quinta-feira, julho 17, 2025

Competir num mundo Mongo com um modelo anti-Mongo



O parceiro das conversas oxigenadoras recomendou-me a escuta deste podcast com Carlos Mendes Gonçalves.

O Grupo Mendes Gonçalves tem registado crescimento sustentado, com aproximadamente 30 % das vendas feitas internacionalmente, presença em mais de 22 países e crescimento anual na faixa de +20%.
O foco estratégico assenta numa diversificação constante de produtos (até 50 novos lançamentos por ano) e a inovação contínua tem sido fundamental para a competitividade global

Nesse mesmo dia, 15.07, tinha lido no FT, "Buffett comes out on top from Kraft Heinz flop". 

Há anos que escrevo aqui sobre a Kraft Heinz:
A Kraft Heinz, nas mãos da 3G Capital, cortou custos com violência (20% dos trabalhadores e 40% dos overheads), mas esqueceu-se de investir em marcas e inovação. Resultado: vendas em queda durante seis trimestres, desvalorização bolsista massiva e marcas ocas. Como escrevi, em Fevereiro de 2019, “não se corta caminho para o crescimento” – e a Kraft Heinz é exemplo disso.

Nos textos “Mongo é inevitável” e “A defesa da suckiness”, mostro que os gigantes tendem a degenerar numa busca doentia por eficiência e escala, que os cega ao valor emocional, à diversidade, e à criação de tribos apaixonadas.

A Kraft Heinz tentou competir num mundo Mongo com um modelo anti-Mongo — volume, uniformidade, centralização e frugalidade. Quando finalmente começaram a lançar 20 variedades de ketchup, era tarde demais e feito com ADN errado: cada nova versão trazia complexidade, mas sem alma. As pequenas marcas de nicho estavam já a conquistar corações.

Escrevo sobre marcas que viram carcaças e da dificuldade em “fingir autenticidade”, o caso Kraft Heinz ilustra esse paradoxo: marcas poderosas (Kraft, Heinz) que já não criam desejo, apenas reconhecimento vazio. Os consumidores tornaram-se ketchup-curious, mas fieis a novos sabores com identidade, não à nostalgia empacotada.

O colapso da Kraft Heinz é o espelho perfeito das minhas reflexões. Mostra como:
  • cortar custos sem repensar o modelo leva ao esvaziamento das marcas;
  • a lógica da eficiência é incompatível com a lógica do encantamento emocional;
  • a fidelidade do consumidor pós-Mongo constrói-se com identidade, não com volume;
  • e o verdadeiro valor nasce de se aceitar a imperfeição, a diversidade, e a emoção - não da padronização "perfeita" do século XX.
Buffett saiu a ganhar porque é mais dono de finanças do que de marcas. Mas o modelo da 3G Capital é uma lição do que não fazer num mundo onde o consumidor escolhe sentir. 

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