domingo, julho 23, 2006

Dar a volta, com ou sem estratégia?

Daqui: "Michael Braun sabe que tem de manter as mangas arregaçadas para «garantir que a Tomé Fèteira continue competitiva a longo prazo para com a concorrência do Extremo Oriente». Por um lado, aposta em produtos de nicho. Produzem-se, sobretudo, grosas de ferrador, limas para serras de correntes e pequenas limas para ferramentas multifuncionais. Por outro lado, a aposta na automatização da produção prossegue nos próximos três a cinco anos e requer um investimento de um milhão de euros. "
A automatização pode apontar para a produção em massa, a não ser que seja algo como mudança rápida de ferramentas, produção em massa é o contrário de produção para nicho.
E daqui: Fica a ideia de que os clientes só estão a voltar porque "Dez categorias ficaram sujeitas a restrições em termos de importações da China. "É evidente que o sistema está a funcionar naquelas dez categorias"
Se isto é verdade, então estamos mal. Quer dizer que a vantagem competitiva é artificial, depende das regras da UE. Como a UE tem mais consumidores que produtores e operários no sector têxtil, mais tarde ou mais cedo, a maioria vai exigir não ser prejudicada. E se as empresas não vislumbram reais vantagens competitivas no seu posicionamento, é natural que se sintam presas fáceis para a operação torniquete "É que os compradores internacionais estão a voltar às origens (a Portugal), no entanto, querem que as empresas locais adoptem os preços praticados na China." Pudera, se os compradores regressam porque são obrigados pela burocracia de Bruxelas, continuam, e com razão, a sentirem-se como a parte forte numa relação desigual.

Agora, se os compradores regressarem porque sentem que há vantagens reais para o negócio, em trabalhar com empresas portuguesas, aí será menos difícil caminhar para uma relação de parceria. Isso só vai acontecer se as empresas apostarem nas diferenças face à China e India.


W. Chan Kim & Renée Mauborgne são os autores de um ”best seller” publicado em 2005 “Blue Ocean Strategy” onde descrevem uma metodologia de trabalho a que chamaram “Value innovation”. O livro acaba por compilar e acrescentar algo mais, a uma série de artigos que os autores foram publicando ao longo dos anos na Harvard Business Review.

Dois desses artigos encheram as minhas medidas:
* “Tipping point leadership” de Abril de 2003 (qualquer chefia do sector público ou privado, ao ser nomeada, devia receber um reprint deste artigo. Nele conta-se a história, e procuraram-se tirar ensinamentos do particular para o geral, de como William Bratton em Fevereiro de 1994, nomeado comissário da polícia de New York, sem orçamento, sem choraminguices, sem politiquices, transformou uma das cidades mais violentas dos Estados Unidos, quase uma pré-Beirute nos anos 80, numa das grandes cidades mais seguras, senão mesmo a mais segura. “Leaders like Bratton know how to reach the organization’s tipping point without extra resources. They can achieve a great deal with the resources they have. What they do is concentrate their resources on the places that are most in need of change and that have the biggest possible payoffs. This idea, in fact, is at the heart of Bratton’s famous (and once hotly debated) philosophy of zero-tolerance policing”;
* “Value innovation – The strategic logic of high growth” de Janeiro-Fevereiro de 1997, onde os autores apresentam a “curva de valor”, mais tarde (Junho de 2002 com o artigo “Charting your company’s future” designada como “strategic canvas”. E é por causa desta curva que me lembrei destes autores a propósito das notícias acima.

Segundo Kim & Mauborgne, antes dos membros da gestão de topo formularem uma nova estratégia, têm de primeiro chegar a um entendimento comum sobre qual a posição, a situação actual da organização, e isso pode fazer-se com o “strategic canvas”: uma curva de valor é um gráfico que descreve a forma como uma organização configura a sua oferta aos clientes. Desenha-se, marcando pontos num gráfico, em que em ordenadas temos o valor relativo de uma oferta face à concorrência, e em abcissas os factores chave para a concorrência.

Por exemplo:

A figura representa a curva de valor para uma cadeia de hotéis franceses do grupo Accor, Formule 1, face à oferta típica dos hotéis de uma e duas estrelas. Os hotéis Formule 1, identificaram um cliente-alvo e concentraram tudo na sua satisfação, tendo evitado desperdiçar recursos que não se traduzissem em retorno, através da satisfação dos clientes-alvo.

Tendo em conta os factores chave para a competição, para fazer face à concorrência: os autores propõem que a gestão de topo responda a quatro questões:
* Que factores a nossa indústria toma por adquiridos e que podem ser eliminados?
* Que factores têm de ser reduzidos bem abaixo do desempenho padrão da indústria?
* Que factores têm de ser privilegiados bem acima do desempenho padrão da indústria?
* Que factores têm de ser criados, acrescentados e que a indústria nunca ofereceu?

Os hotéis F1, desprezam o investimento nas instalações, na estética, no tamanho dos quartos,… e tendo em conta o cliente-alvo, um profissional em viagem que precisa de um quarto para dormir e descansar, oferece-lhe: uma cama com qualidade, higiene e silêncio a um preço ligeiramente superior ao dos hotéis de 1 estrela.

Para o caso da empresa de cosméticos (?) “The Body Shop” a curva de valor pode ser:

Assim, as empresas têxteis que querem ter um futuro que não dependa de benesses temporárias de Bruxelas, podem recorrer à elaboração de uma curva de valor actual, onde se compara a sua oferta com a da concorrência europeia, nacional e asiática. Para perante essa curva actual, equacionar uma nova curva de valor para o futuro, com base nas quatro questões referidas acima.

1 comentário:

CCz disse...

http://lecercle.lesechos.fr/entreprises-marches/management/organisation/221155120/the-untruths-and-truths-about-blue-ocean-strat