Ontem, ao preparar elementos para uma acção de formação, fui vasculhar uma das pastas de recortes de jornais que guardo, às tantas, encontro o seguinte editorial de Sérgio Figueiredo no Jornal de Negócios no distante dia 30 de Março de 2005 "Um colossal problema", onde se pode ler:
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"Só não é ainda uma catástrofe, porque vai ficar pior: o sector do calçado, ex-libris da nossa indústria tradicional, um caso exemplar de modernização, caminha silenciosamente para a morte. Os últimos anos já estão marcados pelo definhamento. A produção regrediu 4% em meia década"
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"O sector atravessa, portanto, uma crise bastante mais grave do que a média do país.
O que torna tudo isto muito mais inquietante é ver que, entretanto, aos outros aconteceu pior. Na União Europeia, um quarto do sector foi varrido do mapa em cinco anos. E na América do Norte, Estados Unidos e Canadá, pura e simplesmente já não se fabrica um par de sapatos.
O colapso dos outros é uma angústia apenas e só porque mostra o destino que espera por nós. As nossas empresas de calçado fizeram a reestruturaração necessária, modernizaram-se e reduziram custos. Mas isso já não chega para sobreviver.
Do exaustivo trabalho realizado por Daniel Bessa ao sector do calçado nacional não é possível tirar duas conclusões. As empresas que não tiverem a capacidade de sair do território nacional estão condenadas. Deslocalização. Sim, essa evidência que o Presidente da República se limitou a observar na recente viagem à China e que, então, irritou os ignorantes e despertou os inconscientes.
Porque, se Jorge Sampaio então indicava as vias da viabilização aos empresários nacionais do têxtil, também poderia fazer o mesmo no calçado. E numa série de sectores que produzem bens transaccionáveis – sujeitos, portanto, à tal concorrência desleal dos chineses e indianos.
É este o grande, o grandessíssimo problema que está colocado à nossa economia, à nossa sociedade e, naturalmente, ao nosso poder político."
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3 anos depois, o que se pode ler no mesmo jornal?
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Consideremos o artigo de 16 de Janeiro de 2008 "Calçado sabe nadar, yô?!"
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"Um par de sapatos exportado por Portugal tem um preço médio de 18 euros, enquanto um par importado da China custa 3 euros. Com números destes, o normal é que a indústria portuguesa de calçado estivesse a ser massacrada, num “remake” dos problemas do sector"
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"Afinal aconteceu o contrário. As exportações aumentaram (em 2007 mais de 90% da produção foi para o exterior), apesar da valorização do euro face ao dólar. As vendas para os EUA foram desviadas para os mercados europeus.
O que aconteceu? O que sempre sucede quando as empresas são largadas no mar: ou aprendem a nadar, ou vão ao fundo. Algumas afogaram-se, a esmagadora maioria safou-se. Perdida a vantagem preço, foram obrigadas a mudar o modelo de negócio. Resultado: a imaginação ganhou à fatalidade (em 2007 quase 50% das empresas já tinham marcas próprias).
É claro que esta revolução não se fez sem dor. Quem não se lembra dos apelos à intervenção do Estado quando a Clarks e a Bawo fecharam as portas? Num país onde um dos passatempos favoritos é a autoflagelação, vale a pena estudar este caso. Pode ser que deixemos de gritar pelo Estado? por tudo e por nada."
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Quantas pessoas têm consciência desta revolução e do seu sucesso no calçado?
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E no têxtil? A mesma revolução e sucesso!
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E no mobiliário? A mesma revolução e sucesso!
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Não precisámos de mudar de empresários por decreto, o mercado (que não liga a cunhas) encarregou-se disso; não precisámos de levantar barreiras alfandegárias; não precisámos de seguir os conselhos Olivier Blanchard no caderno de Economia do semanário Expresso de 18 de Novembro de 2006: "Salários têm de cair 20%"
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Em vez de atacar o custo pensaram no valor para vencer a batalha da produtividade
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