Em Agosto de 1978, mês em que João Paulo I foi eleito papa, de férias na Figueira da Foz, comprei um livro sobre o tema que o Canal História transmite sob o título de "Alienígenas." Na contracapa trazia uma frase que nunca mais me largou:
"Não há acasos, todas as coincidências são significativas!"
Vejamos uma coincidência: No FT de hoje um artigo sobre o excesso de turismo no Japão, "Why Japan resents its tourism boom", e no NYT International de ontem, mas lido hoje, um outro artigo sobre o excesso de turismo na Islândia, "Iceland grapples with being on tourists' maps".
O Japão tem registado números recorde de visitantes, criando superlotação em pontos turísticos e problemas para residentes.
"Annual foreign visitor arrivals to Japan have surged from just 6.7mn in 2005 to nearly 37mn in 2024. This year is likely to set another record....The government has set a target of 60mn annual visitors by 2030, implying an increase of roughly 50 per cent from current numbers."
O artigo refere os impactes negativos: Trânsito, aumento do custo de vida, barulho, lixo, degradação de sítios culturais e sensação de perda de qualidade de vida para os habitantes.
Os especialistas alertam que, sem regulação e planeamento, os efeitos negativos do turismo de massa podem ultrapassar os benefícios económicos.
"Abe acknowledges that employment and consumption are increasing and that the boom is economically positive. "But in certain parts of Kyoto, the very existence of tourism feels negative," he adds. "The number of hotels has increased so sharply that rents have risen and people cannot live there, and there is no real sense that the lives of Kyoto residents are improving.
"If we just keep pushing forward with tourism for the sake of its economic benefits, the downsides will just become more and more obvious," he concludes."
Acerca da Islândia, o artigo refere a explosão turística recente: a Islândia tornou-se um destino popular em pouco tempo, impulsionada por redes sociais e cruzeiros.
"Fifteen years have passed since Eyjafjallajokull's seismic eruption - and tourists have flooded in. In 2024, Iceland received about 2.3 million foreign overnight visitors, up from fewer than 500,000 in 2010."
O turismo é hoje uma das principais fontes de receita da economia islandesa.
"Tourism now accounts for nearly 9 per cent of Iceland’s GDP, making it one of the country’s most important industries."
O artigo refere os impactes negativos: aumento do preço da habitação, substituição de casas tradicionais por alojamentos turísticos, pressão sobre serviços e infraestruturas. Vilas pequenas, como Vik, deixam de ser comunidades agrícolas para se tornarem locais turísticos, alterando o modo de vida local.
Os residentes reconhecem a importância do turismo, mas alertam para o risco de perder a essência cultural e a sustentabilidade do país.
Há um trecho que me faz lembrar o Porto:
"The city's main street is lined with colorful storefronts, many of which cater to tourists. Tiny troll dolls, horn-hatted Viking figurines and encased bits of volcanic rock were all for sale. Locals wryly call the seemingly identical stores "puffin shops" for their countless offerings related to the island's famous clown-faced birds."
Aquelas largas dezenas de lojas que vendem treta para turista como se fosse tradição (como aquela cena das sardinhas)
"As herd tourism is exacerbated by social media trends and massive cruise ships, its holistic impact is increasingly under the microscope.
"We have to really stop and think," said Katrin Anna Lund, a professor of geography and tourism, in her office at the University of Iceland. "What do we want to be offering?""
Japão, Islândia e Portugal estão a viver a mesma história em tempos diferentes. O turismo de massas, gostei daquele "herd tourism", começa por parecer uma benção económica, mas se não for gerido com visão de longo prazo, transforma-se em ameaça à identidade cultural e à qualidade de vida.
A questão central é a mesma que tantas vezes abordo noutros sectores: subir na escala de valor.
O turismo de volume, baseado em “quanto mais, melhor”, tem um tecto muito baixo e custos sociais elevados.
O turismo de valor, baseado em permanência, experiência autêntica, preservação cultural e ambiental, cria sustentabilidade económica e social.
Nem o Japão, nem a Islândia, nem Portugal podem manter o turismo como uma corrida apenas ao número de visitantes. É tempo de repensar o modelo: menos quantidade, mais qualidade. Só assim o turismo continuará a ser fonte de riqueza — sem destruir o tecido social e cultural que o torna atraente em primeiro lugar.
%2011.02.jpeg)

Sem comentários:
Enviar um comentário