quarta-feira, maio 22, 2013

Se calhar há mais qualquer coisa


Nas últimas semanas os jornais divulgaram os seguintes sintomas:

  • O calçado em 2012 teve o melhor ano de sempre e, o primeiro trimestre de 2013 está 6% acima;
  • Têxtil em 2012 voltou a crescer e a exportar ao nível de 2006 com cerca de 60% das empresas de então;
  • O mobiliário teve em 2012 o melhor ano de sempre e, o primeiro semestre de 2013 está cerca de 6% acima;
  • A agricultura cresceu em 2012 a dois dígitos;
  • A metalomecânica teve em 2012 o melhor ano de sempre;
  • A vitivinicultura teve em 2012 o melhor ano de sempre;
  • A floricultura teve em 2012 o melhor ano de sempre;

Entretanto, os que acreditam que a produtividade e a competitividade aumentam à custa de boleias dada pelo Estado continuam a sua campanha “Ferraz da Costa: Degradação da competitividade externa é o principal problema da economia portuguesa”.
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Um mapa não é a realidade, um mapa é uma ferramenta que tenta ajudar a descrever a realidade. É certo que a queda continuada desde 2000 é um sinal preocupante, mas se calhar há mais qualquer coisa que o índice não apanha.

14 comentários:

Bruno Fonseca disse...

boas meu caro!

se me permite a questão, o que significa "o melhor ano de sempre"? estamos a falar de produção ou exportações?
o calçado já produziu e exportou mais. naturalmente que em outras condições.

em relação à evolução, fazendo uma análise entre 2006 e 2011 ao nível das exportações, chegamos a algumas conclusões interessantes, como sejam:
- aumento de 1,1 mil milhões de combustiveis
- aumento de 500 milhões em acessórios automóveis
- aumento de 500 milhões ao nível de papel e cartão
- +300 milhões em móveis
- +250 milhões em plásticos e suas obras
- resinas +230 milhões
- calçado +250 milhões
- lenha +60 milhões
- alimentar: tomate +60M; maça e pera+50M; azeite +110M; cervejas +80M; conservas +50M

curiosamente, ou não, sectores onde por norma houve investimento significativo

Bruno Fonseca disse...

a grande questão, para mim, é a capacidade de continuar a aumentar as exportações. já referi no passado, e cada vez mais me convenço que se não houverem investimentos, vejo como dificil continuar este percurso.

em relação ao calçado, cujo comportamento tem sido fantástico, você próprio já referiu que estão em projecto mais de 20 novas industrias de calçado a serem lançadas a breve prazo.

vejamos a evolução do sector papel, por exemplo. tem tido uma evolução espantosa, mas é normal que assim seja. foram feitos diversos investimentos (fábrica papel Portucel em Setubal; fábrica Suavecel em Viana; fábrica AMS Goma em V.V. Ródão). como tal, é normal e esperado que nos próximos anos a evolução continue a ser positiva.

no caso dos móveis, por exemplo, já estou mais céptico. se inicialmente houve uma grande transferência de encomendas do mercado interno para o externo, com várias fábricas a fechar no entretanto, acho dificil continuar esta evolução positiva. porque muitas empresas estão a cair no sector, e ao mesmo tempo,não está a haver renovação da capacidade produtiva. é uma situação de algum stress. um pouco como acho que está a acontecer no têxtil.

bem haja!

Bruno Fonseca disse...

por último, sem querer canibalizar o blog, só para referir a questão investimento / exportações:
- cerca de metade do crescimento das exportações de móveis entre 2006 e 2011 é explicada pela fábrica do IKEA. devemos ter em atenção esse grande pormenor. as exportações cresceram nesses anos cerca de 285M, só a Swedwood deve explicar pelo menos 120M desse crescimento. além disso, a Aquinos fez um investimento numa nova fábrica que vai fornecer o IKEA em sofás, não sei quando entrou em laboração, mas também terá um impacto significativo
- cervejas: exportações a aumentar bastante. fruto dos fortes investimentos que Unicer e Central de Cervejas realizaram nas suas fábricas
- papel: já falei anteriormente
- conversas: investimentos de renovação na Poveira, Cofaco e Ramirez. aumento capacidade produtiva em Peniche. investimentos em azeite e vinho foram (são) vários
- embalagens de vidro: grandes investimentos na Santos Barosa e Gallo. tenho ideia que os efeitos vão ser ainda bastante sentidos nos próximos anos
tenho esperança que à semelhança da revolução que foi a AutoEuropa em Portugal (ao nível de criar industria de componentes), a Embraer traga um efeito semelhante. acho que é o único investimento verdadeiramente estruturante que temos em mãos por agora.

existem contudo outras áreas onde não vejo investimento nenhum. têxtil (já falámos por aqui), mobiliário (depois da Aquinos não se vê nada), cortiça, cerâmica (excepto o investimento da VistaAlegre para o IKEA tb).

CCz disse...

Boas caro Bruno,

O "melhor ano" vem daqui "http://balancedscorecard.blogspot.pt/2013/01/nao-ha-nada-fazer.html

Em nº de pares produzidos não, mas em termos de volume de vendas julgo que 2012 foi o mais alto de sempre, página 7 http://www.apiccaps.pt/c/document_library/get_file?uuid=f8d3b825-21ae-4c68-bbff-c865bd67335d&groupId=10136

CCz disse...

Caro Bruno, não acha estranho que a par da degradação da pontuação nos índices de competitividade global, as nossas indústria de bens transaccionáveis exportam cada vez mais?

CCz disse...

é claro q é preciso investimento, mas por favor mais "so-called" investimento público não!

http://www.publico.pt/economia/noticia/portugal-precisa-de-investimento-como-pao-para-a-boca-diz-mira-amaral-1595183

Esta manhã alguém apresentou um gráfico da evolução do endividamento público entre 2000 e 2012. Depois, outro gráfico com a evolução do endividamento privado entre 2000 e 2012. Julgo que falou em 240 mil milhões de euros investidos nesses 12 anos pelo Estado e pelos privados.

Ou seja, não estamos na situação que estamos por falta de investimento, por falta de dinheiro

CCz disse...

http://rr.sapo.pt/informacao_detalhe.aspx?fid=1&did=108371&utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter

Bruno Fonseca disse...

boas meu caro!

em relação ao calçado, em 2001 as exportações foram superior a 1,7 mil milhões. e tenho ideia que em anos anteriores foi ainda superior. em 2012 creio terem sido de cerca de 1,6 mil milhões. mas a tendência é positiva, portanto, está a caminho de bater records antigos. é claro é que o tipo de produção evoluiu.

em relação ao investimento, não falo de investimento público. falo de investimento de empresas.

por exemplo, refere o sector do vinho. e bem. mas temos que ter consciência que foi feito um investimento enorme nos últimos 10 anos neste sector. consigo apontar-lhe facilmente 10 noticias relativas a investimentos, tanto nacional como externo. tal como o azeite. e é esta relação que refiro. se não houvesse este investimento todo, naturalmente que não haveria este push nas exportações.

é um pouco como acontece com as conserveiras. é fácil adivinhar que daqui a 2 anos toda a gente vai andar a falar do sector das conservas como um exemplo! porque está a ser feito um excelente trabalho no sector. porque estão a modernizar todas as fábricas. porque estão a fazer novas fábricas.

Bruno Fonseca disse...

em relação ao Mira Amaral, não sei se já lhe aconteceu, mas já perdi a conta ao número de fábricas que já visitei e que têm lá a placa "inaugurado pelo ministro da indústria Mira Amaral". repito, quando falo de investimento, falo de investimento privado. mas que deve ser facilitado!

em relação ao aumento dos sectores exportadores, não quero repetir-me, mas o crescimento em grande medida é feito com capacidade instalada que não estava a ser utilizada. e ainda bem que assim foi, conseguiram aumentar substancialmente a eficiência produtiva. mas chega a um ponto, em que não dá mais. sem investimento, não há volta a dar.

vou dar outro sector como exemplo. pellets. Portugal é dos principais produtores europeus de pellets, o que tendo em conta a nossa dimensão, é algo digno de registo. e hoje exportamos cerca de 40 ou 50 milhões, de um bem que é totalmente produzido internamente, ou seja, toda a cadeia de valor faz-se sem importações. mas para isto acontecer, houve uma série de investimentos em fábricas e equipamentos que permitiu corporizar essa situação.

um pouco como nos móveis. atrevo-me a dizer que o factor IKEA (tanto com a Swedwood como a Aquinos) ajudam a explicar talvez 2/3 do crescimento do sector do mobiliário. até porque se formos a Paredes, não se vêm fábricas a serem criadas. muito pelo contrário. há uma focalização das empresas nos mercados externos (em particular França), mas estão a desaparecer muitas empresas. a capacidade instalada está a reduzir-se. quando as que ficarem conseguirem atingir uma velocidade de cruzeiro, não há mais por onde crescer. a menos que surjam os investimentos. mas não vejo nada a aparecer. ao contrário do que está a acontecer no sector do calçado.

um bem haja!

Bruno Fonseca disse...

por último, em relação aos vinhos, que acho que até conheço relativamente bem, é um sector com capacidades extraordinárias.

quando refere a China, lá é muito mais complicado vender um vinho de 2EUR do que um de 200EUR. aliás, hoje a zona de Bordéus vive à custa da China. a dificuldade é dar a conhecer os nossos vinhos.
a ViniPortugal fez um estudo há meia dúzia de anos do conhecimento que existia do vinho Portugues. ao contrário das expectativas, não havia opinião, nem positiva nem negativa. até o próprio vinho do Porto não era identificado como nacional.
começaram a investir então na divulgação. antes disso, houve um investimento enorme no processo produtivo. é impossível comparar um vinho de hoje com outro de há 15 anos atrás. o nível médio subiu imenso. sei de casos de rir. aliás, há 15 anos por norma as vinhas não estavam separadas por castas. a vindima era efectuada toda ao mesmo tempo.só para dar um exemplo.

após a melhoria na qualidade (e implicou milhões de euros), investiu-se na divulgação. presença em feiras, trazer importadores, realizar degustações. ao mesmo tempo começaram a surgir as criticas positivas das revistas da especialidade. e foram mesmo muito positivas! basta ver o top100 da bestbuy para termos lá uns 8 vinhos. o que para um país que produz menos de 5% do vinho mundial é fantástico!
como pontos positivos, além da relação preço qualidade muito acima da média, temos o vinho verde e uma diversidade de castas inalcançável (enquanto alguns países do novo mundo estão intrinsecamente associados a uma casta, Portugal vive da sua diversidade).
aliás, não é por acaso que dentro do vinho Portugal é conhecido como "o novo mundo do velho mundo"

CCz disse...

http://www.portugalglobal.pt/PT/PortugalNews/RevistaImprensaNacional/Comercio/Documents/Pasta%20e%20papel_jneg220513.pdf

CCz disse...

Caro Bruno,

Os seus comentários trazem sempre muito informação útil que muito agradeço

CCz disse...

http://www.jornaldoalgarve.pt/vinhos-algarvios-medalhados-em-concurso-mundial/

Bruno Fonseca disse...

Boas meu caro!

agradeço as suas agradáveis palavras.

em relação ao sector do papel, que tem tido um crescimento brutal, além do investimento da Fapajal que se encontra no artigo que mostrou, podemos relembrar o seguinte:
- https://www.cgd.pt/Site/Caixa-Empreender/Case-Studies/Documents/5-Novembro2009.pdf
- http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/industria/detalhe/fabrica_de_papel_cria_184_postos_de_trabalho_em_viana_com_investimento_de_25_milhoes.html
- http://www.publico.pt/economia/noticia/investimento-da-portucel-e-mais-um-sinal-de-confianca-na-economia-portuguesa_1248844

ou seja, estas coisas não acontecem por acaso. é uma relação causa-efeito.

a nível de azeite e vinho, o que não faltam são referências a investimentos vários. que permitiram aumentar o grau de qualidade e a capacidade instalada.

ao nível de vinhos, creio que a melhor notícia que revela a nossa qualidade é a seguinte:
- http://boasnoticias.sapo.pt/noticias_eua-revista-elege-10-vinhos-lusos-como-best-buy_13015.html

ter 10 vinhos no bestbuy da Wine Enthusiast, é qualquer coisa inamiganivável há 15 anos. e nos azeites igual. aliás, quando o Roquette achou que já era tempo de em Portugal haver um azeite capaz de competir com os italianos, era quimérico pensar que nós poderíamos ser suficientes, quanto mais ser exportadores. mas para este caminho ser percorrido, foram efectuados investimentos de milhões, tanto por portugueses como espanhóis (que trouxeram muito know-how, verdade seja dita).
hoje, vêem-se investimentos deste género ao nível de fruta (em particular morangos no sul e mirtilos a norte,kiwis e também fala-se muito de cogumelos), por norma conjugando portugueses e estrangeiros, bastante disperso.