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E o tema foi, de certa forma, um deja vu para mim. Já várias vezes pensei no tema, ao reflectir sobre a minha vida profissional e, sobretudo, sobre o futuro da vida profissional de muito boa gente, bons técnicos, que foram meus colegas de empresa e emprego e que agora, estão a chegar aos 50 anos e são reconhecidos nas suas empresas. Tudo corre bem! Enquanto a empresa existir. No dia em que a empresa fechar... o mundo muda completamente. Quem vai querer empregar uma pessoa com 50 anos e que sempre trabalhou na mesma empresa?
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Recordo-me tão bem de quando a empresa onde trabalhava adquiriu nova tecnologia de fabrico e duplicou a produção e despediu 50 ou 60 operários. Recordo-me de pensar que cada um daqueles operários era um craque naquilo que fazia mas que lá fora... com 20 anos de experiência a fazer a mesma coisa, todo esse conhecimento de pouco lhes valeria.
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Recordo-me de pensar que a nossa vida profissional era demasiado importante para ser depositada na capacidade de decisão de burocratas bem intencionados.
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Interessante... penso agora. Ao longo da minha vida despedi-me 3 vezes e, de cada uma das vezes o motivo da decisão foi sempre o mesmo: rejeitar o convite para subir na hierarquia e deixar de fazer o que gostava. Após a rejeição, achava por bem demitir-me porque tinha concluído que era a altura de ambas as partes ganharem mais em separar-se do que manterem o status-quo.
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Nassim Taleb em "Two Types of Professions" conta a história de dois irmãos:
"Consider the fate of Ioannis (John) and Georgios (George), two identical twin brothers, born in Cyprus (both of them), currently both living in the Greater London area. John has been employed for twenty-five years as a clerk in the personnel department of a large bank, dealing with the relocation of employees around the globe. George is a taxi driver.Este "in fact this is an illusion" faz-me procurar uma citação ali da coluna da direita, julgo que da minha autoria:
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John has a perfectly predictable income (or so he thinks), with benefits, four weeks’ annual vacation, and a gold watch every twenty-five years of employment. Every month, £3,082 is deposited in his local Nat West checking account. ... He used to wake up on Saturday morning, the day when people stretch and linger in bed, anxiety free, telling himself “life is good”—until the banking crisis, when he realized that his job could be “made redundant.” Unemployment would seriously hit him hard. As a personnel expert, he has seen the implosions of long careers, with persons who, laid off at the age of fifty, never recovered.
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George, who lives on the same street as his brother, drives a black taxi ... His income is extremely variable. Some days are “good,” and he earns several hundred pounds; some are worse, when he does not even cover his costs; but, year after year, he averages about the same as his brother. To date, he has only had a single day in his twenty-five-year career without a fare. Because of the variability of his income, he keeps moaning that he does not have the job security of his brother - but in fact this is an illusion, for he has a bit more."
"A estabilidade é uma ilusão"Estávamos inspirados neste dia.
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E voltando a Nassim Taleb:
"This is the central illusion in life: that randomness is risky, that it is a bad thing—and that eliminating randomness is done by eliminating randomness. Artisans, (Moi ici: Os habitantes de Mongo, os prosumers, os artesãos) say, taxi drivers, prostitutes (a very, very old profession), carpenters, plumbers, tailors, and dentists, have some volatility in their income but they are rather robust to a minor professional Black Swan, one that would bring their income to a complete halt. Their risks are visible. Not so with employees, who have no volatility, but can be surprised to see their income going to zero after a phone call from the personnel department. Employees’ risks are hidden. Thanks to variability, these artisanal careers harbor a bit of antifragility: small variations make them adapt and change continuously by learning from the environment and being, sort of, continuously under pressure to be fit. (Moi ici: Ao reler este último parágrafo lembrei-me do impacte e do significado das greves de zelo)E para terminar, recordar todas as nossas leis bem intencionadas que reduzem (ou reduziam, embora continuem a reduzir porque moldaram e enformaram muitas mentes durante a sua vigência) a flexibilidade das empresas num mundo cada vez mais cheio de variabilidade:
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Man-made smoothing of randomness produces the equivalent of John’s income: smooth, steady, but fragile. Such income is more vulnerable to large shocks that can make it go to zero (plus some unemployment benefits if he resides in one of the few welfare states). Natural randomness presents itself more like George’s income: smaller role for very large shocks, but daily variability. Further, such variability helps improve the system (hence the antifragility). A week with declining earnings for a taxi driver or a prostitute provides information concerning the environment and intimates the need to find a new part of town where clients hang around; a month or so without earnings drives them to revise their skills." (Moi ici: Isto é mesmo verdade, recordo-me tão bem de 2002 e de começar a pensar o que significaria para o meu futuro ser mais um consultor a trabalhar com a ISO 9001. Até podia pensar que era muito bom naquilo que fazia mas se calhar não havia muitas empresas a precisar de um trabalho com essa exigência, bastava-lhes ter a bandeira)
"we humans are afraid of the second type of variability and naively fragilize systems - or prevent their antifragility - by protecting them. In other words, a point worth repeating every time it applies, this avoidance of small mistakes makes the large ones more severe. The centralized state resembles the income of John; the city-state model that of George. John has one large employer, George many small ones - so he can select the ones that fit him the best and hence has, at any point in time, “more options.” One has the illusion of stability, but is fragile; the other one the illusion of variability, but is robust and even antifragile. The more variability you observe in a system, the less Black Swan–prone it is."Se calhar é uma resposta rápida, simples e ... errada, mas talvez estas leis que reduzem a flexibilidade das empresas expliquem a diferença entre Portugal e Espanha em 2012:
- Em Portugal, em 2012, por cada 4,25 empresas constituídas houve uma insolvência;
- Em Espanha, em 2012, por cada 11,22 empresas constituídas houve uma insolvência;
3 comentários:
Caro CCz,
Não resisto a tentar uma interpretação alternativa à sua interpretação da alta taxa de insucesso das startups portuguesas.
Primeiro que tudo, parto de um pressuposto que não é de todo consensual: o tecido empresarial português é de extrema qualidade, de outra forma, como seria possível sustentar um estado que pesa mais do que 50% na Economia e todo o conjunto de empresas do sector "privado"que não são mais do que rent seekers (EDP, PT, REN, CP, etc's).
A alta taxa de insucesso das startups portuguesas parece-me assim mais um sinal da saúde do tecido empresarial português, um conjunto de startups que são instintivamente e por necessidade extremamente lean (mesmo sem ter feito o curso do Steve Blank): que tentam, falham, e vão tentar outra coisa até que acertam.
Criando no processo uma paisagem empresarial anti-frágil, como se está a revelar agora com a capacidade para melhorar os resultados das exportações perante uma crise destas proporções.
Parece-me importante louvar o falhar e o errar num ambiente controlado, com perdas máximas bem definidas. Imbuirmo-nos ainda mais de um espírito à la Sillicon Valley de fail often, fail early. Este não é um evangelho fácil de pregar mas isso nunca o pareceu demover antes.
Dito isto convêm salientar que sou um optimista com um certo enviezamento para ver o lado positivo de tudo e o seu contrário.
Como quando se fala da falta de qualificações académicas dos empresários portugueses, que me parece dizer mais da falta de iniciativa dos licenciados (e também um medo de falhar) do que da impreparação dos empresários.
Luis Tinoco Azevedo
"A alta taxa de insucesso das startups portuguesas parece-me assim mais um sinal da saúde do tecido empresarial português"
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Lembrei-me logo do trecho de "Antifragile" que ouvi ontem. O elogio da procrastinação.
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É claro que o sistema fica mais antifrágil, mas para cada empreendedor isolado podia-se evitar muito sofrimento pessoal. Ainda agora continuam a constituir-se milhares de empresas nos sectores da construção e da restauração e do imobiliário, se perguntar à maioria desses empreendedores o que vão fazer de diferente para terem um destino diferente, já que a maioria das insolvências e dissoluções está nestes sectores... se calhar nem vão perceber a pergunta.
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Não interprete isto como uma crítica aos empresários. Todos são bem vindos.
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Em todos os países europeus, até na Suécia, os empresários têm menos qualificações que os empregados. Aliás recordo sempre esta correlação: quanto mais estudos académicos menos espírito empreendedor.
Só mais uma coisa caro Luís, olhe para os gráficos iniciais da série sobre a taxa de insucesso das startups... a taxa portuguesa é tão alta comparada com a dos outros países.
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Será por causa da legislação nacional?
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