sábado, agosto 28, 2010

Defender o passado impede-nos de abraçar um futuro

Por volta de 1981 entrou em casa dos meus pais um calhamaço dum livro chamado "The Third Wave". Nesse ano ou no ano a seguir li-o. Um dos soundbytes que recordo foi sobre a explosão da diversidade de temas que se podiam aprender numa universidade. O casal Toffler escreveu qualquer coisa como: "numa universidade podem-se aprender desde tácticas de guerrilha até tácticas na bolsa".
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Pois foi desta frase que me lembrei ao ler este artigo no ionline:
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"Hipermercados em Lisboa em risco de não abrirem ao domingo".
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"o alargamento do horário dos hipermercados pode pôr em causa a sobrevivência do pequeno comércio e sustenta que "são dias para olhar para o céu e não para dentro de grandes superfícies". "
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Estas medidas legislativas para proteger o pequeno comércio têm o mesmo efeito que tentar ajudar uma borboleta a sair do casulo. A ajuda impede o fortalecimento, a ajuda impede a mudança, a ajuda é contraproducente.
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Tantos milhões que se gastam em apoios, em formações, em... e onde está a mudança?
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Será que o futuro do pequeno comércio é continuar a ser o que sempre foi, alheio às mudanças no exterior?
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Será que o preço comanda todas as decisões de compra dos clientes? Será que o preço é o único critério de compra dos clientes?
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"In the early months of the recession Wal-Mart enjoyed increased store traffic and sales (Moi ici: A migração de valor, ver marcador). This certainly was the result of changing shopping patterns as consumers shifted to retailers with a low-price focus.
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In an attempt to reduce inventory costs, increase inventory turns, and improve efficiency, Fleming drastically reduced the number of SKUs in Wal-Mart stores. This immediately resulted in decreased traffic as customers went elsewhere to find the products no longer available at Wal-Mart. For the last four quarters, Wal-Mart has experienced decreases in sales. " (Trecho retirado de "The Wal-Mart Dilemma!"
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O preço é importante mas não é tudo. Mesmo em tempo de recessão o preço não é tudo.
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Há cerca de um ano escrevi aqui no blogue sobre o livro "Up Against the Wal Mart's" (parte I, parte II e parte III)... como é que o pequeno comércio pode combater os Continentes e Jumbos e Pingos Doces e Lidls deste país?
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Eles são grandes, eles são enormes, eles têm muito dinheiro, nós somos pequeninos...
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Talvez valha a pena ler a interpretação que Malcom Gladwell dá sobre o confronto entre David e Golias, ou sobre Lawrence e os turcos, ou sobre ... (texto de Gladwell aqui e a minha interpretação nesta série sobretudo neste postal).
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E volto a Toffler, tanto dinheiro gasto em apoios ao pequeno comércio e nunca ninguém convidou ou traduziu os trabalhos ou as teses de gente como Don Taylor e Jeanne Archer ou George Whalin? Até parece que somos o único poço do mundo.
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O que seguramente não tem funcionado e vai continuar a não funcionar é o coitadinhismo, ainda ao menos se os media não o alimentassem ...
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Como se instila mudança? Como se aponta para uma Terra Prometida onde corre leite e mel?
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Ainda ao menos se os media não alimentassem o coitadinhismo... e os políticos.
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BTW, se são dias para olhar para o céu ou não deve ser deixado ao livre arbítrio das pessoas, já Hayek no seu livro escreveu sobre a tentação de planear o tempo livre dos cidadãos pessoas impostados.
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13 comentários:

Jonh disse...

O comércio tradicional é, talvez, o "sector económico" de Portugal onde se vê a falta de estratégia empresarial. É claro que o comércio tradicional não consegue competir, na maioria das vezes, com as grandes superfícies pelo preço.

Mas será que eles já pensaram em diferenciação ou na especialização? Um pequeno supermercado pode aproveitar a proximidade com o cliente para ganhar vantagem competitiva. Um pequeno supermercado pode começar a vender fruta e legumes frescos. Um supermercado pode especializar-se na venda de produtos do campo. Um supermercado pode estabelecer relações próximas com os clientes. Um supermercado pode levar as compras à casa do cliente. O mesmo raciocínio pode ser aplicado às restantes lojas do comércio tradicional.

lookingforjohn disse...

Sarcasmo nº 1: naaa, eles precisam é disto: http://www.lac.com.pt/index.php

Sarcasmo nº 2: eu vi bem ou até este LAC é apoiado/ patrocinado/ financiado pelo ModCom?...

Jonh disse...

Bom dia Jonh (também sou Jonh :)),

Não conhecia este projecto (LAC). Não digo que não seja importante o atendimento e que não seja uma área a merecer melhoramento (o que mais vemos por aí todos os dias são atendimentos péssimos), mas antes disso tem que haver uma estratégia empresarial, uma estratégia que diferencie uma empresa das restantes, como diz o Carlos, uma empresa única.

Cumprimentos,

João

lookingforjohn disse...

Viva, Jonh.
Totalmente de acordo, daí eu ter explicitado que usava de sarcasmo. Esta coisa (que também é - muito - financiada) actua sobre a aparência do ponto de venda, tem zero carácter de intervenção estratégica. Aliás, a única proximidade com a expressão "estratégia" deve ter estado na própria ideia de avançar com isto para obter apoios comunitários e remunerar "adequadamente" os intervenientes na benfeitoria. (upa, sarcasmo outra vez...)
Talvez na francesinha (vai estar?) possamos desvendar mais acerca disto - que, contudo, não passa dum fait-divers no meio da questão central, que é da ausência de pensamento estratégico global, mas também da ausência de capacidade para fazê-lo (pensar).
Em suma, yes, que importa ter a montra mais bonita e as miúdas mais giras a atender se ninguém passa na rua onde abri a loja? Ou se ninguém compra os meus produtos?...

lookingforjohn disse...

é um detalhezinho, mas onde aparece "upa", deve ler-se "ups"... XD

Jonh disse...

Olá jonh,

Concordo totalmente com a sua visão. Apesar de concordar com a ideia de melhorar o atendimento e a satisfação ao cliente, a verdade, como diz, é que o pensamento estratégico permance inócuo.

Ainda por cima, é minha opinião, são os sectores primário e secundário que precisam mais de ajuda e não tanto o sector terciário. É no sector primário e secundário que se mede a competitividade de um país. No entanto, continuamos a gastar recursos públicos no apoio ao sector terciário.

NO que respeita ao jantar, por falta de tempo não poderei estar presente. Sou cá de cima do Norte (ainda mais cá em cima) - distrito de Braga - e visto que começarei esta semana a trabalhar, e tenho muito trabalho à minha espera, não pderei, com muita pena minha, não poderei estar presente.

Cumprimentos,

João

CCz disse...

Caro John,
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"Ainda por cima, é minha opinião, são os sectores primário e secundário que precisam mais de ajuda e não tanto o sector terciário."
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Cada vez me interrogo mais sobre se as ajudas servem para alguma coisa.
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Até que ponto não servem para proteger os incumbentes, e evitam a sua mudança ou desaperecimento?

Jonh disse...

Bom dia Carlos,

Compreendo e, de certa forma, até corroboro da sua opinião acerca das ajudas. Quando falo de ajudas não me refiro necessariamente a ajudas financeiras, e se me referir a elas apenas as admito na fase de arranque da empresa. Claro que existem muitas empresas que apenas se mantêm em pé por causa dos subsídios concedidos, o que é uma pena, a sua mentalidade empresarial não mudará.


Estas ajudas (talvez a palavra escolhida não tenha sido a melhor) podem ser de natureza formativa, etc.

Não percebo muito bem como é que o Estado, que é de todos nós, subsidia da mesma forma a criação de empresas, sejam do sector primário, secundário ou terciário (refiro-me, por exemplo às ILE's).

Cumpimentos

CCz disse...

Nem sei se a questão das ajudas não estará associada a crescimento desajustado à dimensão das empresas, tema referido pela José Silva aqui https://www.blogger.com/comment.g?blogID=8455467&postID=5223267354480097413&isPopup=true

Jonh disse...

No caso do arranque de uma empresa, uma ajuda financeira por parte do Estado, não estará a contribuir para adiar esse ajustamento. Estamos numa fase muito embrionária do clilo de vida da empresa.

Muitas vezes, um subsídio no arranque serve para que as pessoas com menos recursos também possam pôr as suas "boas" ideias em acção.


Claro, a partir do arranque da empresa, os frequentes subsídios concedidos servem para adiar o tal ajustamento...

CCz disse...

Nesse caso particular, caro John, estou tentado a concordar consigo, embora, resta a questão:
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Que projectos apoiar e com que critérios?
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Recordo o que Christensen escreveu recentemente sobre a falta de dinheiro na fase inicial das startups.
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Agora tenho de sair, logo vou pescar a citação.

Jonh disse...

Aí é que está o busílis da questão (que projectos apoiar e com que critérios). Claro, como aqui já disse, tem de se dar prioridade aos projectos do sector primário e secunário (os serviços, talvez, apenas os serviços turísticos que acrescentem verdadeiramente valor), pois são eles que nos dão competitividade. Não se pode, no entanto apoiar todos eles.

Fico um bocado preocupado quando vejo ou oiço notícias que dão conta que um projecto de interesse nacional (os chamados PIN) demoram 3 ou 4 anos a serem avaliados. Isso não se faz em semanas???

Muitos desses promotores acabam por desistir. Num país deficiário como Portugal, não nos podemos dar ao luxo de rejeitar, seja porque motivo for, um único projecto de acrescente valor....

CCz disse...

“Ironically, one thing that many promising startup companies suffer from is having too much capital. Once a company gets burdened with too much investor capital, it starts to think that it needs to grow very quickly. Almost always, a startup’s first strategy is wrong. Once they get out into the marketplace and try to sell things, they find that many of the things that they had assumed are untrue, and that their strategy needs recalibrating. But when a company is overcapitalized, the founders can assume that they’re right for quite a while before they start to need to depend on peoples’ willingness to pay. The more capital, the longer a company can go without testing its fundamental assumptions. Tough economic circumstances tend to keep capitalizations lower, so in general, in the long term, I think that lean economic times can foster a proliferation of disruptive companies.” (Moi ici: Tal como Tony Hsieh conta no seu livro acerca da história da Zappos, os primeiros anos foram de crónica falta de dinheiro o que os obrigou a fazer vários testes no modelo de negócio porque estavam sempre a olhar para o dinheiro em caixa.)
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http://www.newsweek.com/2010/08/18/predicting-innovation-winners-and-losers.html?from=rss