sábado, dezembro 13, 2025

Curiosidade do dia

Neste postal de 2020, "Não é agradável escrever sobre fracassos (parte I)" recuo a 1993(?):

"Na altura, fabricavam-se autorádios de uma marca alemã em Braga. Esses autorádios incorporavam circuitos impressos fabricados na Alemanha. A certa altura, o fabricante alemão, que pertencia ao mesmo grupo da fábrica de Braga, teve de fechar a fábrica para uma série de investimentos e manutenções. À boa maneira alemã ambas as fábricas planearam a paragem com stocks para a fábrica portuguesa que continuaria a laborar. As empresas põem e os clientes dispõem. A Audi resolveu fazer uma actualização qualquer de emergência e a fábrica de Braga não tinha stock, nem possibilidade de receber da Alemanha o novo circuito impresso. Então, para não falhar com a Audi, descobrem a fábrica onde eu trabalhava e fazem uma encomenda. Aproveitam a onda e fazem mais uma e mais outra.

Para a fábrica de Braga foi uma experiência interessante, por uma vez eram eles que mandavam, por uma vez não tinham de aturar um fornecedor alemão que mandava neles (recordar os clientes prisioneiros nos ecossistemas).

Não sei se a coisa surgiu naturalmente ou se foi forçada por Braga. Numa visita do cliente Audi à fábrica de Braga ele refere que reparou que os autorádios estavam melhores em termos de desempenho, que tinham investigado e percebido que os circuitos impressos vinham de outro fornecedor. Um parêntesis, se olharem para um circuito impresso ele tem sempre a marca do fabricante. E a bomba! A Audi queria que, de agora em diante, os circuitos impressos para os seus autorádios viessem daquele fornecedor.

O certo é que passado algum tempo, por causa da Audi, por causa dos preços, por causa da relação de poder que Braga ganhava, a minha fábrica começou a trabalhar mais e mais para Braga. BTW, a fábrica alemã acabou por ser desmontada e vendida para a Malásia."

 Lembrei-me disto ao ler "Samsung (Mobile) não consegue comprar chips à... Samsung". A Samsung Mobile (a divisão que faz os telemóveis Galaxy) está, neste momento, incapaz de comprar chips essenciais à sua própria divisão de semicondutores dentro do grupo Samsung. Por isso, tem de recorrer a outro fornecedor.

Imaginei um cenário em que a Samsung Mobile descobre que tem vantagens, pode não ser custo, em recorrer a um fornecedor exterior definitivamente.

O que destrói valor em organizações grandes raramente é a falta de tecnologia, ou a falta de dinheiro, ou a falta de talento. O que destrói valor é a falta de alinhamento, os silos que não falam, os incentivos que empurram cada equipa para direcções opostas, as decisões tomadas com informação parcial, as práticas políticas internas que sabotam a visão conjunta.

A certa altura há menos fricção em recorrer a um fornecedor externo do que a uma empresa do mesmo grupo.



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