Uma pequena empresa com 17 trabalhadores, com 118 anos de tradição (o potencial de autenticidade que não se pode copiar do pé para a mão), que aposta na diferenciação:
.
"Manter as receitas originais, algumas com base em receitas inglesas, e melhorá-las com "uma aposta forte na qualidade superior dos produtos e pela diferenciação",
.
Uma pequena empresa que aposta em "Aqui, tudo é feito à moda antiga, só o embalamento ganhou alguma modernização."
.
Em vez de apostar na marca e num crescimento lento via lojas gourmet e lojas alternativas, que lhe permitiria sonhar com margens elevadas, temos a aposta na quantidade:
.
"Hoje, há muito por onde escolher. Desde os bolos de mel caseiros aos gelados de fruta, que irão brevemente surgir embalados nas grandes superfícies em doses duplas."
.
Acompanhem-me essas margens, vão trabalhar muito, vão facturar muito, mas aposto que vão ganhar cada vez menos. A grande distribuição não é má, tal como o escorpião não é mau, a sua natureza vai vir ao de cima, e pressionar, sugar, gritar eficiência, eficiência, eficiência... vão prometer quantidade, quantidade, quantidade se lhe fornecerem Quality, Cost e Delivery... tudo isso é incompatível com: pequena empresa; 17 trabalhadores; tradição, diferenciação, variedade, ...
.
Juro que escrevi o último parágrafo deste
postal ainda antes de ler este
artigo e este pormenor:
.
"o jovem gerente, Bruno Vieira, 30 anos, com formação em controlo de qualidade alimentar."
.
Quando se aposta no QCD e cumprem-se os mandamentos todos, e entram no mercado concorrentes com outro modelo de negócio assente na escala, em lotes gigantes, com compras de matérias-primas em grandes quantidades, a reacção instintiva é esta:
.
"Actualmente, a grande percentagem do que se vende em Portugal é oriunda de outros países. Os produtos entram mas ninguém controla a qualidade. Encontramos bolacha mais barata do que o preço da nossa farinha. Como é que podemos competir perante isto?", questiona. Daí o apelo à sensibilização de quem governa: "Os nossos produtos, aqueles que nos dão uma identidade própria enquanto portugueses, que diferenciam culturas, deveriam ter protecção. Infelizmente, não se dá o devido valor ao que é nosso e genuíno."
.
Esta reacção é lapidar, está cá o cardápio todo:
- os outros não têm qualidade;
- incapacidade de perceber que existe mais do que um modelo de negócio;
- apelo ao proteccionismo
Se tivesse oportunidade de trabalhar com este gerente dava-lhe a conhecer o mundo dos modelos de negócio... recordava este
postal e esta
apresentação, para mostrar que, qual lanceiro polaco a investir contra panzers, não tem hipóteses em tentar enfrentar esta gente de frente no terreno que lhes dá toda a vantagem, a grande distribuição, as grandes quantidades. Chamava-lhe a atenção para o risco dos
descontos. Promoveria uma reflexão sobre o que fazem, de que se orgulham, de quais as suas diferenças. Depois, dava-lhe a conhecer
o mundo dos clientes, e desafiava-o a procurar "casar" as características da empresa com o grupo de clientes mais adequado - os clientes-alvo.
.
Olhar olhos nos olhos dessa gente, não confiar em estatísticas, conversar com eles e chegar à proposta de valor: O que procuram e valorizam? Onde compram? Onde vivem? Quem nos pode ajudar a influenciar os clientes-alvo? Que promessa lhes vamos fazer? O que vamos comunicar e como? E depois, passava a bola ao marketing.
.
O campeonato não pode ser o dos custos, tem de ser o do valor... custo da farinha? Um concorrente adaptado à vida no ecossistema da grande distribuição, pode numa encomenda encomendar mais que a fábrica em causa durante 2 ou 3 anos... e quer competir no preço da farinha? Saia desse campeonato com estilo e aproveite esses 118 anos com orgulho.
Sem comentários:
Enviar um comentário