Na semana passada escrevi sobre a mudança na China, a transição de Keynes para Schumpeter:
"A coligação que venceu as eleições na Alemanha anunciou esta semana um fundo de 500 mil milhões de euros que se destina a investimento em infraestruturas e defesa. A DBRS Morningstar considera que este fundo será uma tábua de salvação para o setor da construção, que se tem apresentado instável.
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Apesar da atenção que tem sido dada à aposta alemã na defesa, a DBRS foca-se mais na vertente da construção, indicando que este apoio será essencial para financiar projetos de infraestruturas públicas, como estradas, pontes, ferrovia e habitação nos próximos 10 anos. "Prevemos que a implementação destes projetos impulsione significativamente a atividade de construção, possivelmente para níveis vistos, pela última vez, na década de 1990", aquando da reunificação da Alemanha.
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"Acreditamos que o fundo proposto de 500 mil milhões de euros provavelmente terá um efeito semelhante, impulsionando o Governo e os gastos do setor privado na atividade de construção, aumentando assim a procura por serviços de construção em toda a cadeia de valor" , lê-se na nota. Entre os maiores beneficiários desta medida estarão a Thyssenkrupp, maior fabricante de aço, e empresas como Bilfinger."
É como se a "DVD leadership team" tivesse lugar nas reuniões da coligação que venceu as eleições na Alemanha.
A aposta no setor da construção pode impulsionar a economia no curto prazo, gerar empregos e melhorar infraestruturas. No entanto, se esta política não for acompanhada de um esforço para aumentar a produtividade e modernizar a economia, a Alemanha pode estar apenas a prolongar artificialmente um modelo de crescimento dependente do betão – algo que a China fez durante décadas e que agora tenta corrigir.
Se os projectos forem infraestruturas estratégicas, como redes ferroviárias modernas, energias renováveis e digitalização, pode ser um investimento positivo.
Se o foco for apenas obras públicas tradicionais (estradas, pontes, edifícios), o impacto será mais limitado, pois são sectores de baixo valor acrescentado e dependentes de mão de obra intensiva.
A China está a migrar da construção civil para alta tecnologia, seguindo o modelo de Japão e Coreia do Sul (Flying Geese). Se a Alemanha insistir em estimular a economia através do sector da construção, pode estar a perder uma oportunidade de acelerar a transição para indústrias de ainda maior valor acrescentado.
A China abandonou os megaprojetos de infraestruturas porque percebeu que essa abordagem criava bolhas económicas e baixa produtividade. Em vez disso, passou a investir em tecnologia avançada, impulsionando sectores como IA, semicondutores e robótica. A Alemanha, com uma economia altamente industrializada, poderia focar-se mais em inovação tecnológica e digitalização em vez de apostar em construção tradicional.
O betão é um risco?
Sim, se for um investimento mal direccionado. Se a Alemanha usar este fundo para modernizar a economia, apostando em infraestruturas estrategicamente relevantes (energias renováveis, digitalização, transportes eficientes), pode ser positivo. Mas se for apenas mais betão sem estratégia, corre o risco de se tornar um entrave ao crescimento de longo prazo, exatamente como aconteceu na China. A lição de Schumpeter e dos Flying Geese deveria servir de alerta para a Alemanha e para toda a Europa.
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