sábado, fevereiro 09, 2013

A humidade do mar vai precipitá-las no oceano...


Diz-se que o saber está nas universidades, que as empresas têm de cooperar mais com as universidades para ganharem o futuro num mundo onde o conhecimento faz milagres... Oh, wait!!!
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E este discurso "Ensino superior privado não consegue estancar perda de estudantes"... nem uma palavra sobre o valor... tudo sobre as propinas (o preço) e a incapacidade de reduzir custos. Nem uma palavra sobre estratégia, e como entender este pensamento:
"Ainda assim, João Redondo não duvida que exista uma explicação conjuntural para a quebra da procura dos últimos dois anos."
Impressionante!!!
Conjuntural?!?!?!
E a demografia?
E a oferta das universidades estatais?
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Há anos que penso e escrevo por aqui que as universidades privadas deviam olhar para as estatais como uma empresa portuguesa olha para a concorrência chinesa e ter em conta a lição:
"Don't try to compete with China on costs and with Wal-Mart Amazon on price"
Por que é que muitas famílias, no passado, faziam um sacrifício e colocavam os seus filhos nas universidades privadas? Por que não tinham lugar nas estatais!
O que é que aconteceu entretanto? Mais lugares nas universidades estatais e menos, muito menos alunos a chegarem ao ensino superior, por causa da demografia.
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Ponham-se no lugar de uma família, qual é o JTBD (job to be done)?
  • Dar uma ferramenta para os meus filhos terem mais oportunidades na sua vida futura;
Acham que uma família não é capaz de fazer sacrifícios pelos seus filhos, na esperança de lhes dar o melhor?
Qual o discurso que lemos?
""Há menos dinheiro e as famílias começam a fazer contas a todos estes custos", avalia o presidente da APESP. "Primeiro têm de confortar o estômago e as casas.""
Custos, custos, custos... este discurso sem paixão, sem sonho e resignado, não cativa clientes. Cria nos potenciais clientes a ideia de que não há diferença entre o ensino das universidades estatais e das universidades privadas... se não há diferença, qual é a que tem o preço mais baixo?
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Julgo que as universidades privadas precisavam de cooperar mais com as PMEs exportadoras para aprenderem o truque de David e actuarem no mercado com sucesso, apesar dos chineses.
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Recordando o velho esquema de Pine & Gilmore:

Uma universidade não dá nada de palpável a um aluno a não ser um canudo no final. Uma universidade pode prestar-lhe um serviço que o leva a viver experiências que o transformam!
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As universidades privadas (e as públicas) deviam fugir do discurso dos custos e do preço e concentrarem-se no discurso do valor, da experiência de ensino que proporcionam e na transformação que co-criam nos seus alunos.
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Quando a demografia ajudava, já o escrevi aqui, a estratégia era existir, era ter as portas abertas que os clientes faziam fila para comprar. Agora não basta existir, é preciso seduzir!
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Seduzir não é enganar, seduzir é ensinar a sonhar, é ensinar a voar mais alto...
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Desde os meus 7/8 anos que uma das minhas leituras foi a Mitologia Grega e pensando em Ícaro, parece que estas universidades vão morrer não porque pensaram em grande e aproximaram-se demasiado do Sol, mas porque pensam pequenino, não sonham, não saem do mundo dos custos e, por isso, a humidade do mar vai precipitá-las no oceano.

BTW, o meu parceiro de almoço de ontem falou sobre este discurso
"As universidades e politécnicos privados cobram entre 2500 e 4000 euros anuais pelas licenciaturas - com excepções pontuais de cursos nas áreas da saúde -, um valor que fica abaixo do que é cobrado em Espanha ou Itália, sustenta João Redondo. "Já estamos a funcionar perto da linha do impossível", garante o líder do ensino superior privado."
Quanto mais distantes da indústria mais as profissões aspiram a ter um rendimento semelhante ao dos outros países, não percebem é porque temos produtividades tão baixas... acham que é porque as pessoas trabalham pouco.

10 comentários:

CCz disse...

E as universidades, quer estatais, quer privadas, que não souberem diferenciar-se, ainda vão ter o espectro da disrupção:

Napster, Udacity, and the Academy em http://www.shirky.com/weblog/2012/11/napster-udacity-and-the-academy/

Your Massively Open Offline College Is Broken em http://www.theawl.com/2013/02/how-to-save-college

Miguel Pires disse...

Eu olho para esta questão de outro ângulo ainda. Repetindo uma pergunta que costuma fazer aqui no "blog":

- "Quem são os clientes alvo?"

A resposta a estão questão é tradicionalmente "os estudantes/as suas famílias". Pois são eles que pagam as propinas.

Para mim isto é miopia. Nesta perspectiva aquilo que a universidade vende é, realmente, o canudo e pouco mais.

Eu, se fosse gestor de uma universidade ou politécnico (que não sou) fazia dos meus clientes as empresas que contratam os meus alunos.

O JTBD destas é "Como é que posso ter acesso ao talento/competências de que preciso como pão para a boca em vez de estar a fazer tábua rasa daquilo que as universidades ensinam hoje e que regra geral é desadequado?"

Quando terminei o curso assisti uma apresentação de uma empresa de consultadoria da nossa praça. Perguntei a alguns consultores juniores, ainda frescos, ingenuamente, o que é que eles utilizavam daquilo que tinham aprendido. Perante o embaraço em responder, veio um partner que me respondeu que na realidade a primeira coisa que faziam nos recém contratados era envia-los para França para receberem nova formação.

Isto em informática é equivalente a fazer:

> format c:

Portanto desse ponto de vista a política a seguir é óbvia:

- Estabelecer alianças com algumas empresas chave. Isto permite a essas empresas criar uma "coutada" privativa de talento e ao alunos uma maior probabilidade de emprego nessas empresas (que no fundo é o JTBD deles)

- Elevar os standards de entrada - selectividade! Note-se: eu não quero mais alunos, eu quero poucos mas bons - contraste com o discurso das universidades privadas. Isto por sua vez atrai as empresas porque eu estarei a separar o trigo do joio e a baixar os custos de recrutamento

- Currículo orientado para as necessidades actuais e de longo-prazo das empresas (e não para perpetuar sebentas e folhas dos anos 60 porque dá muito trabalho fazer novas)

COmo não me quero alongar fico por aqui, mas percebe a ideia...

p.S. - isto não é nada novo. é a formula das antigas escolas industriais, então extintas...

CCz disse...

Excelente!!!!
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A sugestão que propõe merece um postal.
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Passamos dos pagadores, para o conceito de ecossistema da procura e de "market scripting".

CCz disse...

“Fifteen years from now more than half of the universities will be in bankruptcy, including the state schools. In the end, I am excited to see that happen.”

http://ht.ly/hwTYN

CCz disse...

http://www.slideshare.net/strategybusiness/the-universitys-dilemma

CCz disse...

http://blogs.hbr.org/cs/2013/01/creative_destruction_visits_th_1.html

CCz disse...

http://ritamcgrath.com/blog/comments/one-competitive-advantage-disappears-another-emerges-this-time-its-the-musi/

CCz disse...

http://www.strategy-business.com/article/00164?gko=093cf

CCz disse...

http://venturevillage.eu/startup-college-leo-widrich

CCz disse...

http://online.wsj.com/article/SB10001424127887323884304578328243334068564?mg=reno64-wsj.html?dsk=y