terça-feira, dezembro 16, 2014

"Não é desilusão, é a simples constatação de que as coisas estão distantes daquilo que tenho ensinado"

Na sequência de "Acerca de Keynes (parte II)", e em resposta a um comentário do Paulo Peres, encontrei estes trechos nesta entrevista:
"O que é que lhe está a custar mais nesta nova tarefa?.
Sair de uma aula de Ética Médica com alunos de Medicina do 5.o ano e, nas minhas tarefas de administração, não conseguir fazer o que ensino. Está-me a custar ver que há uma grande diferença entre os pareceres, artigos, livros e congressos e o que se passa na gestão de um hospital. Sei que a gestão do hospital não se pode fazer estritamente "by the book", mas se seria bom os bioeticistas mergulharem por dois ou três meses na gestão de cuidados de saúde, quem tem responsabilidades de gestão na saúde também devia ter outra formação teórica.
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Só está a ter agora essa percepção?.
Nunca tinha estado numa administração! Fiz a carreira na ética mas era um simples médico que trabalhava numa consulta de grávidas. Fui chefe de banco, fiz urgências, mas nunca tinha tido de decidir e assinar de 15 em 15 dias a compra de 1,5 milhões em medicamentos.
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Mas sente o quê, desilusão?.
Não é desilusão, é a simples constatação de que as coisas estão distantes daquilo que tenho ensinado. Tem de haver transparência, prestação de contas, decisão informada e eu dou por mim a ver que me faltam dados. Como é que posso tomar uma decisão informada se não tenho os dados todos? Admito que os medicamentos que estou a comprar são os adequados porque confio nos meus colegas mas uma decisão eticamente responsável tem de seguir estes passos, o que exige tempo, colaboração, transparência."
O que Schrage critica na frase de Keynes, na minha interpretação, está relacionado com a preocupação acima manifestada pelo professor de ética tornado gestor. As nossas ideias, as nossas teorias, as nossas hipóteses de explicação do mundo serão sempre tentativas incompletas e imperfeitas de o descrever e de prescrever uma linha de actuação.
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Ontem, durante o jogging, ouvia o comentador de futebol, Luís Freitas Lobo, defender que o treinador Lopetegui desenhou uma estratégia para o clássico de Domingo passado e, durante o jogo, ficou demasiado tempo preso a essa estratégia. Lembrei-me logo de Napoleão:
"A estratégia inicial não resiste aos primeiros minutos da confusão da batalha"
A realidade não só é imperfeitamente percepcionada por nós, como está em permanente convulsão, tornando verdade hoje o que ontem era mentira e vice versa. Por isso, Schrage no seu livro "The Innovator's Hypothesis" valoriza o papel da experimentação sobre o intelectual.
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1 comentário:

Carlos Albuquerque disse...

Quer a experimentação quer o intelectual têm o seu papel em tudo. Valorizar um em detrimento do outro ou usar um quando se devia usar o outro é que não dá bons resultados.