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sexta-feira, junho 06, 2025

"to build brand first, distribution second"

Há cerca de 15 anos escrevi sobre os frangos Purdue.

A história dos frangos Purdue é sobre sair da lama pegajosa da comoditização. Nos anos 70, na América, todos os frangos tinham de exibir um selo veterinário — garantia de que estavam legais e próprios para consumo. Resultado: nas prateleiras, eram todos iguais. E quando tudo parece igual, o critério passa a ser só um — o preço. E aí, é a guerra do cêntimo.

A Purdue recusou-se a alinhar nessa dança. Em vez de competir por eficiência cega, decidiu diferenciar-se. Cuidou da qualidade, trabalhou a marca, e — mais ousado ainda — comunicou directamente com o consumidor final fez o by-pass à distribuição das cadeias de supermercados grandes. Apontou aos olhos de quem compra e disse: o nosso frango é diferente. E explicou porquê.

Enquanto os outros vendiam a peso, a Purdue vendia com história, com nome, com cara. Criou valor percebido. Não ficou à espera que o distribuidor ditasse o preço — escolheu canais que valorizavam o que tinha para oferecer.

E quando fez bem o trabalho de casa, adivinha? Os distribuidores vieram bater-lhe à porta. Porque o consumidor já tinha escolhido. Porque eficácia, quando bem feita, atrai. Porque nem tudo se resolve com tabelas de Excel.

Já agora, também posso recordar o desastre de quem não segue essa via, "Especulação à volta da carne de porco". Só foram precisos quase 5 anos para confirmar o que se adivinhava.

Recordo os frangos Purdue por causa de um artigo no The Times do passado dia 2 de Junho, "How I sold my first million cans ... by not Dashing":

"Supermarket shelves are often seen as the ultimate destination for a brand. They’re high-traffic real estate that let you say, “I’ve arrived”. When you’re a challenger brand, getting listed can feel like validation. But in our first two years at Dash, one of the best things that happened in our journey was that we didn’t go anywhere near a supermarket shelf. In fact, we sold nearly a million cans before a single customer could pick one up in a supermarket. Going this way wasn’t without its challenges. But it taught us something important. Success doesn’t depend on being available, it depends on being visible.

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[Moi ici: Supermarkets] They’ve got legacy, trust and footfall. And when you’re a start-up, you really covet that kind of exposure. Big-name retailers are also tough, competitive environments. Incumbent brands often have the edge: their product may not be better than yours but they can outspend you, out-discount you and outmuscle you in conversations with buyers. You need more than a good pitch. So from day one we focused on building a brand, not just shifting stock. In our first nine months we had boots on the ground, literally. We were a small team essentially of travelling salespeople, spending our days traipsing around London, rain or shine, with heavy rucksacks full of cans. We knocked on the doors of coffee shops and delis, dropping off samples and trying to convince anyone who’d listen. We worked seven days a week, clocked at least 20,000 steps a day and got used to hearing “no”.

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We’d always been digitally savvy, and during the pandemic, when stores were closed, habits were changing, and people were spending more time online, our investment in a direct-to-consumer approach paid off. We poured effort into our website, customer experience, content and data. To this day we still have much higher than average direct-to-consumer numbers. In fact, 55 per cent of our total sales are online. We also got smart about how and where we showed up. We did giveaways at high-profile events like festivals that helped us build awareness and relevance, whether we moved ten cans or a hundred. We were present, even if we weren’t (yet) physically on a supermarket shelf. 

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key lesson — to build brand first, distribution second — is one we now apply to every new market we enter.

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You need people to understand what your product is and why it matters before they see it for the first time. That way, the first sighting is less speculation and more tipping point. I’m proud that today Dash is stocked in supermarkets across the UK. It means more people can discover our product and what we stand for. But if we hadn’t invested in building the brand early on, no retailer would have had a reason to list us. And no customer would have had a reason to pick us up."

A história dos frangos Purdue e o percurso da marca Dash convergem num ponto essencial: a marca antecede o mercado. Ambas recusam a lógica do “estar disponível” como sinónimo de sucesso, e escolhem o caminho mais difícil — mas mais sólido — da construção de identidade e valor percebido antes da massificação da distribuição.

No caso da Purdue, nos anos 70, o mercado dos frangos era uma monocromia legalizada: todos com selo veterinário, todos iguais aos olhos do consumidor. A Purdue decidiu ser diferente, não no papel, mas na cabeça das pessoas. Investiu em qualidade, falou com o consumidor final, deu cara ao frango — e só depois vieram os distribuidores.

A Dash, quase 50 anos depois, faz o mesmo com latas de água com gás e fruta. Em vez de correr para o altar dos supermercados, fez-se presente sem estar presente: caminhou, falou, entregou amostras, ouviu recusas, aprendeu. Só depois — quando já havia marca — é que procurou prateleiras.

Ambas perceberam algo que muitos ainda não digeriram: ser visível é mais importante do que ser disponível. A Purdue sabia que um frango com cara vale mais do que dez com selo. A Dash aprendeu que uma lata com história faz mais sentido do que mil empilhadas sem ninguém saber porquê.

E há mais: ambas mostram que a tentação de acelerar a distribuição sem maturidade de marca é perigosa. A Dash caiu nessa armadilha num mercado internacional — foi para a prateleira antes de ir para a cabeça do consumidor. Pagou o preço. A Purdue evitou-a, e colheu os frutos.

No fundo, é a diferença entre fazer eficiência para encaixar num sistema, ou fazer eficácia para moldar esse sistema à nossa proposta. Como a Dash diz: “You won’t win by being available if you’re invisible.” E como a Purdue provou: quando és relevante, o mercado vem ter contigo. Não o contrário.

domingo, janeiro 03, 2016

Muito mais do que valor financeiro

O @pauloperes via Twitter enviou-me esta foto (os sublinhados a amarelo são meus):
Estou tentado a concordar com o que leio com uma condição, que aqueles "customers" não sejam traduzidos por "consumidores".
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B2B é um bicho bem diferente do B2C ou do B2B2C!
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Se o negócio é B2B acredito que se aplica o que está sublinhado na figura. E, por isso, faz todo o sentido evoluir para um value-based pricing que considere todo o ciclo de vida do produto nas mãos do cliente. Por exemplo, o fabricante de polímero que vende o seu material mais caro por demonstra ao cliente que ele produzirá mais por unidade de tempo. Por exemplo, o fabricante de máquina de espuma que vende a sua máquina mais cara porque demonstra ao cliente que produzirá mais espuma e com menos desperdício por unidade de tempo.
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Se o negócio é B2B2C vai depender. Quem é que a empresa do primeiro B eleje como aquele para quem realmente trabalha? Vimos recentemente aqui o caso da Raporal. A empresa, sem marca própria na qual aposte a sério, elejeu o segundo B como o vector, já a Purdue elejeu o C da relação como o seu vector principal. Quando se eleje como vector o outro B as hipóteses de value based pricing são poucas ou nenhumas porque se concentram na cadeia logística. Quando se eleje como vector o C, as hipóteses de value based pricing crescem muito porque, usando a linguagem de J. C. Larreche, já não estamos a trabalhar só ao nível da captura de valor, estamos a trabalhar também ao nível da originação de valor!!!
Se o negócio é B2C vai depender do posicionamento da empresa. No caso do B2C como interpretar a frase traduzida:
"Diminuir os custos totais dos consumidores e/ou aumentar as suas receitas e você aumentar seus lucros."
Agora, imaginar um consumidor a preferir um iphone a um HTC... conheço um HTC-fan que é capaz de demonstrar tecnicamente a superioridade de um HTC apesar do preço inferior face a um iphone... mas é de atributos técnicos que estamos a falar no reino do B2C ou de magia?
Se o negócio é preço, então, para mim como consumidor, prefiro comprar couve romanesca no Lidl a 1,59/kg do que no Pingo Doce a 1,99/kg.
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No entanto, se o negócio não é preço, então, é um desperdício de oportunidade e um erro pensar como um muggle e não perceber que o consumidor quer mais do que a coisa, quer a experiência que a coisa permite sensoriar. É claro que se pode ir buscar uma bicicleta à Sport Zone por um bom preço e pagar a um técnico para a afinar e fazer alguma customização adicional mas não é a mesma coisa que ir arranjar uma bicicleta à megastore do mercado de Matosinhos que tenha passado pelas mãos dos duendes.

Continua.


domingo, fevereiro 06, 2011

Especulação à volta da carne de porco

Esta história sobre a Raporal "O novo negócio da Raporal é tornar mais saborosa a carne que comemos" fez-me recordar a história dos frangos Purdue.
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Como é que uma empresa cria, entrega e captura valor?
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"Todos os dias saem da fábrica das instalações da Raporal, nos arredores do Montijo, quatro camiões em direcção aos armazéns da Jerónimo Martins (JM). Em cada um seguem 20 a 25 toneladas de carne de porco, mas não uma carne qualquer. A empresa chama-lhe o "porco com mais sabor", mas, na realidade, é o resultado de um projecto que demorou três anos, custou 20 milhões de euros e foi premiado recentemente num concurso nacional, o Portugal Vencedor"
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Não conheço a Raporal e, por isso, o que escrevo aqui é pura especulação.
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Será que a Raporal vai conseguir obter o retorno adequado daquele investimento que fez?
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"A carne, que se diz mais saborosa e tenra, é vendida sob a marca Pingo Doce nas lojas da JM (Pingo Doce, Feira Nova, Recheio e Lidosol), graças a um contrato de cinco anos no valor de 250 milhões de euros. E tudo começou numa simples troca de palavras."
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Ou seja, os donos da prateleira continuam a controlar a prateleira.
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Os consumidores não vão conhecer a marca Raporal...
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Espero que a Raporal tenha o retorno adequado do investimento que fez... mas é um risco ter um produto inovador, um produto que tem de ser mais caro para poder pagar o investimento e aumentar a margem de quem arriscou, e escoá-lo através de uma marca que todos os dias nos canta, nos media, que o preço é baixo o ano inteiro...
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Ou será que é o Pingo Doce que está equivocado? A publicidade não é sobre o melhor produto, é sobre o produto mais barato...
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O mais certo, e aqui especulo, é a Raporal, não ter tido a paciência estratégica para fazer o by-pass inicial à grande distribuição e esperar que o consumidor viesse a exigir a marca Raporal na grande distribuição. A frangos Purdue é uma grande lição!