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sexta-feira, setembro 26, 2025

Arbitrage: o segredo dos que ousam ver o que os outros não vêem

 

"My father ran a small business. The great thing about growing up in a small business—whether it’s a shop, a café, or a restaurant—is that if you’ve got a family business, it’s like getting a free MBA. You automatically start to notice things.
The entrepreneurial mindset is very different from the bureaucratic mindset. The bureaucratic mindset hates outliers and surprising information because it disrupts their mental model. They tend to react with hostility to what you might call counterintuitive information—just like the original behavioral economists were shunned by mainstream economists for messing with the neatness of their artificial models.
The entrepreneurial mindset is the complete opposite. When it notices something weird, it immediately starts looking for an arbitrage opportunity. In contrast, the governmental or bureaucratic mindset says, “I must maintain consistency so I can avoid blame for my decisions. I must preserve fidelity to the model I use to justify my activities, to create a spurious veneer of rationality around everything I do—all with the ultimate aim of avoiding blame and responsibility.”
The entrepreneurial mindset says: “What the hell is going on there? Wait a second... If I know this and nobody else does, there's a market opportunity here.”"

 

A cultura burocrática não quer aprender. Quer proteger-se.

Esta frase, inspirada na transcrição acima, ajuda a expor um dos maiores bloqueios à eficácia dos sistemas de gestão: o medo de enfrentar o estranho, o inesperado, o que não encaixa nos modelos mentais existentes.

A ISO 9001 fala de liderança (5.1.1), de cultura da qualidade, de avaliação de riscos e oportunidades (6.1), de acção correctiva e melhoria (10.2 e 10.3). Mas o que acontece, na prática, quando aparece um dado fora do esperado?

Quando algo não encaixa nos nossos planos, dashboards e procedimentos? Numa cultura empreendedora, alguém pára e pergunta:
-"O que é que se passa aqui? Será que isto é uma oportunidade? Podemos aprender com isto?"
Numa cultura burocrática, a reacção típica é:
"Isto está fora do plano. Vamos arquivar. Fingir que não vimos."

A ISO 9001 pede explicitamente que as organizações determinem e avaliem oportunidades, com o mesmo rigor com que avaliam riscos. Mas quase ninguém o faz.

Porquê?
Porque ver oportunidades exige desconforto. Exige aceitar o "weird".
É preciso ver padrões onde outros só vêem ruído.
É preciso estar atento a falhas no modelo dominante.
É preciso fazer perguntas inconvenientes:
  • E se o cliente não quiser o que sempre quis?
  • E se este desvio for sinal de mudança de comportamento, não de erro?
A maior parte das empresas, mesmo certificadas, confunde oportunidade com melhoria interna. Automatizar um formulário não é aproveitar uma oportunidade. É, no máximo, reduzir desperdício.

Oportunidade, em termos económicos, é arbitrage.

É ver uma diferença de valor entre dois mundos.
É perceber que há algo disponível, barato, subvalorizado — e que pode ser transformado em algo que alguém valoriza mais.
Mas para isso... é preciso ver.
É preciso aceitar que o inesperado pode ser o sinal.

Grande parte da mentalidade empresarial — sobretudo anglo-saxónica — está enraizada num modelo de competição perfeita: mais eficiência, mais corte de custos, mais concorrência, mais pressão para o preço mais baixo.

Este modelo não valoriza o estranho. Valoriza a normalização.
Procura escala, não nuance.
Procura replicar, não reinventar.
Procura "compliance", não surpresa.

Resultado?
Quando aparece uma arbitrage - uma diferença de valor percebido - quem a aproveita não é a multinacional nem o governo, mas o pequeno agente periférico que tem a coragem (ou a liberdade) de ver o que os outros ignoram.

É ingénuo esperar que a inovação venha de quem precisa de justificar todas as suas decisões com base num modelo estável e previsível. O funcionário público, o gestor de grande empresa, o auditor de gabinete - todos são formatados para manter a coerência, não para detectar o estranho.

Quem vê o estranho como "bug" nunca o vai aproveitar como "feature". A arbitrage exige curiosidade.
Exige desconfiar dos consensos.
Exige sistemas de gestão que permitam olhar para uma não conformidade e dizer:
- "Não vamos só corrigir. Vamos explorar."
- "Isto pode ser o princípio de uma ideia nova, não o fim de um desvio."

Um sistema de gestão da qualidade eficaz não serve para garantir previsibilidade.
Serve para garantir aprendizagem rápida e acção inteligente.
O estranho, o inesperado, o fora do plano — tudo isso pode ser ruído.

Mas pode também ser ouro.

Depende de quem olha.
Depende de que cultura se tem.

Depende de se estás a usar a ISO 9001 como escudo contra a realidade - ou como lente para vê-la melhor.