nos episódios anteriores desta série fomos do reconhecimento de um problema até à formulação de uma política da qualidade alinhada com a estratégia, e daí à tradução dessa política em objectivos da qualidade com indicadores associados. Agora chegamos a uma etapa crítica: como fazer com que esses objectivos não sejam apenas boas intenções, mas trajectórias de melhoria sustentada? A resposta está no desenvolvimento de iniciativas estratégicas.
"Conjunto de elementos interrelacionados ou interatuantes de uma organização para o estabelecimento de políticas e objectivos e de processos para atingir esses objectivos."
É nada mais nada menos que o que nos propomos com os primeiros 3 passos. BTW, nunca gostei da revisão da definição com a incorporação da palavra "processos", mas adiante.
Os resultados que a Vitrumo obtém hoje não são fruto do acaso: são a consequência natural do modo como trabalha, decide e aprende. Se os resultados futuros desejados forem mais exigentes, então a organização terá de se transformar. Essa transformação não acontece por decreto, mas sim através de projectos concretos — as iniciativas estratégicas — que criam as condições para a convergência entre o desempenho actual e o desempenho futuro desejado.
As iniciativas são projectos, conjuntos de actividades a desenvolver por alguém num certo espaço de tempo. Cada uma dessas actividades faz parte de um cronograma e é possível acompanhar e controlar a sua execução.
E como é que se definem estas iniciativas? (estas iniciativas podem ser chamadas de iniciativas estratégicas pois estão focadas no cumprimento de objectivos, desafios de desempenho, alinhados com a estratégia).
Kaplan e Norton propuseram, na sua evolução do Balanced Scorecard, que as iniciativas estratégicas fossem definidas por brainstorming. Foi uma desilusão! O problema não está na técnica em si, mas no seu uso superficial: depois de todo o rigor intelectual na construção de um mapa da estratégia e na definição de indicadores, reduzir a escolha de iniciativas a um exercício criativo e genérico, come on!
Aqui entra o contributo de Goldratt e da sua Teoria das Restrições (TOC): identificar os pontos fracos que limitam o sistema e concentrar esforços em quebrar essas restrições. E também o contributo de Senge e do pensamento sistémico: ver os resultados não como acidentes isolados, mas como produtos de ciclos invisíveis que conspiram contra a estratégia.
O desempenho insatisfatório raramente é culpa de um “terrorista organizacional” ou de um acidente do destino. É o resultado previsível de um sistema a funcionar exactamente como está desenhado. Usando o “iceberg de Senge”, percebemos que os resultados visíveis são apenas a ponta; por baixo estão padrões de comportamento e estruturas sistémicas que os alimentam. Ou seja, os resultados de uma empresa não são como meteoritos caídos do céu, nem são obra de um jogo de roleta, nem uma consequência de artimanhas de “terroristas”, intervenientes maldosos, que fazem mal de propósito.
Normalmente as organizações vêem o mundo assim:
Um lugar cheio de resultados inesperados que conspiram contra sua existência e o seu sucesso.
Mas se cavarmos um pouco, se mergulharmos mais fundo vemos:
Encontramos sempre um sistema invisível com a sua agenda própria. Pior, encontramos grupos de ciclos invisíveis conspirando contra a agenda oficial.
Muitas vezes, estas estruturas estão interligadas em ciclos de feedback negativos que reforçam a manutenção do status quo.
Este iceberg é uma boa forma de perceber a realidade e os resultados, e uma boa ferramenta para diferenciar remendos de actuações estruturais.
Assim, o primeiro passo, portanto, não é inventar ideias, mas mapear a conspiração da realidade: recolher factos negativos observáveis (que ninguém pode negar), relacioná-los com as suas causas prováveis e perceber como se encadeiam em ciclos de causa-efeito. É nesse emaranhado que se escondem as restrições centrais que geram um efeito dominó:
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Se determinarmos a primeira peça, podemos actuar para impedir a reacção em cadeia.
A minha primeira hibridização do BSC surge quando descobri a teoria das restrições e percebi como a podia usar para desenvolver as tais iniciativas estratégicas, como a podia usar para fazer emergir à superfície os ciclos sistémicos conspirativos. A partir do trabalho de uma equipa heterogénea pode-se tirar uma fotografia ao vivo e a cores de como funciona a conspiração da realidade actual, podemos vislumbrá-la como uma sequência de dominós a caírem, e a contribuírem de uma forma normal para o tal desempenho negativo.
As iniciativas estratégicas afloram de uma forma cirúrgica das abordagens para quebrar os ciclos conspirativos.
O primeiro passo para desenvolver iniciativas estratégicas não é inventar soluções, mas mapear a conspiração da realidade. O exercício pode seguir três passos simples usando post-its:
- Recolher factos negativos – Observações concretas, que ninguém pode negar: “a máquina X esteve parada 12 horas”, “faltam peças críticas”, “não temos plano de manutenção preventiva”.
- Ligar causas e efeitos – Relacionar cada facto com possíveis causas. Ao ligar vários post-its numa parede, começa a surgir o desenho dos ciclos invisíveis.
- Identificar restrições e causas-raiz – Onde estão os “não temos”, “não fazemos”, “não sabemos”? São esses os pontos de alavanca para a mudança.
Este trabalho, feito por equipas heterogéneas que conhecem a realidade no terreno, revela onde actuar. É nesse ponto que a teoria ganha vida.
Voltemos ao exemplo:
Há muitos anos com William Dettmer aprendi a magia de usar esta trilogia:1 - Começar por um facto negativo. Algo que seja inegável (factual), sem discussão. Por isso, pode ser usado como uma âncora segura, uma boa fundação para o resto.
2 - O facto negativo pode ser incontestável, mas ser irrelevante para o nosso desafio estratégico. Por que é que o facto negativo é importante para o nosso desafio? Esta pergunta obriga-nos a subir na escala de abstracção e ver o mundo a outro nível.
3 - Agora vamos entrar no domínio da especulação. Qual a causa ou causas na origem do facto negativo?
Voltemos à política. A política retrata um estado futuro desejado, mas a empresa está no presente. O que fazemos é:
Vamos ao futuro desejado retratado na política e quantificado nas metas associadas aos indicadores e vemos como é o mundo, como é a realidade da organização. Depois, regressamos ao presente e comparamos o que se vê no presente com o que se viu no futuro desejado. Cada trilogia fica ancorada num facto negativo que se observa quando se faz a comparação.
Se pedirmos a X pessoas que isoladamente escrevam 4/5 trilogias relacionadas com a estratégia da empresa, elas conseguem facilmente gerar 20 ou 30.
Se as afixarmos numa parede e olharmos para o conjunto, começamos a notar que conseguimos estabelecer relações entre elas. Por exemplo:
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