No Sunday Times de hoje em "Our leaders have to keep offering us new clothes or they'd be for the chop" o autor compara as democracias ocidentais ao conto do “Rei Vai Nu”, argumentando que os líderes políticos actuais, como o imperador, estão reféns da ilusão colectiva de que se pode prometer tudo sem custo real. Apesar dos alertas financeiros e das pressões demográficas (como o envelhecimento populacional e o aumento da dívida pública), os cidadãos continuam a exigir mais despesa pública sem aceitar sacrifícios, e os políticos, com receio de perder o poder, alimentam essas ilusões em vez de dizerem verdades impopulares.
Esta análise tem eco em Portugal, onde o debate político se centra cada vez mais em promessas irrealistas e menos na confrontação com os limites orçamentais.
"Western democracies have become like the fairytale emperor, blind to fiscal reality."
Portugal, tal como outros países europeus, acumula há décadas défices públicos e dívida crescente. Apesar de alguma consolidação orçamental pontual (sobretudo sob intervenção externa), o discurso político evita encarar de frente o custo das promessas. Discutem-se aumentos de salários e pensões, mais contratações no Estado e redução de impostos... mas raramente se explica como se paga tudo isto.
O orçamento torna-se um instrumento de ilusão.
"Politicians can only achieve office by flattering mass sensibility."
No nosso contexto, quem ousa contrariar o "senso comum" popular é rapidamente acusado de insensível ou neoliberal. Os partidos evitam dizer que não é sustentável aumentar salários sem ganhos de produtividade, ou que reformas estruturais (como o SNS ou a ADSE) exigem escolhas difíceis. A frase "flattering mass sensibility" aplica-se bem às campanhas eleitorais recentes, onde quase nenhum partido ousa propor uma subida da idade da reforma — apesar de todos saberem que é inevitável.
"We complain if manifesto pledges are broken even though it's our fault."
O autor põe o dedo na ferida: os cidadãos são cúmplices da ilusão. Em Portugal, critica-se quando os governos não cumprem as promessas, mas também se castiga severamente quem tenta explicar a impossibilidade de as cumprir. Queremos "mais habitação pública", mas rejeitamos a construção no nosso bairro. Queremos "melhor justiça", mas recusamos discutir a sua eficiência e responsabilidade.
"Round and round they sped, / 1 am dressed at last, /I can see the whole crowd cheering, for it seemed to him they were right."
Esta imagem do imperador, finalmente vestido com nada mas convencido pelo aplauso, é inquietante. Em Portugal, há sectores inteiros onde a política pública se limita a alimentar expectativas - educação, saúde, habitação - sem admitir que o modelo actual já não é financeiramente viável. O resultado é que vamos aplaudindo discursos que soam bem, mas não vestem o país com soluções reais.
"The emperor is clothed... in the desire to believe illusions."
Portugal, à semelhança de outros países, parece viver num pacto social não escrito: fingimos que tudo é possível, desde que ninguém desminta em voz alta. Essa cumplicidade atravessa o eleitorado, os partidos e os media. E tal como no conto, quem ousa dizer "o rei vai nu" arrisca-se a ser excluído ou ignorado.
A proposta do autor é clara: precisamos de recuperar o sentido de responsabilidade. Em Portugal, isso significaria voltar a tratar os cidadãos como adultos, capazes de ouvir que há limites, que há escolhas a fazer, e que o futuro colectivo depende da verdadee não apenas da sedução eleitoral.
"It's time to admit what is staring us in the face."
Talvez ainda estejamos a tempo.

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