sábado, dezembro 20, 2025

Hollowing ao vivo e a cores



A revista The Economist desta semana publica o artigo, "Luxury handbags may be shoddier than you think".

O artigo analisa a crescente pressão sobre o negócio das malas de luxo, tradicionalmente um dos pilares financeiros da indústria. Vídeos virais nas redes sociais expõem falhas de qualidade em produtos muito caros, o que aumenta o escrutínio público num contexto em que os preços subiram fortemente após a pandemia. 
"Creators such as ‘Tanner Leatherstein’ and ‘Fabricateurialist’ show their audiences that even the priciest tier of clothes and accessories is rife with loose heel caps and shoddy stitching."
Ao mesmo tempo, o consumo abranda, sobretudo nas malas, devido à pressão sobre a classe média e a uma mudança de preferências em direcção a experiências em vez de bens materiais. 
"Declining sales of leather goods accounted for three-fifths of the reduction in overall spending on luxury items since 2023."
Surgem alternativas como o mercado de segunda mão e as "superfakes". 
"Online marketplaces for secondhand luxury goods are growing quickly."
"Decent quality knock-offs known as ‘superfakes’ have also lured some one-time luxury clients."
Algumas marcas tentam responder reforçando o controlo da cadeia de fornecimento e investindo em artesanato, com a Hermès a surgir como exemplo de que a qualidade consistente continua a ser recompensada.

Isto faz-me lembrar um tema que volta e meia abordo aqui no blogue: Hollowing (parte I, parte II e parte III).

O que a The Economist revela é que o hollowing chegou ao luxo: quando a marca sobrevive, mas o produto já não está lá. 

Durante anos, o fenómeno do hollowing — marcas que mantêm preços premium depois de terem esvaziado o produto de valor real — foi observado em sectores industriais tradicionais. Hoje, chegou ao coração do luxo.

O artigo, sobre o abrandamento do negócio das malas de luxo, descreve um padrão conhecido: preços a subir rapidamente, qualidade sob escrutínio público e consumidores a testar alternativas. Vídeos virais expõem falhas em produtos caríssimos, enquanto mercados de segunda mão e imitações de alta qualidade ganham terreno.

Durante o boom pós-pandemia, muitas marcas subiram preços muito acima dos custos, esticando a margem sem reforçar a diferenciação. O resultado foi previsível: maior exigência, maior desconfiança e perda de ligação emocional ao produto. Tal como noutros sectores, não é apenas a pressão sobre o poder de compra que explica a mudança — é a percepção de valor.

A história repete-se. Cadeias de fornecimento longas, foco excessivo na redução de custos e menor controlo sobre o processo produtivo acabam por corroer aquilo que sustentava a marca. Fica o logótipo, fica o marketing, mas o produto já não justifica o preço.

A excepção confirma a regra. 
"Hermès has avoided quality concerns by having a single artisan produce its priciest handbags… Craftsmanship, it seems, still pays."
A Hermès, que manteve controlo apertado da produção e uma lógica artesanal coerente com o posicionamento, continua a crescer. Mostra que o problema não é o luxo, mas a estratégia.

O hollowing não é um acidente conjuntural. É o resultado de escolhas. Quando o produto deixa de ser o centro, a marca pode sobreviver algum tempo — mas mais cedo ou mais tarde, o consumidor percebe.

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