domingo, outubro 05, 2025

Curiosidade do dia

Na ISO 9001 de 2015, a cláusula 6.3 (Planeamento das alterações) era quase um lembrete de bom senso: “tenham cuidado para não estragar o que já funciona quando mexem no sistema”. Até aqui, nada de novo, quase como dizer a uma criança para não correr com a tesoura na mão.

Mas eis que chega agora a ISO/DIS 9001:2025 e a conversa fica mais séria. Agora não basta planear para que nada corra mal; é preciso pensar como se fosse um mini manual de gestão da mudança. Três palavrinhas ganham protagonismo: eficácia, comunicação e revisão. Traduzindo: não chega lançar a mudança — é preciso definir como se vai medir o sucesso, explicar às pessoas o que vai acontecer e, pasmem-se, voltar atrás para ver se correu bem e aprender com isso.

E se aplicássemos isto ao caso português da política de habitação, tão falada durante os anos de António Costa e da ministra Marina Gonçalves? A ideia do Mais Habitação era nobre: casas mais acessíveis, menos especulação, mais oferta pública. Mas, seguindo a lógica da ISO 9001:2015, o governo limitou-se a desenhar medidas, passar leis e distribuir responsabilidades. Cumpriu o guião.

Já pela lente da DIS 9001:2025, a coisa teria sido diferente:
  • Eficácia: antes de lançar o pacote, teria sido obrigatório dizer como se ia medir o sucesso. Número de casas acessíveis em cinco anos? Redução do preço médio das rendas em Lisboa e Porto? Sem estes indicadores, o risco é cair na tentação de dizer “a política está a funcionar” apenas porque existe.
  • Comunicação: em vez de anúncios apressados e respostas defensivas, teria sido preciso explicar antecipadamente aos investidores que incentivos iriam ter, aos municípios como encaixar isto nos seus planos locais e aos cidadãos que milagres instantâneos não existem.
  • Revisão: aqui é onde dói. A revisão, tal como a ISO a pede, teria de ser estruturada: ao fim de X, avaliar o que resultou, o que falhou, e corrigir o rumo. Em vez disso, o que tivemos foi uma espécie de “revisão pública” em directo nos telejornais, alimentada pelo descontentamento geral.
Resultado? O que era para aumentar a oferta acabou por desmotivar o investimento privado, os preços continuaram a subir e a confiança no programa foi-se desmoronando. Em linguagem ISO: falhou a eficácia, falhou a comunicação e falhou a revisão.

Moral da história? A ISO/DIS 9001:2025 acaba por ser quase uma lição prática para governos: não basta aprovar medidas, é preciso planear com rigor, medir com clareza e aprender com humildade. Se a cláusula 6.3 tivesse sido levada a sério em São Bento, talvez o Mais Habitação tivesse sido “mais” do que o nome prometia.

Como não recuar a 2007? Ou, 😬, 2006? Sim, 2006!

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