quinta-feira, agosto 14, 2025

Olhar para a frente

O meu querido pai, que perdi há mais de 20 anos, um dia perguntou-me:

- Quando é que tens férias?

Sorri, e respondi:

- Um empreendedor nunca tem férias.

Isto é eu a ser eu ... perdido nas minhas tangentes.

Bom, esta semana estive em Inglaterra e no Domingo passado tive oportunidade de participar numa missa na igreja de São José e Santa Teresa em Wells (condado de Somerset). O pároco, (natural do estado de Kerala na India, católico não por causa dos portugueses (isso é mais a norte em Goa) mas por causa da acção missionária e martírio de São Tomé... outra tangente), durante a homilia reflectiu sobre a segunda leitura, um trecho do capítulo 11 da Carta aos Hebreus:

"A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê. Foi ela que fez a glória dos nossos antepassados.

...

Foi pela fé que Abraão obedeceu ao apelo divino, partiu para uma terra que devia receber em herança. E partiu não sabendo para onde ia. Foi pela fé que ele habitou na terra prometida, como em terra estrangeira, habitando aí em tendas, com Isaac e Jacob, co-herdeiros da mesma promessa. Porque tinha a esperança fixa na cidade assentada sobre os fundamentos (eternos), cujo arquitecto e construtor é Deus.

Foi pela fé que a própria Sara cobrou o vigor de conceber, apesar de sua idade avançada, porque acreditou na fidelidade daquele que lhe havia prometido. Assim de um só homem quase morto nasceu uma posteridade tão numerosa como as estrelas do céu, e inumerável como os grãos de areia na praia do mar."

A fé não é acreditar em algo que vem do passado ... a fé é como ter a certeza em algo que ainda não aconteceu e confiar no que não se vê. 

Abraão tinha 75 anos quando ouviu o chamamento de Deus, podia ter ficado na sua comodidade, na boa vida da casa dos pais, mas não, partiu para a aventura, partiu para o desconhecido.

Enquanto ouvia a homilia, realizei que se calhar nunca tinha percebido a fé assim. Ter fé, segundo Hebreus 11, é acreditar e agir confiando em Deus, mesmo quando não se tem todas as respostas ou provas visíveis. Não é "esperar sentado" - é andar para a frente como se o que Deus prometeu já fosse real.

Isto casa bem com uma das minhas selecções do Novo Testamento: A Parábola dos Talentos.

E como podemos descobrir o chamamento de Deus?

Recordo a história do profeta Elias (1 Reis 19:9-13), no Antigo Testamento. Perseguido e desanimado, ele refugia-se no monte Horeb, onde um anjo(?) lhe diz que Deus vai passar diante dele. Primeiro veio um vento fortíssimo, mas Deus não estava no vento. Depois, um terramoto, mas Deus não estava no terramoto. Em seguida, um fogo, mas Deus também não estava no fogo. Por fim, ouviu-se uma brisa suave - e foi aí, no murmúrio silencioso, que Elias reconheceu a presença de Deus.

Talvez o chamamento de Deus não se descubra sempre nos grandes sinais, mas no silêncio e na atenção ao que parece pequeno.

Eu, que sou muito visual, ainda a ouvir a homilia imaginei como a ilustraria: fé não é ser empurrado pelo passado, mas puxado pelo futuro. Acabei a desenhar este "jogo da corda" entre o passado conhecido e o futuro desconhecido.


E, pensando bem, o regresso ao trabalho depois das "férias" é um pouco como este "jogo da corda". 

O passado conhecido puxa-nos para a rotina confortável, para o que dominamos, para o caminho já gasto. O futuro - com novos desafios, oportunidades e até incertezas - convida-nos a dar um passo fora dessa zona segura.

Talvez este seja o momento de entrar no novo ano de trabalho com o espírito de Abraão: não sabendo tudo o que nos espera, mas confiando que, se avançarmos com fé e atenção à "brisa suave", podemos transformar o que fazemos no dia a dia numa resposta ao chamamento de Deus.

Senhor, obrigado por este novo ano de trabalho; que eu Te conheça, sirva, adore, glorifique, louve, respeite, tema e ame mais nele do que no anterior. Amém.

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