quarta-feira, junho 12, 2024

Futurizar manifestações de PMEs (parte II)


Nas últimas semanas não há jornal que não inclua um artigo, várias páginas, um suplemento, dedicado à "avalanche regulatória" do ESG.

Portugal é um país de PMEs e estas ou pensam estar ao abrigo dessa pressão, ou que essa pressão ocorrerá mais tarde do que cedo. No entanto, estão a esquecer-se do abraço de urso:

  • de um lado a pressão da banca - a banca vai ser pressionada a não financiar as empresas sem reporte ESG,
  • do outro lado as empresas grandes na cadeia de fornecimento a jusante e que vão exigir informação necessária para o seu próprio reporte.
Por exemplo, ontem no JdN em "Portugal tem "desafios acrescidos" no report ESG":

"No que diz respeito ao papel do sistema financeiro na transição ESG, a vice-governadora do BdP avisa que "os bancos têm de conhecer bem as empresas que estão a financiar". Quanto à forma como é feita essa análise, deixa um alerta: "Tem de ser coerente, não podemos ter um banco que faz uma análise de uma empresa e outro que faz uma análise completamente diferente." Recados que não passaram despercebidos aos responsáveis da banca presentes na conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG.
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"A banca vai ser empurrada para não financiar"
Outra das questões levantadas durante a conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG foi o facto de a falta de informação sobre sustentabilidade poder influenciar a concessão de crédito às empresas. Questionado se esta já será uma realidade, José Miguel Pessanha, vogal do conselho de administração do Millenium BCP, é perentório: "Já estamos nesse ponto. Uma informação mal compreendida, mal transmitida, é suscetível de prejudicar o nosso pricing e podemos praticar um preço que não é devido." Por isso, adverte: "É extremamente relevante as empresas prestarem informação já."
Apesar de as PME não estarem, para já, obrigadas a fazer o reporte de sustentabilidade, os vários responsáveis da banca são unânimes em afirmar que as pequenas empresas também vão ter de o fazer devido à pressão do mercado."

Lembram-se daquele poema de Emil Niemöller:

"Quando os nazis levaram os comunistas, eu calei-me; afinal de contas, eu não era comunista. Quando eles prenderam os social-democratas, eu fiquei calado; eu não era social-democrata. Quando eles levaram os sindicalistas, eu fiquei em silêncio; eu não era sindicalista. Quando eles vieram por mim, não havia mais ninguém para protestar."

A minha versão é: quando a União Europeia veio impor um jugo burocrático aos agricultores, eu me calei; afinal de contas eu não era agricultor ... Quando ela vier pelas PMEs, não haverá ninguém para protestar. 

Leiam o artigo do JdN, percebam o espírito... depois, recordem a resposta de Nigel Croft à minha pergunta em "Futurizar manifestações de PMEs" e o que ela significa.

Como contraste, recuem cerca de um ano a esta entrevista à presidente da Euronext Lisboa:
"A presidente da Euronext Lisbon pede bom senso às autoridades europeias e alerta que um dos perigos do excesso de legislação sobre a sustentabilidade é a excessiva concentração de empresas para ajudar a diluir os custos de contexto: "Há um incentivo claro à consolidação, o que não é necessariamente mau nalguns setores, mas vai ser negativo noutros setores onde vão desaparecer empresas que fazem efetivamente falta".
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As novas regras europeias sobre Finanças Sustentáveis vão aplicar-se sobretudo às cotadas?
Não, a diretiva de Reporte de Sustentabilidade aplica-se a todas as grandes empresas, todas as que não são PME, mais as PME cotadas, embora com alguma dilatação no tempo. E depois como todas as grandes empresas têm empresas mais pequenas nas suas cadeias de fornecimento, isto potencialmente tem um impacto muito significativo na economia. O tecido económico é constituído por muitas PME e temos de ter muito cuidado com o impacto que estas coisas vão ter. A Europa exporta para muitas regiões do mundo e nessas regiões não existe este tipo de abordagem. A Europa é o espaço mundial onde o enquadramento regulatório da sustentabilidade está mais avançado, é mais abrangente.
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Podemos chegar a um ponto onde a regulação pode esmagar algumas empresas?
Não sei se esmagar é o termos correto, não sei se será tão radical a esse ponto, mas há uma preocupação clara das entidades com quem nós falamos. E se pensarmos que esta complexidade e este peso regulatório não vem apenas das Finanças Sustentáveis, mas vem de uma série de outras áreas como a fiscalidade, as autorizações, as licenças, as certificações, chegamos à conclusão que isto tem muito peso. E quando estas coisas têm muito peso, o que tende a acontecer? Concentração, concentração e concentração. [Moi ici: BTW, Recordar "A minha primeira lei sobre a concorrência?"] Ou seja, as empresas têm de distribuir os custos fixos da regulação. Há um incentivo claro à consolidação, o que não é necessariamente mau nalguns setores, mas vai ser negativo noutros setores onde vão desaparecer empresas que fazem efetivamente falta."

Em todo lado se o usa o termo "avalanche regulatória": 

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